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Questão étnico-racial e gênero

ASSOCIAÇÃO CASA SÃO JOSÉ

Tainara Dos Santos 20

Palavras-Chave: Racismo. Adolescência. Hip-hop. 1. INTRODUÇÃO

Este trabalho refere-se ao projeto implementado como Projeto de Intervenção do estágio obrigatório III, do curso de graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina, na Associação Casa São José. Desse modo, este projeto teve como diretriz inserir o debate da questão racial com os adolescentes da instituição.

Assim, o objetivo geral consistiu em estimular o debate através do diálogo (instrumento que quebra barreiras) e da escuta, ferramentas chaves do processo, e propiciar reflexões críticas e antirracistas acerca das questões raciais tanto para sujeitos pretos quanto para sujeitos brancos. Além disso, tem como objetivos específicos elaborar e executar oficinas, com a utilização de material lúdico bem como filmes, livros, músicas, poesias, entre outros, que estimulem o debate das questões raciais e racismo; estimular a auto identificação da negritude como ferramenta política na construção social dos sujeitos; propiciar reflexões críticas e antirracistas com adolescentes de 13 á 15 anos.

Entendendo a adolescência como a principal fase de formação ideológica, onde as noções de mundo e de realidade começam a se concretizar com fortes pressões externas a se enquadrar a um padrão de gênero, raça/etnia, corpo, opiniões, entre outros. Entendendo também que para o combate da desigualdade racial é necessário que se fale, se escute e se aprenda sobre, com reflexões críticas para além do senso comum, proponho o Projeto: “Histórias, registros e escritos. N~o é conto, nem f|bula, lenda ou mito: Discutindo relações étnico raciais com adolescentes da Associaç~o Casa S~o José”.

A metodologia deste Projeto de Intervenção se dará a partir da realização de seis oficinas com instrumentais de caráter lúdico e concreto como filmes, livros, músicas, poesias, entre outros, com objetivo de trazer à tona o debate da questão étnico racial. Antes de iniciar a

20 Graduanda de Serviço Social e Bolsista do Programa de Monitoria pela Universidade Federal de Santa Catatina, tainara-

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primeira oficina apresentarei o Projeto aos adolescentes explicitando quais os objetivos e convidando-os a construir uma Batalha de Rap.

As ações se darão da seguinte forma: 1° Ação: Minha Característica.

2° Aç~o: “Com quem me pareço”.

3° Aç~o: Discuss~o filme “Vista Minha Pele”. 4° Ação: Atividade com Flávia (CRESS).

5° Ação: Hip-Hop como ferramenta antirracista. 6° Ação: Construção Batalha de Rap da CSJ. 2. DESENVOLVIMENTO

Segundo conclusões da análise do texto de João Baptista de Lacerda no I Congresso Universal de Raças realizado em Londres no ano de 1911:

(1) homens brancos e negros formam duas raças, e não espécies; (2) o mestiço é um tipo étnico variável e pode retornar a uma ou outra raça que o produziu; (3) a população atual se ressente do atraso e dos vícios que os negros trouxeram para o Brasil; (4) se o mestiço é inferior ao negro em força física, rivaliza com o branco em sua capacidade intelectual; (5) os mestiços brasileiros, diferentemente do que aconteceu em outros países, ajudaram no progresso do Brasil; (6) a imigração, a seleção sexual e a inexistência de preconceito de raça levarão à desaparição, breve, dos mestiços no Brasil; (7) em um século a população do Brasil será provavelmente branca e no mesmo período os índios e os negros desaparecerão; (8) um futuro brilhante aguardava o Brasil, que ocuparia o mesmo papel, na América do Sul, que os EUA desempenhavam na América do Norte. (SCHWARCZ, 2011, p. 231).

Tabela 1 - População Residente, por Cor ou Raça, Segundo a Situação do Domicílio, o Sexo e a Idade.

Total Branca Preta Parda Indígena

100 47,73 7,61 43,13 0,43

Fonte: IBGE - Censo Demográfico

Como pode-se observar acima, comparando o texto e a tabela, as previsões do médico João Baptista de Lacerda, cientista eleito para representar o Brasil no I Congresso Universal de Raças entre os dias 26 a 29 de julho de 1911, exposta em sua tese que propunha o “branqueamento do Brasil” felizmente foram traiçoeiras. Em 1911, 23 anos após a aboliç~o da escravatura o Brasil era visto como uma espécie de laboratório racial que se expressava e ainda se expressa pela “mistura das raças/etnias”, ou seja: a miscigenaç~o e/ou mestiçagem. É

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neste contexto de intensa miscigenação e projetos e ações que liquidem a mesma que ocorre o Congresso.

No gráfico do IBGE referente a classificação da população por cor ou raça observa-se que a população preta, parda e indígena juntas totalizam 51,17% da população Brasileira. Se totalizam 51,17% da população brasileira, abre-se o seguinte questionamento: Porque não encontramos 51,17%% da população preta, parda e/ou indígena ocupando espaços que não estejam relacionados à subalternidade da hierarquia social?

Ainda pensando estas inquietações e questionamentos onde este Projeto de Intervenção foi aplicado, na Associação Casa São José, no que diz respeito a presença de pretos na instituição, a negritude é expressiva entre usuários (indivíduos que encotram-se em situação de vulnerabilidade social) já no que diz respeito à equipe de profissionais não se aplica.

Pode-se dizer, então, que perdura fortemente no Brasil a ideia de democracia racial. A democracia racial é um termo utilizado para descrever as relações raciais no Brasil. A ideia do mito da democracia racial estrutura-se no imaginário racista de que na sociedade brasileira a branquitude e a negritude desfrutam das mesmas condições e que não há desigualdades sociais entre ambas e que o país escapou do racismo e da discriminação racial. Sendo assim o racismo é uma desigualdade que opera expondo pessoas negras a situações de discriminação que geram desigualdade e danos à saúde.

Se o serviço social atua nas expressões da questão social, que são o conjunto das expressões que definem as desigualdades da sociedade, acredito ser coerente impulsionar o debate acerca das questões raciais da sociedade brasileira bem como propostas de intervenções no âmbito da profissão uma vez que este tema tem destaque tímido no interior da categoria. É necessário entender o racismo como um determinante na condição de existência dos indivíduos e que esta classe trabalhadora, para qual o serviço social e suas produções voltam-se, tem marcadores de raça/etnia, entre outros.

Ainda no que se refere a questão racial no serviço social, o código de ética profissional de 1993 é nítido no artigo VI:

VI. Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças. (CFESS, 2012, p. 23).

E no artigo XI:

XI. Exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade,

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orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física. (CFESS, 2012, p. 24).

Este projeto, então, vem no sentido de inserir o debate sobre questão racial através de momentos lúdicos entre os adolescentes, por meio da intervenção do serviço social na CSJ. Ainda busca propor reflexões antirracistas que contribuam para a formação de indivíduos críticos que saibam identificar situações de racismo e intervir nelas seja se afirmando como negritude ou reconhecendo seu papel de branquitude.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este projeto foi aplicado na Associação Casa São José nos meses de maio à junho de 2019. Nos primeiros dois encontros, com as atividades “ Minha Característica” e “Com quem me pareço”, busquei trabalhar e estimular a auto identificaç~o racial dos adolescentes como forma política de se posicionar. Ainda, com objetivo de captar melhor as falas, gravei estes encontros e fiz uso da escuta qualificada como instrumental-técnico.

Nos dois encontros seguintes os mesmos foram estimulados a identificar situações de racismo e a debater sobre elas. Além disso, os adolescentes relataram situações que até então não sabiam identificar e que a partir daquele momento entenderam como sendo discriminação racial. A partir da identificação, então, é possível se sentir mais confiante para intervir e se posicionar.

Os últimos encontros ressaltaram a importância do hip-hop (gênero musical com forte influência nas periferias) como escudo na luta antirracista e como forte disseminador de conhecimento entre os jovens. Foi no último encontro, a partir de duas convidadas Mc’s, que os adolescentes puderam expressar, através de frases rimadas, o acúmulo do que foi desenvolvido nos seis encontros.

Contudo, fica cada vez mais evidente a necessidade de debates, pesquisas e outros meios que possam promover uma compreensão mais evidente da questão racial na sociedade brasileira e sobretudo nos processos de formação e exercício profissional de Assistentes Sociais, no intuito de modificar as bases estruturais dos processos de sociabilidade dos indivíduos.

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