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Apesar de reconhecermos que a palavra metodologia pretende transmitir a ideia de caminho e de orientação, também estamos conscientes do quão difícil é penetrar nesse mesmo caminho, ensaiando o esforço dos primeiros e titubeantes passos, face à meta que nos propomos alcançar.

A escolha de uma metodologia de investigação assenta sobre uma extensa gama de tomadas de decisão, indispensáveis à definição de um conjunto de procedimentos, que se constituem, à partida, em tarefa exigente e rigorosa relativamente à obtenção, recolha, análise e tratamento de dados, suscetíveis de tornarem visíveis e compreensíveis as dimensões exploradas e encontradas no campo de estudo em que pretendemos penetrar.

1.7.1. Opções metodológicas, sujeitos empíricos e fontes documentais

Para analisar, detalhadamente, o modelo de Educação Especial, que foi implementado na Madeira, escolhemos como metodologia uma abordagem do tipo qualitativo, tipificada num estudo de caso.

Em complementaridade, iremos depois associá-lo ao método narrativo de Histórias de Vida, aplicado aos diferentes sujeitos empíricos, no convite à narrativa da sua experiência na Educação Especial da Madeira e também para investigar, de modo retrospetivo, até que ponto, a pessoa e a História de Vida do Professor Eleutério de Aguiar, enquanto professor, decisor político, dirigente e líder, foi determinante para a especificidade do modelo que ele criou e tutelou, ao longo de várias décadas.

Estabelecida a opção metodológica, procuraremos realizar a componente empírica do nosso trabalho em duas fases distintas: numa primeira fase criaremos um guião de entrevista, construído para o efeito, quer a partir da literatura consultada, que corporizará o enquadramento teórico do nosso trabalho, bem como dos objetivos, anteriormente delineados.

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Como podemos verificar na figura 1, realizaremos entrevistas semiestruturadas a vinte e oito sujeitos empíricos, aos quais associámos os testemunhos de dois ex-alunos. Uns e outros constituem a população alvo do nosso estudo, distribuídos por diferentes categorias, visando, quer a obtenção de olhares diversificados, face à realidade em estudo, quer o reavivar de memórias narrativas, como forma de aceder aos acontecimentos e ao conhecimento dos factos.

Para tal, teremos em conta as narrativas de três políticos (ex-Secretários Regionais de Educação); dezassete Profissionais (docentes especializados e técnicos de diferentes áreas de intervenção); quatro Pessoas com Necessidades Especiais (que tenham usufruído dos serviços da Educação Especial e Reabilitação na Madeira); quatro colaboradores externos (peritos que, em determinado momento, tenham colaborado, ao nível do aconselhamento, consultadoria ou formação, na área das Necessidades Especiais, aos profissionais da Educação Especial na Madeira) e ainda dois familiares do Professor Eleutério de Aguiar:

Fig. 1: Sujeitos empíricos do estudo

Os documentos, quais artefactos que conservam e testemunham, indelevelmente, as marcas de histórias, decisões, discursos e opiniões revelam-se cruciais para se estabelecerem pontes entre o passado e o presente.

Profissionais (17)

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Neste sentido, cientes da importância de que a mesma se reveste, numa segunda fase, procederemos à análise documental, no intuito de pesquisar dados, inerentes ao percurso e à organização do modelo de Educação Especial na Madeira, presentes em normativos, discursos proferidos, jornais, revistas/publicações, prémios e outros elementos de reconhecimento público, como destacamos no esquema que a figura n.º 2 traduz:

Fig. 2: Fontes de pesquisa para o estudo

1.7.2. Período em análise (em que tempo aconteceu?)

Garaudy (1975), citando Claudel defende que “o tempo é o sentido da vida. (sentido: como se diz o sentido dum curso de água, o sentido duma frase, o sentido dum tecido, o sentido do olfacto)” (p. 51). Também Iturra (1998) salienta o factor tempo, relativamente à influência e impacto que o mesmo projeta no percurso vital dos seres humanos, tanto a nível individual como social, afirmando:

(...) o tempo é o crescimento da experiência. O tempo é a reprodução do grupo. O tempo é o indivíduo a ganhar saber. O tempo, em fim, é a entrada do indivíduo nos vários sítios sociais. Quer a entrada no próprio saber, quer no saber do grupo, aberto como um leque. Cada momento da vida, é entendido de forma diferente, conforme a experiência pragmática que a pessoa desenvolve e incute no seu entendimento. Nas suas ideias, nas suas alianças com os outros, nas suas separações dos outros, nos seus lutos (p. 27).

Fontes

Prémios

e mérito Publicações

Discursos

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Por conseguinte, conscientes da relevância que o tempo incute na história das pessoas e dos factos, após a determinação das dimensões, anteriormente apresentadas, sentimos uma premente necessidade de decidir em que horizonte temporal enquadraríamos o fenómeno a investigar.

Assim, a nossa escolha recaiu no período que vai desde o início dos serviços de Educação Especial em 1965, até à extinção, em dezembro de 2011, da Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação, que os tinha tutelado até esta época.

Tendo em conta o extenso período em análise, dividimo-lo em cinco décadas, tal como mostra a figura 3, estabelecidas enquanto patamares de análise, no intuito de situar e relevar os acontecimentos essenciais que cada um desses períodos abarcou.

Fig. 3: Período a investigar

1.7.3. Período em análise (como aconteceu?)

Devemos referir que, para além do exercício de apreciação dos dados de estrutura, emanados da cronologia, e subjacente ao percurso evolutivo do modelo de Educação Especial que vigorou na Madeira, move-nos a pretensão de conhecer também o seu dinamismo, inscrito na singularidade da sua história, olhada sob o ponto de vista que Ricouer (2003) nos oferece quando, associando memória e história, defende:

(...) a memória pode aparecer duas vezes ao longo da nossa análise: antes de mais, como matriz da história, se nos colocarmos no ponto de vista da escrita da história, depois como canal da reapropriação do passado histórico tal como nos é narrado pelos relatos históricos (...) o passado é reconhecido (...) e rememorado (...) (s. p).

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Fá-lo-emos, a partir dos olhares dos sujeitos empíricos e dos dados provenientes das fontes documentais, que nos propomos pesquisar, apoiados nas dimensões: retrospetiva- perspetiva-prospetiva-conhecimento, que apresentamos, seguidamente, na figura 4.

Fig. 4: Retrospetiva-perspetiva-prospetiva-conhecimento

Concluída a recolha e a respetiva análise de dados relativos aos acontecimentos que desencadearam, determinaram e autenticaram a intervenção da Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação (DREER) na Madeira, procederemos à sua triangulação, no sentido de verificar que analogias significantes se entrelaçam entre os mesmos, suscetíveis de se constituírem em saber e conhecimento a eleger e a preservar, porque de acordo com Touraine (1996) “O essencial é que a separação crescente entre o actor e o sistema seja substituída pela sua interdependência, graças à ideia de sistema de acção” (pp. 23-24).

Deste modo, apresentada que está a moldura representativa das ações, das relações e do dinamismo que determinaram os acontecimentos, em que pretendemos enquadrar o nosso trabalho de investigação, resta-nos empreender a caminhada, enfrentando e vencendo as encruzilhadas do desassossego, face à romagem de ideias, de obras, de autores, de vozes, de informações, de dados, de azáfamas e de acontecimentos que nos esperam.

Parte B - Da divagação (pela bibliografia) ao enquadramento

(conceptual)

Pelo sonho é que vamos, Comovidos e mudos.

Chegamos? Não chegamos? Haja ou não frutos,

Pelo Sonho é que vamos. Basta a fé no que temos. Basta a esperança naquilo Que talvez não teremos. Basta que a alma demos, Com a mesma alegria, Ao que desconhecemos E ao que é do dia-a-dia. Chegamos? Não chegamos? - Partimos. Vamos. Somos.

Capítulo 2 - Ciências da educação e educação especial: paradigmas e

percursos

De olhos postos no horizonte que o campo da educação perspetiva, calcorreadas que estão quase duas décadas deste auspicioso século XXI, somos levados a constatar que a Modernidade, a Pós-Modernidade e a Contemporaneidade nos colocam perante a evidência de um mundo incomensurável e gradativamente globalizado, pródigo em novidades, alternâncias, aspirações e desafios, mas também espelho de contradições.

É indubitável que esta circunstância impulsiona e determina a incessante urgência de reflexão, acerca dos desígnios da condição humana, em que a singularidade e a pluralidade, os direitos e os deveres, as conquistas e as derrotas, os avanços e os retrocessos assumem um especial relevo, conjugados na esteira de um presente que, ao reavivar as lutas do passado, sonha e projeta o devir, estabelecido em progresso e realização.

Consequentemente, as tendências e as oscilações provenientes da globalização económica, política e cultural, marcadas pela complexidade e pela incerteza, despoletaram a inevitabilidade de se estabelecerem novos modos de olhar e de lidar com a realidade, à luz dos novos conhecimentos e descobertas, com que os diferentes campos científicos foram patenteando o mundo, em domínios distintos, diversificados e decisivamente influentes, nos quais as áreas da educação e do saber se estabelecem como trampolins de progresso e de evolução.

De facto, é com o legado, oriundo da educação que, de geração em geração, desde os tempos mais remotos da sua História, a Humanidade olha o futuro, qual icebergue de um empreendimento catalisador de sonhos insondáveis, de esperanças acalentadas, de realizações ambicionadas, de curiosidade infinita, mas também de receios profundos, onde se inscrevem medos e incertezas dilacerantes, suscetíveis de serem vencidos e ultrapassados pelo conhecimento, pela cultura e pelos saberes adquiridos.

Entretanto, o mundo contemporâneo, herdeiro do fenómeno de mutação social, ditado pela evolução, pelas descobertas e pelos paradigmas que o mundo da Ciência e a ação do homem têm vindo a imputar à realidade existencial, ensaia, no presente, a gestão de um futuro que se apresenta tão próximo na necessidade de intervenção e, por vezes, tão longínquo face à dificuldade em determinar respostas promissoras e significativas, circunstâncias a que o campo educacional não pode, de modo algum, ficar alheio.

A este propósito, Toffler (1970), incentivando-nos a ultrapassar obstáculos e barreiras, recomenda: “Não obstante tudo isto, é tempo de acabar, de uma vez para sempre, com o mito popular de que o futuro é “insondável”. As dificuldades devem disciplinar e desafiar, e não paralisar” (p. 453).

Apresentada deste modo, enquanto desafio que urge disciplinar, e de acordo com Giddens (1995), não podemos ignorar que a Modernidade emerge, em cadência de descontinuidade, marcando o ritmo da sua extensividade (efeito da mudança nas interações sociais de ordem global) e intensividade (resultado da mudança a nível pessoal e existencial).

Por tudo isto é urgente acreditar que o acolhimento dos fundamentos da educação, associado à tarefa da sua projeção em práticas educativas significativas e proativas, promotoras de espírito crítico, desenvolvimento global, autonomia e emancipação revela-se fundamental para a evolução, satisfação, equidade e bem-estar dos seres humanos.

No entanto, ainda que evocada e proclamada como direito inabalável e valor fundamental da vida em sociedade, a educação é afetada pelas tomadas de decisão, movimentos e ditames, oriundos de diferentes contextos, interesses, factos e acontecimentos, à escala global e local. Atento a esta circunstância, Monteiro (2017) refere-se à globalização, que nenhum de nós pode ignorar, defendendo que:

O Mundo novo da Globalização precisa de uma educação global, isto é, que seja educação de todo o ser humano, do ser humano todo, durante a vida toda, em todos os lugares da vida. Uma educação não meramente instrumental e utilitarista, redutora e deformadora das crianças e dos adolescentes (...) como “capital humano”, mas com visão das múltiplas dimensões do desenvolvimento humano: pessoal, cultural, social, ética, cívica, estética, económica, ecológica (p. 268).

Conscientes de que a Educação se constitui em agente promotor de dinamismo, importa reativar e compreender o âmago do protagonismo que, quer as Ciências Sociais, quer as Ciências da Educação, desempenharam, e continuam a desempenhar, no estudo e na análise dos fenómenos adstritos à complexidade e à mudança, enquanto circunstâncias intrínsecas à natureza humana, suscetíveis de impulsionar e determinar o percurso existencial e histórico das sociedades, dos sistemas educativos e das pessoas.

É isso que nos propomos fazer, no presente capítulo, perscrutando conceitos, retratando épocas preponderantes e revisitando autores de referência que, a propósito dos diferentes âmbitos em que a educação se inscreve, estabeleceram o constructo de ideais, argumentos, modus operandi e metas que a devem sustentar, na senda da sua universalização e legitimidade, ao serviço dos povos.