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3.3 Funções psíquicas

3.3.3 O uso de signos

3.3.3.2 Choro comunicativo

A primeira etapa do desenvolvimento linguístico é denominada de período pré- linguístico e ocorre, segundo Pontes (2005, p.143), do nascimento até aproximadamente um ano e um ano e três meses. Nesse período acontecem os primeiros recursos comunicativos, principalmente com a mãe. Pontes acrescenta que essas trocas comunicativas, inicialmente, podem ser observadas através do choro “cuja entonação, ritmo e intensidade podem vir carregadas de informações”. Ao modificar o choro de acordo com a situação, o bebê está demonstrando que houve uma aprendizagem.

Winnicott dedicou uma parte de seus estudos para compreender o choro do bebê já que o considerava como uma manifestação comunicativa na interação mãe/bebê. Para Winnicott (1977, p. 64), “os bebês, tanto quanto necessitam de leite e de carinho maternos, também precisam do amor e compreensão da mãe”. Nesse sentido, ele aponta o choro como um elemento de aprendizagem dentro dessa relação, classificando o choro em quatro tipos: satisfação, dor, raiva e pesar.

Winnicott concorda com os médicos quando dizem que “o choro veemente do bebê recém-nascido é um sintoma de saúde e energia”. Todavia, para Winnicott (1977, p. 66), é muito mais que satisfação como “uma forma inicial de exercício físico, o desempenho ativo de uma função, satisfatório como tal e mesmo agradável”. Assim, para a área médica, o choro inicial, no momento do nascimento, representa o impulso de vida; a satisfação estaria sendo traduzida pela possibilidade de viver. Entretanto, para Winnicott (1977, p. 66-67), o choro possui um

aprofundamento em sua interpretação, devendo ser entendido em suas diversas modalidades. Assim, o choro de dor e de apreensão ocorre quando a criança “está em dificuldade e necessita de auxílio da mãe”. Para este autor “quando o bebê sente alguma dor, emite som penetrante ou guincho e, com frequência, dá ao mesmo tempo uma indicação do lugar onde está a dificuldade”. Nesse caso, a criança chora diante de uma dor física, fome, cólica, etc.

Segundo Winnicott (1977, p. 67), o choro de dor é rapidamente esquecido quando o adulto de alguma forma atende a criança buscando uma maneira de sanar a dor. Entretanto, com o tempo, surge o choro de apreensão ou medo. Nesse caso, a criança demonstra que aprendeu a antecipar a sensação que resultou na dor. Winnicott acredita que o choro de apreensão é um indício de que “o bebê está travando conhecimento com uma ou duas coisas”. Ele diz que a base desse choro é a dor e:

[...] é por isso que o pranto soa da mesma maneira em ambos os casos, mas agora é uma dor recordada e que ele já espera ver repetida. Depois de um bebê ter conhecido qualquer sensação dolorosamente aguda, poderá chorar de medo quando acontece qualquer outra que o ameace de voltar a ter essa mesma sensação. E logo começa a ter ideias, algumas assustadoras, e então volta a chorar porque alguma coisa recordou ao bebê a dor, embora essa alguma coisa seja agora imaginária. (WINNICOTT, 1977, p. 68).

Nem sempre é possível satisfazer todas as necessidades de uma criança ou bebê e, muito menos, a seu tempo. O choro de raiva tem início a partir de uma necessidade não satisfeita imediatamente. Winnicott (idem) diz que “o bebê sabe o que é estar furioso. Por mais que a mãe se esforce, nada impede que ela o decepcione algumas vezes, e ele chorará de raiva”. Segundo este pesquisador:

É uma coisa saudável para o bebê conhecer a extensão completa da sua capacidade de fúria. Compreenda-se: o bebê certamente não se sente inofensivo quando está raivoso. As mães conhecem bem o ar com que ele fica. Grita, esperneia e, se já tiver idade para isso, levanta-se e sacode as grades do berço [...] Por alguns minutos, sua intenção é realmente destruir ou, pelo menos, danificar tudo e todos, e nem sequer lhe importa destruir a si próprio no decorrer da crise. (WINNICOTT, 1977, p. 69).

Neste processo de aprendizagem, Winnicott (1977, p. 69) diz que a criança com raiva

possui autenticidade porque “sabe o que quer, sabe como conseguir o que quer e recusa-se a perder a esperança de consegui-lo”.

Winnicott faz uma comparação entre o sentimento de um adulto e o de uma criança diante do sentimento de tristeza, sendo essa a quarta classificação de choro. Assim:

Se pela perda de alguém que amamos profundamente, não podemos evitar uma dolorosa tristeza, cumprimos um período de luto que os nossos amigos compreendem e toleram. E, depois disso, podemos esperar uma recuperação,

mais cedo ou mais tarde. Não nos deixamos entregar a uma tristeza aguda, a qualquer momento do dia ou da noite, como acontece aos bebês. (WINNICOTT, 1977, p. 70).

Portanto, Winnicott (1977, p. 71) define o choro de tristeza e aponta uma diferença entre a raiva e a tristeza, visto que, “enquanto a raiva é uma reação mais ou menos direta à frustração, a tristeza implica acontecimentos bastante complexos na mente infantil”. Além disso, ao se dirigir às mães, o autor diz que “quando o seu bebê mostra que pode chorar de tristeza, você poderá deduzir que ele percorreu uma longa jornada no desenvolvimento de seus sentimentos”. Ele completa seu pensamento sobre o choro de tristeza com a seguinte afirmação:

[...] um bebê triste poderá necessitar do amor físico e demonstrativo da mãe. O que ele não precisa, contudo, é ser distraído efusivamente (por exemplo, fazê-lo saltar no colo, provocar cócegas, etc.) da sua tristeza. Digamos que ele se encontra num estado de luto e requer certo período de tempo para recuperar-se. Precisa apenas de saber que a mãe continua a amá-lo e, por vezes, pode ser preferível deixá-lo chorar à vontade. (WINNICOTT, 1977, p. 74).

Por fim, ele aponta um quinto tipo de choro, chamando-o de choro de desamparo ou desespero, sendo para ele “o choro em que todos os outros tipos se diluem se não restar qualquer esperança no espírito do bebê”. Porém, ele reforça que somente nas instituições ouviu “o choro de desamparo e desintegração, onde não existem meios nem possibilidades de fornecer uma mãe para cada bebê”. Winnicott se refere às instituições e abrigos de crianças órfãs e abandonadas nas quais desenvolveu muitas de suas pesquisas.

Ele conclui sua palestra sobre o choro infantil dizendo que, quando existe uma mãe que ampare e esteja disposta a cuidar de seu bebê, ele terá condições de caminhar em frente e demonstrar à mãe “quando está zangado com ela e quando a ama, quando quer livrar-se dela, quando está ansioso ou com medo, ou quando apenas quer que a mãe compreenda que ele está triste”. Não se pode negar a importância deste código comunicativo entre a família ouvinte e a criança surda como um diálogo inicial em que a criança pode expressar seus medos, anseios e desejos buscando no adulto um amparo psíquico.