• Nenhum resultado encontrado

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

F ACTORES P ESSOAIS

3. C ONDICIONANTES C ONTEXTUAIS

3.1. Factores Inerentes aos Contextos Institucionais de Trabalho

3.1.3. O Clima Institucional

A cultura institucional é também fortemente marcada pela dinâmica relacional e pelos conflitos de poder. A cultura institucional ultrapassa aqui o conjunto de valores, crenças ou práticas partilhadas, incorporando simultaneamente um sistema de “equilíbrio de facções

mais do que uma unidade sólida” (Zabalza, 2004, p.84). Para o autor, o ensino superior é por

163

estilos de vida, circunstâncias intensificadas pelos fenómenos de democratização” (idem, p.

84).

Referimo-nos portanto ao clima relacional, que vai muito além do clima experienciado em sala de aula, mas que se estende também ao clima que de forma mais abrangente é experienciado no seio das instituições, a par da cultura que a representa. Assim, o clima é também exortado na literatura como factor com ascendência no envolvimento dos actores e das organizações em processos conducentes ao desenvolvimento profissional. Um exemplo recente decorrente dos resultados do projecto Talis revela que um dos factores com maior impacto no envolvimento dos professores (aqui do ensino básico e secundário) em processos de desenvolvimento profissional é a presença de um clima de escola positivo que leva os professores a acreditar que a melhoria da educação e da aprendizagem é uma missão simultaneamente individual e colectiva, acarretando por isso desenvolvimento dos actores e da organização (Scheerens, 2010).

Deter-nos-emos em dois ângulos de análise: o peso das relações interpessoais, por um lado, e das relações de poder que marcam a vidas das instituições, por outro.

As Relações Interpessoais

Alguns dos factores apontados como decisivos nas formas de actuação e no desenvolvimento profissional dos docentes do ensino superior são aspectos inerentes às relações interpessoais (Cafarella & Zinn, 1999; Escudero, 1999; Feixas, 2002, 2004; Robertson, 1999; Zabalza, 2004). Destacamos como variáveis a atender: o suporte pessoal no trabalho, a relação com as chefias, o clima de respeito entre colegas, o trabalho em equipa e os níveis de competição, entre outros.

A estas condições associam-se os fenómenos decorrentes da vida pessoal dos docentes, correspondendo ao efeito de condicionalismos decursivos de um contexto menos imediato (Bronfenbrenner, 1983) sobre a dimensão profissional. Ao mesmo tempo, é apontado especificamente o impacto das relações familiares e das relações de amizade nos processos de desenvolvimento profissional. Diversos autores reconhecem o inegável efeito quer dos acontecimentos da vida familiar, que requerem maior ou menor implicação por parte dos sujeitos (Feixas, 2004), quer dos níveis de apoio e suporte que possam existir para que os docentes invistam na sua carreira e no seu desenvolvimento profissional (Caffarella & Zinn, 1999; Knight et al., 2006).

164

A literatura é abundante no que diz respeito à influência do clima organizacional e das relações entre os colegas, nomeadamente no que diz respeito ao estabelecimento de culturas de práticas colaborativas, práticas essas reconhecidas em diversos estudos com professores de outros níveis de ensino pelo efeito potenciador do desenvolvimento profissional.

As Relações de Poder

Como salientámos, é possível identificar alguns traços comuns que marcam a cultura do ensino superior (visível na componente formal das instituições) e que surgem como factores com poder para limitar ou potenciar processos de desenvolvimento profissional no seu seio. Comecemos por apontar dois elementos fundamentais inerentes às relações de poder que se estabelecem em diferentes níveis:

Por um lado, sinalizamos o(s) tipo(s) de relação com o poder externo, destacando em particular a questão da autonomia, aqui não a autonomia de cátedra tradicionalmente consignada ao docente, mas a autonomia institucional (o que nos remete para o contexto político da profissão, tópico que retomaremos mais adiante) e a forma como esta é percebida pelos diferentes actores.

Por outro lado, atentamos aos fenómenos de regulação interna, balizados pelas culturas organizativas e associados aos níveis de participação e decisão dentro das instituições (componente dinâmica da cultura institucional). Comecemos por atender a estes últimos. A regulação interna

As instituições de ensino superior são organizações atípicas, mormente, pela forma como têm adoptado altos níveis de participação dos diferentes grupos de actores nos processos de gestão interna (Zabalza, 2004).

A democracia característica das instituições de ensino superior reflecte-se, por um lado, na constituição de diversos órgãos colegiais, com representação de diferentes sectores da vida institucional e, por outro, na própria selecção dos representantes, resultante de processos de eleição entre pares. Se esta disseminação dos níveis de decisão (estruturas policêntricas) facilita a participação dos indivíduos, pode igualmente dificultar a manutenção de uma linha de orientação e de políticas comuns. Com efeito, a forte democratização das instituições, que se verifica, por exemplo, em processos de tomada de decisão dependentes de órgãos colegiais, pode levar a longos processos negociais, capazes, por seu turno, de conduzir ao arrastamento de tomadas de decisão e de mudança, uma vez que esta participação inevitavelmente implica a

165 presença de grupos organizados com filiações de diferentes tipos (políticas, sindicais, profissionais, interesses, vinculação a pessoas, religiosas…) (Zabalza, 2004).

Estamos perante uma situação ambivalente, uma vez que a democracia de natureza formal e estatutária poderá ser favorável ao desenvolvimento de culturas genuínas de trabalho cooperativo ou, em consequência dos sistemas de relações e de comunicação vigentes, traduzir-se em esquemas de colegialidade forçada (Fullan, 1990; Hargreaves, 1997xxix

; Zabalza, 2004). Se na primeira situação é vasto o acordo em torno do seu potencial em termos de promoção do desenvolvimento profissional, na segunda condição, o trabalho em equipa poderá ficar limitado à resposta a tarefas burocráticas e de natureza administrativa, cimentando, assim, a tendência do professor para o isolamento, assente na permanência de um poder individual decorrente de um estatuto auferido (primum inter pares), por vezes de difícil permeabilidade (Escudero, 1999; Zabalza, 2004).

Face ao exposto, o papel dos docentes na regulação da estrutura, afigura-se-nos ser ainda mais poderoso no contexto particular do ensino superior. “Em algum sentido a docência directa

prima mais pela anarquia” (Zabalza, 2004, p.75) isto é, “o ensino relegado para a esfera privada e discricional” (idem, p.75) em que cada um faz o que melhor lhe parece, pouco

sendo influenciado pela dinâmica democrática.

É igualmente assinalada a presença de “corporativismos disfarçados de liberdade de cátedra

mal entendidas” (Escudero, 1999, p.138), a que Cunha (2005) associa a um outro fenómeno:

o saber como delimitador de espaços de poder nas universidades, através do qual se definem limites e propriedades para os que o dominam. A este propósito Becher (1989) faz referência à existência de tribos e territórios no seio das instituições de ensino superior.

Para romper com esta tendência para o isolamento dos docentes ou a organização em territórios impenetráveis, assume especial relevância a dinâmica da instituição e a forma como esta se configura. Referimo-nos, nomeadamente aos mecanismos de coordenação, aos sistemas de comunicação, às relações hierárquicas e aos estilos de liderança, entre outros (Imbernón, 1999b; Ramsden, 2004; Zabalza, 2004), dependendo ainda do grau de formalização das hierarquias (Zabalza, 2004). Para este último autor quanto mais estabilizada uma instituição ou grupo se encontrar mais se vai fixando a sua estrutura interna.

O segundo nível de relações de poder que enunciamos prende-se com a(s) conexão(ões) com o(s) poder(es) externo(s) remetendo-nos para uma análise do contexto político da profissão docente.

166