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Collective Arbitration

No documento Ana Luiza Barreto de Andrade Fernandes Nery (páginas 192-198)

CAPÍTULO III – CLASS ARBITRATION NO DIREITO ESTRANGEIRO:

III.2 Breve histórico da Large-Scale Arbitration

III.2.3 Collective Arbitration

A terceira forma de arbitragem em larga escala é a collective

arbitration, que inclui diferentes procedimentos em grande escala unificados

unicamente pelo fato de que são mecanismos privados que não se encaixam na definição de class arbitration.446

446 S. I. STRONG. Class, Mass and Collective Arbitration in National and International Law, Oxford: Oxford University Press, 2013, n. 1.31, p. 17.

Na Espanha, o Decreto 231/2008 instituiu e regulamentou o Sistema Arbitral de Consumo desenvolvendo uma modalidade de collective

arbitration.447

O artigo 56 do referido diploma legal indica que há apenas um tema passível de sujeição à collective arbitration:

“Artigo 56. Arbitragem de consumo coletivo.

A arbitragem de consumo coletivo tem por objeto resolver em um único procedimento arbitral de consumo os conflitos que, com base no mesmo pressuposto fático, tenham podido lesar os interesses coletivos dos consumidores e usuários, afetando um número determinado ou determinável de pessoas.” 448

Não cabe a arbitragem de consumo, entretanto, para proteger intereses difusos, em que os prejudicados são uma pluralidade de consumidores indeterminada ou de difícil determinação.449

Segundo prescreve o artigo 58 da Lei, o Presidente da Junta Arbitral competente adotará, de ofício ou a requerimento das associações representativas de consumidores, um acordo de iniciação de autuações. Uma vez adotado, o Presidente requererá à empresa supostamente causadora dos danos consumeristas para que manifeste, no prazo de 15 (quinze) dias, se aceita se submeter à arbitragem de consumo coletivo e, nesse caso, que proponha um acordo para satisfazer total ou parcialmente os potenciais consumidores lesados.

447 S. I. STRONG. Class, Mass and Collective Arbitration in National and International Law, Oxford: Oxford University Press, 2013, n. 1.35, p. 19.

448 No original: “Artículo 56. Arbitraje de consumo colectivo. El arbitraje de consumo colectivo tiene

por objeto resolver en un único procedimiento arbitral de consumo los conflictos que, en base al mismo presupuesto fáctico, hayan podido lesionar los intereses colectivos de los consumidores y usuarios, afectando a un número determinado o determinable de éstos”.

449 Manuel Jesús MARÍN LÓPEZ. Análisis del Real Decreto 231/2008, de 15 de febrero, que regula el Sistema Arbitral de Consumo, disponível em:

https://www.uclm.es/centro/cesco/pdf/trabajos/19/2008/19-2008-1.pdf, acesso em 22.7.2015, às 1h04min.

Se a empresa não aceitar, se decretará o arquivo das autuações. Se aceitar, se fará um chamamento aos consumidores afetados, por meio de publicação de anúncio no diário oficial correspondente, para que exerçam seus direitos na arbitragem (artigo 59 da Lei). O chamamento se realizará por um prazo de dois meses a partir de sua publicação e deve observar os requisitos insertos no artigo 59 da Lei.

A aceitação, pelo fornecedor, para resolver em um único procedimento arbitral os interesses coletivos dos consumidores afetados pelo fato lesivo suspende a tramitação das ações individuais que tenham por objeto o mesmo pedido.450

Efetuado o chamamento, o Presidente da Junta Arbitral designará o órgão arbitral. Os consumidores que queiram que seus direitos se resolvam nesse processo coletivo devem apresentar seu requerimento dentro desse prazo de dois meses. O artigo 61 da Lei estabelece que as petições apresentadas depois dessa data, desde que antes da audiência, também serão aceitas. Nesse último caso, a admissão do requerimento no retroagirá em relação aos atos processuais já praticados, mas o consumidor poderá intervir em todos os atos processuais posteriores.

O artigo 62 da Lei determina que o prazo de seis meses para a prolação da sentença arbitral coletiva começa a computar transcorridos dois meses da publicação do chamamento dos interessados no diário oficial.

RICHARD GONZÁLEZ entende que, uma vez tendo sido

sistematizada a arbitragem de consumo com vistas a proteger o consumidor na Espanha, figura-se absolutamente lógico o mecanismo que permite a propositura de reclamações de vários consumidores contra uma ou mais empresas a respeito

450 Pedro MARTÍNEZ GONZÁLEZ. El nuovo regímen del arbitraje, Barcelona: Bosch, 2011, n. XXII., pp. 217-262.

do mesmo fato lesivo.451 A collective arbitration seria, para esse autor,

consequência lógica do sistema arbitral de consumo espanhol.

Para MARÍN LÓPEZ, a sentença arbitral proferida na

arbitragem coletiva apenas afetará os consumidores que efetivamente participaram da arbitragem, seja porque requereram sua participação por meio do chamamento, seja porque esse requerimento foi trazido aos autos da arbitragem coletiva. Dessa sentença, portanto, não podem se beneficiar outros consumidores afetados por esses mesmos atos, tampouco são atingidos pela coisa julgada formada nessa arbitragem. Assim, concluída a arbitragem, os demais consumidores lesados podem iniciar os procedimentos judiciais ou arbitrais que a eles correspondam. 452

No mesmo sentido é o posicionamento de DIANA MARCOS FRANCISCO, para quem a arbitragem coletiva de consumo não se consubstancia

instituto cujo regime jurídico corresponda com a tutela coletiva, incompatível, para essa autora, com a voluntariedade característica da arbitragem. A sentença da arbitragem coletiva de consumo não pode beneficiar consumidores que não estejam presentes na arbitragem. Para ela, trata-se de meramente uma acumulação objetiva-subjetiva de ações como resumo de conflitos individuais.453

451 Manuel RICHARD GONZÁLEZ. Análisis crítico del sistema y los procedimentos arbitrales y de mediación en España. Especial atención a la reforma de la Ley de Arbitraje (Ley 11/2011) y al proyecto de Ley de Mediación de 2011, in: Manuel RICHARD GONZÁLEZ, Iñaki RIAÑO BRUN, José Maria

RIFÁ SOLER (coord) Estudios sobre Arbitraje de Consumo, Pamplona: Thomson Reuters, 2011, n. II,

pp. 67-146.

452 Manuel Jesús MARÍN LÓPEZ. Análisis del Real Decreto 231/2008, de 15 de febrero, que regula el Sistema Arbitral de Consumo, disponível em:

https://www.uclm.es/centro/cesco/pdf/trabajos/19/2008/19-2008-1.pdf, acesso em 22.7.2015, às 1h04min.

453 Diana MARCOS FRANCISCO. Arbitrajes de consumo, in: Silvia Barona VILAR (coord) Comentarios a

Este também é o entendimento DE MADRIÑÁN VÁZQUEZ que

reforça o efeito inter partes da sentença proferida na collective arbitration espanhola, negando a possibilidade de sobrevir sentença com efeitos erga

omnes.454

Assim, a arbitragem coletiva de consumo é um mecanismo para resolver, em um mesmo procedimento arbitral, as reclamações individuais de vários consumidores. Não se tutelam, portanto, os danos coletivos dos consumidores, tampouco serve esse procedimento para obter uma reparação dos danos individualmente sofridos pelos membros de uma coletividade (determinada ou determinável) de consumidores. Em virtude disso, na hipótese de prolação de sentença arbitral procedente, somente o consumidor que efetivamente participou da arbitragem poderá ver ressarcido seu direito.455

Trazendo a lição doutrinária de MARÍN LÓPEZ E MARCOS FRANCISCO para o nosso sistema jurídico, poderia-se afirmar que a arbitragem coletiva de consumo instituída na Espanha cuida de disputas envolvendo direitos individuais homogêneos.

Em sentido diverso, é a collective arbitration instituída na Alemanha, que permite a eficácia da coisa julgada para membros da coletividade ausentes na arbitragem.

A collective arbitration foi desenvolvida na Alemanha depois que a Corte Federal de Justiça declarou, em emblemático julgamento, ser arbitrável disputa relativa a acionistas de uma companhia.456

454 Marta MADRIÑÁN VÁZQUEZ. Incidencia de la nueva regulación del sistema arbitral de consumo en los caracteres esenciales del mismo, in: Maria Paz GARCÍA RUBIO (coord) Estudios juridicos en

memoria del professor José Manuel Lete del Río, Pamplona: Thomson Reuters, 2009, pp. 561-587.

455 Manuel Jesús MARÍN LÓPEZ. Análisis del Real Decreto 231/2008, de 15 de febrero, que regula el Sistema Arbitral de Consumo, disponível em:

https://www.uclm.es/centro/cesco/pdf/trabajos/19/2008/19-2008-1.pdf, acesso em 22.7.2015, às 1h04min.

456 Christian BORRIS. Arbitrability of Corporate Law Disputes in German, disponível em:

http://www.kluwerlawonline.com/abstract.php?id=ASAB2012083, acesso em 21.7.2015, às 22h58min.

Naquele mesmo ano de 2009, a Associação Alemã de Arbitragem editou regras especiais para disputas corporativas envolvendo acionistas.457 Há informação, no sítio eletrônico da referida associação, de que

houve a instituição de cinco collective arbitration sobre o tema, cujo conteúdo, contudo, é confidencial.458

A collective arbitration instituída na Alemanha versa, apenas, sobre conflitos que envolvam direitos de acionistas de determinada companhia, aplicando-se as regras da Associação Alemã de Arbitragem.

As regras da associação estabelecem, inclusive, os efeitos da coisa julgada na collective arbitration entre acionistas, vinculando inclusive aqueles que não participaram da arbitragem:

“2. Os efeitos de uma sentença arbitral se estendem também aos acionistas que foram identificados como ‘interessados’ dentro dos prazos previstos, independentemente de terem feito uso de sua oportunidade de participar do processo arbitral como parte ou como interveniente. Os acionistas nomeados como ‘interessados’ comprometer-se a reconhecer os efeitos de uma sentença arbitral proferida em conformidade com as regras suplementares”.459

457 Disponível em: http://www.dis-arb.de/en/16/rules/dis-supplementary-rules-for-corporate-law-

disputes-09-srcold-id15, acesso em 21.7.2015, às 23h09min.

458 Disponível em: http://www.dis-arb.de/en/39/content/statistics-id54, acesso em 21.7.2015, às 23h13min.

459 No original, em alemão: “Die Wirkungen des Schiedsspruchs erstrecken sich auch auf die

Gesellschafter, die fristgemäß als Betroffene benannt werden, unabhängig davon, ob sie von der ihnen eingeräumten Möglichkeit, dem schiedsrichterlichen Verfahren als Partei oder Nebenintervenient beizutreten, Gebrauch gemacht haben (§ 11 DIS-ERGeS). Die fristgemäß als Betroffene benannten Gesellschafter verpflichten sich, die Wirkungen eines nach Maßgabe der Bestimmungen in den DIS-ERGeS ergangenen Schiedsspruchs anzuerkennen.”

Na versão em inglês: “2. The effects of an arbitral award extend also to those shareholders, that

have been identified as Concerned Others within the time limits provided, irrespective whether they have made use of their opportunity to join the arbitral proceedings as a party or as an intervenor (section 11 DIS-SRCoLD). The shareholders named as Concerned Others within the time limits provided, commit to recognize the effects of an arbitral award rendered in accordance with the DIS- SRCoLD”.

Essa é a grande novidade da collective arbitration alemã em relação à espanhola: a eficácia erga omnes da coisa julgada, ultrapassando as partes do processo arbitral.

Ainda que se observe a limitação da arbitrabilidade objetiva atribuída à collective arbitration alemã, posto que apenas pode versar sobre conflitos societários, a clareza da norma procedimental que fixa o efeito da sentença arbitral é inédito.

No documento Ana Luiza Barreto de Andrade Fernandes Nery (páginas 192-198)