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Comentários à CM OCDE como contexto do artigo 3(2)

CAPÍTULO II. A INTERPRETAÇÃO DOS ACORDOS INTERNACIONAIS

2.4. Definição de contexto para fins do artigo 3(2)

2.4.3. Comentários à CM OCDE

2.4.3.2 Comentários à CM OCDE como contexto do artigo 3(2)

Outro ponto de divergência na doutrina internacional refere-se à específica possibilidade de inclusão dos Comentários da OCDE no escopo do contexto mencionado no Artigo 3(2) da CM OCDE.

Uma vez que inexiste qualquer dispositivo expresso sobre a validade e natureza jurídica dos Comentários na CVDT, no texto dos acordos contra a bitributação ou em outro

346JONES, John F. Avery.; ELLIS, Maarten J.; MAISTO, Guglielmo et al. The interpretation of income tax

treaties with particular reference to the commentaries on the OECD model. Amsterdam: IBFD, 2006. p. 6-7.

347Id. Ibid., p. 8.

348No ordenamento jurídico da Noruega aparentemente é possível, em tese, sustentar que os Comentários têm

força vinculante, em razão da decisão Norsk Retstidende, na qual a Corte judicial mais elevada daquele país entendeu que os procedimentos amigáveis previstos no Artigo 25 da CM OCDE seriam considerados como acordos tributários (vide Klaus Vogel, VOGEL, Klaus. Influence of the OECD commentaries on treaty interpretation, cit., p. 613.

instrumento semelhante350, a dificuldade está em classificar os Comentários para fins interpretativos.

Entre as possíveis classificações dos Comentários como contexto nos termos da CVDT, estaria seu enquadramento como (i) contexto interno, de acordo com o Artigo 31(2)(a) ou (b); ou (ii) contexto externo, de acordo com o Artigo 31(3).

A classificação enquanto contexto interno com base no Artigo 31, parágrafo 2, (a), levaria em consideração os Comentários como um acordo celebrado pelos Estados em conexão com a conclusão do acordo objeto de interpretação. Já sua classificação no Artigo 31, parágrafo 2, (b), estaria calcada na concepção de contexto lato sensu, i.e., um instrumento aceito pelas partes relativamente ao acordo351. Essa é a posição de VAN RAAD352.

Também JONES et al.353, defende que, quando o acordo não contiver a definição de determinado termo e este estiver definido nos Comentários (vigentes na época da celebração do acordo), os Comentários deverão ser considerados como contexto nos termos do Artigo 3(2) da CM OCDE evitando, assim, o reenvio ao direito interno pelo Estado que estiver aplicando o acordo tributário.

Sustentando entendimento contrário, AULT partilha da opinião de que inexistiria conexão entre os Comentários e a conclusão do acordo contra a bitributação celebrado pelos Estados Contratantes354 e, consequentemente, não poderiam ser considerados como contexto segundo a CVDT.

No direito pátrio, XAVIER também discorda da classificação dos Comentários como contexto para fins das regras da CVDT consignando, contudo, seu relevo interpretativo355.

Defendendo a impossibilidade de enquadramento dos Comentários como contexto interno e externo, ROCHA afirma que, para fins do Artigo 31(2)(a), os Comentários não são um acordo relativo à interpretação do tratado celebrado juntamente com este e, para

350JONES, John F. Avery. The effect of changes in the OECD commentaries after a treaty is concluded.

Bulletin for International Bureau of Fiscal Documentation, Amsterdam, p. 102, March 2002.

351A questão envolvendo o fato de o Estado ser ou não membro da OCDE não seria relevante para ambas as

classificações (Cf. GIULIANI, Federico Maria. op. cit., p. 137).

352Kees Van Raad, Interpretation of Tax Conventions, m.B.B., 1978, n. 2/3, p. 49 apud AULT, Hugh J. op.

cit., p. 145.

353JONES, John F. Avery.; ELLIS, Maarten J.; MAISTO, Guglielmo et al. op. cit., p. 112. 354AULT, Hugh J. op. cit., p. 145.

fins do Artigo 31(2)(b), não constituem um instrumento estabelecido pelas partes quando da conclusão do acordo, relacionados à sua interpretação356.

No que se refere à classificação dos Comentários como contexto externo, nos termos do Artigo 31(3), observa-se que só serviriam para fundamentar a interpretação de acordos com base em Comentários posteriores à celebração dos primeiros, pois os itens (a) e (b) desse dispositivo da CVDT tratam apenas de acordo posterior e prática seguida posteriormente, respectivamente, para a sua inclusão no contexto dos acordos contra a bitributação. Assim, só serviria para os defensores da interpretação dinâmica dos Comentários357.

Ao divergir sobre essa possibilidade, ROCHA assevera que os Comentários: (i) não são um acordo posterior entre as partes a respeito da interpretação do tratado já celebrado (Artigo 31(3)(a)); (ii) não materializam uma prática seguida posteriormente pelas partes na aplicação do tratado, pela qual se estabeleça um acordo sobre sua interpretação (Artigo 31(3)(b)); e (iii) não são regras de Direito Internacional que integram a interpretação dos acordos contra a bitributação (Artigo 31(3)(c))358.

Sob essa ótica, JIMÉNEZ salienta que os Comentários, enquanto soft-law podem se tornar hard-law quando são aplicados dentro de um sistema nacional pelas autoridades tributárias e pelos tribunais. Contudo, eles seriam somente um elemento de interpretação a ser considerado quando da interpretação do acordo contra a bitributação, pois sob o ponto de vista de direito interno eles não existem como normas nacionais359.

Curiosa a conclusão de ROCH e RIBES no sentido de que, consequentemente, apenas na hipótese de se considerar o conteúdo dos Artigos 31(2) e (3) como não sendo de natureza taxativa (numerus clausus) é que seria possível incluir os Comentários da OCDE no escopo de “contexto” de tratado definido na CVDT360.

Porém, essa conclusão recebe corretas críticas na medida em que, conforme já aduzimos, a maior parte da doutrina entende que o contexto do Artigo 3(2) da CM OCDE é de maior abrangência do que aquele previsto na CVDT. Logo, se os Comentários não se

356ROCHA, Sérgio André. Interpretação dos tratados contra a bitributação da renda, cit., p. 156.

357ELLIS, Maarten J. The influence of the OECD commentaries on treaty interpretation – response to Prof.

Dr. Klaus Vogel. Bulletin – Tax Treaty Monitor, Dec., p. 617-618.

358ROCHA, Sérgio André. Interpretação dos tratados contra a bitributação da renda, cit., p. 157.

359MARTÍN JIMÉNEZ, Adolfo. The 2003 revision of the OECD commentaries on improper use of tax

treaties: a case of declining effect of the OECD Commentaries? Bulletin for International Taxation, Amsterdam, p. 27-28, Jan. 2004.

360ROCHA, Maria Teresa Soler; RIBES, Aurora. Tax treaty interpretation in Spain. In: LANG, Michael

inserem na CVDT (de escopo mais restrito), isso não significa que não poderiam, por esse raciocínio, estar incluídos no Artigo 3(2) (de escopo mais amplo).

Pela simples redação dos Artigos 31 e 32 da CVDT, quer nos parecer que os Comentários não estariam inseridos, propriamente, na definição de contexto por eles descrita. Isso não significa, para nós, que os Comentários não devam ser utilizados como relevante elemento adicional na interpretação dos acordos contra a bitributação que adotam essa modelo (total ou parcialmente).

2.4.3.3. Comentários à CM OCDE como significado ordinário ou especial – linguagem

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