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Evolução de beneficiário efetivo na jurisprudência geral

CAPÍTULO I. BENEFICIÁRIO EFETIVO NO DIREITO INTERNO E OS

1.3. Beneficiário efetivo no direito interno

1.3.2. Beneficiário efetivo na Inglaterra

1.3.2.2. Evolução de beneficiário efetivo na jurisprudência geral

Em primeiro lugar, é importante relembrar que, conforme explicado no item 1.2.1., o direito inglês utiliza-se da interpretação jurídica e não da econômica quando da análise dos atributos relacionados à definição da propriedade do beneficiário efetivo.

Historicamente, existem diversos precedentes tributários julgados pelas cortes inglesas que tratam da conceituação de beneficiário efetivo. A maior parte deles envolve a isenção do imposto de selos (stamp duty) sobre certas transferências de propriedade entre

companhias, nas quais determinada porcentagem das ações da companhia deveria ter como beneficiário efetivo a outra companhia111. O segundo exemplo mais corriqueiro na jurisprudência inglesa refere-se à transferência de prejuízos fiscais para fins de imposto de renda entre empresas do mesmo grupo econômico em circunstâncias similares112.

Convém, portanto, fazer algumas observações desde já sobre o tema. O direito inglês faz uso do termo beneficiário efetivo em diversas situações que não envolvem, necessariamente, um trust, conforme demonstrado nas duas situações acima mencionadas.

Em segundo lugar, o direito inglês não diferencia entre beneficiário efetivo para fins fiscais e para outros fins, por exemplo, direito civil ou comercial, conforme comprovaremos pela exposição dos julgados.

Em terceiro lugar, a grande maioria dos casos trata do beneficiário efetivo de bens tangíveis e corpóreos – o que é de se esperar em razão da origem do direito de propriedade e da definição de coisa para fins de direito, analisada previamente – sendo pouco discutida a questão do beneficiário efetivo no caso de intangíveis (como ocorre no caso de royalties). Na Inglaterra, alguns casos tangenciaram o tema sem, contudo, terem adentrado de forma satisfatória. No primeiro deles, Lysaght v. Edwards113, de 1876, a questão envolvia a análise de um contrato de compra de imóvel em que o vendedor tinha falecido antes da conclusão do negócio jurídico. Nesse caso, as conclusões relevantes foram a de que, no momento em que alguém tem um contrato de compra e venda válido, o vendedor se torna um trustee em equity para o comprador do espólio vendido, e o beneficiário efetivo passa a ser o comprador.

111Artigo 27 (2) do Finance Act de 1967 da legislação inglesa, assim redigido no original:

27. Conveyances and transfers on sale: reduction of duty, and amendment of provisions for exemption. (…)

(2) This section applies to any instrument as respects which it is shown to the satisfaction of the Commissioners that the effect thereof is to convey or transfer a beneficial interest in property from one body corporate to another, and that the bodies in question are associated, that is to say, one is beneficial owner of not less than ninety per cent of the issued share capital of the other, or a third such body is beneficial owner of not less than ninety per cent of the issued share capital of each. (g.n.). FINANCE Act 1967. Disponível em: <http://www.legislation.gov.uk/ukpga/1967/54/section/27>. Acesso em: 07 jan. 2012.

112Artigos 402 a413 e 838 do Income and Corporation Taxes Act de 1988. Vide, por exemplo, a redação

original do Artigo 838 (3):

838. Subsidiaries (…)

(3) In this section references to ownership shall be construed as references to beneficial ownership.

Em The English Sewing Cotton Company Ltd v. Commissioners of Inland Revenue114, ações detidas pelo contribuinte em outra companhia foram dadas em penhor como garantia de um empréstimo, transferências em branco das ações foram realizadas e os dividendos foram serviram para cobrir o empréstimo. Na decisão, Lord Greene julgou que o efeito de uma operação com penhor não é o de privar o concessor do penhor de ser o beneficiário efetivo das ações.

No julgamento de Leigh Spinners Ltd v. Commissioners of Inland Revenue115, a sociedade (apelante) formou uma nova companhia, para a qual transferiu seus bens e depois transferiu as ações da nova companhia para outras pessoas. Todos esses atos aconteceram em poucos dias. O tribunal entendeu que a apelante não era o beneficiário efetivo das ações da nova companhia, pois, a partir do momento em que a nova companhia foi constituída, a apelante estava obrigada a transferir essas ações para outrem.

No mesmo ano e em situação semelhante àquela descrita em Leigh Spinners, o julgado Holmleigh (Holdings) Ltd v. Commissioners of Inland Revenue116 teve como principal diferença o fato de que as novas companhias foram constituídas antes da celebração do contrato de transferência de suas ações. O tribunal entendeu que a sociedade holding era o beneficiário efetivo das ações até a data em que o contrato foi celebrado. A partir dessa data, a companhia perdeu sua qualidade de beneficiária efetiva das ações.

No caso Rodwell Securities Ltd v. Commissioners of Inland Revenue117 a constatação de que a personalidade jurídica deve ser preservada foi de suma importância para a temática. No caso, a sociedade holding foi considerada como o beneficiário efetivo das ações de sua subsidiária direta, mas não foi considerada o beneficiário efetivo dos ativos da subsidiária. De acordo com o juiz Pennycuick J., a subsidiária, sim, era o beneficiário efetivo dos ativos. Isso porque, não obstante o fato de que numa cadeia de empresas controladas, a sociedade controladora – apesar de possuir participação e controle indiretos nas demais – não é a proprietária dos bens dessas subsidiárias. Todavia, essa decisão foi bastante técnica, pois se ateve, em sua interpretação interpretação, ao termo

114[1947] A.T.C. 79, C.A., p. 81. 115[1956] 46 T.C. 425, Ch D.

116[1956] 46 T.C. 435, Ch D. Em sentido semelhante, também o caso Inland Revenue Commissioners v.

Ufitec Group Ltd., [1977] 3 AII ER 924, QB.

utilizado na legislação (beneficial ownership) e não ao termo controlling interest e se privou de interpretar as expressões direta ou indiretamente para o caso118.

Já em Brooklands Selangor Holdings Ltd v. Inland Revenue Commissioners119, uma sociedade holding tinha que transferir ações de sua subsidiária e ao mesmo tempo transferir certos ativos seus para a subsidiária. Em razão de todas as operações compreendidas na operação terem sido desempenhadas ao mesmo tempo como parte de uma única transação, a sociedade holding deixou de ser o beneficiário efetivo das ações na subsidiária no momento em que os ativos foram transferidos.

Os fatos descritos em The Andréa Ursula120 e em I Congresso Del Partido121 são bastante semelhantes, e tratam da questão de um navio por afretamento a casco nu, ou em posse de operadores e administradores, poder ser considerado como parcialmente de propriedade efetiva com relação por alguém (apenas em relação às partes do navio, i.e., o casco). Segundo a decisão no primeiro caso, o contrato de afretamento a casco nu faz com que, nos limites do contrato, o armador seja o beneficiário efetivo da embarcação. Porém, ele não é o beneficiário efetivo com relação a todas as partes do navio.

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