• Nenhum resultado encontrado

ANÁLISE DAS ENTREVISTAS

II. TRAJETÓRIA NA LUTA SINDICAL: A CONSCIÊNCIA DE CLASSE DOS PROFESSORES E DAS PROFESSORAS

5. COMO ERAM OS SALÁRIOS

Perguntar sobre como eram os salários dos professores, quando do início da carreira docente é importante para se tentar captar como os professores e as professoras percebem sua profissão, no que diz respeito à remuneração. Embora o salário seja um aspecto da valorização profissional, pode-se dizer que seja considerado fundamental na procura pela profissão, mas, sua permanência na carreira do magistério deve-se também a outros fatores.

As respostas a essa questão foram organizadas em três pontos. Um desses se refere ao poder aquisitivo dos salários e que aos poucos vai caindo e perdendo seu poder de compra. O outro ponto se refere ao “prestígio” de se casar com alguém com salário de professor e por fim, a resposta quase unânime, de que o salário do magistério equiparava-se ao de um Juiz de Direito.

Tabela 9: quantidade de comentários a respeito do salário docente por categoria.

Salário

Equipara-se ao do magistrado 7

Poder aquisitivo decadente 6

Prestígio casar com professor 2

Satisfatório 1

Total 13

Essa tabela, bem como os depoimentos abaixo, demonstram esses pontos. Dos treze entrevistados que mencionaram este tema, observa-se que a maioria (sete) considerava que o salário do professor já foi equiparado ao do magistrado. Seis realçaram a decadência do poder aquisitivo que o salário proporciona. Dois salientaram a crença de que casar com professor era sinal de prestígio social. Deve-se considerar, que por serem respostas semanticamente semelhantes, não excludentes, alguns responderam à pergunta abrangendo mais de um ponto. Apenas um relatou como satisfatório o valor do salário.

“Então a gente comprava uma casa e ia pagando a casa. Dava para pagar as prestações de carro. Dava pra gente estudar, criar os filhos e manter a casa. Agora, depois foi caindo. A gente perdeu as cinco referências. Não me lembro o ano que a gente perdeu. Não recuperamos mais. E isso foi empobrecendo, empobrecendo, empobrecendo”.(Ge, professora, 67 anos).

“Então cinco anos se passaram como professor contratado e eu consegui fazer meu pé de meia, comprar um apartamento. E nesse ínterim eu consegui também aulas no ensino particular”. (Mom, professor, 70 anos).

“Com o salário de professora eu comprei um piano. Hoje pra eu afinar o piano tenho que pagar em três vezes” (Glo, professora, 69 anos).

Ser professora no início da carreira era sinal de ser um bom partido. Casamentos não faltavam e significava ser disputada.

“Antigamente, falou: ‘casou com professorinha, casou bem’. E você sabe, que nós batemos uma briga nisso. Porque aí nós passamos a ganhar mais que os homens. Você entendeu? ‘É rico, casou com professorinha’” (Glo, professora, 69 anos).

“Os salários eram superiores. Tanto assim que muitas professoras se casavam com homem simples da roça. Porque naquela época eles achavam que casar com professora era bom negócio”. (Ig, professora, 73 anos).

A comparação com o salário de um magistrado povoa o imaginário dos professores e professoras ainda hoje. Souza (1996) também constatou esse mesmo tipo de depoimento na sua pesquisa sobre representação do trabalho docente realizada com professores e professoras de uma escola estadual paulista. E então, pergunta essa autora, se o salário é tão ruim, o que mantem professores e professoras no magistério? Essa é outra questão que merece maiores estudos, pois atualmente no Brasil, entre todos os docentes, o único segmento que goza de algum prestígio social é o professor do ensino público superior federal.

“Nessa época o salário era igualzinho ao de um juiz de Direito”. (Professora, 67 anos).

“No começo nós ganhávamos como um juiz. E depois foi desvalorizando”. (Professora, 72 anos).

“Bom, eu posso dizer por mim, quando eu comecei no magistério o salário do professor era equiparado ao Magistrado. Equiparado. Bem alto”. (Mom, professor, 70 anos).

“Olha, na época nós ganhávamos como um juiz. Hoje nós não ganhamos dez por cento do que ganha um juiz”. (Professora, 80 anos).

“No início o professor ganhava igual ao juiz de Direito”. (Mar, professor, 74 anos).

“Ah, quando eu ingressei eu ganhava igual um juiz. Agora o mesmo que a gente ganha num ano não dá um mês de juiz”. (Wa, professora, 74 anos).

Porém existia controvérsia em relação à comparação do salário dos docentes com o dos magistrados, como afirmou uma professora.

“Eu escutei muito sobre a idéia de que o salário do magistério era igual ao de juiz”. Eu acho que isso não existiu não. É mito “. (Ig, professora, 73 anos)”.

Souza (1996), ao dissertar sobre as condições e organização do trabalho docente, assegura que, “Embora seja um trabalho árduo, é desvalorizado, não é reconhecido socialmente, é desprestigiado. A concepção de desvalorização traz consigo uma ambigüidade: para uns, é dada pelas circunstâncias de trabalho e salário; para outros, pela perda de status, que o professor recupera no nível simbólico com prazer e vocação”. Confirmando tal conclusão, vale a pena transcrever a fala de um dos seus depoentes na pesquisa que essa autora empreendeu e que serviu de base para sua afirmação. “-Veja: quando me formei o salário de

professor era igual ao de um juiz de direito. Então, numa cidade do interior era o juiz de direito, o médico, o prefeito e o professor eram a cúpula da cidade. Hoje, o professor não faz parte de cúpula alguma. Houve uma derrocada. Eu acho que o professor caiu (Professora CLT, 40 anos no magistério)” (Souza, 1996: 118). E conclui que a perda do prestígio, do

status, foi decorrente do rebaixamento salarial que os professores têm enfrentado na história recente do país. As condições de trabalho são também causa da grande rotatividade de professores na rede pública de ensino.

Novaes (1991), já citada anteriormente, ao realizar seu estudo sobre a transformação do processo de trabalho da professora primária e, particularmente da segmentação e parcelamento do trabalho pedagógico e de suas relações com o desenvolvimento do Estado capitalista, conclui que na própria escola a professora está sendo expropriada do seu saber e conseqüentemente, do seu salário, do seu prestígio e do seu poder político. Tudo isso, fazendo parte do processo de proletarização da profissão.

O professor Paulo Nathanael Pereira de Souza, coloca a questão em uma perspectiva diferente. Para esse autor, o professor hoje é despreparado e confuso. Em recente artigo publicado no jornal, Correio Braziliense, do dia 22 de setembro de 2007, faz uma análise sobre a educação brasileira e com base nas últimas avaliações nacionais e internacionais, confirma a

crise e descaminhos da Educação. Segundo esse autor a crise tem a ver com a massificação e a heterogeneidade econômico-social dos alunos que invadiram as salas de aula a partir da segunda metade do século XX. Trata-se da expansão da oferta de ensino, que na avaliação desse autor, não foi acompanhada de atualização e diversificação dos procedimentos pedagógicos.

Nesse artigo, esse autor faz uma rápida retrospectiva da educação no Brasil e justifica os êxitos dessa no passado como conseqüência de vários fatores e cita entre eles, “a dedicação dos professores que eram vocacionados, bem formados e também bem pagos”. Em relação a esta questão afirma: “havia naqueles tempos o casamento do chupim com a professora que ganhava tão bem a ponto de sustentar sozinha – e com nível confortável de vida – a família, enquanto o marido passava as tardes no jardim público, a ler jornal e jogar damas”. E ainda, “os professores, que tinham salários equiparados aos dos juízes de direito, hoje, são os profissionais qualificados mais mal pagos do país”. Constata, então que, “não havia as multidões que, graças a Deus, hoje lotam as escolas. Quinhentos alunos por estabelecimento se tanto e todos maduros para aprender. Diferentemente de hoje, quando as estatísticas de matrícula explodem e as escolas se enchem, de um lado de alunos sem prontidão para a aprendizagem, dada a sua origem social cheia de carências, e de outro de professores confusos, com a cabeça cheia de mal-assimiladas teorias e pouquíssima capacidade operacional para assegurar um mínimo de resultados positivos no processo sob sua responsabilidade”.E conclui, colocando como possibilidade de superação, a necessidade que os professores sejam melhores formados, que sejam dignamente remunerados, para que se retome a qualidade e a funcionalidade do ensino básico.

Independente de se discutir o mérito da questão, o autor do artigo reforça o que está presente no imaginário de muitos professores e professoras, que houve um tempo em que pelo menos uma certa parcela dos docentes percebiam salários dignos, como se fossem juízes. O que se interroga a partir daí é que, como os docentes com a subjetividade equivalente a de magistrados, se organizariam em luta sindical? Para esses docentes haveria realmente necessidade deste tipo de luta?