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CONDIÇÕES DE CONSTRUÇÃO DO SINDICALISMO DOCENTE DE EDUCAÇÃO BÁSICA.

A EDUCAÇÃO NO BRASIL COLÔNIA

A forma como Portugal “conquistou” o nosso país, em 1500, irá refletir diretamente nas políticas educacionais durante os diversos momentos históricos e deixará seqüelas, verificadas até hoje, nesse processo. A necessidade de dominar e explorar as terras “descobertas”, a concepção de homem, expressa na carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal, deixa claro, o tipo de trabalho educativo que seria feito desde o início da colonização.

“Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais vimos contra o sul, até outra ponta que vem contra o norte, de que nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco léguas por costa (...)

Sobre o sertão, nos parece do mar, muito grande porque, a estender olhos, não podíamos ver senão terra e arvoredo, que nos parecia mui longa terra.

Nela, até agora, não podemos saber que haja ouro, nem prata, e nem nenhuma coisa de metal, nem ferro lho vimos. Mas, a terra em si, é de muito bons ares(...) Águas são muitas, infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem.

Mas o melhor fruto que nela se pode fazer, me parece, que será salvar esta gente, e esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve lançar”.

Para os portugueses, que chegavam, os habitantes da terra a conquistar eram “bárbaros”, “gentios”, que deveriam ser “civilizados” E é preciso aqui, deixar claro, o tipo de processo civilizatório por que esses habitantes deveriam passar. A maioria deles haveria de ser transformada em mão de obra gratuita, alguns iriam desempenhar o papel de exploradores, alimentando assim o império luso-colonial. A utilização da mão de obra indígena se torna indispensável, nessa fase inicial de colonização. Portanto, era preciso dominar os índios e dar- lhe uma educação restrita à conversão da fé católica pela catequese e pela instrução elementar.

Com a criação do Governo Geral, Tomé de Sousa aporta no Brasil, em 1549, em Salvador acompanhado por quatro padres e dois irmãos jesuítas. Têm-se então a partir daí o marco inicial da educação no Brasil.

Em termos de política educacional para o país colonial que ia sendo criado pelos colonizadores portugueses, saber era decorar. Decorar as primeiras letras, as regras da língua portuguesa, a tabuada e principalmente os mandamentos da Igreja Católica.

O objetivo da educação jesuíta era desenvolver o senso de responsabilidade, solidariedade de grupo e de obediência à autoridade. Os cursos dados se relacionavam com a educação elementar, com a área de humanidades, de artes e de teologia.

Segundo Vieira & Farias (2003:35), “O trabalho desenvolvido pelos jesuítas tem duas fases distintas. A primeira delas orienta-se pelo plano de estudos concebido por Manoel da Nóbrega, sendo voltada para o ensino de primeiras letras, a catequese, a música e alguma iniciação profissional. A segunda fase inspira-se nos princípios do Ratio Studiorum, concentrando-se sobre o ensino de humanidades, filosofia e teologia”.

A clientela no período inicial eram os índios, depois se acrescentaram os filhos dos colonos e os mamelucos, os órfãos e os filhos dos caciques. Os jesuítas também foram os responsáveis pela educação da elite colonial, que tinha condições de dar prosseguimentos aos seus estudos na metrópole.

Sabe-se que o índio não foi facilmente dominado e que nesse período, para cumprir a determinação da colonização, que objetivava conquistar capital para contribuir com a passagem de Portugal, de país de capitalismo mercantil, para transformar-se em país de capitalismo industrial, foi executada pelos colonizadores uma política de exploração do Brasil

baseada no trabalho escravo. Para tal, foram trazidos negros da África, que durante trezentos anos exerceriam trabalho escravo, em condições subumanas.

Mas, quem eram esses negros escravos? Teriam eles dado alguma contribuição à formação social brasileira? E em relação à educação?

Gilberto Freyre, em sua obra, Casa Grande & Senzala alerta que, “Para o Brasil a importação de africanos fez-se atendendo-se a outras necessidades e interesses. À falta de mulheres brancas; às necessidades de técnicos em trabalhos de metal, ao surgirem as minas. Duas poderosas forças de seleção”. (Freyre, 1998: 306). Isso significa que esses africanos possuíam qualificações, não somente, força bruta para o trabalho braçal. Esses africanos contribuíram em outras áreas, além da formação agrária.

E afirma, “A verdade é que importaram-se para o Brasil, da área mais penetrada pelo Islamismo, negros maometanos de cultura superior não só à dos indígenas como à da grande maioria dos colonos brancos – portugueses e filhos de portugueses quase sem instrução nenhuma, analfabetos uns, semi-analfabetos na maior parte. Gente que quando tinha de escrever uma carta ou de fazer uma conta era pela mão do padre-mestre ou pela cabeça do caixeiro. Quase que só sabiam lançar no papel o jamegão; e este mesmo em letra troncha. Letra de menino aprendendo a escrever”. (Freyre, 1998: 299). A este respeito, Dal Rosso tem afirmado que Gilberto Freyre diverge frontalmente de Caio Prado e de outros que falam no escravo “boçal”, povos “bárbaros e semibárbaros”, trazidos de regiões culturalmente rudes, portanto, sendo ele inferior culturalmente e materialmente. Para Dal Rosso, Caio fala da contribuição nula, ao máximo passiva pelo sangue. Gilberto emprega o exemplo da Bahia, dos malês.“É que nas senzalas da Bahia de 1835 havia talvez maior número de gente sabendo ler e escrever do que no alto das casas-grandes...”(Freyre, 1998: 299).

Ribeiro, (1995: 113) escrevendo sobre os afro-brasileiros afirma, tendo como base os estudos de Nina Rodrigues e Arthur Ramos, que os negros do Brasil foram trazidos principalmente da costa ocidental africana. Que esses podem ser distintos em três grandes grupos. “O primeiro, das culturas sudanesas, é representado, principalmente, pelos grupos Yoruba – chamados nagô -, pelos Dahomey – designados geralmente como gegê – e pelos Fanti-Ashanti – conhecidos como minas -, além de muitos representantes de grupos menores da Gâmbia, Serra Leoa, Costa Malagueta e Costa do Marfim. O segundo grupo trouxe ao

Brasil culturas africanas islamizadas, principalmente os Peuhl, os Mandinga e os Haussa, do norte da Nigéria, identificados na Bahia como negro malé e no Rio de Janeiro como negros

alufá. O terceiro grupo cultural africano era integrado por tribos Bantu, do grupo congo-

angolês, provenientes da área hoje compreendida pela Angola e a ’Contra-Costa’, que corresponde ao atual território de Moçambique”.

Sobre o tema Freyre (1998), afirma, ”Os escravos vindos das áreas de cultura negra mais adiantadas foram um elemento ativo, criador, e quase que se pode acrescentar nobre na colonização do Brasil; degradados apenas pela condição de escravos. Longe de terem sido apenas animais de tração e operários de enxada, a serviço da agricultura, desempenharam uma função civilizadora. Foram a mão direita da formação agrária brasileira, os índios, e sob certo ponto de vista, os portugueses, a mão esquerda”. (Freyre, 1998: 307). Para o sociólogo Dal Rosso, nesse aspecto do livro Casa Grande & Senzala, está descrita em toda profundidade a tese principal de Freyre sobre a cultura africana e sua contribuição à formação do Brasil.Na avaliação de Dal Rosso, Gilberto Freyre coloca a presença negra como protagonista da formação brasileira.

Freyre (1998) conclui que, “A formação brasileira foi beneficiada pelo melhor da cultura negra da África, absorvendo elementos por assim dizer de elite que faltaram na mesma proporção no sul dos Estados Unidos” (Freyre, 1998: 299-300).

Em relação à educação no Brasil colônia, vale lembrar ainda que Freyre demonstra que, a Casa Grande, o local em que morava o senhor de engenho e sua família, representou muito mais do que uma simples residência. A casa grande patriarcal não foi apenas fortaleza, capela, escola, oficina, harém, convento de moças, hospedaria, cemitério, santa casa de misericórdia amparando os velhos e as viúvas, recolhendo órfãos. Desempenhou outra função importante na economia brasileira: fez também o papel de banco comercial. Portanto algum ensinamento acontecia no seu interior. É possível, a partir daí, cogitar-se que negros africanos ensinassem na Casa Grande, além de o fazê-lo nas Senzalas.

Porém a organização social era caracterizada pelo regime patriarcal. Nesse sentido, verifica-se que a educação feminina era restrita à aprendizagem de prendas domésticas e de boas maneiras, e em termos de letramento, o máximo que algumas mulheres conseguiam, era aprender a ler, de forma muito rudimentar, em seus lares.

Ribeiro (1987: 28) sintetiza a educação formal do período colonial em três pontos que definem claramente essa política, que era exclusiva para o sexo masculino: “a) a orientação universalista jesuítica baseada na literatura antiga e na língua latina; b) a necessidade de complementação de estudos na metrópole (Universidade de Coimbra); c) o privilegiamento do trabalho intelectual em detrimento do manual, o que afastavam os alunos dos assuntos e problemas relativos à realidade imediata, distinguia–os da maioria da população que era escrava e iletrada e alimentava a idéia de que o mundo civilizado estava ‘lá fora’ e servia de modelo. Os ‘letrados’ acabavam por rejeitar não apenas esta maioria, e exercer sobre ela uma eficiente dominação, como também a própria realidade colonial, contribuindo para a manutenção deste traço de dominação externa e não para sua superação”.

Talvez derive daí à histórica dicotomia entre ensino acadêmico (propedêutico) e ensino técnico (profissionalizante), presente até hoje na realidade educacional brasileira. Em um país que se manteve, durante séculos, com a exploração de trabalho escravo, trabalhar passa a ser concebido como exercício típico de dominados, portanto indigno. Ser rico pode significar também ser desocupado.

Então, se considerando que no período colonial que vai de 1549 a 1759 o ensino ficava ao encargo dos Jesuítas, se conclui que nenhuma organização associativa fosse possível, mesmo de caráter mutualista, tendo-se em conta que os padres jesuítas eram missionários, desempenhavam sua incumbência como determinação e estavam submetidos à ordem religiosa, à Companhia de Jesus, e conseqüentemente, a hierarquia da Igreja. Em termos de condições objetivas e subjetivas, a submissão a hierarquia da Igreja não comportava nenhum tipo de organização.

Com a expulsão dos jesuítas, pelo Marquês de Pombal (Sebastião José de Carvalho e Melo), em 1759, era preciso superar duzentos anos de influência dos “Soldados de Deus”. Expressão, com que se designava os aos padres jesuítas que tentavam conquistar os nativos pela fé. Era preciso que se fizesse um trabalho que extrapolasse a área restrita ao campo educacional. Desde confisco de bens dos padres jesuítas, mudança e reformulação no ensino, proibição de uso dos livros dos jesuítas, até extinção da Companhia de Jesus. Era o período pombalino em vigor, trazendo o elemento novo, a presença do Estado ditando diretamente a política educacional brasileira.

Data dessa época a introdução da educação laica em contraposição a educação religiosa ministrada pelos jesuítas. Também datam dessa época as Aulas-Régias, pagas pelo Erário Régio e proferidas por pessoas ilustradas, que iriam contribuir para a transformação da mentalidade em relação à educação.

A era pombalina ficou caracterizada como a época das reformas políticas e educacionais. Nesse período a educação se destinava também à formação de padres que atuassem como agentes da metrópole para modernização econômica da colônia; preparados pelos princípios do conhecimento científico, conhecedores das riquezas minerais, vegetais e hídricas do Brasil; ao domínio das literaturas e línguas clássicas, as línguas modernas, a gramática portuguesa, as modernas ciências naturais e exatas, desenho, geografia, cronologia e teologia; com uma metodologia mais branda, no que diz respeito à relação entre mestre e discípulos, sem castigos físicos, entre outras violências.

As reformas pombalinas foram implantadas com dificuldades uma vez que na colônia havia ainda os partidários da educação jesuíta, não havia grandes interesses na instrução dos colonizados e até desvio de recursos dos subsídios literários. Mesmo assim, conseguiu -se estabelecer uma rede de aulas avulsas, que eram aulas de conteúdos específicos e de iniciativa pública, estatal.

Mas, quem eram os professores dessa fase do Brasil Colônia? Eram os professores que ministravam Aulas Régias. Professores que, por exemplo, em 1760 foram nomeados como os primeiros professores régios. “Um deles é indicado para o Estado do Grão-Pará e Maranhão (Eusébio Luiz P. Ludon) e dois para a Capitania de Pernambuco (Manuel da Silva Coelho e Manuel de Castro de Melo)“ (Apud, Vieira &Farias, 2003: 41).

Assim iam sendo nomeados os professores que iriam proferir as Aulas Régias. Docentes de Lisboa que vinham para o provimento nas províncias, como Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Pernambuco e Maranhão, quando não, esses provimentos eram feitos por professores interinos.

Havia ainda as aulas dadas por professores pagos com soldos militares, os mestres de capela pagos pela folha eclesiástica custeadas pelo Reino, os professores mantidos pelas diversas ordens religiosas em conventos e casas de recolhimentos de crianças órfãos, os

mestres particulares, pagos pelas famílias e até aqueles que ensinavam atividades produtivas específicas, como, costura, marcenaria, etc.

Contudo, esses professores não se constituíram em nenhuma organização associativa, porque foram necessários vários anos para que se estabelecesse uma educação alternativa à educação jesuíta, depois, o número de mestres régios era mínimo, embora a reforma pombalina tenha pretendido se constituir em um sistema de instrução publica, na prática, esse sistema não chegou a se formar. Portanto, pode-se afirmar que o campo educacional no Brasil Colônia ainda não estava estruturado.

A título de exemplo Cardoso registra que “O primeiro concurso para professores públicos realizado no Brasil foi em Recife, a 20 de março de 1760. No mesmo ano, em 7 de maio, realizaram-se os primeiros exames para professores régios de Gramática Latina no Rio de Janeiro. Entretanto, em 1765 não havia sido nomeado nenhum professor público no Brasil, embora os concursos já houvessem se realizado. No Rio de Janeiro, o início oficial das Aulas Régias ocorreu em 28 de junho dede 1774, com a Aula de Filosofia Racional e Moral, ministrada pelo professor régio Francisco Rodrigues Xavier Prates, presbítero secular, à qual compareceram várias autoridades. Havia se passado exatamente quinze anos, desde o alvará de 28 de junho de 1759, quando foi implantado o novo sistema público de ensino, no Reino português” (Cardoso, 2004: 183).

Mesmo com o advento do Império o balanço que se faz é o de que o legado educacional brasileiro do Brasil Colônia é muito pobre e esse processo não seria tão diferente durante outros momentos históricos do nosso país. A partir daí verifica-se a tendência à estatização da gestão da educação, bem como, certo pragmatismo, no sentido de oferecer conhecimentos científicos utilitários, profissionais, em instituições de ensino avulsas e isoladas.