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Capítulo I – Introdução

Capítulo 2 Enquadramento Teórico

2.1 Abordagem e apresentação do conceito de Competência

2.1.2 Competências para o Século XXI

Como referido anteriormente, as alterações vivenciadas a nível social nas últimas duas décadas têm levado à necessidade de repensar os paradigmas subjacentes ao processo de ensino-aprendizagem, sendo as tecnologias um fator fulcral nessas mudanças. Tapscott (1998) e Prensky (2004; 2005; 2009), por exemplo, salientaram que os alunos se encontram mais preparados do que os professores e os pais para utilizar as tecnologias digitais, constituindo-se mesmo como impulsionadores do seu uso. Prensky, em 2006, referiu também a emergência de entender que os alunos atuais não são iguais aos das gerações anteriores, ao referir que eles,

are no longer little versions of us, as they may have been in the past. In fact, they are so different from us, that we can no longer use either our 20th century knowledge or our training as a guide to what is best for them educationally. (p. 1).

Este alerta já tinha sido dado por Jacques Delors (1996) no relatório elaborado para a UNESCO no âmbito da Comissão Internacional sobre Educação para o séc. XXI. A relevância em articular “o global e o local; o universal e o singular; a tradição e a modernidade; as soluções a curto e a longo prazo; a indispensável competição e o cuidado com a igualdade de oportunidades, o extraordinário desenvolvimento e

(Delors, 1996, p. 14), implicam que o papel da escola seja evidenciado através da preparação dos alunos para esta nova realidade, auxiliando-os a “entrar na vida, com capacidade para interpretar os factos mais importantes relacionados quer com o seu destino pessoal, quer com o destino colectivo” (Delors, 1996, p. 52). A Comissão Europeia (2008) retomou esta preocupação ao sublinhar que “cada cidadão deverá estar provido das competências necessárias para viver e trabalhar nesta nova sociedade da informação” (p.2).

Assume-se, deste modo, que o desenvolvimento das tecnologias acelerou a presença de informação e comunicação na sociedade e, consequentemente, na escola, obrigando-a por isso a protagonizar transformações que a adeqúem às alterações sociais. Esta perspetiva vai de encontro ao sublinhado por Morin (1999) que refere que, para se educar dentro de uma sociedade em mutação, é fundamental auxiliar o processo de desenvolvimento de competências: competências do conhecimento, do desenvolvimento social e, por último, as competências de comunicação.

Trilling e Fadel (2009) consideram que a transformação genérica a que

assistimos no campo social terá inevitavelmente que ser transposta para a sala de aula, ajustando os instrumentos de aprendizagem e a própria aprendizagem às necessidades da sociedade atual, tendo implicações diretas nas competências desenvolvidas por alunos e por professores.

Retoma-se assim o conceito de competência, encarado como um conjunto de recursos cognitivos – capacidades, conhecimentos técnicos e teóricos, atitudes, perceções e capacidades de compreensão – mobilizados para solucionar, pertinente e eficazmente, um conjunto de situações, não existindo fora de um determinado contexto. Esta perspetiva é abordada por diferentes entidades como a Partnership for 21-st century-skills (2009), a ISTE (2008), a enGauge 21st Century skills (2009) ou a OCDE

que pretenderam balizar as competências a desenvolver numa época caraterizada pelas alterações constantes e ajustamentos consequentes - as competências para o século XXI, foram designadas naquelas obras de referência.

Segundo Silva (2009) o termo competência para o século XXI (ou XXI century skills) quando utilizado em educação é vago, já que reúne em si competências

diversificadas de diferentes domínios (como competências práticas, transversais ou técnicas), competências pessoais e competências não são específicas ao século XXI, sendo a ênfase colocada nos processos cognitivos de análise e de aplicação do conhecimento por parte dos alunos, em detrimento das próprias unidades de conhecimento que detêm.

Contudo, apesar de poder ser considerado um conceito difuso, a necessidade de corresponder às exigências da sociedade atual, em que a resolução de problemas, a tomada de decisões, o trabalho em equipa, o profissionalismo, o sentido ético, a liderança e a gestão de projetos, e o fazer uso das tecnologias digitais, levaram ao desenvolvimento do conceito de competência para o século XXI (Trilling & Fadel, 2009). Segundo estes autores, há quatro forças que em conjunto convergem para novas formas de aprendizagem: Knowledge work (relacionado com os conhecimentos

adquiridos e a sua aplicação), Thinking tools (processos cognitivos subsequentes a cada sujeito), Digital lifestyles (relativo aos desenvolvimentos tecnológicos e às suas

implicações na sociedade) e Learning research (ligado ao desenvolvimento da aprendizagem e das metodologias de pesquisa de informação), cada uma

desempenhando um papel fulcral para o desenvolvimento, tendo influência consequente no processo de Ensino-Aprendizagem.

Alicerçando-nos na definição de competência anteriormente explicitada, importa definir em que medida esse conceito se explicita no domínio das competências do século XXI.

Sendo o termo competência compreendido como um constructo que envolve em si mesmo conhecimento, capacidades e os processos cognitivos que suportam a

mobilização e a integração desses recursos diversos procurando responder a situações concretas, a sua aplicação em contexto de sala de aula remete para o desenvolvimento técnico e pedagógico por parte do professor. Desta forma, há sempre um envolvimento destas duas dimensões em todas as competências docentes (Pedro, Matos, Pedro & Abrantes, 2011).

Pedro et al. (2011) realizaram um estudo que consistiu numa meta-análise a 13 frameworks de competências para o século XXI, com base numa revisão de literatura a partir de diferentes bases de dados. Os resultados evidenciaram um conjunto de

competências organizadas em diferentes domínios: competências digitais;

gestão/organização de informação; capacidade de pesquisa; planificação e resolução de problemas; reflexividade; pensamento crítico, competências de comunicação;

colaboração; responsabilidade social; literacia, inovação; criatividade; produtividade e e-business, salientando o aspeto prático, técnico, pedagógico e ético.

Como é possível analisar na imagem seguinte, as competências metacognitivas identificadas são as mais referidas, estando presentes em 11 dos 13 referenciais

analisados. Os domínios relativos aos aspetos técnicos (como as ‘Digital Literacy Skills’) surgem igualmente com grande frequência, sendo indicados em nove

documentos analisados. Com a mesma incidência estão ainda competências ligadas à criatividade, à inovação e à comunicação.

Embora os frameworks analisados não sejam específicos para docentes, têm servido como base da investigação realizada sobre as competências necessárias aos professores do século XXI, quer numa dimensão mais técnica, quer numa dimensão pluridimensional.

Em 2008, a UNESCO publicou o ICT Competency Framework for Teachers (ICT- CFT), documento revisto em 2011. Este referencial, apesar da sua forte componente relacionada com as tecnologias e a sua utilização, estrutura-se em diferentes níveis de progressão docente, especificando deste modo as competências que cada professor deve desenvolver durante a progressão na sua profissão, simultaneamente ao desenvolvimento que deve potenciar nos seus alunos. Assim, o referencial baseia-se em seis domínios de trabalho: (i) Understanding ICT in education; (ii) Curriculum and assessment; (iii) Pedagogy; (iv) ICT; (v) Organisation and administration; (vi) Teacher professional learning (UNESCO, 2011); organizados em três níveis de desenvolvimento profissional docente: Technology Literacy; Knowledge Deepning e Knowledge Creation.

No primeiro nível, espera-se que os professores auxiliem os seus alunos a trabalhar de forma mais eficiente, com o apoio das tecnologias, refletindo sobre o contributo destas para esse processo. No segundo nível há uma maior associação ao desenvolvimento de

competências e de conhecimentos e à sua aplicação em contextos específicos, relacionando- se assim com os processos metacognitivos. Por último, no terceiro nível procura-se que os professores sejam atores do seu próprio desenvolvimento profissional, potenciando

simultaneamente a aquisição de conhecimentos nos seus alunos, tornando-os construtores desse conhecimento.

Figura 3: Unesco ICT Framework for Teachers (2011)

À semelhança do Referencial anterior, em Portugal desenvolveu-se igualmente um referencial de competências TIC. Este referencial, desenvolvido por Costa (2008) no âmbito do Plano Tecnológico da Educação, procurou definir o modelo de formação e certificação de competências TIC para pessoal docente e não docente do contexto português.

Organizado em três níveis de formação e certificação (Certificação de Competências Digitais; Certificação de Competências Pedagógicas e Profissionais com TIC e Certificação de Competências Avançadas em TIC na Educação) indica um conjunto de

macrocompetências necessárias para uma atuação competente dos professores (Costa, 2008):  Deter conhecimento atualizado sobre recursos tecnológicos e seu potencial de

utilização educativo;

 Acompanhar o desenvolvimento tecnológico no que implica a responsabilidade

profissional do professor;

 Executar operações com hardware e sistemas operativos (usar e instalar

programas, resolver problemas comuns com o computador e periféricos, criar e gerir documentos e pastas, observar regras de segurança no respeito pela legalidade e princípios éticos…);

 Aceder, organizar e sistematizar a informação em formato digital (pesquisa,

seleciona e avalia a informação em função de objetivos concretos…);

 Executar operações com programas ou sistemas de informação online e/ou off-

line (aceder à Internet, pesquisar em bases de dados ou diretórios, aceder a obras de referência…);

 Comunicar com os outros, individualmente ou em grupo, de forma síncrona

e/ou assíncrona através de ferramentas digitais específicas;

 Elaborar documentos em formato digital com diferentes finalidades e para

diferentes públicos, em contextos diversificados;

 Conhecer e utilizar ferramentas digitais como suporte de processos de avaliação

e/ou de investigação;

 Utilizar o potencial dos recursos digitais na promoção do seu próprio

desenvolvimento profissional numa perspetiva de aprendizagem ao longo da vida (diagnostica necessidades, identifica objetivos);

 Compreender vantagens e constrangimentos do uso das TIC no processo

educativo e o seu potencial transformador do modo como se aprende. À semelhança do referencial da UNESCO, o Referencial de Competências TIC português apenas se foca na mobilização de competências transversais alicerçadas pelas tecnologias. Contudo, apesar de considerarmos que estas devem ser encaradas como

fundamentais na reflexão sobre o desenvolvimento de competências para o século XXI para o professor do Ensino Básico, não nos cingimos a elas. Entende-se que no domínio das

competências para o século XXI para os professores, as competências digitais, de gestão e organização de informação, ligadas à metacognição, à comunicação e à colaboração e aos aspetos éticos e sociais devem ser consideradas como fundamentais, abarcando assim as diferentes dimensões práticas, técnicas, pedagógicas, científicas e éticas.

Importa assim refletir sobre quais as competências fundamentais no desenvolvimento da profissão docente, considerando a multidimensionalidade da docência (áreas disciplinares, anos de lecionação e níveis de ensino). A ideia de que ser professor constitui uma profissão complexa, que requer empenho, dedicação e formação, remete para a análise de competências tendo por base o sujeito como ser social, influenciado direta e indiretamente pelos diferentes níveis de contextos que o rodeiam, seja a nível microssistémico, mesossistémico, passando para um exossistémico ou macrossistémico (Broffenbrenner, 1996).