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Comunicação interna da empresa inovativa (os indivíduos na empresa)

CAPÍTULO 2 – ROTINAS COMUNICACIONAIS NAS ORGANIZAÇÕES

2.2 Comunicação interna da empresa inovativa (os indivíduos na empresa)

Ao conviver em um ambiente corporativo, o indivíduo passa a interagir com outras pessoas, tanto no plano interno, com outros funcionários, quanto no externo, com clientes e fornecedores. A empresa é formada, sobretudo, por pessoas, que compartilham valores, crenças e normas formais e informais de comportamento. O espaço de convivência entre essas pessoas é justamente um espaço de comunicação, seja esta organizacional ou mesmo pessoal. É também um espaço em que vigora uma dada cultura organizacional, a qual, por meio da comunicação, as pessoas têm acesso. Uma vez que as pessoas agem de acordo com a cultura em que estão inseridas, a influência da cultura organizacional sobre os indivíduos é grande. Por outro lado, as pessoas também ajudam a construir e a influenciar as instituições.

O modo como a organização se comunica com seus funcionários e o conteúdo que transfere a eles define uma dada cultura organizacional. Essa cultura é tão mais transmissível quanto melhor forem geridos os processos de comunicação. Conforme afirma Marchiori

(2005, pg 110), “a gestão da comunicação deve ser efetiva para que uma mensagem possa ser interpretada, discutida, assimilada e praticada no sentido de ser valorizada pelas pessoas, gerando o que chamamos de conhecimento compartilhado”.

Esse conhecimento compartilhado é vital para a organização, uma vez que ajuda a unir as pessoas em prol de objetivos comuns. No entanto, em uma organização inovativa, a gestão da comunicação precisa ir além do compartilhamento do conhecimento.

Isso porque a organização inovativa é justamente aquela que cria novos conhecimentos, a que permite que os funcionários trabalhem em novas ideias, que arrisquem tempo e dinheiro em projetos que podem não ter retorno financeiro imediato. Não que devam esses funcionários agir de modo a não contribuir com o crescimento da empresa, mas há atividades que se mostram viáveis e lucrativas apenas a médio e longo prazo. Nesse sentido, a comunicação em uma organização inovativa deve contribuir para o conhecimento compartilhado, mas deve também incentivar o surgimento de novos conhecimentos.

A geração de uma comunicação organizacional baseada nesses pilares – compartilhamento de conhecimentos e incentivos a novos conhecimentos – está permeada por rotinas. São esses hábitos que permitem que o gestor de comunicação conheça a empresa, saiba quais conhecimentos devem ser compartilhados e até mesmo em que áreas é mais provável o surgimento de conhecimentos novos e úteis à organização. Com base nessas perspectivas é que direciona o conteúdo da comunicação a ser feita.

É possível falar, portanto, que as rotinas comunicativas, como vimos, são em partes evolucionárias. Elas são escolhidas muitas vezes por tentativa e erro e a tentativa só pode existir se houver uma busca por possibilidades. Ao optar por um caminho e não por outro, o gestor de comunicação seleciona o modo como atua e como a área de comunicação atua.

Rotina, seleção e processos de busca são conceitos emprestados da Economia Evolucionária

Neo-schumpeteriana.

Uma outra perspectiva que pode ser relacionada a esse tipo de comunicação é a da Nova Economia Institucional (NEI). Em semelhança à Economia Evolucionária Neo- Schumpeteriana, os teóricos da Nova Economia Institucional, como Douglass North, não acreditam que os indivíduos sejam plenamente racionais. Falam também na incerteza que permeia o processo econômico (e, adicionamos, permeia o processo comunicacional) e em um ser humano com “racionalidade limitada”, na expressão consagrada de Herbert Simon. Dão peso a uma abordagem holística e enfatizam o papel das instituições. Podem, ademais, ajudar a elucidar os motivos pelos quais a comunicação organizacional inovativa precisa incentivar a descoberta e a pesquisa.

Instituições, conforme conceitua North, “são as regras do jogo de uma sociedade, ou, mais formalmente, limites e restrições desenvolvidos pelos indivíduos para moldar a interação humana” (1990, p. 3). A explicação de como essas instituições são formadas, para o ramo da Nova Economia Institucional, se baseia na formação de modelos mentais compartilhados, que ocorre por meio da linguagem.

O conceito de modelo mental surgiu pela primeira vez com Charles Sanders Pierce (1896). Mais tarde, ele foi aprimorado pelo psicólogo Kenneth Craik (1943) e pelo psicolinguista Phillip Johnson-Laird (1983). Os três autores estavam preocupados em explicar como os raciocínios ocorrem. Craik sugeriu que a mente constrói modelos de pequena escala da realidade para antecipar eventos, raciocinar e embasar explicações, ideia que foi mais tarde aprofundada por Johnson-Laird. Segundo define a página da Universidade de Princeton sobre modelos mentais, eles estão para a linguagem assim como maquetes para a arquitetura, modelos de moléculas complexas para a biologia e diagramas de interação de partículas para a física.

A comunicação é um processo que ajuda a compartilhar os modelos mentais para um dado grupo. Na medida em que conversam, isso é, se apropriam e utilizam a linguagem, as pessoas tendem a estabelecer alguns modelos mentais bastante próximos. Dessas semelhanças resultam as instituições, que são “as regras do jogo”.

Dentro desse contexto e para os teóricos da Nova Economia Institucional,

(...) é a interação entre instituições e organizações que molda a evolução institucional da economia. Se as instituições são as regras do jogo, as organizações e os empresários são os jogadores. As organizações são feitas de grupos de indivíduos unidos por algum propósito comum e que visam a atingir alguns objetivos (...) (NORTH, 1990, p. 3)

Nesse sentido, a comunicação interpessoal e a comunicação interna concorrem, entre outros fatores, para mostrar aos jogadores, que incluem todos os funcionários, quais são as regras formais e informais, escritas ou não escritas, da organização. Esse processo resulta no compartilhamento de conhecimentos e em modelos mentais compartilhados, que são importantes para o grupo.

Entretanto, na medida em que só trabalha com conhecimento já adquirido, a organização não desenvolve novos conhecimentos. Não é, assim, inovadora e não melhora os seus processos e produtos. Por isso, a organização precisa estar estruturada para inovar e a comunicação deve incentivar o surgimento de novos conhecimentos.

das instituições prevalecentes. Isso é, o comportamento inovador representa um comportamento que deixa, em algum momento, de seguir o conhecimento já adquirido, para seguir uma trilha ainda não aberta, inovadora. Ao mesmo tempo em que desvia de uma norma, o indivíduo não despreza o que já conhece e, por isso, segue todas as outras normas/instituições (também chamadas de “convenções”). Conforme afirma Dequech,

(...) o comportamento inovador é ao menos em parte não convencional. Ainda assim, é difícil pensar em uma pessoa que age de modo completamente não convencional. Existem muitas convenções, e é muito difícil romper com todas ao mesmo tempo. O empreendedor ou firma schumpeteriano irá continuar a seguir algumas convenções ao romper com outras. Uma inovação implica em quebrar com modos convencionais de fazer alguma coisa, mas isso não necessariamente viola muitas outras convenções que existem em relação a uma firma, como, por exemplo, direitos, deveres, hierarquia, práticas contábeis, e assim por diante (...) (DEQUECH, 2003, p.157)

Um bom exemplo de desvio de instituições é o da empresa americana 3M e da criação do adesivo Post-it, produto de enorme sucesso de vendas. Para a fabricação de outro adesivo, existia uma lista de recomendações do que deveria ser feito e do que não poderia ser feito. O pesquisador que “descobriu” o Post-it fez um desvio intencional, uma ação que estava sugerida para não ser feita. Agiu assim de modo criativo. Ao tomar essa decisão, inovou e produziu um novo produto, o próprio Post-it, que depois foi comercializado.

Nesse caso, em vez de trabalhar com um conhecimento já adquirido pela empresa, ele ousou criar um novo conhecimento. Houve aí um desvio das instituições/convenções prevalecentes. O jogador, isso é, o responsável pela inovação, burlou uma das “regras do jogo”. Mas isso só foi possível porque a empresa incentiva a cultura da inovação e trabalha a sua comunicação para isso. Não possui assim, uma cultura organizacional que pune aquele que age de modo diferente rumo a um propósito comum, isso é, a criação de novos produtos e o crescimento da empresa.

Por essa razão, a comunicação interna de uma empresa inovativa não deve apenas expor os conhecimentos que a empresa já tem. Deve também incentivar o surgimento de novos conhecimentos. Para isso, precisa destacar práticas e aprendizados que resultaram em crescimento da organização e também no crescimento intelectual de seus funcionários. Precisa ainda estar alinhada com outras estratégias, como a de desenvolvimento e retenção de capital humano por parte da empresa.

Becker (1964) conceituou capital humano como aqueles ativos que não podem ser separados da pessoa como o são os ativos físicos e financeiros. Nessa perspectiva, o capital humano está presente nos conhecimentos, habilidades e hábitos que o indivíduo desenvolve.

Há uma relação intrínseca entre capital humano e inovação pois é por meio do aprendizado que os processos inovativos transcorrem. Assim, inovar e aprender são processos que transcorrem lado a lado. Logo, no dizer de Marchiori, “a estratégia de negócios não pode estar dissociada da estratégia de pessoas” (2008, p. 213).

Cabe à comunicação interna permitir que os indivíduos percebam suas oportunidades de aprendizado e crescimento intelectual dentro da organização, o que só pode ser feito se essas oportunidades existirem. De acordo com Marchiori, “criar condições para que cada indivíduo procure desenvolver ao máximo seu potencial é função básica de uma empresa, hoje” (2008, p. 213).

A cultura organizacional da empresa é condicionada pela comunicação interna desenvolvida. Nessa linha, Marchiori aponta que

(...) a comunicação interna é, sem sombra de dúvida, a vertente que constrói a identidade organizacional e engloba, portanto, todas as demais posturas internas da empresa: processo comunicativo entre pessoas e grupos com suas barreiras e ruídos, comunicação administrativa, fluxos informativos, redes formais e informais, canais de comunicação (...) (2008, p. 221).

Nesse sentido, essa comunicação precisa ser constante e dinâmica. Os funcionários têm de ser partes do processo, tanto na posição de emissores quanto na de receptores. A interação entre líderes e liderados é fundamental, bem como a ampliação e construção de canais pelos quais a comunicação entre todos os membros da empresa transcorre. Atualmente, diversas empresas têm redes sociais internas, o que contribui para que as pessoas se conheçam melhor, ampliem os pontos de contato, interajam profissionalmente, criem oportunidades e possam, assim, construir o futuro da organização.

Nas palavras de Marchiori se faz necessário “criar um ambiente interno no qual informação, conhecimento e competência fluam livremente para que exista comprometimento pessoal e auto-desenvolvimento, aspectos que contribuem para um crescimento organizacional” (2008, p. 213).

Em termos da comunicação organizacional, entendida como uma comunicação feita pela empresa para os seus funcionários, essa precisa ser planejada de modo a atingir os diferentes públicos internos com a mesma eficiência, para o que pode precisar de mais de um veículo comunicacional. É comum que os interesses das pessoas pertencentes a áreas diferentes sejam também diversos, mas a comunicação precisa atingir a todos, sem menosprezar nenhum público. Como salienta Bueno,

internos -, porque, na prática, é esta a realidade. E daí o contato com os públicos internos já não se dá com base em um veículo ou canal único: uma

newsletter para os que ocupam cargos de chefia ou decisão, com informações

sobre mercado, novas tecnologias, concorrência, etc.; um house-organ para os colaboradores que, reconhecidamente, têm o hábito de leitura, com notícias sobre a empresa e sobre sua atuação no mercado, mas também com espaços destinados ao lazer, à educação para a saúde etc.; um vídeojornal ou a implementação de uma estação de 'rádio-empresa' para os colegas de 'chão de fábrica’ (...) (2002, p. 27)

Para isso é necessário conhecer em profundidade quem trabalha na empresa, que conhecimentos detêm, quais são seus interesses. No caso de uma empresa inovativa, a comunicação é mais eficiente quando o gestor de comunicação conhece o perfil de seus funcionários e sabe como cada um pode contribuir para melhorar produtos e processos.

É um grande erro considerar que determinado funcionário não possa melhorar nenhum produto ou processo porque, na medida em que ele desempenha uma função, essa função pode sempre ser aprimorada. É evidente que em algumas áreas bastante técnicas apenas algumas pessoas com grandes conhecimentos específicos podem melhorar produtos e processos, mas uma empresa inovativa não realiza apenas atividades complexas. Por isso, mesmo pessoas que fazem atividades simples têm como fazer essas atividades de uma forma melhorada, para o que é preciso uma comunicação incentivadora. Além disso, prêmios podem ser instituídos internamente para que os funcionários procurem agir de forma a melhorar as atividades que realizam.

Nesse sentido, aindanas palavras de Marchiori,

(...) Não há como um veículo de comunicação ser global – servir para todos os públicos e interesses. É preciso segmentar a comunicação para que ela efetivamente traga alguma mudança. Se ela não causou nenhuma prática, ou seja, nenhum novo comportamento ou atitude, não houve entendimento (...) (2008, p. 212)

Por outro lado, os modos e discursos de incentivo à inovação para o pessoal técnico têm muitas vezes características próprias, decorrentes do perfil profissional a quem se destinam, de situações específicas, do contexto em que estão inseridos. Por isso, é conveniente que a comunicação tenha veículos diferentes, a fim de que atinja e incentive públicos também distintos, os quais, no entanto, têm metas em comum.

Além disso, a organização precisa ouvir os seus funcionários. Isso porque, conforme afirma Marchiori, “quanto maior for o envolvimento do funcionário com a organização, maior

será o seu comprometimento (…) é preciso aprender a ouvir o que o funcionário tem a dizer em relação à empresa” (2008, p. 209). Assim, a comunicação não deve ser planejada dentro de um castelo de difícil acesso, mas sim com base nos contatos, nas respostas e nas impressões fornecidas pelos funcionários sobre a empresa e suas atividades.

As rotinas comunicacionais que produzem os melhores resultados precisam ser praticadas no dia a dia da organização. É importante salientar que a avaliação das rotinas precisa ser realizada periodicamente, até mesmo para que se possa medir os resultados obtidos no curto, médio e longo prazo. Algumas práticas são funcionais no curto prazo, mas, se não estiverem em consonância com as tendências comportamentais dos funcionários, podem ser disfuncionais em prazos mais estendidos.

Por exemplo, se um veículo de comunicação interna não ajudar, após um tempo, a criar valor para a empresa, em termos de aprendizado e disseminação de conhecimento, a tendência é que deixe de ser lido, mesmo que alcance seu público nos primeiros números. Nesse caso, algumas das rotinas envolvidas na criação do conteúdo precisam ser alteradas. Ninguém percebe melhor a contribuição que uma comunicação interna gera do que os próprios funcionários. O gestor de comunicação precisa estar sempre atento para saber até que ponto o conteúdo que produz gera resultados, a fim de adotar rotinas adequadas para essa produção.

A melhor comunicação interna de uma organização, no dizer de Marchiori, ocorre quando “seus funcionários se comunicam de maneira contínua e informal entre os diversos níveis organizacionais e contam a mesma história da empresa para seus diferentes públicos”. (2008, p. 214). Com os fins de lograr essa meta, a gestão de comunicação deve incentivar a comunicação entre os funcionários, bem como produzir conteúdo pertinente.

Nesse ponto, é importante apontar que o conhecimento, no nível organizacional, não é qualquer visão que se tenha a respeito de algo, como seria em uma perspectiva filosófica, mas sim ideias e incentivos que permitam à organização lograr seus objetivos e metas. Isso só será possível quando a dimensão humana da empresa for respeitada, ou seja, quando os funcionários forem tratados com dignidade, respeito e entendimento do seu papel de autores e de pertencimento na história organizacional.