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CAPÍTULO 4 – INOVAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA EMBRAER

4.2 A Embraer e sua visão de inovação

Considerando os aspectos levantados pela pesquisa da CNI e da PINTEC, bem como os dados anteriormente referidos, é possível, agora, verificar, em que medida a empresa selecionada para este pesquisa, a Embraer, está em consonância com os resultados apresentados.

A escolha da Embraer para esta pesquisa de mestrado foi pautada por critérios objetivos relacionados à atividade inovativa da mesma. A empresa pertence ao segmento de aviação e presta também serviços de manutenção de aeronaves de porte médio e pequeno. Além de atuar no Brasil, opera ao menos em outros 10 países e 3 continentes. Pode, desse modo, ser considerada uma empresa de porte grande. Em alguns dos principais rankings de inovação mundial, que listam as empresas mais inovadoras, como o da Comissão Européia, em 2015, e o da revista americana Fast Company, também de 2015, a Embraer aparece bem posicionada. Além disso, já venceu, em 2012, o prêmio Finep de inovação, concedido a empresas que se destacam por suas atividades inovadoras.

Para entender melhor as estratégias de Comunicação e de Inovação da Embraer, foram

realizadas entrevistas com a área de Comunicação e de Inovação da empresa. A entrevista

com o gerente de inovação sênior da Embraer, Sandro Valeri, entrevista prospectiva e pré- formulada, aconteceu na sede da empresa em 29 de abril do corrente ano e durou cerca de uma hora. Já a entrevista com o analista de marketing e comunicação empresarial, Marcelo Conteçote, nos mesmos moldes, foi realizada no dia 9 de setembro, no mesmo local, com

duração semelhante. A íntegra das entrevistas encontra-se nos anexos. Foi também contatada por e-mail a analista de marketing Tatiane Santos Pereira, em 15 de dezembro de 2015, para a obtenção de dados referentes a campanhas publicitárias da empresa, que fazem parte da estratégia de construção e de consolidação da imagem institucional.

Até hoje, ainda que tenha se internacionalizado, a maior parte das pesquisas sobre desenvolvimento tecnológico feitas por essa empresa são conduzidas nessa sede de São José dos Campos, em São Paulo. O escritório em que trabalha o gestor de inovação funciona dentro no mezanino de um hangar. É preciso passar ao lado de aviões em fabricação para se chegar ao local da entrevista, iniciada pontualmente no horário marcado.

Fomos avisados ao iniciar a conversa com esse gestor que a entrevista não poderia ser gravada, sob a justificativa de que se trata de uma empresa que trabalha também com Defesa e Segurança. Essa restrição, embora, a nosso ver, desnecessária, não impediu que fizéssemos diversas anotações. No dia posterior à entrevista, foi realizada a transcrição da conversa em sua totalidade e essa transcrição foi depois enviada ao entrevistado, vez que poderíamos ter cometido algum equívoco no processo. Após o envio, o entrevistado entrou em contato e confirmou a íntegra da entrevista. Essa íntegra (perguntas e respostas) está nos Anexos dessa dissertação.

A entrevista com o analista de marketing e comunicação empresarial não teve a mesma dificuldade e foi gravada. Após a gravação, fez-se a decupagem do conteúdo. O material não foi novamente enviado para o analista de marketing e comunicação empresarial porque a decupação já torna a entrevista bastante fiel o que foi dito. Esta entrevista também se encontra como anexo.

Para a entrada na sede e entrevista com o gerente da área de inovação da Embraer, foi preciso assinar um termo de compromisso que proíbe, por exemplo, que indiquemos o nome da organização no título da dissertação ou mesmo no decorrer do texto. Esse procedimento é comum em trabalhos desse tipo e, conforme verificado com pesquisadores mais experientes com empresas, o trabalho não ocorre sem a assinatura do termo. Entretanto, após as entrevistas serem realizadas a empresa foi contatada, com sucesso, para a liberação do uso do nome da Embraer na dissertação, vez que não se abordou segredos industriais ou pontos que não pudessem ser revelados publicamente.

A Embraer: uma Casa da Moeda Inovativa

De qualquer modo, nessa dissertação, chamaremos a Embraer também por um nome fantasia, criado para facilitar o desenvolvimento do trabalho. Em consonância com o restante do texto, a empresa será, chamada de Casa da Moeda Inovativa (CMI). Evidente que outros substantivos como “empresa” ou “organização”, entre outros, também poderão ser usados.

A Casa da Moeda Inovativa se localiza próxima geograficamente a instituições de ensino e pesquisa que têm forte reputação nas áreas de Ciências Exatas, em São José dos Campos. Ela foi fundada pelo governo brasileiro em fins da década de 1960 e, após forte crescimento e posterior breve período de estagnação e crise, foi privatizada em meados da década de 1990. Há algumas evidências, como o crescimento na última década e a geração do número de postos de trabalho, de que o processo de privatização contribuiu para a retomada do crescimento da empresa na mesma década e em décadas subsequentes.

De acordo com estudo publicado na revista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), número 37, de agosto de 2012, a privatização da Embraer permitiu reestruturar suas dívidas, obter novos recursos financeiros e concluir projetos em desenvolvimento. A União resguardou para si, por meio da emissão de alguns ações especiais (golden share), o “direito a veto em determinadas matérias, em especial no que se refere a programas militares”. Ou seja, o governo pode vetar alguma atividade relacionada à produção de inovações ou de bens aeronáuticos militares caso seja necessário. Além da privatização, a recuperação do mercado de aviação regional foi importante para a retomada do crescimento da Embraer.

A expansão da Embraer pode ser mensurada, também, em termos de número de empregados. Em 1994 a empresa tinha cerca de 6 mil funcionários. Em 2010, o número quase triplicou, chegando a um pouco mais de 17 mil trabalhadores, de acordo com o mesmo estudo publicado na revista do BNDES. Hoje, a empresa conta com cerca de 19 mil funcionários. Embora haja certa resistência política e econômica de alguns setores sobre a ideia de privatização, o processo relativo a essa empresa em particular foi saudado como benéfico mesmo por algumas lideranças em geral críticas a ideias privatizantes. Em reportagem do jornal Valor Econômico, de fins de 2014, o ex-presidente da Embraer, Ozires Silva, responsável por conduzir o processo de privatização, relata encontro com um ex-presidente do país. De acordo com o ex-presidente da empresa, o ex-presidente do Brasil “pegou no meu braço e disse: companheiro, eu sempre apoiei as privatizações que deram certo”.

humanos especializados, e ao conhecimento acumulado durante décadas de atuação no setor de aviação, a escolha da Embraer, além de sua posição de destaque em rankings nacionais e internacionais, partiu da ideia que a empresa já tem quantidade considerável de “moeda inovativa”. Conforme definimos anteriormente, essa moeda é um ativo intangível que representa a relação dinâmica entre comunicação e confiança que pode existir entre os funcionários de uma dada organização ou entre essa organização e outras organizações, sejam elas públicas ou privadas. Essa moeda ajuda a pagar os custos do processo de inovação e é “emitida” pela própria empresa, de modo que cada empresa é uma Casa da Moeda Inovativa.

Assim, pode existir “moeda inovativa abstrata” (quando não se materializa em um produto ou serviço), “moeda inovativa concreta” (quando se materializa), “moeda inovativa interorganizacional” (quando essa relação de comunicação e confiança se dá entre organizações) ou mesmo não existir essa “moeda inovativa”. No caso em que ela não existe, o custo de inovar é consideravelmente maior.19

Em termos práticos, o fato de essa empresa ter um grau adequado de moeda inovativa indica, no plano externo à empresa, que ela já estabeleceu algum grau de confiança e reputação com o mercado, com o governo e com outras organizações, como universidades, e consegue se comunicar com esses públicos de referência (stakeholders) de forma eficaz. No plano interno, a existência de moeda inovativa indica que os funcionários desenvolveram algum grau de confiança entre si e uma boa eficiência na comunicação, tanto em termos de formas (por exemplo, Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs)) quanto de conteúdos (jargões técnicos, termos comum à organização, modos de se comunicar). Imaginamos que a relação entre confiança e comunicação pode ser verificada na prática, tanto no plano interno quanto no plano externo, relação que, conforme observado nessa empresa, ajuda a diminuir os custos do processo de inovação.

Por essa lógica, foi possível formular nossa primeira questão central ao trabalho, aqui respondida a partir da pesquisa na empresa.

Questão 1: a empresa tem grau elevado de confiança entre seus empregados e com

organizações externas, o que ajuda em uma comunicação interna e externa eficiente? Essa eficiência comunicativa ajuda a manter e a ampliar o grau de confiança já estabelecido?

Em termos de imagem e reputação, imaginamos, a princípio, que a empresa também tenha construído de forma eficiente essas características. Sabemos que a imagem de uma empresa pode ser volátil, se não sustentada ao longo dos anos. Já a reputação é construída e

19 Os termos foram criados pelo autor dessa pesquisa para melhor entendimento da relação entre confiança e comunicação e o papel dessa relação nos processos inovativos – ver Capítulo 3

consolidada ao longo de um período temporal muitas vezes extenso.A imagem empresarial é uma característica que surge de um pensamento mais emotivo e não necessariamente racional. Nessa hipótese está relacionada ao fato de que o nome da empresa é lembrado de forma positiva por parte de parcela considerável de cidadãos brasileiros. Em relação à reputação, imaginamos que estivesse ligada à capacidade inovativa da empresa, para a qual concorre tanto a confiança no trabalho desenvolvido, sua aceitação no mercado, quanto a comunicação eficiente. Afinal, não basta ser eficiente. A comunicação ao público interno e externo é essencial para a manutenção desta confiança na empresa. A presença dessa Casa da Moeda Inovativa em rankings globais de inovação, sua posição no mercado entre os principais players do setor e a divulgação de peças de comunicação como os relatórios anuais aos acionistas contribuem para que elaboremos a segunda questão, que é:

Questão 2: a empresa tem conseguido construir forte imagem e reputação, características de

um processo eficiente de comunicação organizacional? Tanto a imagem quanto a reputação ajudam na construção da confiança e, assim, diminuem os custos do processo de inovação?

Por fim, nossa terceira e última questão é se a comunicação constitui um processo essencial para as atividades de busca conforme o conceito já explorado de Nelson e Winter (1982). Nesse sentido, seria preciso se comunicar para que a busca fosse exitosa e permitisse a elaboração de inovações. Embora, como vimos, a maior parte das inovações tenha origem com um indivíduo específico, é válido lembrar que uma busca realizada em grupo tem mais chances de sucesso.

A busca quando feita pelo grupo resulta em uma série de dados e informações cuja utilidade para a inovação é enorme. O indivíduo que inova é aquele que possui um comportamento capaz de reunir essas informações e, com a ajuda do corpus informativo, desvia de algumas instituições presentes no processo produtivo. Esse desvio passa pelo processo de seleção do mercado e pode vir depois a transformar rotinas dentro da própria empresa. Nesse sentido, é possível perquirir se

Questão 3: a comunicação representa aspecto de grande importância para as atividades de

busca, capazes de levar a inovações? Essa comunicação é mais eficaz porque existe adequado grau de confiança dentro da empresa e com outros agentes?

Após a colocação das três perguntas, foram elaboradas respostas com base nas entrevistas concedidas com os dois funcionários estratégicos da empresa, do ponto de vista da

comunicar da empresa passou por uma evolução em termos de formas e se há também uma busca por parte da área de comunicação para melhorar as tecnologias empregadas nos processos comunicativos.

Ademais, durante a entrevista outros pontos, que não dizem respeito a essas três questões colocadas e nem a esse último ponto, foram levantados. Aspectos como a formação e utilização de recursos humanos, a relação com a universidade, a importância da linguagem para a inovação, quais canais de comunicação são utilizados nos processos comunicativos, e, por fim, o ambiente de negócios para inovar no Brasil e, em particular, a importância da Lei de Inovação nesse ambiente.

Ainda que as visões dos funcionários entrevistados possam ser comentadas e

examinadas em maior ou menor grau, o que se fará abaixo, acreditamos que as conversas

foram produtivas, entre outras razões, porque não existem muitos trabalhos sobre Comunicação e Inovação no Brasil e também porque as respostas trouxeram certa riqueza de detalhes. As respostas fornecidas, portanto, podem ser pontos a serem refletidos de modo mais detido em estudos subsequentes.

É importante assinalar ainda que, em uma pesquisa conduzida por De Falco (2009) junto à Embraer e a outras três empresas inovativas, foi observado que há um descompasso entre o conteúdo referente à inovação dos seus portais corporativos e a dimensão de seu processo inovativo. Existe, portanto, um centro contraste entre a capacidade inovativa da mesma e a capacidade de comunicação de conteúdo relativo à inovação nos portais.

Entretanto, conforme este trabalho mostra durante todos os capítulos anteriores, a comunicação é um processo essencial para atrair recursos, em termos de capital financeiro e humano, conduzir pesquisas e desenvolver processos e produtos, bem como para melhorar e consolidar a imagem institucional para seus diferentes públicos. A comunicação importa e muito para a inovação, o que foi explicitado nesta dissertação não apenas em termos teóricos, mas, conforme se verá nas páginas seguintes, confirmado de modo empírico.

4.3 Comunicação, Confiança, Imagem e Reputação (Respostas das três questões