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CAPÍTULO 1: ECONOMIA EVOLUCIONÁRIA E INOVAÇÃO

1. Um pouco de teoria

1.3 Economia evolucionária neo-schumpeteriana

Na década de 1980, o trabalho de Nelson e Winter foi fundamental para mostrar novos conceitos sobre a economia evolucionária. Em um livro publicado em 1982, “An Evolutionary Theory of Economic Change”, esses autores apontam para três conceitos importantes nessa analogia entre Ciências Biológicas e Econômicas. São eles os conceitos de busca, rotina e seleção. Para indicar os principais pontos do trabalho desses autores usaremos comentários feitos por Possas (2008).

Em um trabalho de 2008, Possas analisa essa perspectiva:

natural, com o darwinismo e com a biologia evolucionária, mas até recentemente sem maiores compromissos. Os exemplos clássicos são Marshall, Veblen e, posteriormente, Hayek, de forma explícita, e Schumpeter, de forma implícita, ainda que talvez potencialmente mais fértil. Após 1950, uma incursão famosa, mas ainda pouco sistemática foi o debate iniciado por Alchian (1950) e corroborado por Friedman (1953), e mais tarde por Becker (1962). O marco principal na incorporação efetiva de argumentos evolucionários no campo da teoria econômica foi o trabalho de Nelson e Winter (1982), que inaugurou um novo terreno fértil para a expansão do escopo e das ferramentas para uma análise da dinâmica evolutiva em economia (…)8

Ainda que veja algumas falhas no trabalho, Possas se mostra bastante favorável à obra. Aponta que “há consenso entre analistas de que as proposições teóricas de Nelson & Winter (1982), e seu modelo setorial (cap 12 e 13), apesar de reconhecidas limitações, abriram uma nova frente para a análise microeconômica da dinâmica industrial e tecnológica”.

No livro escrito por Nelson e Winter, os conceitos de “rotina”, “busca” e “seleção” ajudam a explicar o surgimento de inovações e também o aparecimento e desaparecimento de indústrias. Para isso, é importante se deter sobre cada um deles.

Veja-se primeiro o conceito de “rotinas”. Nelson e Winter afirmam que:

(…) O conceito de “rotinas”, tem “o papel que os genes têm na teoria da evolução biológica. Eles são um elemento persistente do organismo e determinam o seu possível comportamento (ainda que o verdadeiro comportamento seja determinado também pelo ambiente); são transmissíveis no sentido de que os organismos de amanhã gerados dos de hoje têm as mesmas características; e são selecionáveis no sentido de que alguns organismos com determinadas rotinas podem cumpri-las melhor que outros e, se isso ocorrer, a sua importância na população (indústria) aumenta com o tempo.(...) (NELSON E WINTER, 1982, p.15)

O significado das firmas terem rotinas é que elas realizam processos, ou seja, têm métodos, habilidades, e seguem por diversas vezes a mesma sequência de atividades. Por exemplo, uma rotina pode fazer com que uma firma combine duas tecnologias distintas para produzir um produto. O conceito abre espaço também para meta-rotinas, ou seja, rotinas que podem promover mudanças em rotinas examinadas. Por exemplo, uma empresa pode estar sempre à procura de uma nova tecnologia que possa ser usada em outra rotina e, assim, a modificar.

Essas meta-rotinas podem também ser classificadas como processos de busca. O conceito de busca é definido pelos autores como

8 Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 40142008000200021 , acesso em 02 de junho de 2015

(…) a contraparte da mutação na teoria biológica evolucionária. E o nosso tratamento da busca como em parte determinada pelas rotinas da firma encontra paralelos com o tratamento na teoria biológica da mutação como sendo determinado em parte pela genética do organismo (…) (NELSON E WINTER, 1982, p.180)

Assim, o que ocorre é que a empresa realiza rotinas e buscas. Algumas rotinas serão modificadas no decorrer de um certo período, enquanto outras permanecerão as mesmas durante períodos indefinidos. Ao realizar a busca – que é também uma rotina ou uma meta- rotina - e modificar uma rotina, a empresa inova no processo de produção de um bem ou mesmo cria um novo produto. Esse trabalho acredita que as mudanças que a firma realiza quanto a sua comunicação, interna e externa, são mudanças de processos ou mesmo de produtos. Ao criar uma newsletter ou um informativo, a empresa inova, isso é, lança um novo produto, muitas vezes para fins internos. A inovação, seja comunicacional ou não, (e cuja analogia com a biologia evolutiva é o conceito de “mutação”) é proposital e planejada, mas apenas um processo de “seleção” irá permitir saber se foi bem sucedida ou não.

Após passar por uma mutação, a empresa continua no mercado, junto com as concorrentes. As condições de oferta e demanda irão determinar quais das empresas terá maior lucratividade e quais terão menor lucratividade ou mesmo prejuízo. No longo prazo, o processo de seleção, que, no caso da economia, é dado por mecanismos de mercado, irá expulsar as empresas menos exitosas daquele ramo. (No caso da comunicação e de novas formas/produtos para se comunicar, o processo de seleção, como veremos, não é só feito pelo mercado).

Nas palavras de Possas, o que ocorre é que

(…) Firmas com rotinas mais adequadas à obtenção de maior lucratividade levam a seu maior crescimento no mercado, portanto maior market share. Inovações que tenham potencial para gerar rotinas indutoras de maior lucratividade serão selecionadas implicitamente pelo maior sucesso competitivo das firmas portadoras dessas. Dessa forma, rotinas mais rentáveis tenderão a ser selecionadas em detrimento das demais, aumentando sua participação no pool de rotinas das indústrias, assim como genes selecionados aumentam sua participação no pool genético de uma população. (…)9

Nem todas as mutações, contudo, são propositais. Se a empresa perde um empregado com um dado conhecimento exclusivo de forma abrupta, mutações em alguns de seus

9 Disponível online em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142008000200021 , acesso em 27 de maio de 2015

processos internos poderão ocorrer. O conhecimento terá que ser redescoberto, visto que apenas aquele funcionário o detinha.

Entretanto, essa intencionalidade da mutação é irrelevante no que concerne ao processo de seleção. A lucratividade auferida por uma empresa depende do seu funcionamento interno e do mercado. O mecanismo de seleção atua de modo implacável.

Possas comenta que:

(…) Os dois componentes-chave da analogia são os mecanismos de variação (mutação) e de seleção: o primeiro correspondendo à inovação econômica, realizada no âmbito da firma – só que mediante um processo de busca (search) (…); e o segundo correspondendo à seleção das respectivas rotinas, realizada pelo mercado. Segundo os autores, ambos substituem com vantagem – pelo contexto evolutivo e dinâmico, mais realista, em que se supõe que operem – os correspondentes pilares da teoria ortodoxa (neoclássica), o comportamento individual racional-maximizador e o equilíbrio de mercado (…)10

Apesar da argúcia do modelo, Possas lista algumas limitações da teoria. Correspondem a questões não muito bem resolvidas, a fraca correspondência entre genes e rotinas, a difícil analogia com mecanismos de replicação (como a rotina é replicável?), o uso da lucratividade como parâmetro para a sobrevivência da empresa (a empresa pode sobreviver mesmo se não der lucro e há outros fatores a considerar sobre competitividade), entre outros.

Possas chama atenção para a ausência de discussões sobre aprendizado, tradicionais na economia da inovação, e para a conexão do processo de busca apenas com inovação e não com o esforço adaptativo. Assim, para o autor,

(…) Essa necessariamente dupla dimensão do processo econômico inovativo leva à conclusão relevante de que existem dois mecanismos evolucionários de

seleção em economia (e na abordagem de Nelson & Winter, ainda que não

inteiramente explicitados), e não apenas um: o primeiro deles equivalente ao da "seleção natural", e o outro via aprendizado adaptativo. Ambos, convém lembrar, são ingredientes necessários em maior ou menor grau para o sucesso do processo de inovação na economia; e não apenas o primeiro. Inovações, em outras palavras, tanto podem ser mais "radicais" como mais "incrementais"; na terminologia schumpeteriana, serão sempre inovações se mudarem o espaço econômico (…)11

10 Disponível online em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142008000200021 , acesso em 27 de maio de 2015

11 Disponível online em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142008000200021 , acesso em 27 de maio de 2015

A conclusão de Possas ressalta o caráter inovador da teoria. Destaca ele que: (…) o processo de seleção deixa de ser regido essencialmente pelo ambiente (mercado), dado o caráter estocástico das "mutações", e passa a ser regido

simultaneamente pelo ambiente e pela estratégia inovativa (e competitiva) das

empresas. (...) A demanda de mercado intervém tanto ex ante quanto ex post,e é possível considerar que o processo de seleção pelo mercado passa pelos dois

momentos. Mas a tecnologia tem uma dinâmica própria, baseada em

conhecimentos e experiências acumuladas, o que cria regularidades e restringe o leque de possibilidades de desenvolvimento subseqüente, constituindo uma

"trajetória tecnológica(...) (disponível online em

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 40142008000200021 , acesso em 27 de maio de 2015)

Considerando a visão de Possas, é possível inferir que a comunicação é, sem dúvida, parte desse ambiente empresarial, isso é, do meio em que opera uma firma. Isto porque a comunicação é parte inerente da cultura organizacional. Ela é resultado, em larga medida, de processos internos e de mudanças culturais e gera, no longo prazo, culturas organizacionais. Desse modo, meios usados para se comunicar e os conteúdos produzidos nas comunicações de empresas inovativas, seja com o público interno ou com agentes externos, como clientes e fornecedores, contribuem para o desempenho da empresa no mercado. Para se entender como a comunicação afeta esse desempenho, é preciso analisar as rotinas comunicacionais formadas pela empresa em suas diversas atividades comunicativas. Isso será feito no próximo capítulo.

CAPÍTULO 2 – ROTINAS COMUNICACIONAIS NAS ORGANIZAÇÕES