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Conceitos Adjacentes: Morte, Karma e Salvação (Evolução) e Purgatório 170 

CAPÍTULO 3 – RELIGIÃO MESSIÂNICA: INTERAÇÃO DE TENDÊNCIAS DIVERSAS 132 

3.6 TENDÊNCIAS HINDU-BUDISTAS: VISÃO SOBRE MORTE E REENCARNAÇÃO 169 

3.6.1 Conceitos Adjacentes: Morte, Karma e Salvação (Evolução) e Purgatório 170 

Antes de abordar a visão das NRJ propriamente dita, apresentarei algumas concepções sobre o tema da reencarnação desde a alta antiguidade e, em seguida, sintetizarei conceitos

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“Concretização da Verdade”. In: Alicerce do Paraíso. SP: FMO, 1991.

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adjacentes a partir da perspectiva de religiões tradicionais orientais como o Budismo e Hinduísmo que, em maior ou menor grau, constituem alguns dos pilares das NRJ.

A doutrina da reencarnação era ignorada entre as maiores religiões até o século VI a.C., não sendo sequer citada pelo Hinduísmo antigo (Vedismo). Foi somente com a introdução dos textos filosóficos do Upanishads que surgiu a idéia de samsara, em geral, compreendido como reencarnação ou transmigração. Na China Antiga, entre VI e III a. C., também não fora mencionada por grandes sábios como Lao-Tsé, Confúcio ou Chuang-Tsé, representantes da idade de ouro da filosofia chinesa. Contudo, é relevante dizer que, mesmo anterior a esta época, já havia nas antigas dinastias chinesas aquilo que se entende como “culto aos ancestrais”. Na China, a idéia de reencarnação foi difundida somente mais tarde, através do Budismo, numa época em que os relatos mitológicos iam sendo substituídos pelos primeiros textos filosóficos. Já as religiões gregas e indianas elaboraram, respectivamente, noções como a metempsicose142 e o samsara (DOMERGUE, 1993, p. 9-26).

Na atualidade, a recorrência de discussões acerca da reencarnação no Ocidente pode se originar do grande interesse deste por tudo que vem do Oriente. Reencarnação, afinal, estaria relacionada à concepção oriental e significaria uma “estratégia de domesticação da morte” (TERRIN, 2003, p.225). Assim como no contexto do mundo moderno nada pode escapar dos centros de controle, a morte, isto é, o além passa a ser monopólio não mais religioso; torna-se a expressão de uma cultura baseada no interesse e no lucro. A reencarnação convive com a certeza de um homem que pensa “viverei de novo”, “terei mais uma chance”.

142 Metempsicose [do grego: meta = mudança + en = em + psukê= alma] 1. Transmigração da alma de um corpo para outro.

2. Doutrina filosófica de origem indiana, transportada para o Egito, de onde mais tarde Pitágoras a importou para a Grécia. Os discípulos desse filósofo ensinavam ser possível uma mesma alma, depois de uma período mais ou menos longo no império dos mortos, voltar a animar outros corpos de homens ou de animais, até que transcorra o tempo de sua purificação e possa retornar à fonte da vida. (http://www.guia.heu.nom.br/metempsicose.htm)

No concernente à temática da reencarnação dentro das NRJ, inevitavelmente, conceitos adjacentes como renascimento, karma, predestinação e salvação suscitam reflexões peculiares.

Para efeitos de exemplificação, vejamos o conceito do karma. O karma é uma espécie de energia acumulada pelo homem através de seus pensamentos, palavras e obras e que produz conseqüências felizes ou penosas, conforme o comportamento anterior da pessoa do ponto de vista ético. Condutas eticamente louváveis produzem bom karma que podem levar ao renascimento em esferas paradisíacas enquanto, ao contrário, o mau karma conduz a renascimentos terríveis em mundos infernais143. Contudo, tanto o Hinduísmo quanto o Budismo não se limitam à busca de soluções puramente éticas que supostamente levam à produção do bom karma. Bem e mal são relativos; o caminho ético144 funciona apenas como uma via para a eliminação de todo e qualquer karma, seja ele bom ou mau. Findo o karma, extingue-se, pois, o sofrimento e a ignorância que cedem lugar à “Suprema Libertação, a Integração no Eu Real, no Absoluto, no Nirvana” (GONÇALVES, R.M., 1977). Em outras palavras, uma vez que o homem é escravo de vários renascimentos, salvar-se significa libertar-se do círculo vicioso das diversas reencarnações.

Até o século XIX, a lei do karma tinha nas suas religiões de origem uma conotação sempre negativa. Isso mudou a partir de uma elaboração ocidental cuja visão positiva acredita que o homem é capaz de purificar seu próprio karma. Representante desta vertente evolutiva da lei do karma, Allan Kardec defende a lei do karma como uma abertura do caminho para a

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É importante destacar que o Budismo surge num momento em que as idéias clássicas indianas de karma e renascimento

estavam em debate. Na contra-mão da idéia de que o renascimento era determinado pela natureza dos karma, os Ajivakas (corrente dos fatalistas) acreditavam que o ciclo de renascimento era determinado por um destino impessoal

(HARVEY,1994, p.22).

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Segundo Ricardo Gonçalves (1977), “O objetivo supremo do Budismo é a Iluminação ou satori, isto é, a integração com o Verdadeiro Eu ou o Absoluto, que se alcança através da superação do egoísmo, fator do qual se origina todo o sofrimento. Muitos acreditam que o Budismo seja um mero sistema de ética, mas na verdade ele é uma ascese que conduz à morte do ego e à transcendência do bem e do mal.”

evolução do indivíduo. Neste sentido, “toda vida humana se apresenta como luta constante entre o poder determinativo do karma e o esforço humano para mudar esse poder”. (BLANK, 1995, p.72) Contudo, segundo o autor, esta visão evolutiva da lei do karma implica numa atitude de orgulho espiritual que, do ponto de vista teológico, significaria o orgulho “de quem não quer aceitar a própria fraqueza humana” ou daquele que pode reduzir Deus apenas ao “simples papel de coadjuvante na difícil tarefa de reprogramar o karma”.

Há teólogos que acreditam na possibilidade de harmonizar a crença na reencarnação com a mensagem cristã através da doutrina do purgatório que seria o local de purificação da alma. Antes da ressurreição ou da reencarnação haveria um estado intermediário de avaliação e purificação das faltas. No catolicismo, tal purificação ocorre apenas após a morte, diferentemente do Espiritismo cuja crença afirma que ela ocorre, sobretudo, na terra mediante sucessivas reencarnações (HIGUET, 1999, p.136-37). Porém, como se caracterizaria o conceito de purgatório e de purificação no caso das NRJ? Por exemplo, o conceito de purificação – central na doutrina messiânica – engloba tanto a purificação exclusiva do após-morte (do catolicismo) quanto a purificação como processo de “maturação que não pára na morte”.