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Reencarnação nas NRJ: Perspectivas da IMM, SNI e Tenrikyo 173 

CAPÍTULO 3 – RELIGIÃO MESSIÂNICA: INTERAÇÃO DE TENDÊNCIAS DIVERSAS 132 

3.6 TENDÊNCIAS HINDU-BUDISTAS: VISÃO SOBRE MORTE E REENCARNAÇÃO 169 

3.6.2 Reencarnação nas NRJ: Perspectivas da IMM, SNI e Tenrikyo 173 

Assim como em outras épocas e localidades, o tema da reencarnação habita o universo das NRJ surgidas no Japão do fim do século 19. No entanto, nas NRJ, ocorre a busca incessante pela libertação do círculo de renascimentos peculiar às origens da teoria reencarnacionista? Ou, ao contrário, enfatiza-se a evolução humana através da superação do karma? Dentre elas, haveria aquela que não crê na susceptibilidade humana ao processo de reencarnação?

Com a finalidade de refletir sobre questões pertinentes ao tema da crença na continuidade de vida pós-morte tendo como enfoque principal a teoria reencarnacionista do ponto de vista das NRJ, procedo a uma análise comparativa entre a visão messiânica e outras duas NRJ – a Seicho-no-Ie (SNI) e Tenrikyo (TK) com relação aos ciclos de renascimentos cujos corpus selecionados são, respectivamente, os seguintes:

3.6.2.1 IMM – Nascer e Renascer

Desprendido do corpo, que se tornou inútil, o espírito retorna ao Mundo Espiritual, onde passa a habitar, começando uma nova vida. (...) os instantes da morte, que os budistas designam pela expressão “vir para nascer”. De fato, se analisarmos do Mundo Material, é “ir para morrer”, mas, se o fizermos do Mundo Espiritual, é “vir para nascer”. Da mesma forma, ao invés de dizerem “antes de morrer”, eles dizem “antes de nascer”. Assim, o espírito vive no Mundo Espiritual durante determinado tempo, às vezes dezenas, centenas ou milhares de anos, para nascer novamente. Desse modo, o homem nasce e morre muitas vezes. Para se referirem a esse nascer e renascer, os budistas usam a expressão “Rin-ne Tensho”145 (FUNDAÇÃO MOKITI OKADA, 1991, p.129).

3.6.2.2 TK – Reencarnação

Pais tornam-se filhos e filhos tornam-se pais... Bem, houve a reencarnação (Indicação Divina de 16.4.1888 apud KAJIURA,M.E.)146

145 Rinne [輪廻 tradução japonesa de Sa sDra / 転生 [traducão japonesa de transmigração de almas; metempsicose].

Expressão contida no ensinamento “Vida e Morte” In: Alicerce do Paraíso. São Paulo: FMO, 1991.

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3.6.2.3 SNI – O renascimento não é compulsório

Diferententemente da crença do Budismo de que o renascimento seja compulsório, segundo o Fundador Masaharu Taniguchi há “espíritos indolentes e ignorantes que, ignorando o processo de evolução espiritual, não têm condição ou vontade de planejar um possível renascimento no mundo material para desenvolvimento espiritual” (p.8).

Segundo a doutrina da IMM, “o homem nasce e morre muitas vezes”; a morte é o desprendimento do espírito do corpo material inútil. Na TK, fala-se abertamente da reencarnação, enquanto na SNI o tema é motivo de controvérsia supostamente solucionada através do ensinamento “Verdade vertical” e “Verdade horizontal” citado adiante.

3.6.2.4 Processo de Reencarnação

O esquema do mundo da natureza e da contínua repetição das estações do ano parece dominar a lógica de vida e morte marcada pelo nascimento, crescimento, amadurecimento, ocaso, e, por fim, novo nascimento. Ao longo dos séculos, as religiões eram unívocas neste tipo de abordagem temporal e transtemporal do homem (TERRIN, 2003, p.228). Naturalmente, há grandes religiões em que o tema da superação da morte parece contradizer a visão cíclica e trazer à tona temas como ressureição final, escatologia, juízo final etc.

Nas NRJ, a idéia de karma é freqüentemente associada a noções da vida cíclica e/ou de plantio: “o homem colhe aquilo que planta”. Portanto, “cortar a raiz” da predestinação é a imagem que carrega o sentido de mudar seu predestino, conforme a interpretação da TK.

3.6.2.4.1 TK – Semeadura e má causalidade

De fato as sementes queimadas e estragadas não tem como germinar. Assim, em qualquer coisa transforma a grande desgraça em pequena desgraça. Embora tenha semeado as sementes de má causalidade nas vidas anteriores, quando vierem a germinar nesta vida, pode se dizer que estarão descontados 30% a 40%.147

Além da questão da causalidade (Lei de Causa e Efeito segundo a doutrina messiânica), na IMM há grande ênfase na Lei da Concordância:

3.6.2.4.2 IMM – grau de purificação do espírito por ocasião da morte

Geralmente o espírito se desprende do corpo pela testa, pela região umbilical ou pela ponta dos dedos do pé. O espírito puro sai pela testa; o que tem muitas máculas, pela ponta dos dedos do pé; o mediano, pela região umbilical. Isso se explica porque o espírito puro praticou o bem enquanto vivia, somou méritos e foi purificado; o que tem muitas máculas somou muitos pecados, e o mediano situou-se entre os tipos mencionados. Tudo está fundamentado na Lei da Concordância (FUNDAÇÃO MOKITI OKADA, 1991, p.129)148.

Embora Meishu-Sama, o fundador da IMM, faça referências a aspectos do Budismo em sua vasta literatura apenas parcialmente traduzida para a língua portuguesa, não se encontrou uma ocorrência sequer do empréstimo karma. Em japonês corrente, em geral, a tradução de karma é a seguinte: 因果 [inga], 因縁 [innen], 運命[unmei]. Na literatura messiânica estes termos de fato aparecem, contudo, traduzidos respectivamente por expressões como “causa e efeito”; “afinidade ou afinidade espiritual” e “destino”, respectivamente.

147 JORNAL TENRI, maio 2005, por Almir Tyuzo Massuda, condutor da Igreja Sorocabana. 148

Conforme se observa no trecho destacado acima, a reencarnação está estritamente relacionada ao princípio da purificação – um dos pilares da doutrina messiânica. Segundo o fundador, a avaliação do momento da morte depende da quantidade de máculas acumuladas durante a vida terrena, e não na ênfase no bom ou mau karma.

Seria então a mácula ensinada na IMM um equivalente ao que se chama de karma? Para facilitar a compreensão do fiel ocidental, a mácula tende a ser explicada como algo equivalente ao “pecado” ensinado no Cristianismo, embora na IMM ela seja um efeito da ignorância a Deus e não apenas resultado de atitudes errôneas. Sem muitas delongas, opto por evitar comparações que possam criar simplificações indevidas. O fato da “teologia da mácula” da IMM envolver elementos da dimensão física / material e até mesmo combinar conceitos de outras ciências que não exclusivamente as do espírito me leva a suspeitar de uma possível ressignificação sincrética nipo-brasileira decorrente do encontro de sistemas religiosos distintos que pode até gerar equívocos doutrinários.

Vejamos que na IMM, o processo e curso da reencarnação (com seus diferentes graus de pureza; de apego; de méritos acumulados) é que são levados em conta, conforme o trecho abaixo.

3.6.2.4.3 IMM – grau de apego e influência na reencarnação

O tempo que o homem leva para reencarnar é bastante variável, podendo a reencarnação ocorrer cedo ou tarde. A rapidez ou atraso são determinados pela própria vontade da pessoa. Quando alguém morre e tem muito apego a este mundo, reencarna mais cedo. Mas isso não traz bons resultados, porque no Mundo Espiritual a purificação é mais rigorosa e, quanto mais tempo o espírito lá permanecer, mais será purificado. Quanto mais purificado estiver, mais feliz será ao reencarnar. No caso de reencarnação prematura, a purificação não foi completa, restando impurezas que deverão ser purificadas neste mundo. Ora, a purificação no Mundo Material

traduz-se em sofrimentos como doenças, pobreza, acidentes, etc.: obviamente, a pessoa terá um destino infeliz. (FUNDAÇÃO MOKITI OKADA, 1988, p.103)149

Ao verificar os termos que exprimem o conceito de karma no Japão, citei o termo destino. Naturalmente, destino é também um conceito adjacente à reencarnação.

Em termos teológicos, fala-se em predestinação como os desígnios de Deus pelos quais os eleitos são conduzidos à bem-aventurança eterna. Já o destino é algo considerado irrevogável.

A visão da TK sobre predestinação vai além desta suposta bem-aventurança eterna, defendida pela teologia. A predestinação pode ser boa ou ruim:

3.6.2.4.4 Tenrikyo – identificação do conceito de karma com predestinação

No ensinamento é dito que sempre importante lembrarmos do dia original. É importante sabermos da nossa predestinação. Para sermos realmente salvos precisamos reconhecer realmente a sua predestinação. Todos nós temos grandes predestinações, muitas das quais acabam passando desapercebidas. As coisas acontecem conforme a predestinação.

Olhando para o passado descobrimos muitas coisas, muitas predestinações, boas e ruins, que temos que batalhar para cortar a raiz. Tendo esta convicção devemos trabalhar em deixar boas predestinações para os sucessores. Para isso nada melhor de que salvar as outras pessoas150.

Segundo os ensinamentos da fundadora da TK, Miki Nakayama, o ser humano pode mudar o seu destino. No texto intitulado “A mudança do destino”, Marcos, que é missionário da TK, relata a orientação recebida diante de um problema pessoal151: “Marcos, pelo fato de

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“A reencarnação” In: A Outra face da doença – A saúde revelada por Deus. SP:FMO,1988.

150 JORNAL TENRI – outubro 2005 – Palestra de Luis Kenji Murakami.

ter abandonado uma pessoa querida na vida passada, nesta vida você foi abandonado. Foi só isso!”.

Marcos diz que aprendeu que jamais deveria pensar mal da moça que o abandonara. Ao contrário, devia agradecê-la pois ela levara embora todo o sofrimento de uma vida que ele teria de passar; foi uma benfeitora. E acrescenta: De fato, é ensinado que somente a satisfação

sincera (o verdadeiro contentamento) dentro das adversidades é a força capaz de modificar o nosso destino.

No mesmo texto, há a citação da Indicação Divina escrita em 20/2/1892 pela fundadora da TK, Miki Nakayama: “Compreendam também a razão única da predestinação.

Porém, se desistirem simplesmente por ser predestinação, nada se poderá fazer.”

Aquilo que a fundadora chama de predestinação, na fala de Marcos, ou seja, na prática da fé, foi expresso como destino ou karma a ser dissipado ou modificado. Possivelmente, os próprios fiéis não estabeleçam uma linha divisória nítida a respeito da diferença entre destino e predestinação, isto é, na prática, os dois termos seriam considerados como uma coisa única.

Entretanto, o mesmo não deve ocorrer na IMM. Isto porque seu Fundador distingue claramente o binômio destino-predestinação. A idéia de predestinação como algo capaz de ser mudado pelo homem inexiste na concepção da IMM. Predestinação não é, em absoluto, uma espécie de karma que pode ser modificado pela ação do homem. Segundo o Fundador da IMM, a predestinação é “algo atribuído a uma pessoa em caráter definitivo, e de maneira

alguma pode ser mudada” (FUNDAÇÃO MOKITI OKADA, 1991, p.365) 152

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Exemplificando, o local de nascimento e a família do indivíduo constituem atribuições imutáveis, portanto, trata-se de predestinação. Já o destino é livre, dentro das limitações da predestinação: “Devemos entender por predestinação certas condições a que

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estamos sujeitos antes mesmo do nascimento, ao passo que o destino depende inteiramente do homem” (FUNDAÇÃO MOKITI OKADA, 1991, p.367)153.