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TENDÊNCIAS XAMÂNICAS E O MUNDO RELIGIOSO DE MEISHU-SAMA 142 

CAPÍTULO 3 – RELIGIÃO MESSIÂNICA: INTERAÇÃO DE TENDÊNCIAS DIVERSAS 132 

3.2 TENDÊNCIAS XAMÂNICAS E O MUNDO RELIGIOSO DE MEISHU-SAMA 142 

O presente item baseia-se nas idéias propostas por Toji Kamata e Koukan Sasaki, estudiosos japoneses integrantes da comissão de pesquisa sobre Mokiti Okada, publicadas nos cadernos anexos do Okada Mokichi Zenshu, ou seja, Obras Completas de Mokiti Okada (1994).

Nos tempos atuais, estudos sobre animismo, xamanismo e totemismo vêm sendo revistos. Contudo, perdurou por muito tempo a visão equivocada de que o xamanismo seria uma sobrivência arcaica da religião primitiva e da mentalidade das culturas “inferiores”.

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A respeito da abreviação e/ou manutenção de oração em língua japonesa na IMM, vide Capítulo 5.

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Este ponto se relaciona, inclusive, ao preconceito e visão errônea sobre as NRJ desde seu surgimento. Para os estudiosos japoneses daquela época, em comparação às religiões estabelecidas, aspectos como os estados de possessão vividos por Fundadores de NRJ ou as revelações de kamis eram tidos como uma reprodução de religiosidades antigas. Hoje, é natural compreender o motivo destas visões. O estudo da religião do Japão após o período Meiji estava fundamentado nas teorias transmitidas por estudiosos europeus das áreas de História Comparada das Religiões e História das Religiões, sobretudo, estudiosos cristãos. A mentalidade reinante era de que a religião cristã – de caráter monoteísta – seria superior às demais e, portanto, deveria ser difundida entre os povos e sociedades atrasadas. Estudiosos como Frazer e Tylor defendiam que o cristianismo era superior ao xamanismo e animismo.

Com o fim da 2ª Guerra Mundial, estudiosos japoneses passaram a ter acesso a pesquisas sobre o catolicismo e protestantismo populares e observaram muitas práticas animistas dentro da dita religião monoteísta cristã. Observaram crenças para afastar infortúnios; crenças em objetos protetores e ações habituais visando a benefícios materiais. Também chegaram ao Japão pesquisas sobre crenças espiritualistas vindas da Califórnia nos EUA e estudos sobre as categorias do xamanismo e canalização, ou seja, o chamado neo-xamanismo. Assim, compreendeu-se que, embora sejam crenças arcaicas, jamais serão superadas como se acreditou no passado. Ao contrário, mesmo as grandes religiões possuem um alicerce de crenças populares que as sustentam e sobrevivem como um eixo central religioso. Conforme se sabe, sobretudo na Ásia, este aspecto é bastante relevante. Na Europa e EUA também se fala de neo-xamanismo. Para Kamata, seria injusto abordar a metafísica ou doutrina de grandes religiões desprezando suas características religiosas que possibilitam o intercâmbio direto entre homens e kamis (KAMATA, 1994, vol.7, p.5).

Através da história é possível verificar aspectos xamânicos mesmo em religiões como o Budismo e o Xintoísmo. Há monges budistas como Kobo Daishi, Enno-Ozunu

(fundador do Shugendo) e Kuuya114 que, através da comunicação direta com budas e kamis, deram suas vidas pela cura de doentes, salvação dos pobres, entre outras ações. Tais personagens com atributos xamânicos dedicaram-se à salvação do povo através de poderes espirituais e invisíveis.

A biografia de Meishu-Sama descreve algumas de suas experiências místicas. Tais experiências contêm em si traços xamânicos. Isto porque, quando se fala sobre xamanismo, de maneira alguma se pode achar que há apenas um tipo de xamã. Conforme o tempo e o povo, variam os tipos de xamã. Assim como há as xamã da categoria itako, há também os xamã da religião Oomoto e do tipo do Fundador da religião messiânica. Há tipos proféticos e tipos mediadores espirituais. Nao Deguchi, fundadora da Oomoto, era uma xamã do tipo mediadora espiritual que passou ao tipo profética conforme a religião foi se institucionalizando. Há ainda a categoria dos “despertos ou esclarecidos” (kensha). Em outras palavras, conforme o intercâmbio com o kami amadurece e se completa, a “forma de comunicação” se altera: de mediúnica à profética e, posteriormente, à de desperto ou esclarecido (IDEM, 1994, p.10).

3.2.1. Relação Entre Meishu-Sama e o Xamanismo Japonês

Antes de tratar da relação entre o fundador da IMM e o xamanismo japonês, é fundamental retroceder no tempo e verificar as influências e o percurso de Meishu-Sama em seu tempo de vida religiosa na Oomoto.

O período inicial desta religião é notoriamente marcado por práticas xamanísticas realizadas, sobretudo, por intelectuais como Asano Wazaburo115, que praticava o tinkon e,

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Responsável pela difusão do Budismo Jodo - Terra Pura entre o povo, no período Nara.

http://www.aisf.or.jp/~jaanus/deta/k/kuuya.htm Acesso em 06/05/2008.

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através da comunicação direta com Deus, influenciou muitas pessoas, dentre as quais o fundador da religião messiânica. No caso do tinkon, diferentemente dos três tipos mediúnicos descritos anteriormente (mediúnico, profético e desperto), em que a pessoa entra em transe e é manipulada pela divindade e fica sem consciência de si própria, ocorre que através de uma intuição (tyokkan) a pessoa interage com o outro.

Na biografia Luz do Oriente constam passagens que descrevem as primeiras expêriências místicas do tipo possessão por divindades (kamigakari) vividas por Meishu-Sama. Trata-se de uma narrativa a partir da perspectiva dos discípulos da época. Mais do que uma experiência interna, os relatos têm uma visão externa dos fatos. Naturalmente, há pontos descritos a partir da visão do Fundador. Contudo, não se sabe se ele ministrou johrei nomeando-se como “Kannon Bossatsu”. Portanto, a experiência do Fundador é sui generis e transcende a experiência xamânica em si uma vez que ele é consciente de uma força espiritual alojada dentro de si, seja de Kannon, Deus Supremo ou força do universo (SASAKI, 1994, vol.7, p.12).

Para Kamata (1994, vol. 7, p.15), ao mesmo tempo em que o Fundador apresenta elementos mediúnicos ao descrever sua unidade com Kanzeon Bosatsu e Sushin, também apresenta um lado profético em que critica a sociedade e prega a construção do Paraíso Terrestre, isto é, a transformação do mundo. Os livros de sua autoria “Medicina do Amanhã (ou Futuro) e “Criação da Civilização” apontam uma experiência e movimentos religiosos voltados para o futuro.

Um outro aspecto a ser levado em conta é a experiência pessoal do Fundador de dedicada pesquisa sobre kami e espíritos (shinrei kenkyu) por volta do anos 13 do período Taisho (1924). Mesmo após o afastamento de Asano Wazaburo da Oomoto, o Fundador o visitou e continuou mantendo a idéia de construção de um mundo de paz e alegria através da Arte, que era um dos pilares da Oomoto.

É importante destacar que o período Taisho foi marcado por tendências culturais e movimentos artísticos próprios. Além da proposta de vida artística da fase inicial da NRJ Perfeita Liberdade (PL), destaca-se o movimento Atarashii Mura, em que artistas da Escola Shirakaba liderados por Mushano Koji Saneatsu defendiam uma vida nova inspirados em idéias humanistas. A despeito do contexto da época, verifica-se em Meishu-Sama um processo de aprofundamento de aspectos como purificação e salvação através da Arte que seriam culminados com a experiência de Revelação da Era da Noite para a Era do Dia ocorrida em 15 de junho de 1931 (KAMATA, 1994, vol. 8, p.7-8).

3.3 TENDÊNCIAS DE CRENÇAS POPULARES: A IMM COMO UMA RELIGIÃO DO