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O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DA IMM NO BRASIL A PARTIR DO CONTATO

CAPÍTULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA IGREJA MESSIÂNICA NO

1.5 O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DA IMM NO BRASIL A PARTIR DO CONTATO

Neste item, pretende-se investigar como se deu o processo de integração da IMM no Brasil através de descrição parcial de situações registradas nos periódicos da instituição, além de relatos escritos e/ou orais coletados junto a fiéis messiânicos, em especial, com referência aos anos sessenta e setenta do século passado.

No processo de integração da religião messiânica na sociedade brasileira, a década de (19) 60 constituiu um período de institucionalização através de registros jurídicos, fixação de instalações físicas, início de produção textual em língua portuguesa e realização de grandes reuniões de membros.

Em 5 de julho de 1964, foi realizado o “1º Grande Encontro de Membros Messiânicos” no auditório do Centro de Cultura Japonesa em São Paulo. Na ocasião, houve a participação de convidados não-messiânicos e veiculação de matéria sobre a religião no jornal brasileiro “A Gazeta”. Um dos objetivos do encontro era o fortalecimento da fé dos membros

com vistas à instituição da Sede Central prevista para o ano seguinte. A respeito dos preparativos para inauguração da nave provisória da Sede Central em 1965, Yamamoto descreve:

A nave provisória com área de 250 m² ficou pronta. Durante dias, entre 30 e 40 dedicantes, vindos de vários locais, participaram na construção sendo que quase todos os materiais de construção foram doados pelos membros. Tanto nikkeis como brasileiros colaboraram na construção da nave colocando suas habilidades à disposição (1995, p. 56).

A construção conjunta realizada por missionários nikkeis e brasileiros demonstra que a integração ocorria a partir convivência cotidiana entre japoneses e brasileiros praticantes da religião. Outras formas de integração, naturalmente, ocorriam paralelamente. Por exemplo, através de um membro fervoroso que possuía conhecidos em emissoras de TV, em junho de 1965, houve transmissões televisivas de entrevistas ao responsável da Sede Central – reverendo Masahisa Katsuno que desembarcara no mês anterior em São Paulo.

Contudo, a integração “como processo e resultado do contato intercultural” (BERRY, 2004, p. 29), no caso da IMMB, entraria em sua fase mais tensa e, portanto, mais rica do ponto de vista da análise da integração a partir da década de 19 (70). Uma fase que comportou continuidade e mudança; constantes negociações e tentativa de conhecimento mútuo não apenas entre japoneses e brasileiros, mas também entre japoneses do Japão e japoneses do Brasil, sobretudo no concernente a questões ligadas ao corpo diretivo da organização.

Em 1969, unificou-se a nomenclatura das várias igrejas seguidas do nome da cidade local como Igreja Messiânica Mundial de Londrina, IMM de Tupã; IMM de Santos. Entre os anos de (19) 69 e 70, houve mudanças nos estatutos da organização, principalmente com relação a artigos de criação do Conselho Deliberativo, número de representantes e mandato de exercício. Trata-se de um fato relevante, pois, a partir de então, os membros brasileiros

passaram a ter representantes junto à direção da Igreja. Em 1971, foi criada a Fundação Messiânica cujo primeiro presidente foi Aníbal Paes do Amaral (in memoriam 1915-1996); sua primeira iniciativa foi o intercâmbio artístico de arte nipo-brasileira. Além disso, a participação da Fundação Messiânica em bazares beneficentes juntamente com a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa demonstra uma tentativa de aproximação e maior contato intercultural.

Dentre outras ações de incremento deste contato intercultural, é possível destacar o início do envio de seminaristas brasileiros ao Japão e a partida da 1ª caravana de peregrinos messiânicos (146 pessoas) aos Solos Sagrados do Japão em 19/3/1970. Em 1972, a segunda caravana levaria ao Japão 300 pessoas que, além de visitarem os locais sagrados da religião, se hospedaram em casas de membros japoneses e experimentaram as dificuldades decorrentes das diferenças lingüísticas, culturais, do cotidiano em geral e até mesmo de práticas messiânicas. Desde então, muitas outras caravanas de messiânicos peregrinaram ao Japão. O contrário também passou a ocorrer. Messiânicos japoneses passaram a viajar ao Brasil como caravanistas, mormente por ocasião de grandes eventos como o Congresso Internacional de Jovens58 e a inauguração do Solo Sagrado de Guarapiranga, em 1995. Naturalmente, o número de caravanistas brasileiros ao Japão supera o número de caravanistas japoneses ao Brasil.

Uma diferença notada pelo sr. A.V., membro messiânico que já peregrinou ao Solo Sagrado do Japão, refere-se à ministração de johrei. No Japão, os messiânicos ministram

johrei para o receptor frente a frente e, depois, solicitam ao receptor que vire de costas para

continuarem a ministração. Após alguns minutos, solicitam ao receptor que retorne a posição inicial e, imediatamente encerram a ministração do johrei. No Brasil, é diferente. Depois que o receptor vira novamente de frente ao ministrante, o johrei continua a ser ministrado por

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O 2º Congresso Internacional de Jovens foi realizado em 25/7/1993 tendo contado com 50.000 participantes incluindo 1.000 participantes japoneses e 4.500 dedicantes (voluntários).

mais 1 ou 2 minutos. O sr. A.V. questiona o motivo da diferença entre a ministração de johrei no Japão e no Brasil.

Certa vez, ouvi a explicação de que no Brasil, após receberem johrei nas costas, as pessoas costumavam ir embora, sem mesmo se despedirem do ministrante. Não sei se a justificativa procede, mas de qualquer forma, passa a impressão de que o brasileiro não se importa muito com cumprimentos formais de agradecimento e, portanto, a modificação fora introduzida a fim de facilitar tal aspecto.

Ainda na década de 19 (70), aconteceu o Congresso 1976, que reuniu missionários messiânicos no Palácio das Convenções no Anhembi em 7/3/1976. Na ocasião, a Igreja do Brasil recebeu uma comitiva composta por 34 componentes, dentre os quais Teruaki Kawai, presidente da ACIK (Associação de Confraternização Internacional Kyusei) e então presidente da Igreja Messiânica no Japão, além de Akishigue Matsumoto, Presidente do Conselho de Administração e do Conselho de Relações e Assuntos Externos. Segundo a mensagem de Kyoshu-Sama (3ª Líder Espiritual) ao Congresso, a comitiva consistia na delegação representante da ACIK que tinha “finalidades culturais filantrópicas e para isso conta com a participação do Corpo de Baile Sakakibara”(REVISTA REUNIÃO, 1976 p.6). Pelas explicações acima, suponho que a ACIK tenha sido o embrião da MOA Internacional, que foi criada posteriormente no Japão e, mais tarde, em 1982 – ano do Centenário do Fundador, inauguraria o Museu Internacional Mokiti Okada, em Atami.

Na sua palestra, o presidente Teruaki Kawai fez uma espécie de relatório das atividades da Igreja em termos mundiais. Em agosto e dezembro de 1971, a igreja enviou ao sudeste da Ásia comissões de inspeção e aprimoramento com vistas a solidificar a amizade com os países vizinhos; instituiu a Fundação Brasil-Japão de Artes Plásticas, que realizou, em 1973 e 1975, exposições que estreitaram os laços de amizade entre Brasil e Japão; enviou recursos financeiros a países como Paquistão e Bangladesh; na Tailândia, instalou uma Escola de Treinamento Profissional Agrícola; respondeu aos apelos da comunidade nipônica no Peru

quanto à sua obra educacional e cooperou com os órfãos de guerra, na Coréia. E complementa: “Temos tido o privilégio de contar com a simpatia dos líderes das mais variadas esferas sociais” (Idem, p. 7-9). Destacou ainda que a IMMB muito deve aos imigrantes japoneses responsáveis pelo firme alicerce messiânico no Brasil a despeito da distância de sua pátria. Caracterizou a nação brasileira como “um caldeirão de raças que, de coração aberto aceitou das mãos da descendência japonesa, a IMM (a qual por ser proveniente do Japão é de natureza tão diferente)” (IBIDEM, p.9).

A imagem do Brasil como um caldeirão de raças é conhecida em geral e ressurge outras vezes no discurso institucional como, por exemplo, nos primeiros anos da década de (19)90 quando o Presidente da IMMB da época incentivava jovens a se prepararem para “fazer difusão mundial59”. O Brasil, tido como um local de formação de muitos missionários fervorosos, tem a função de ponte para ampliar a difusão da religião messiânica em termos mundiais. Assim sendo a identidade messiânica brasileira seria marcada pela “harmonia de diferenças” e por uma fervorosa atitude religiosa. Esta visão, certamente, possibilitou o reforço de uma imagem de processo de integração, em certa medida, harmonioso.

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Ao longo deste capítulo, foi possível conhecer a realidade do surgimento da religião messiânica no Japão e sua introdução no Brasil. Apresentei os motivos da nomenclatura “messiânica” na denominação de uma religião japonesa que não é de tradição cristã, além de ter enfatizado a atenção aos conceitos e práticas das NRJ para uma compreensão mais próxima da sua real natureza. Muitas vezes, tipologias pré-estabelecidas não dão conta da

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complexidade e diversidade de religiões produzidas em contextos histórico-culturais tão distintos do brasileiro.

No movimento missionário da IMM no exterior, viu-se que tanto nos EUA quanto no Brasil, missionárias mulheres como Kiyoko Higuchi e Teruko Sato, respectivamente, tiveram participações fundamentais no início da difusão pioneira. A partir da contextualização dos diferentes períodos históricos do processo de assimilação dos imigrantes japoneses no Brasil, pôde-se perceber os desafios da integração cultural-religiosa da fase inicial da IMMB.

A análise das diferentes fases da trajetória messiânica no Brasil permitiu a visualização de um processo de transplantação complexo e marcado por dificuldades organizacionais, criatividade e fé ardorosa dos missionários pioneiros. Em seu período mais recente, a IMMB inovou através da construção de um Solo Sagrado brasileiro, da implantação do sistema de Johrei Center (posteriormente implantado em outros países) e da elaboração de uma teologia messiânica.

No próximo capítulo, tendo como foco a religião em processo de integração, apresento os referenciais teóricos com os quais travo diálogos. Também explicitarei os pontos centrais do estudo que denomino de “recomposição identitária” e “ressignificação sincrética nipo-brasileira”.