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Configurar um coletivo: outra das condições de possibilidade Como já assinalei o ECV configurou-se como um coletivo de

projetos Nesse sentido, esses comitês seriam os embriões dos grandes projetos curriculares nas áreas de ciências que

6. ESPAÇO CIÊNCIA VIVA: “O CIENTISTA TEM QUE IR AONDE O POVO ESTÁ”

6.1. CONDIÇÕES DE POSSIBILIDADE

6.1.2. Configurar um coletivo: outra das condições de possibilidade Como já assinalei o ECV configurou-se como um coletivo de

pessoas envolvidas com temas científicos, que tinha como propósito tanto ajudar na melhoria da educação em ciências quanto contribuir para a democratização de conhecimentos científicos através da participação ativa da população(BAZIN et al., 1987). Para configurar este coletivo, foi preciso acontecer a articulação de um grupo de professores universitários, estudantes de graduação e pós-graduação, profissionais, e professores de educação básica, sob a premissa de se convidar colegas e amigos que se unissem ao projeto, pois a viabilidade da proposta dependeria da participação e tamanho do coletivo. O próprio Bazin (1985) reconhecia que isso seria uma comunidade em termos propostos pela teologia da libertação e, consequentemente, implicava uma estrutura organizacional horizontal, na qual todos seus integrantes participavam das decisões e das ações do ECV.

Dessa forma, existiam duas dinâmicas que atravessavam as práticas do ECV no começo. A primeira pode se resumir na expressão “tudo se discute”, em um marco de abertura política, no qual jovens professores universitários e seus estudantes tinham um forte envolvimento político e uma grande preocupação em ajudar na construção de uma sociedade democrática. Assim, durante os primeiros anos, a equipe era formada principalmente por voluntários, em um ambiente em que todos expressavam abertamente as suas opiniões e o mínimo detalhe era discutido. Contudo, ainda que isso fosse interessante como espaço de formação, os processos de decisão eram lentos e cansativos. Portanto, estas atividades implicavam muito tempo para os integrantes, ao ponto de terem de decidir entre o ECV ou seus projetos pessoais (Entrevista Constantinopla, Rio de Janeiro, Outubro de 2012).

A segunda dinâmica, complementar à anterior, baseia-se em um design coletivo em que todos eram coautores das atividades desenvolvidas, por meio das quais o diálogo e discussão eram as ferramentas para propor, definir e melhorar as experiências desenvolvidas pelo ECV. Um bom exemplo da importância dessa situação na equipe deu-se no final da década de 1980, quando foi construída uma célula gigante na qual as pessoas podiam entrar e experimentar algumas das características da estrutura celular. Este projeto, que significou um grande esforço para uma parte da equipe devido à gestão de recursos, planejamento, fabricação, implementação e cumprimento dos compromissos adquiridos com os financiadores, gerou uma forte discussão por causa de um painel colocado na exposição no

qual estavam os nomes do criador, curador, técnicos, etc. Isto, ainda que normal em vários cenários, era inaceitável para muitas das pessoas do ECV, pois, segundo eles, o museu era um projeto coletivo (Entrevista Michael, Rio de Janeiro, Outubro de 2012).

Esta divergência implicava profundas diferenças que estão à base da própria atividade científica, na qual existe uma grande importância da autoria. Em respeito a isso, Tânia Araújo Jorge, em entrevista transcrita por Costantin (2001), assinalava-o da seguinte maneira:

O que eu queria era definir responsabilidades, identificar as competências, dar o crédito às pessoas, como se faz no mundo científico, e aí houve aquele grande mal-estar geral. Ali eu decidi que não tinha como participar de um grupo onde não existe o reconhecimento do trabalho das pessoas do próprio grupo (p. 110).

Estas dinâmicas eram animadas por uma articulação entre a vida privada e a vida pública, que aconteceu desde o começo do museu, pois muitas das reuniões para se discutirem atividades e se escreverem projetos aconteciam nas casas dos integrantes da equipe. Nesse sentido, o planejamento/design, fabricação de materiais para as atividades e, inclusive, adega ocorriam nas casas dos integrantes.

No entanto, as características até aqui assinaladas, que eram muito valorizadas pela equipe de trabalho no começo, foram complicando-se por causa do aumento das pessoas participantes, da desigualdade de engajamento, da diferença de formação, da flexibilidade interpretativa sobre o propósito do ECV, além dos problemas de consecução de recursos. Assim, o caso anteriormente apresentado da célula é um exemplo destas dificuldades, razão pela qual identifico que esta circunstância, entre outras que analiso mais adiante, geraram, por fim, a desarticulação do ECV na década de 1990, evidenciada pela saída da maioria de professores universitários e pela dificuldade de se convocarem novos participantes para manter o grupo.

Essas situações apresentadas permitiram inicialmente que fosse agrupada uma grande quantidade de pessoas, temáticas, apoios e solidariedades, que reconheço como parte das condições que permitiram e permitem o funcionamento do ECV. Isso, somado a um exercício permanente de divulgar a experiência e de tecer redes com pessoas e instituições tanto no exterior quanto no Brasil. Esta ultima estratégia

serviu para o reconhecimento do projeto, e também para convocar novos integrantes. Este é o caso do engenheiro indiano Amit Bhaya, que trabalhou no ECV na década de 1980. Ele conheceu do projeto por meio do artigo publicado por Bazin (1986) em Monthly Review sobre a não neutralidade dos conhecimentos técnico-científicos e a necessidade de se usar uma pedagogia liberadora no ensino de ciências.

Além disso, o ECV seria referenciado em vários textos de ampla circulação no campo dos museus. Assim, por exemplo, no texto de Sally Duensing (1999), são apresentadas as suas características de mediação e a maneira como foram adaptados os artefatos do Exploratorium para se converterem em atividades de mesa. E no artigo de James Bradburne (1998), no qual fez uma forte crítica aos grandes museus, pois argumentava a sua extinção como aconteceu com “os dinossauros119”, e, os assinalava de “elefantes brancos”. Nesse artigo, o ECV seria apresentado como exemplo de formas mais flexíveis e econômicas de museu.

6.1.3. Condições institucionais: entre a formalidade e a