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5 A ADEQUAÇÃO DOS MÉTODOS RESTAURATIVOS NOS CONFLITOS

5.3 CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS DO PROCESSO RESTAURADOR

Esta forma, participativa, de resolver os conflitos jurídico-penais advindos da violência doméstica é muito mais eficaz do que a atual forma de responder aos delitos, isso porque o processo oficial, distante e frio, impossibilita, não só a efetiva solução do conflito, mas também destrói a possibilidade de comunicação, refazimento de elos, e manutenção de qualquer forma de relacionamento, após a intervenção estatal.

A mulher que toma para si a responsabilidade de resolver seus problemas, especialmente esta que se encontra subtraída de sua autoestima, diminuída perante si mesma, muitas vezes acreditando que tem uma parcela de culpa diante daquela situação problemática, precisa ser resgata. E o Estado deve fazer isso. Oportunizando que esta cidadã torne-se agente diretor e gerenciador de sua vida, fazendo-a crer que é capaz de resolver pessoalmente seus conflitos, entendendo que o ocorrido deve ser utilizado como meio de crescimento e não de submissão e transferência de responsabilidades.

Essa mulher, que esteve sob a “proteção” do marido/companheiro, também já esteve, quando criança e adolescente sob a guarda do pai, agora, vítima, passa a ser protegida, mais uma vez pelo masculino, pelo paterno, pelo Estado.

Não se afirma com isso, que a intervenção estatal não é importante, e muitas vezes necessária, mas o modo como essa atuação dar-se-á que deve ser alargada, entendendo-se, para tanto, que empoderar esta mulher é possível.

E esta tarefa pode ser desenvolvida através da mediação, pois no centro do processo, a mulher tem voz ativa e controle da situação, perseguindo a pacificação e a harmonia, desfazendo, assim, o espiral de vitimização e estigmatização social, já que a Justiça Restaurativa: “envolve a vítima e busca satisfazer os anseios que não são trabalhados pelo sistema de Justiça Retributiva”352

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Encarando o Estado sempre como um ente secundário no processo de vitimização, bem como os demais membros da comunidade que não foram diretamente atingidos pelo delito, as respostas oferecidas pela Justiça Restaurativa são muito mais adequadas a atender os desejos da vítima direta, aquela que precisa entender o que aconteceu e, para tanto, deve participar do processo ativamente, desfazendo, assim, os traumas causados pelo evento com maior probabilidade.

No tocante aos benefícios da aplicação da mediação referentes ao agressor, especialmente à prevenção de novos delitos, estes se demonstram muito mais eficazes com os métodos aplicados pela Justiça Restaurativa, pois a conscientização será alcançada através do embate e do enfrentamento, e não pela aplicação de uma sanção penal imposta pelo Estado. Participando de uma mediação, as chances de conscientização e de não retorno ao delito são muito maiores, pois ouvir o sofrimento causado, as angústias e dores experimentadas, é uma forma mais provável de reeducação do que pela condenação determinada pelo Poder Judiciário, de maneira fria e hermética.

Com efeito, a participação do réu no processo oficial é sempre negativa, de defesa, ele não pode assumir o que fez (exceto quando for estrategicamente vantajoso), pois tal postura implica em confissão, prova a ser valorada no caderno processual, mas com relevância e forte carga condenatória. Essa postura,

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BIANCHINI, Edgar Hrycylo. Justiça restaurativa: um desafio à praxis jurídica. Campinas: Servanda, 2012, p. 146.

normalmente retraída do acusado, não auxilia em nada sua reinserção social, além de não desestimular a prática de novos delitos, especialmente se tratando de violência doméstica, pois, muitas vezes, o homem agressor, envolvido em um ambiente familiar hostil, não consegue ter a visão clara sobre aquele acontecimento, devendo, portanto, participar de um processo de mediação, e, ainda, havendo necessidade, de outros programas que o ajudem a entender o seu erro e resgatar o elo partido.

Nesse sentido, os acordos realizados na sessão de mediação podem incluir, se for o caso, a participação dos homens ofensores em programas destinados a confrontar seus valores, muitas vezes ultrapassados em relação à mulher, possibilitando que as concepções machistas sejam revistas e encaradas, de forma a adequar ao novo parâmetro de igualdade entre os gêneros, respeito e harmonização das relações.

Por isso, o processo restaurador é capaz de mostrar ao agressor todas as consequências da sua ação, na esfera da vítima, da família dos envolvidos e da comunidade, e não apenas um ataque ao Estado que será “pago” com o cumprimento de uma pena. Sendo a Justiça Restaurativa: “uma forma posterior de submeter o criminoso ao modelo social de adequação comunitária”353

, deve ser encarada como um modo de integrar aquele indivíduo à sua comunidade, podendo o Estado, via o Direito Penal, encará-lo em todas as suas peculiaridades para, ouvindo-o, possibilitar que se arrependa e aprenda com seu erro.

Aplicar os métodos restaurativos é sempre uma tentativa de devolver ao agressor a sua empatia, a possibilidade de ouvir o que sua atitude causou no outro, sacudindo aquele cidadão insensível, bloqueado, trazendo-o para a coletividade, através de um método indolor, pois o tradicional afasta-o cada vez mais, pois violento e excludente.

Além de serem mais benéficos para vítima e para o agressor - especialmente quando o problema rotulado como criminoso deriva de uma violência doméstica ocorrida entre um casal que tiveram filhos, crianças que serão educadas (ou deseducadas) por essas partes envolvidas em um processo penal com possibilidade de encarceramento e estigmatização reais, os métodos propostos pela Justiça

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Restaurativa oportunizam respostas mais humanas e menos invasivas em uma sociedade cada vez mais dinâmica.

Essa forma de solucionar os conflitos auxilia na convivência entre os membros da comunidade, pois permite a aproximação entre as pessoas, levando ao entendimento das causas e das consequências daqueles eventos, o que possibilita uma vida social muito mais harmônica, na medida em que restauram laços, e, mais ainda, estreitam-se e aprofundam-se relações humanas.