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Contexto histórico da distribuição de renda

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2.3 Desigualdade como passivo social do século XXI

2.3.1 Contexto histórico da distribuição de renda

Para traduzir a dimensão de equidade em termos econômicos, Barros (2001) utiliza o coeficiente Gini e o índice T de Theil, complementado pelas proporções de renda internacionalmente utilizadas como indicadores de desigualdade, 20/20 e 10/4032, que refletem o rendimento dos segmentos extremos de renda, com dados PNAD de 1999. A justiça ou injustiça social, aqui refletida, será tanto mais expressiva quanto menor ou maior for, respectivamente, o valor da renda média dos mais ricos em relação à renda média dos mais pobres.

Uma comparação internacional de um conjunto de países com dados Gini, o autor revelou que apenas a África do Sul e Malavi possui índice superior ao brasileiro (0,60). Desafortunadamente, o Brasil ocupava a 89ª pior posição entre 92 países estudados.

Com base no indicador da proporção entre os 10% mais ricos e os 40% mais pobres (10/40), o Brasil se apresenta como campeão isolado entre os 50 países em estudo, chegando a um indicador que mostra que a renda média dos 10% mais ricos apresenta-se 30 vezes maior que a renda média dos 40% mais pobres, quase o dobro da Colômbia e do México, ficando a Argentina com apenas um terço desta nossa razão.

Já na relação entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres (20/20), o Brasil novamente vem confirmar o quadro anterior, quando encabeça o grupo com o extremo indicador que supera os 30 pontos. Além dele, têm-se apenas quatro países que superam os 20 pontos, dentre eles Panamá, Guiné Bissau e Guatemala, ficando todos os restantes abaixo dessa marca.

As disparidades apresentadas pelo país são irrefutáveis, em relação ao seu monumental grau de desigualdade de renda, quando se leva em conta o contexto internacional, tanto regional quanto global. De tal fato deriva a indagação dominante do porquê de sua pobreza ser tão maior que a de países com PIB per capita semelhante, bem como desperta a provocação em melhor compreender os intricados mecanismos que sustentam tal realidade.

Nesse sentido, os dados que se seguem sugerem algumas possibilidades nessa compreensão, quando se agrupam blocos de países com rendas e realidades distintas, onde o foco se concentra no grupo dos menos favorecidos pelo mercado de trabalho, como se verá mais adiante na pesquisa.

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As proporções internacionalmente utilizadas referem-se, singelamente, aos coeficientes entre os 20% com maiores ganhos e os 20% com os menores ganhos, com procedimento semelhante para demais razões como 10/40 ou outras.

Dos treze países componentes do bloco brasileiro, Ramos (2001) mostra que a desigualdade de renda brasileira, conforme tabela apresentada, a partir de um indicador entre as proporções dos 10% mais ricos em relação aos 40% mais pobres está entre as duas piores do grupo, com o índice de 5,6 vezes no comparativo.

Tabela 3: Razão das frações de renda 10% mais ricos e 40% mais pobres (1996 e 1998)

Fonte: Elaboração de Ramos (2001).

Segundo mostram os dados, para o ano de 1998, o país é detentor nesse critério da mais alta relação, juntamente com o Paraguai, expressando exatamente o dobro da desigualdade da Argentina, e mais de duas vezes e meia a do Uruguai, melhor colocado no grupo dos latino-americanos.

Em relação aos países de renda elevada, o Brasil apresenta-se 5.6 vezes mais desigual que a Bélgica, o Japão, a Espanha e a Suíça, detentores dos melhores indicadores nesse grupo. Quando comparado com a França, país que apresenta o pior índice dentre os de melhor renda, a proporção brasileira ainda situa-se na ordem de mais de 2,6 vezes inferior do que esta, em relação ao indicador em tela.

Percebe-se facilmente que mesmo no grupo dos países classificados como de baixa renda, nenhum deles apresenta índices semelhantes aos do Brasil. Um destaque pode ser feito aos indicadores do Quênia e Zimbábue, como os que mais se aproximam na proporção entre os 10% mais ricos em relação aos 40% mais pobres, todos bem distantes de países como Egito, Madagascar e Siri Lanka.

A tabela que se segue reflete, de forma clara, um histórico do comportamento de alguns indicadores brasileiros, mostrados ao longo de mais de duas décadas do final do século passado.

Tabela 4: Evolução dos indicadores de desigualdade de renda no Brasil (1977-1999)

Fonte: Elaboração de Ramos (2001).

Para esse conjunto mais amplo de indicadores verifica-se um conjunto de dados para melhor avaliação, conforme tabela elaborada por Barros (2001), como os índices Gini (0,60), T (0,74), renda média 20/20 (29,2) e renda média 10/40 (24,5), para o primeiro ano em vigor da LDB nacional (1997). Como primeira constatação que salta aos olhos, pode-se observar que o Coeficiente de Gini permanece praticamente estável, oscilando entre 0,58 e 0,64 ao longo do período de 22 anos em estudo.

Já no final da década perdida, conforme denominação conferida por vários economistas e auge da instabilidade macroeconômica brasileira, o ano de 1989 apresenta os pontos máximos de todos os indicadores mencionados, elevando especialmente o índice T de Theil aos patamares de 0,89. Os indicadores que representam as proporções vão finalizar o século (1999) na faixa de 23 vezes (10/40) e 27 vezes (20/20), ambos superiores a anos

anteriores como 1984 e 1986, como se pode verificar, mostrando pioras na evolução da pobreza brasileira.

É curioso notar que a desigualdade medida por Gini e Theil não apresenta qualquer sinal de melhoria, especificamente no período compreendido pela segunda metade da década de 90, posterior à implantação do Plano Real, apesar de ser sintomática a redução nos indicadores de pobreza, apresentado pelas proporções extremas de distribuição de renda.

Outra tabela que se apresenta a seguir mostra que a desigualdade de renda se mantém inabalável e extremamente concentrada em seus altíssimos patamares.

Tabela 5: Evolução temporal da desigualdade de renda Brasil (1977-1999)

Fonte: Elaboração de Ramos (2001).

Como se pode ver para o ano de 1997, uma década após a redemocratização do país com a CF/1988, a população representada pelo seleto grupo composto pelo 1% dos mais ricos detém em renda (13,8%) mais do que a apropriada por todos os 50% mais pobres (12,1%).

Vê-se, ainda, que os 20% mais pobres se apropriam, em conjunto, de apenas pouco mais de 2% da renda total ao longo do último quartil do século XX, sem nenhum movimento

expressivo em torno dessa taxa. A mesma perversa estabilidade se manifesta na média da taxa de apropriação da riqueza da metade mais pobre (50%) da população, que se situa em 12,4% e pode ser representada pelos anos de 1983 e 1985. A oscilação dos ganhos dos mais pobres é praticamente estática, com uma ligeira margem de apenas meio ponto percentual, em regra.

Pode-se afirmar que o quadro em destaque é de forte assimetria, e mostra o grau de injustiça social com que o povo brasileiro terminou o século XX. O fato é que a estaticidade dos indicadores como que consolida a naturalização da desigualdade econômica, o que leva a alguns pesquisadores da época classificar estudos nessa área como enfadonhos.

Conhecida a dimensão da desigualdade brasileira na virada do novo século, expressa pela mais precária distribuição da renda fruto do trabalho, conveniente também se faz dedicar atenção a mais um aspecto relevante: os modos de atuação e funcionamento do mercado, peça imprescindível para a compreensão dessa gigantesca máquina, que a cada ano parece produzir mais pobres no Brasil.

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