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Longevidade como componente social da saúde no desenvolvimento humano

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3.1 Duas décadas de desenvolvimento humano: Goiás em foco

3.1.2 Longevidade como componente social da saúde no desenvolvimento humano

Em sua obra agraciada com o Prêmio Nobel, o economista Sen (2010) aborda o tema do que denomina disposições sociais mediadas pelo crescimento, oportunidade em que comenta a estreita relação entre renda per capita e longevidade. Inicialmente o autor chama a atenção para que o tema da renda não seja analisado de forma isolada e pontual, apenas, mas que sua compreensão seja vista sobre o prisma da totalidade. Seu entendimento é de que somente um exame mais atento fornece uma convincente justificativa, para além da opulência caracterizada pela renda, a externalizar o caráter relevante das disposições sociais.

Ao tomar uma base comparativa entre países, Sen (2010, p. 63) constata que a relação positiva entre PIB per capita funciona, sobretudo, a partir de dois impactos distintos do PIB “sobre (1) as rendas, especificamente dos pobres, e (2) os gastos públicos com serviços de saúde em especial”. Compreende-se que a influência causal do PIB per capita em relação à expectativa de vida desaparece por completo, quando a variável gasto público com saúde e pobreza é incluída por si mesma nas estatísticas.

A constatação não significa dizer que a expectativa de vida não se eleva com o crescimento do PIB, ao contrário, implica afirmar que a relação apresenta funcionalidade perante a eficácia na eliminação da pobreza e os investimentos públicos nos serviços de saúde. As palavras de Sen (2010), a seguir, aclaram a situação:

Por diversas razões históricas, como a ênfase na educação elementar e na

assistência básica à saúde, além da conclusão de reformas agrárias eficazes no início do processo, a ampla participação econômica foi mais fácil de obter em muitas das economias do Leste e Sudeste Asiático de um modo que não foi possível, digamos, no Brasil, Índia ou Paquistão, onde a criação de oportunidades sociais tem sido muito mais lenta (grifos nossos), tornando-se

assim uma barreira para o desenvolvimento econômico. A expansão de oportunidades sociais serviu para facilitar o desenvolvimento econômico com alto nível de emprego, criando também circunstâncias favoráveis para a redução das taxas de mortalidade e para o aumento da expectativa de vida (SEN, 2010, p. 67).

Percebe-se em Sen (2010) uma conexão muito forte entre participação econômica e oportunidades sociais, em especial as representadas pela educação elementar como alfabetização e inclusão nas primeiras séries escolares, e também pela assistência técnica à saúde básica. Nessa direção o econômico e o social se potencializam, em uma espécie de ciclo virtuoso, de modo que os resultados apresentam reflexos diretos na expectativa de vida, mortalidade e emprego. Ocorre simultaneamente uma espécie de retro alimentação do social (por exemplo: educação e saúde) para o econômico (por exemplo: desenvolvimento e emprego) e vice-versa.

Os dados trabalhados por Sen (2010, p. 67) atentam para um Brasil cujo elevado crescimento do PIB não apresentou reflexos correspondentes para a longevidade, pelo fato de manter “uma longa história de grave desigualdade social, desemprego e descaso com o serviço público de saúde”. Ao comparar o Brasil com economias de alto crescimento do PIB, como Coreia do Sul e Taiwan, o desempenho das melhorias sociais no nosso país é lento e desproporcional à dimensão econômica.

Além dos processos “mediados pelo crescimento”, afirmados por Sen (2010, p. 68) como aqueles em que a prosperidade econômica é utilizada “na expansão de serviços sociais relevantes, como os serviços de saúde, educação e segurança social”, o autor destaca outro eixo de possibilidades.

O outro processo é mediado ou conduzido pelo custeio público, que contrasta com a falta de possibilidades de crescimento econômico, e se desenvolve mediante “um programa de hábil manutenção social dos serviços de saúde, educação e outras disposições sociais relevantes”. Nessa direção, o autor exemplifica sua teoria, em que reduções de mortalidade e melhorias na qualidade de vida operam sem elevados níveis de renda per capita.

Apesar de seus níveis de renda baixíssimos, os habitantes de Kerala, China ou Sri Lanka apresentam níveis de expectativa de vida imensamente mais elevados do que as populações muito mais ricas do Brasil, África do Sul e Namíbia, sem mencionar o Gabão. Até mesmo a desigualdade aponta para o sentido oposto quando comparamos, de um lado, Kerala, China e Sri Lanka e, de outro, Brasil, África do Sul Namíbia e Gabão (SEN, 2010, p. 69).

O autor insere no grupo da China o populoso estado indiano de Kerala, para mostrar que até a entrada desses países nas economias de mercado, no início dos anos 1990, a expectativa de vida, comparativamente, se destacava do grupo composto pelo Brasil. Sua sustentação de que o processo de melhorias sociais foi conduzido pelo custeio público, dentre outros, baseia-se no fato de que esses serviços são altamente trabalho-intensivos. E, em

consequência, relativamente baratos em economias pobres, uma vez que os salários são mais baixos.

Mas, esse segundo viés não foi o caso do Brasil e do Estado em estudo no momento. Deve, contudo, figurar como possibilidade para os dias atuais, e perspectivas futuras menos otimistas de PIB, como o que se apresentou no fechamento do ano de 2014, na marca de 0,1 ponto percentual, configurando como o menor desde a marca do primeiro ano após a crise imobiliária americana de 2008.

Aborda-se, a partir de agora, a expectativa de vida dos mais de 6 milhões de habitantes, em 2010, a compor o território do Estado de Goiás, no coração do Brasil.

Segundo dados do IBGE, essa população atinge a ordem de 6.523.222 habitantes em 2014, distribuídos em uma área geográfica de 340.111.783 km2, o que implica em uma densidade populacional de 17,65 hab./km2. Comparativamente, Goiás apresenta uma densidade demográfica abaixo da média nacional, mais semelhante a grandes estados como Minas Gerais e Bahia, apesar de apresentar concentração populacional na região metropolitana.

Para uma análise da longevidade goiana, necessário se faz um percurso pela sua demografia, em conjunto com alguns aspectos relevantes no campo da saúde. Para a primeira década do século XXI, a taxa média de crescimento anual da população goiana foi de 1,84%, enquanto que a brasileira foi de apenas 1,01% no mesmo período. Para a década anterior a essa, o crescimento populacional do país foi praticamente o mesmo (1,02%), enquanto que Goiás cresceu 2,46%.

A taxa de urbanização da UF passou de 80,81%, em 1991, para 90,29%, em 2010, com crescimento de aproximados 10 pontos percentuais da população que migrou para as cidades. Assim, Goiás começa a segunda década deste século com, aproximadamente, metade da população rural que tinha em 1991 (19,19%).

Tabela 10: Estrutura etária da população goiana em 1991, 2000e 2010

A tabela apresenta em destaque no campo das populações, para o período dos últimos três censos, dois termos importantes para melhor compreensão do movimento entre as faixas etárias, expressos pela razão de dependência e pela taxa de envelhecimento.

O índice de envelhecimento da população de Goiás, medido pelo quociente entre a faixa de população com 65 anos ou mais e a população total, saltou de 3,65%, em 1991, para 6,25%, no ano de 2010, com crescimento de 71%no período. Verifica-se, ainda, que o período de 2000 a 2010 responde por maior parcela dessa taxa. Para uma melhor visualização desses índices, a figura da pirâmide populacional abaixo ilustra o tema.

Figura 5: Pirâmide etária goiana do ano de 2010

Fonte: PNUD, Ipea e FJP (2014).

Em relação à razão de dependência, para o seu cálculo procede-se, inicialmente, a soma do contingente de população de 65 anos ou mais com os que integram a faixa dos menores de 15 anos. O quociente dessa soma com a população total irá definir o indicador de dependência. Ela decai de 61,47%, em 1991, passa para 51,49%, em 2000, chegando a 43,41% para o ano de 2010. Verifica-se que a taxa de dependência da população em idade ativa reduziu em mais de 40 pontos percentuais nas duas décadas.

A pirâmide etária mostra que a soma acima mencionada é composta pelas 4 barras superiores, que compõe o índice de envelhecimento, com as 3 inferiores, integrados pelas faixas de população com idade menor de 15 anos. Essa soma de extremos populacionais da

pirâmide representa a população potencial de dependentes da classe economicamente ativa. Ao contrário, a pirâmide populacional de 1991 possui o cume e a base em formato bem diferente da acima exposta. Para efeito comparativo das transformações, apresenta-se a figura a seguir.

Figura 6: Pirâmide estaria goiana para o ano 1991

Fonte: PNUD, Ipea e FJP (2014).

A redução expressiva da taxa de dependência presenciada por Goiás, como se vê nas faixas que compõem a base e o topo da pirâmide nas duas épocas, sinaliza por um bom momento por que passa a UF. O fato se dá pela conjugação dos extremos etários, no numerador, e pelo núcleo central da pirâmide formada pela potencial população ativa, no denominador. Como o numerador é formado por duas variáveis, enquanto uma apresenta crescimento (população envelhecida), a outra se encontra em redução (população de jovens). Isto faz com que a soma, até certo ponto, permaneça relativamente constante. Em outras palavras, assim como ocorre um alongamento do topo da pirâmide, com a longevidade, em sentido contrário ocorre um afunilamento de sua base, com a redução da população jovem goiana.

De forma contrária, em relação à compensação que se dá no numerador da taxa de dependência, o denominador, que se forma pela população no núcleo central da pirâmide, sofre uma efeito inverso de ampliação ou o que se pode chamar de certo “engordamento”

central na pirâmide. Diante desses efeitos, o quociente do índice não poderia comportar outro movimento senão sofrer redução.

Contudo, como o movimento de redução da taxa de dependência não é indefinido, a UF deve aproveitar os bons tempos e direcionar os investimentos em políticas públicas sociais. Apesar de inexorável a reversão do movimento, não foi possível encontrar dados concretos a respeito deste lapso temporal favorável que ainda se tem, nem do grau de evolução a partir do momento em que a taxa de dependência ganha escalada positiva.

Para completar as análises da longevidade no Estado, cumpre verificar o comportamento da mortalidade infantil e da natalidade goiana. No caso da fecundidade total, que é medida pelo número de filhos por mulher, verifica-se que a taxa caiu de 2,6 em 1991 para 1,9 no ano de 2010. No ano intermediário de 2000 ela apresenta taxa de 2,2 filhos por mulher.

Este indicador corrobora com o afunilamento da base da pirâmide, em especial quando o indicador apresenta redução inferior a 2, ficando abaixo da taxa mínima de reposição por mulher. Os dados para os anos de 1991, 2000 e 2010 são apresentados na tabela que se segue.

Tabela 11: Longevidade, mortalidade e fecundidade em Goiás (1991, 2000 e 2010)

Fonte: PNUD, Ipea e FJP (2104).

Na seara temática da mortalidade infantil, a taxa representada pelos mil nascidos vivos, até um ano de idade, apresenta queda de 29,5% (1991) para 24,4% (2000) e chega a 14 pontos percentuais em 2014. Taxas semelhantes, com queda proporcional aos números apresentados, porém logicamente maiores, constam da tabela para a mortalidade até 5 anos de idade por mil nascidos vivos.

Chama atenção a pequena queda da mortalidade infantil, para a última década do século XX, que apresenta redução de apenas 5,1 pontos em relação aos altos patamares por nascidos vivos (29,5), com até um ano de idade. Ao contrário, a primeira década desse século reduz a taxa de mortalidade em aproximados 43%, com queda de 10,4 pontos por mil, mais do dobro na redução bruta em relação à década anterior.

Assim, no contexto do comportamento da natalidade e mortalidade infantil, o índice de longevidade, representativo da composição do IDHM no campo da saúde, passará de uma esperança de vida ao nascer de 65,1 anos, em 1991, para 74,6 anos em 2010. Com a ampliação de 9,5 anos na expectativa de vida ao nascer, nas duas décadas em análise, Goiás supera o indicador nacional, de 73,9 anos, em 2010.

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