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Em Freud, uma das saídas para a mulher, seria a maternidade. Essa saída seria para dar ao pai um filho que seria uma representação do pênis-falo. Portanto esta também seria uma saída pela via de uma identificação masculina, estando ligada a mulher à inveja do pênis ou ainda a um desejo de ser homem. (FREUD, 1905/1972)

Ao constatar que a mãe não tem pênis, a menina abandona a identificação a ela e se dirige ao pai, para aquele que tem. (FREUD, 1905/1972)

Em Freud a inveja do pênis parece ser uma coisa insuperável para a mulher. Se a mulher nunca vai poder ter uma outra saída que não a inveja do pênis, inclusive em uma análise, a questão da feminilidade, contínua em um impasse, na medida em que nada que é próprio à mulher se apresentaria. (FREUD, 1905/1972)

A diferença sexual, como se sabe, gira em torno da falta do falo, cujo suporte anatômico, é o pênis. Na medida em que falta à mulher, fica a vagina assim ignorada, ou melhor, não reconhecida como radicalmente outra com relação ao falo. O sexo feminino se caracteriza pela ausência de um significante. Não é o falo e também não é nenhum outro. (FREUD, 1905/1972)

Para Lacan, não há significante que represente o sexo feminino. Para ele, mesmo os termos ―furo‖ ou ―nada‖, só podem evocar as bordas que cercam o vazio. Essa ausência sem nenhuma positividade só contribui para um enigma da feminilidade. ―Ela é sem o ter‖, diz Lacan. (LACAN, 1995)

Enquanto que para Freud, o furo do sexo feminino é recoberto e a menina só dispõe da castração para tornar-se mulher, daí estar condenada à inveja do pênis, para Lacan, a relação entre furo e castração não é de simples recobrimento. Usando a lógica do significante e seus efeitos, o furo não deve ser considerado como anterior ao significante que vem nomeá-lo.

50 Ele diz que é o significante do falo que produz a falta. É por que um significante nomeia a existência de algo, que por isso mesmo vai produzir o furo. No entanto, para ele um significante não apenas significa, ele não faz só significar, ele tem também como efeito um relançamento, ou seja, o falo, que é um significante, não camufla o furo, ele pode fazê-lo surgir como um mais além. (LACAN, 1992)

No seminário 11 Lacan diz: ―Onde está o furo é a ausência? Não. A rotura, a fenda, o traço de abertura, faz surgir a ausência assim como o grito não se perfila sobre o fundo do silêncio, mas, ao contrário, fá-lo surgir como silêncio.‖ (LACAN, 1992)

A mulher não existe enquanto significante e, porque não está toda inscrita na ordem fálica, aponta além do fálico, para além das palavras, para o que escapa ao discurso. Lacan diz: ―A mulher não existe‖. Mas o que quer dizer isso? Em primeiro lugar a retomada da tese Freudiana de que a feminilidade não é um ser, mas um se tornar. Para Lacan, mais do que uma retomada é um ir mais além dos diferentes efeitos de castração no menino e na menina. (LACAN, 1996)

A castração não deve ser um obstáculo no qual a mulher deve esbarrar. Ela deve tomar uma via que indica por si mesma um mais além.

O conceito de gozo em Lacan é fundamental para podermos situar melhor essa concepção. Para Lacan, existe o gozo fálico, permitido pelo significante, que também pode ser chamado de gozo simbólico (gozo das palavras) e o gozo do outro, um outro gozo que é interditado pelo significante e ligado ao próprio ser. Esse último gozo é também chamado de gozo do ser ou gozo do corpo. (LACAN, 1995)

Como se sabe, na introdução do sujeito na linguagem existe uma perda ligada ao corpo, ou seja, na medida em que o sujeito entra na linguagem ele se separa um pouco do corpo, do pulsional. Isso basta para dizer que o gozo do significante, do falo, separa o sujeito do gozo do ser, do gozo do corpo. (LACAN, 1995)

O fato de estar aprisionado na linguagem, dependente do significado sobre o seu ser, implica para o ser humano uma perda em nível do corpo. Porque o ser humano fala, não é mais um corpo, introduz-se uma disjunção entre o sujeito e seu corpo. O sujeito, que é efeito da linguagem é como tal distinto do corpo. Resta-lhe assim, a tarefa de habitá-lo ou de atingir o corpo do Outro, da linguagem. Isso quer dizer um acesso ao corpo enquanto simbólico e

51 uma barreira ao corpo enquanto real. Pertencemos ao visível e ao invisível. Temos um corpo enquanto real e nos apreendemos ao corpo enquanto simbólico. (LACAN, 1995)

A mulher é um ser virtualmente desdobrado entre sua propriedade subjetiva, pessoal e a natureza que dela se apropria e que nela trabalha. A mulher é regrada, regulada por uma outra lei que a da sua individualidade. Ela confere vida e é a sede de um processo que precisa dela, mas a ultrapassa em sua imperiosa necessidade. (LACAN, 1996)

Assim, na mulher, a exterioridade do corpo, diferente do homem, é manifesta e irrecusável. As manifestações histéricas mais antigas eram isso, a irrupção aberta dessa virtualidade feminina que definia a condição feminina. A mulher faz a exibição do arrebatamento vital do corpo, daquilo que ele é capaz. A menstruação, por exemplo, é lembrada pelo sangue como regularidade do poder gerador. As histéricas, na antiguidade, eram chamadas de bruxas, feiticeiras, possuídas pelo demônio. (FREUD, 1893/1996)

A apreensão do corpo pelo sujeito é feita através de duas polaridades (LACAN, 1995):

1- Corpo como lugar onde se inscreve o significante, efeito de linguagem;

2- Real do corpo, externo ao sujeito, inominável, que escapa à palavra.

Se a linguagem opera como esvaziamento do ser do corpo, este toma um lugar vazio de substância, onde pode se inscrever uma série de significantes. Tal como o Outro, lugar da inscrição, onde a fala do sujeito adquire efeito de sentido, é que Lacan coloca o corpo da mulher, como metáfora do Outro. (LACAN, 1995)

Ele formula a questão: Haverá um gozo próprio da mulher? Ele diz que há um gozo para além do falo, que não pode ser dito nominável, apenas semi-dito por estar na referência do corpo, do ser, daquilo que escapa às palavras. (LACAN, 1995)

A feminilidade é assim o que o homem atribui à mulher. O que ele deseja nela só ele pode dizer se ela possui ou não. Mas de qualquer maneira, não tem nome. É possível a mulher se reconhecer para além do falo, para além do significante e para além do Édipo – por um interesse narcísico, igual ao que fez o menino abandonar o Édipo – a mulher poderá fazê-lo se constituindo como objeto de desejo do Outro. O maior problema é justamente que ela, quando colocada como objeto do desejo do homem, confunde a passividade própria do objeto, como submissão. (LACAN, 1995)

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