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Corte Africana dos Direitos Humanos e dos Povos

Por sugestão da Cimeira da UA para atender à demanda do continente, a UA criou um protocolo adicional à Cor.ADHP, que originou a criação da Cor.ADHP. Dessa forma, em 09 de junho de 1998, em Ouagadougou, capital de Burkina Faso, o referido protocolo foi aprovado e aberto à assinatura, sendo o documento assinado somente por alguns Estados- membros da UA. Em decorrência da não assinatura do respectivo protocolo por parte de certos Estados, oficialmente, a Cor.DHP da África somente veio a ser efetivamente criada oito anos depois da adoção do protocolo, em janeiro de 2006. Essa Corte encontra-se, ainda, em processo de consolidação e amadurecimento. Logo no seu prefácio, o protocolo reitera que a Carta Africana adota a liberdade, a igualdade, a justiça, a paz e a dignidade da pessoa humana como essenciais à solidificação das vontades legítimas dos povos da África.

Funcionou provisoriamente em Adis Abeba, capital de Etiópia; após um ano do seu funcionamento, em agosto de 2007, teve a sua sede fixada definitivamente em Arusha, capital da Tanzânia. Na sua totalidade, integram-na 11 magistrados; somente o presidente da Corte é obrigado a ter residência fixa na sede da Corte, os outros magistrados não se fixam permanentemente na sede, fazendo isso temporariamente. De acordo com o artigo 3º39

, a jurisdição dessa Corte atinge todas as matérias relacionadas com as questões dos direitos humanos; isto quer dizer que a Corte tem o direito de interpretar e aplicar todos os

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Artigo 3 (Jurisdição) 1. A jurisdição do Tribunal estender-se-á a todos os casos e disputas que lhe sejam apresentados e que digam respeito à interpretação e aplicação da Carta, deste Protocolo e de quaisquer outros instrumentos relevantes dos Direitos Humanos ratificados pelos Estados em questão. 2. No caso de uma disputa relativa à jurisdição do Tribunal, o Tribunal deverá decidir.

instrumentos de proteção e promoção dos direitos e liberdades fundamentais criados e reconhecidos pela UA e ratificados pelos Estados-partes no litígio.

Formalmente, de acordo com o protocolo que deu origem à Corte, esta tem competência para julgar todos os casos relacionados à violação dos direitos humanos e dos povos protegidos pela Carta Africana dos Direitos dos Homens e dos Povos, como também por outros instrumentos jurídicos africanos reconhecidos pelos Estados-partes. Tem também o poder de emitir pareceres consultivos; com base no artigo 4º40

, a Corte pode emitir consultas quando for solicitada por parte de qualquer Estado que compõe a UA, incluindo a Guiné- Bissau, ou qualquer organização africana reconhecida pela UA. O conteúdo do parecer pode envolver assuntos conexos com a Carta Africana, como também com outros instrumentos jurídicos de direitos humanos de relevância ao continente. Estas são as instituições que podem acionar a Corte41

; além da Com.ADHP e dos Estados-partes, também podem propor ações perante a Corte Africana as Instituições Intergovernamentais Africanas, sendo estas, em primeiro plano, as partes legitimadas para acionar aquela Corte, mas nada impede que as Organizações Não Governamentais recebam autorização da Corte para trabalhar junto com a Com.ADHP para procurar a justiça perante a Corte Africana, e, em determinadas condições, a própria Corte também pode receber as queixas individuais da vítima e/ou dos seus representantes legais.

Constata-se que no sistema africano, comparado a outros sistemas, há um repertório bem mais amplo dos atores de direito que podem mobilizar uma queixa junto à Corte. Quanto à Comissão, ao receber uma comunicação por escrito sobre as violações dos direitos humanos que não seja simplesmente arquivada, ela deverá fazer questão de resolver o caso amistosamente. Se não chegar a um consenso a fim de solucionar o problema, deverá ser submetido à Corte, para que esta possa julgá-lo. A decisão da Corte é revestida da qualidade

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Artigo 4 (Pareceres Consultivos) 1. A pedido de um Estado-Membro da OUA, de quaisquer dos seus órgãos ou de qualquer organização africana reconhecida pela OUA, o Tribunal poderá dar o seu parecer sobre qualquer questão jurídica relacionada com a Carta ou com quaisquer outros instrumentos relevantes dos Direitos Humanos, conquanto a questão sujeita a parecer não esteja relacionada com uma questão em análise por parte da Comissão. 2. O Tribunal deverá apresentar razões para os seus pareceres consultivos, conquanto cada juiz tenha direito a apresentar um parecer separado ou divergente.

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Artigo 5 (Acesso ao Tribunal) 1. As seguintes entidades terão direito a apresentar casos ao Tribunal: (a) A Comissão; (b) O Estado-Parte que apresentou queixa à Comissão; (c) O Estado-Parte contra o qual foi apresentada a queixa à Comissão; (d) O Estado-Parte cujo cidadão seja vítima de uma violação dos Direitos Humanos; (e) Organizações Intergovernamentais Africanas. 2. Quando um Estado-Parte tem interesses num caso, aquele poderá apresentar um pedido ao Tribunal para que seja autorizado a juntar-se-lhe. 3. O Tribunal poderá conceder a organizações não-governamentais (ONG) relevantes o estatuto de observador perante a Comissão e poderá dar autorização a indivíduos para que instaurem casos directamente perante o Tribunal, em concordância com o Artigo 34(6) deste Protocolo.

de coisa julgada definitiva, como estabelece o artigo 30 do Protocolo, e o acompanhamento de sua execução é confiado ao Comitê de Ministros da União Africana, nos termos do artigo 29.2 do mesmo Protocolo.

O Estado objeto do presente estudo não ratificou o protocolo que deu origem à Cor.ADHP. O que acabaria, infelizmente, impossibilitando que essa instituição africana analisasse casos de violência em matérias dos direitos humanos daquele Estado. Dentre os Estados integrados à UA, uma boa parte ainda não ratificou o protocolo. Sobre a ratificação desse protocolo que deu origem à Cor.ADHP, na entrevista que tivemos com o doutor Alfredo Cristovão Gomes Lopes, Diretor Geral de Assuntos Jurídicos e Tratados do Ministério de Negócios Estrangeiros, ele nos diz o seguinte: Guiné assinou em 9 de junho 1998, mas não ratificou, mas vamos pedir a representação de União Africana aqui em Bissau para nos arranjar o texto para podermos desencadear ao procedimento de ratificação (ALFREDO CRISTOVÃO GOMES LOPES, DIRETOR GERAL DE ASSUNTOS JURÍDICOS E TRATADOS DO MINISTÉRIO DE NEGÓCIOS ESTRANGEIROS; ENTREVISTA CONCEDIDA EM JANEIRO DE 2014).

Este nos garantiu que, ainda naquele governo de transição (2012 a 2014.1), seriam tomadas as medidas necessárias, priorizando assim o processo de ratificação do instrumento que deu origem à Corte, isto é, a Guiné será em breve parte integrante da Cor.ADHP, uma vez que é comum que a Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau aprove os instrumentos internacionais encaminhados pelo executivo. E, sobre a importância da ratificação desse protocolo, um dos Juízes Conselheiros do STJ, ao ser questionado se entende que a ratificação do tratado que deu origem à Cor.ADHP poderia melhorar a justiça na Guiné, teve o seguinte posicionamento:

O alargamento das instituições é sempre bem-vinda, isso porque o nosso Estado, quando tem um compromisso internacional, deve-se cumprir, deve-se obedecer e deve-se incorporar todas as decisões das instâncias africanas dentro do nosso ordenamento jurídico, por forma a permitir que os direitos lesados pelos nossos cidadãos tenham uma demanda junto das instituições africanas de proteção dos direitos humanos, porque, senão, se o Estado for um Estado frágil, talvez a única forma de recorrer e salvaguardar os interesses dos cidadãos é a Corte Africana. Isso seria uma válvula de escape para que o Estado não seja um Estado infrator em termos de proteção dos direitos humanos (OSÍRIS FRANCISCO PINA FERREIRA, JUIZ CONSELHEIRO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA GUINÉ- BISSAU; ENTREVISTA CONCEDIDA EM BISSAU, JANEIRO DE 2014).

Este magistrado judicial do STJ guineense compartilhou a ideia de que aquele Estado deveria aderir à Cor.ADHP, uma vez que o reconhecimento da jurisdição desta Corte por parte da Guiné poderia trazer efeitos positivos para toda a sociedade guineense, pelo simples fato de ser uma das saídas plausíveis à implementação do respeito aos direitos humanos naquele país.

Voltando um pouco atrás, percebe-se que, levando em consideração tantos problemas de violações de direitos humanos que afetam toda a África e especificamente aos países que ratificaram o protocolo da Corte, os juízes que compõem este órgão regional de justiça são muito poucos para efetivamente estar à altura de atender às demandas que deveriam ser submetidas a esta Corte, aliás, deve-se lembrar que um dos principais problemas enfrentados por esta Corte é o ingresso de casos junto à sua jurisdição, pois desde a sua implementação tem recebido poucos casos de ataques aos direitos humanos, levando em consideração proporcionalmente a grande quantidade de violações que acontecem naquele continente, em especial nos próprios países que ratificaram o protocolo. Dentre todas as Cortes continentais dos direitos humanos, esta é a mais ineficiente de todas, o que se deve muito ao atual quadro político vivido naquele continente, em que muitos não reconhecem a jurisdição da Corte e os que reconhecem dão pouca contribuição para que seja uma verdadeira Corte dos Direitos Humanos.

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