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Direitos e liberdades fundamentais são objetos de lutas

Como a Guiné-Bissau, desde a sua democratização até o momento atual, passou mais tempo vivendo fora da lei do que dentro da lei, viveu muito pouco dentro do respeito às liberdades fundamentais, inclusive de expressão e de comunicação social, em decorrência disso:

A vida do direito é a luta, a luta de povos, de governos, de classes, de indivíduos. Todo o direito do mundo foi assim conquistado, todo ordenamento jurídico que lhe contrapôs teve de ser eliminado e todo o direito, assim como o direito de um povo ou o de um indivíduo, teve de ser conquistado com luta. A paz sem luta e o prazer sem trabalho pertencem à época do paraíso, mas a história conhece ambos apenas como resultado incessante e como penoso esforço. (IHERING, 2005, p. 27-28).

Os direitos e as liberdades públicas são objetos de lutas contínuas que devem ser travadas contra os inimigos da liberdade e da justiça. Todo indivíduo humano, quando for necessário, em nome de povo e da coletividade, deve participar no trabalho de luta pelos direitos humanos, dando a sua parcela fracionada de ajuda à realização da justiça, paz e bem- estar de todos.

As liberdades públicas são institutos que dignificam uma pessoa humana, a dignidade da pessoa humana repousa no princípio das liberdades fundamentais, sem as quais um ser humano perderá a sua autonomia e a sua essência como ser humano, passando a ser reduzido a mero objeto e/ou a seres vivos irracionais, um animal, por exemplo. Notadamente este posicionamento havia sido defendido por Ihering há muito tempo: o ser humano, através do direito, possui e defende sua existência moral – sem direito, ele se rebaixaria até os animais, como já faziam os romanos, que, do ponto de vista do direito abstrato, nivelam os escravos aos irracionais (IHERING, 2005, p. 27-28).

Percebe-se que os direitos fundamentais e as liberdades públicas são institutos jurídicos de natureza irrenunciável, ou seja, um ser humano não pode, de modo algum, abrir mão deles, são naturais, são atributos humanos. Por serem objetos de muita disputa, uma vez que o mundo real nos comprova isso, em detrimento do mundo virtual, há constantes ataques de terceiros a tais direitos e liberdades; neste caso, a única saída plausível seria o recurso a novas lutas, com o intuito de restaurá-los.

Essas demonstrações feitas acima, por nós, são vistas como uma obrigação de todo o indivíduo humano, como também da sociedade e/ou comunidade inteira. A defesa dos diretos humanos por qualquer dos meios ao seu dispor é um dever de todos, não somente do Estado, até porque este é visto como sendo um dos principais violadores dos direitos e liberdades básicas das pessoas humanas, então a tarefa de promover, de defender e resgatar tais direitos e liberdades não deveria ser totalmente confiada a ele – o Estado. Qualquer que seja o ser humano, aceitando e mantendo-se na posição passiva quanto aos ataques incessantes aos direitos fundamentais, estará automaticamente contribuindo com a consumação desse fato, pelo menos na visão sociológica e do direito internacional dos direitos humanos.

Falamos muito de Estado Democrático, aliás, este foi objeto, em parte do nosso trabalho, mas entende-se que, em um Estado Democrático e progressista, as entidades públicas deveriam engajar-se muito nas questões relacionadas à luta pelos direitos humanos, tanto nas suas relações ditas de “verticalidade” como de “horizontalidade” dos direitos humanos. As liberdades públicas devem ser respeitadas em todos os sentidos; quando houver infrações por parte de terceiros e de quem quer que seja, o Estado deve atuar no limite do direito.

Ao terminar este capítulo, entende-se que os interesses do Estado Democrático deveriam andar em compasso com o respeito às liberdades públicas. Os fitos dos direitos humanos dependem muito da justiça e, por sua vez, a justiça pressupõe a liberdade de um ser

humano, ou seja, este necessita de ser livre em todos os sentidos para poder se sentir membro de uma sociedade justa e transparente: a proteção contra as não-liberdades existenciais básicas é necessária à própria existência das pessoas enquanto agentes sociais, sendo portanto uma condição para a justiça, mais do que uma de suas soluções (KOLM, 2000, p. 13). As liberdades fundamentais, como o próprio nome diz, são mecanismos facultados aos seres humanos para ter e realizar certos desejos de seus agrados.

CAPÍTULO IV

SISTEMA INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS E A IMPOSIÇÃO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO NA GUINÉ-BISSAU

10 Panorama Genérico

Nos capítulos anteriores, foi demonstrada a existência de uma grande discrepância entre o reconhecimento formal-jurídico da liberdade de expressão e de mídia pelo Estado da Guiné-Bissau e a realidade vivenciada por seus cidadãos, que gostariam de usufruí-las livremente. As pertinentes normas da ordem jurídica doméstica não possuem um grau de eficácia suficiente para garantir a articulação de ideias e opiniões políticas por pessoas físicas, de um modo que digam respeito às necessidades de um Estado e de sua sociedade aspirante a consolidar o processo democrático introduzido. Diante disso, coloca-se a pergunta: quais são as potenciais contribuições do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) nesse contexto?

A seguir, esta pergunta será analisada sob duas perspectivas diferentes. Por um lado, serão identificadas as obrigações internacionais da Guiné-Bissau que decorrem do DIDH em relação à garantia da liberdade de expressão e de mídia. O objetivo principal é demonstrar até que ponto o Estado pode ser responsabilizado em nível internacional por presumíveis falhas e violações dos direitos humanos aos seus cidadãos. Serão distinguidos dois aspectos: as obrigações materiais e a possibilidade da sua imposição por instituições internacionais, sejam elas de caráter jurídico ou simplesmente político.

Por outro lado, é também óbvio que um maior engajamento da comunidade internacional em defesa da garantia mais eficaz dessas liberdades na Guiné seria de grande importância para a sua sociedade civil e para a sua democracia em si. Nesse contexto, pergunta-se se os Estados que compõem a comunidade internacional podem obrigar juridicamente um Estado violador a respeitar a liberdade de expressão com as provas concretas de que tal liberdade pode criar obrigações erga omnes. Será que as liberdades de expressão e de comunicação social hoje possuem esse status, no Direito Internacional Público, que requer uma atitude mais ativa de outros Estados em relação aos governos que as protegem de uma forma insuficiente? Em caso afirmativo, a sociedade civil de pequenos Estados como a Guiné-Bissau pode não só politicamente exigir o apoio da comunidade internacional, mas também dispõe até de uma base legal para fazer isso.

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