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Neste item, adotar-se-á o pensamento de Caria (2005a), cujos escritos teóricos sobre a análise do trabalho e do saber em grupos profissionais tem como centro o conceito de cultura profissional. Aqui se detalhará o modo como podem ser concebidas as relações entre educação, trabalho e conhecimento em diversos grupos profissionais. Dessa forma, a análise

sobre a construção da identidade profissional será ampliada a partir da compreensão da interface entra cultura e identidade.

A cultura, segundo Caria (2005b), trata-se de um dos conceitos mais centrais ao recente debate sobre as transformações que atualmente as sociedades capitalistas atravessam. Essas transformações alteram a forma como se constituem as profissões e como se constroem as identidades profissionais. Por essas razões, os conceitos de cultura e identidade estarão reunidos nesta pesquisa.

Muito do que será apresentado é uma tentativa de conceber um diálogo para melhor compreender de que forma as atividades profissionais se relacionam com o conceito de cultura profissional. Primeiramente a noção de cultura revela-se como ideal para compreender a subjetividade dos sujeitos participantes de um coletivo centrado nas relações com o conhecimento, pois não há trabalho sem conhecimento.

Antes de mais nada, torna-se imprescindível falar sobre a concepção de cultura apresentada por esse autor embasada numa interpretação crítica de vários autores que se reúnem em princípios que lhe permitem formalizar e desenvolver uma visão integrada sobre as várias epistemologias da cultura, sendo estas:

Cultura é uma construção social e histórica capaz de produzir uma identidade coletiva inscrita numa relação social com “o outro”, resultante de miscigenações variadas;

Cultura é uma prática social indissociável da análise das dimensões simbólicas do social e nunca uma prática social divorciada das construções simbólicas dos atores sociais ou vice-versa;

Cultura é uma reflexividade que começa por se expressar no uso de saberes práticos na interação social, por isso não parte apenas da produção e expressão discursivas.

Em resumo, estes princípios baseiam-se em três tópicos: prática, reflexividade e identidade.

Dessa forma, a cultura está entrelaçada ao processo de construção da identidade. O foco apresentado nesta pesquisa é a compreensão do processo de identidade profissional e se utilizará importantes aspectos da cultura profissional.

Quando se fala de cultura profissional, Caria (2005) refere-se à construção e desenvolvimento (em curso) de saberes coletivos num contexto de trabalho que não está delineado por formas de conhecimento exteriores à interação social entre pares: não está determinada por papéis sociais, por posição de poder em campos sociais, nem por processos identitários individuais, ligados a trajetórias sócio – educativas e a origens sociais. Na verdade, trata-se de um conceito de cultura que, segundo Miranda (2002 apud CARIA, 2005),

não tem substância, nem ser no parecer; é uma cultura-ação à procura de argumentos e do possível no existente provisório.

A cultura é uma prática social que se incorpora por meio das vivências dos atores sociais, não é uma representação mental ou discursiva, nem é um esquema prático nem um esquema discursivo, é uma consciência prática. Para ser uma consciência prática, a cultura só pode existir na interação social, portanto, na reciprocidade de sentido que a comunicação verbal e não verbal exige Giddens (1989 apud CARIA, 2005).

Mas a cultura, além de ser uma expressão identitária, de mediação reflexiva dos atores sociais entre práticas e condições sociais, tem uma gênese que deriva e que se atualiza em função das relações intersubjetivas com o “outro”. Esta gênese está na reflexividade que se constrói na interação social, embora isso não implique que não esteja articulada com a reprodução das estruturas e dos sistemas sociais e simbólicos, dado a cultura inscrever-se, pelo uso desigual de regras e recursos, na rotinização da vida social Giddens (1989 apud ACARIA, 2005).

A consciência prática em interação expressa-se em significações sociais que decorrem de uma atividade sociocognitiva (CARIA, 2008), atividade que associa práticas sociais, saber experiencial em situação (capaz de lidar com a singularidade das pessoas e as contingências do social) e uso do conhecimento abstrato em contexto de ação (capaz de pensar os efeitos possíveis da ação por relação a singularidades sociais conhecidas)

Em resumo, Caria (2008) conclui que a epistemologia da cultura a ser abordada seria a da reflexividade interativa que só ganha autonomia teórico empírica, porque se destina, preferencialmente, à análise do trabalho e do conhecimento nos grupos profissionais que têm a função de desenvolver a reflexividade institucional da modernidade e que, ao mesmo tempo, são práticos, porque têm de recontextualizar o conhecimento abstrato em saberes experienciais e em práticas em situação, para serem capazes de intervir socialmente com legitimidade, eficácia estratégica e especificidade contextual e assim construir seu perfil identitário.

Por fim, a forma identitária permite ao profissional reconhecer-se como agente profissional, identificar a sua atividade, o seu papel social legitimado e o saber da ação profissional que lhe atribui autoridade e confiança na primeira instância que é a si mesmo e depois ao ambiente onde atua profissionalmente.

6 PROCESSOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A ideia central deste trabalho tem como ponto de partida a noção de que a identidade profissional para ser construída e socialmente validada deve compor-se de exercício dos conhecimentos acadêmico construídos em contexto real de trabalho, ser compreendida e requerida pelo mundo do trabalho. Os elementos que fazem parte da sua composição devem estruturar-se de modo articulado, dentre elas formação, atuação, experiência, perspectivas futuras.

O cenário apontado pelos contextos produtivos pontuado pelas mudanças tecnológicas e organizacionais, além de alterarem os processos produtivos, alteram a forma de aquisição das qualificações profissionais e o modo como os indivíduos as percebem e valorizam.

Dentre as possibilidades empíricas, que essa noção sugere, afigurou-se, como um campo bastante promissor para a pesquisa, a investigação na indústria local. Este é um espaço reconhecido pela concentração de várias áreas da produção industrial, portanto capaz de concentrar um número significativo de tecnólogos, além do sindicato destes profissionais e órgão regulador desta profissão. Desse modo, buscou-se possibilitar que se investigue como se configura a identidade profissional deste trabalhador, sob múltiplos olhares.

Ciente da força que hoje ganham para as pesquisas sobre a formação/qualificação profissional, os estudos interinstitucionais que versam sobre “cadeias e complexos”, em sua maioria realizados pelos sociólogos do trabalho, optou-se justamente por buscar entender o fenômeno da identidade profissional através da relação intrainstitucional e legislativa acrescentando-se ao foco da análise sociológica o olhar da Pedagogia, na perspectiva da formação educacional do trabalhador para o mundo do trabalho.

Para isso, foram escolhidas empresas no Pólo Industrial de Camaçari, campo de intensas mudanças tecnológicas e organizacionais. Essa escolha, além de permitir observar como se configura a construção da identidade do tecnólogo, propiciou igualmente investigar um contingente de trabalhadores que pudessem expressar como percebem a contextualização dos saberes academicamente construídos para o contexto produtivo e de que maneira se colocam nas empresas a partir das funções desenvolvidas.

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