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CAPÍTULO 4 A DINÂMICA RELAÇÃO ENTRE AUTONOMIA E

4.2 O OCASO, DE LEGE FERENDA, DOS LOTEAMENTOS FECHADOS

4.3.2 Da compatibilização entre os licenciamentos urbanísticos e ambientais

O fato de não haver lei federal que estabeleça normas gerais sobre condomínios urbanísticos não autoriza que o Município deixe de observar cuidados urbanísticos e ambientais, os quais merecem a estrita preocupação das autoridades locais que pretendam legislar sobre essa modalidade de retalhamento do solo urbano.

Com relação aos cuidados urbanísticos, a Constituição Federal é pródiga em exigir especificamente dos Municípios planejamento urbano, com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (CF, art. 30, inc. VIII, e art. 182).

O licenciamento urbanístico, basicamente, consiste em procedimento administrativo tendente à aprovação do projeto de parcelamento do solo (de que trata a Lei n. 6.766/1979) e da licença para a realização de edificações, obras e empreendimentos, podendo abranger reforma e eventual demolição de construções.152

Por exemplo, dentro do licenciamento urbanístico, o Estatuto da Cidade estipula que é função de lei municipal definir os “empreendimentos” (e não apenas loteamentos ou desmembramentos!) situados em zonas urbanas que dependerão de Estudo de Impacto de Vizinhança – EIV, para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento (cfr. Lei n. 10.257/2001, art. 36). A propósito, conforme disposto no art. 37 do ECid, o EIV deverá contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise de questões como adensamento populacional; equipamentos urbanos e comunitários; uso e ocupação do solo; valorização imobiliária; geração de tráfego e demanda por transporte público; ventilação e iluminação; e paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.

Por seu turno, com relação aos cuidados ambientais, nada obstante, no Brasil, “a maior parte dos licenciamentos ambientais mantém-se nas atribuições de órgãos ambientais estaduais, e a União traz para si o controle ambiental de alguns

empreendimentos”;153 é certo que os Municípios não podem negligenciar a preservação do meio ambiente. Com efeito, além de a Constituição prever a “conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição” como matéria de competência concorrente (art. 24, inc. VI, e art. 30, inc. II), determina, também, que é competência comum da União, dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios, por exemplo, proteger as paisagens naturais notáveis, o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas e preservar as florestas, a fauna e a flora (art. 23, incs. III, VI e VII).

Como se pode perceber, os cuidados com o meio ambiente devem ser objeto de preocupação dos três níveis de nossa federação. A propósito, o parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 53/2006, estabelece que “leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”.

Vale ressaltar que, com o objetivo de fixar normas para a cooperação entre os entes federados, nas ações administrativas decorrentes da competência comum à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora, foi editada a Lei Complementar n. 140/2011.

No art. 9º da referida lei, constam os deveres-poderes administrativos dos Municípios em relação ao meio ambiente, dentre os quais se destacam os seguintes: (a) organizar e manter o Sistema Municipal de Informações sobre Meio Ambiente; (b) elaborar o Plano Diretor, observando os zoneamentos ambientais; (c) exercer o controle e fiscalizar as atividades e empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for cometida ao Município; (d) observadas as atribuições dos demais entes federativos, promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos: (d.1) que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade; ou (d.2) localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APA); (e) observadas as atribuições dos demais entes

federativos previstas nesta Lei Complementar, aprovar: (e.1) a supressão e o manejo de vegetação, de florestas e formações sucessoras em florestas públicas municipais e unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APA); e (e.2) a supressão e o manejo de vegetação, de florestas e formações sucessoras em empreendimentos licenciados ou autorizados, ambientalmente, pelo Município.

Percebe-se que, muito embora não haja texto expresso que preveja especificamente licenciamento ambiental para o empreendimento denominado “condomínio urbanístico”, é certo que, com a entrada em vigor da Lei Complementar n. 140/2011, ao Município compete, além dos licenciamentos urbanísticos, promover os licenciamentos ambientais supramencionados.

Não é ocioso lembrar, também, que o direito à moradia, ao mesmo tempo em que remete à gestão das cidades, está conectado com a gestão ambiental, uma vez que a degradação ambiental pode-se apresentar como consequência perversa da falta de planejamento urbano.154

Acresce que, a depender da magnitude da intervenção decorrente da implantação de um condomínio urbanístico, o licenciamento ambiental deverá, sim, ser exigido pela autoridade municipal, até mesmo porque, de certa forma, a referida espécie de retalhamento do solo urbano pode ser considerada como atividade do abrangente gênero “parcelamento do solo” de que trata o Anexo I (Das Atividades Diversas) da Resolução Conama n. 237/1997.

Nessa ordem de ideias, no que tange ao licenciamento ambiental para fins urbanísticos, seja para loteamentos, desmembramentos ou condomínios urbanísticos, a despeito das omissões de que padece a legislação federal (máxime a Lei n. 6.766/1979), pode-se dizer que, após a entrada em vigor da Lei Complementar n. 140/2011, abre-se horizonte rumo à unificação dos licenciamentos urbanístico e ambiental pelos Municípios, na tramitação de projetos que envolvam o retalhamento do solo urbano.

154 A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (também chamada

Agenda 21), realizada em 1992, no Rio de Janeiro, em seu Capítulo 7, item 6, conectou o direito à moradia com a gestão ambiental, com a seguinte redação: “O acesso a uma habitação sadia e segura é essencial para o bem-estar econômico, social, psicológico e físico da pessoa humana e deve ser parte fundamental das ações de âmbito nacional e internacional”. Sobre o tema, cfr. Rogério Telles Correia das Neves (2012, p. 42).

A esse propósito, Paulo José Villela Lomar (2013, p. 98) chama atenção para o fato de que, sabendo-se que o licenciamento urbanístico também deve observar a legislação ambiental, seria adequado que a legislação local estabelecesse que o alvará de licença expedido pelo Município produzisse, simultaneamente, os efeitos de licença urbanística e ambiental, evitando-se burocratização e demora resultante da obrigação de satisfação pelo empreendedor de exigências dispersas em variados guichês governamentais.

4.3.3 Das vantagens e desvantagens comparativas entre condomínios urbanísticos e