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CAPÍTULO 2 A DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS COMPETÊNCIAS

2.2 O PLANEJAMENTO DAS CIDADES BRASILEIRAS

2.2.2 O tratamento de áreas urbanas e rurais pelo Plano Diretor municipal

2.2.2.1 Das construções em áreas urbanas e rurais

O adensamento de construções é indicativo de urbanização. É certo dizer que a atividade de urbanização de determinado território se dá por meio de seu adensamento populacional, aperfeiçoando-se por meio da conexão das construções erigidas no terreno a redes provedoras de certos serviços públicos, tais como: abastecimento de água; sistema de esgoto sanitário; coleta de lixo; sistema de iluminação etc.

Geralmente, emprega-se o termo “urbanização” para designar o processo espontâneo pelo qual a população urbana cresce em proporção superior à população rural. Trata-se de fenômeno de concentração urbana. Reputa-se urbanizada a sociedade em um determinado país quando as pessoas situadas nas cidades representam mais da metade da população.

Por seu turno, a urbanificação é procedimento de intervenção do Poder Público, por meio do qual – de forma deliberada – criam-se áreas urbanas novas ou modificam- se áreas já previamente urbanificadas (José Afonso da SILVA, 2012, p. 26-27, 319, 320).

No Brasil, grosso modo, para que determinada construção possa ser erigida em zona urbana, há que se preparar o terreno por meio de procedimento tendente à produção de lote, unidade básica de um terreno apropriada para o recebimento de edificações.

Para que lotes sejam criados, como visto, os proprietários das glebas devem obedecer às leis de parcelamento de terrenos. No caso de imóveis situados em área rural, os proprietários devem observar os dispositivos contidos no Decreto-Lei n. 58/1937 e na Instrução Incra n. 17-B, de 22 de dezembro de 1980, ao passo que, para

imóveis urbanos, o diploma nacional que dispõe sobre o parcelamento desta espécie de terrenos é a Lei n. 6.766/1979.83

Não se pode negar que as edificações são mais afetas às áreas urbanas, uma vez que, segundo a definição legal já mencionada no tópico 1.2 (Lei n. 4.504/1964, art. 4º), os imóveis rurais são vocacionados não propriamente à construção, mas à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial.

Por isso, como bem ensina Victor Carvalho Pinto (2014, p. 230), ao tratar do regime jurídico de construção em municípios desprovidos de planos urbanísticos:

a propriedade rural pode ser utilizada para atividades agropecuárias ou extrativistas, segundo o estabelecido pelas regras de direito agrário e ambiental. Admite-se apenas uma edificabilidade limitada, em harmonia com a utilização atualmente praticada, tal como uma sede de fazenda ou armazém em área agrícola. A edificabilidade só se torna a utilização principal do terreno após uma urbanização prévia, operação que só pode ser feita em áreas previamente programadas pelos planos urbanísticos.

A propósito do licenciamento municipal para a construção em área rural, o §3º do art. 692 do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina dispõe que averbações de construções podem ser feitas em matrículas ou transcrições de imóveis rurais sem a necessidade de apresentação de alvará de construção nem de “carta de habite-se”, uma vez que supostamente não competiria ao

83 Como advertem Paula Santoro et al. (2004, p. 11), há diversas interpretações envolvendo a

sobreposição de legislações e competências que definem o parcelamento do solo. Uma vertente considera o parcelamento do solo rural competência do município; para outra, é de competência federal, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Embasando essas vertentes, há diferentes interpretações sobre o Direito Agrário, Ambiental e Urbanístico. O Incra é responsável pelo estabelecimento dos módulos mínimos das unidades de produção agrícola nas diversas regiões brasileiras. A referida autarquia federal utiliza a supramencionada Instrução n. 17-B, para regular parcelamentos urbanos em zona rural. Esse ato normativo é dividido em quatro tópicos. O primeiro trata da definição das duas espécies de parcelamento do solo: loteamento e desmembramento. O segundo aborda requisitos para o “parcelamento, para fins urbanos, de imóvel rural localizado em zona urbana ou de expansão urbana” (dispondo, no item 2.2, que, em tal hipótese, caberá ao INCRA, unicamente, proceder à atualização do cadastro rural, desde que aprovado o parcelamento pela instância local). O terceiro tópico estabelece parâmetros para o “parcelamento, para fins urbanos, de imóvel rural localizado fora da zona urbana ou de expansão urbana” (determinando, em seus itens 3.3, 3.4 e 3.5, que, em tal hipótese, caberá ao INCRA unicamente prévia audiência de não oposição ao parcelamento, após a comprovação pela Municipalidade de que a área: (a) por suas características e situação, seja própria para a localização de serviços comunitários das áreas rurais circunvizinhas; (b) seja oficialmente declarada zona de turismo ou caracterizada como de estância hidrominaeral ou balneária e (c) tenha, comprovadamente, perdido suas características produtivas, tornando antieconômico o seu aproveitamento). O quarto tópico trata do “parcelamento, para fins agrícolas, de imóvel rural localizado fora de zona urbana ou de expansão urbana”.

município regular construções em áreas rurais. Vejamos a dicção do referido dispositivo normativo:

Art. 692. Para averbação de obra de construção civil (construção, reconstrução, demolição, reforma ou ampliação de prédios), é necessária a apresentação de licença municipal e dos documentos exigidos pela legislação previdenciária (certidão negativa de débito - CND -, quando for o caso).

(...)

§ 3º Para a averbação de construção em imóvel situado em zona rural, não se exigirá "habite-se" ou alvará de conservação, mas tão somente declaração do proprietário de que, no imóvel matriculado ou transcrito, se realizou a edificação84.

Ademais, a jurisprudência administrativa do Tribunal de Justiça de São Paulo (v.g.: Apelação Cível n. 6.163-0 julgada pelo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo em 12/09/1986, sob a relatoria do Des. José Renato Nalini) considerou que, se houver, por exemplo, instituição de condomínio edilício (de casas ou de apartamentos) em área supostamente rural, o empreendimento deverá ser aprovado pela Municipalidade (nos termos da alínea “d” do art. 32 da Lei n. 4.591/64 e do art. 53 da Lei n. 6.766/1979), uma vez que o terreno perderá a sua destinação rural e passará a ser urbano. Em relevante passagem do julgado supramencionado, o relator asseverou:

A gleba está situada na zona rural, cuja destinação é incompatível com o aproveitamento para finalidades de moradia e lazer. A inversão desse preordenamento deveria ser submetida ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, a teor do disposto no art. 53 da Lei 6.766, de 19.12.79.

A propósito, de lege ferenda, o Projeto de Lei n. 31/2007, que pretende estabelecer normas gerais disciplinadoras do parcelamento do solo para fins urbanos e

84

O Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina (CNCGJ) é a consolidação de provimentos e atos administrativos de caráter geral e abstrato, instituído em 2013, por ora, atualizado pelo Provimento n. 16, de 09 de outubro de 2015. Partindo da premissa contida nas referidas normas, a competência para autorizar edificações em área rural, a rigor, seria do Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, mas essa autarquia federal não faz tramitar procedimentos para autorização de tais edificações; portanto, as averbações de construções em imóveis rurais, via de regra, nessa linha de entendimento, prescindem de aprovação pela municipalidade. Vale destacar, contudo, que, tal como ocorre com as construções em geral, para a averbação da construção, na matrícula ou transcrição de imóvel rural, o interessado deve apresentar planta elaborada pelo profissional habilitado (engenheiro ou arquiteto), com a respectiva ART – anotação de responsabilidade técnica no Conselho de Fiscalização (CREA ou CAU) e a CND – certidão negativa de débitos previdenciários referentes à obra.

da regularização fundiária sustentável de áreas urbanas, bem assim instituir a denominada Lei da Responsabilidade Territorial Urbana, prevê, no artigo que abre o Capítulo referente às Disposições Complementares e Finais, que: “Art. 130. O uso e a ocupação de imóvel situado fora do perímetro urbano com finalidade diversa da exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativista ou mineral, mesmo que não implique parcelamento do solo, requererá licença urbanística expedida pelo Poder Público municipal, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigidas”.

Nessa linha de entendimento, é adequado afirmar que a edificabilidade é apanágio mais relevante para imóveis situados em área urbana, de expansão urbana ou de urbanização específica. Com efeito, nos termos do art. 3º da Lei n. 6.766/1979, somente é admitido o parcelamento destinado à edificação, em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal. Outrossim, segundo o §4º do art. 2º da mesma Lei n. 6.766/1979, considera-se “lote” o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe.

A edificabilidade em área urbana estará presente em imóveis decorrentes de regular procedimento de parcelamento de glebas em lotes, desde que observadas as normas urbanísticas (federais, estaduais, distritais e municipais), a fim de que se preveja e se aperfeiçoe o direito de o proprietário construir sobre o seu terreno.

Vale ressaltar que muito se discute se a edificabilidade constitui prerrogativa inerente ao direito de propriedade de terreno urbano.85 A esse respeito, concordamos com Victor Carvalho Pinto (2014, p. 234), no sentido de que não se pode mais considerar o direito de construir como uma faculdade do direito de propriedade, o qual, supostamente, seria posteriormente limitado ou restringido pelas normas urbanísticas. “O que há é exatamente o oposto: é a legislação urbanística que concede ao terreno um direito de construir antes inexistente”.

A bem da segurança, da saúde e da preservação do meio ambiente, nem todo imóvel poderá ser parcelado, há glebas (terrenos), em áreas urbanas, que, eventualmente, não serão suscetíveis de parcelamento em lotes, tal como prevê o parágrafo único do art. 3º da Lei n. 6.766/1979:

Não será permitido o parcelamento do solo:

I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas;

Il - em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados;

III - em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes;

IV - em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;

V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.

Ademais, pode haver áreas urbanas (eventualmente até mesmo loteadas) que não poderão receber construção, por limitações, por exemplo, de ordem administrativa (como são o caso de áreas non aedificandi de que trata o art. 5º da Lei n. 6.766/1979;86 servidões administrativas em regiões próximas a aeródromos e heliportos; em zonas fortificadas de que tratam os Decretos-Leis n.os 3.437/1941 e 8.264/1945; limitações em imóveis tombados em virtude de seu valor histórico, artístico, paisagístico, turístico, cultural ou científico de que trata o Decreto-Lei n. 25/1937) ou por restrições convencionais.

De todo modo, no que tange ao poder normativo do Município em relação às construções rurais, entendemos serem constitucionais regras municipais, estejam ou não veiculadas por meio do plano diretor, que tratem de exigir alvará de construção para o licenciamento de edificações.

Com efeito, não faria sentido que construções, mesmo as não sofisticadas, não pudessem ser submetidas a licenciamento administrativo. Por exemplo, o inc. VIII do art. 39 da Lei n. 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor) vedou ao fornecedor de produtos ou serviços “colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra

86 Sobre a importância da observância das áreas non aedificandi, cfr. os votos do Min. Nelson Jobim e do

Min. Marco Aurélio na ADI 2.344/SP (Medida Cautelar), julgada na sessão de 23/11/2000, sob a relatoria do Min. Celso de Mello, em que se discutia a constitucionalidade da Lei paulista n. 10.358/1999, a qual, ao alterar o art. 7º do Decreto-Lei paulista n. 13.626/1943, assim dispôs: “Nos trechos rodoviários que atrevessem perímetros urbanos ou áreas urbanizadas passíveis de serem incluídas em perímetro urbano, será dispensada a exigência de recuo [de 15 metros] previsto neste artigo”. O STF, por maioria de votos, não conheceu da ação direta, pelo fato de que, em controle abstrato, a suposta inconstitucionalidade deve transparecer de modo imediato, derivando o seu reconhecimento do confronto direto que se faça entre o ato estatal impugnado e o texto da própria Constituição da República.

entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro)”.

Por seu turno, o Conmetro, por meio da Resolução n. 01, de 08/01/1992, definiu como “Norma Brasileira” toda e qualquer norma elaborada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ou outra entidade credenciada pelo Conselho. Ademais, revogou resoluções anteriores que estabeleciam classes de Normas Brasileiras (definitivas e recomendadas), sendo que – a partir de então – toda e qualquer decisão normativa, tomada no âmbito do Foro Nacional de Normalização, passou a ser considerada Norma Brasileira Registrada (NBR).

Com relação aos projetos de construção, estes devem obedecer normas técnicas que seguem padrões internacionais de qualidade quanto à perfeição estrutural, funcional, estética e de execução eficiente, como, por exemplo, indicado por meio da NBR 13.531/1995 – que fixa as atividades técnicas de projeto de arquitetura e engenharia exigíveis para a construção de edificações; da NBR 6.120/1980 – que fixa condições exigíveis para determinação dos valores das cargas que devem ser consideradas no projeto de estrutura de edificações, qualquer que seja sua classe e destino; e da NBR 6.122/1996 – que fixa condições básicas a serem observadas no projeto e na execução de fundações de edifícios, pontes e demais estruturas).87

Com efeito, conforme disposto nos incs. I e II do art. 30 da Constituição Federal, compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual, no que couber. Acresce que, nos termos do inc. VIII do mencionado art. 30, compete, também, ao Município promover adequado ordenamento territorial, o qual pode ser entendido em toda a sua extensão (urbana e rural), a despeito de a continuação do referido inc. VIII conter a expressão “mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”.

Como no Brasil, diferentemente do que acontece com a Alemanha,88 não há um Código Federal de Construções, nem há vedação para que as instâncias locais legislem

87 Para maiores detalhes sobre a construção em imóveis rurais, confira-se o Manual de Construções

Rurais de Jorge Luiz Moretti de SOUZA (1997). Para maiores detalhes sobre normas técnicas da ABNT aplicáveis à construção civil, cfr. MEIRELLES (2013, p. 415-419).

88 Abordaremos o regime de repartição de competências urbanísticas na República Federal da Alemanha,

e mais especificamente o Regulamento Federal sobre a Utilização de Terrenos com vista à construção (Baunutzungsverordnung), no tópico 4.4.3.

sobre construções rurais, é adequado que Municípios estabeleçam normas sobre a fiscalização das edificações tanto em território urbano quanto rural.

O adequado ordenamento territorial do município pressupõe que o município tenha o poder de disciplinar o uso, a ocupação e o parcelamento do solo de todo o seu território. Um dos mecanismos para esse planejamento, previsto no texto constitucional, com relação à organização política e administrativa do município, é, por exemplo, a criação e organização de distritos que abrangem tanto o território rural ou urbano.

Para Nelson Saule Jr. (2004, p. 43), o ordenamento do território rural dos municípios e o disciplinamento do uso, da ocupação e da exploração econômica do seu território por legislações e resoluções federais ou estaduais, instituídas sem adequação a necessidades e interesses dos habitantes dos municípios, devem ser matérias obrigatórias dos Planos Diretores dos municípios, os quais devem ser formulados e executados por meio dos mecanismos de participação popular previstos para o desenvolvimento da gestão democrática da cidade.

Como ensina Kazuo Nakano (2004, p. 34), “a regulação das formas de uso, ocupação e parcelamento do solo no território municipal é, inegavelmente, de interesse local. Portanto, o município deve tomar para si a responsabilidade de exercer essa regulação que, certamente, envolverá negociações e articulações com o INCRA”.

Em consonância com tal entendimento, o Código de Edificações do Distrito Federal (Lei distrital n. 2.105/1998) é claro ao dispor, em seu art. 32, caput, que a Administração Regional (e não o Incra ou a União federal) é competente para licenciar e fiscalizar obras em área urbana e rural. Senão, vejamos:

Art. 32 - O projeto de arquitetura referente a obra inicial ou modificação em área urbana ou rural, pública ou privada, será submetido a exame na Administração Regional para visto ou aprovação.

No âmbito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), é pacífico o entendimento de que as construções em áreas rurais devem ser licenciadas pela autoridade local (distrital, que faz as vezes de autoridade municipal). Confira-se a seguinte ementa:

DIREITO ADMINISTRATIVO. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA. IRREGULARIDADE. DEMOLIÇÃO. PODER DE POLÍCIA.

I – É legítima a determinação administrativa de demolição de obra construída em espaço público sem o devido alvará, porquanto expressão do exercício regular do poder de polícia da Administração Pública.

II – O Código de Edificações do Distrito Federal impõe que toda e qualquer obra de construção ou modificação de edificações na área urbana ou rural, pública ou privada, do Distrito Federal devem ser precedidas de licenciamento na respectiva Administração Regional, sob pena de demolição, conforme artigos 51 e 178, ambos da Lei Distrital n. 2.105, de 08 de outubro de 1998.

III – Negou-se provimento ao recurso.

(Acórdão n.883787, 20130110467935APC, Relator: JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, Revisor: Vera Andrighi, 6ª Turma Cível, unânime, Data de Julgamento: 22/07/2015, publicado no DJe: 04/08/2015)

Por outro lado, caso o Município exorbite de sua competência urbanística e, por exemplo, invada competência estadual ou federal, expedindo indevidamente, de forma autista, licença ambiental, deverá ser responsabilizado, tal como indica o precedente abaixo indicado, cuja ementa transcrevemos parcialmente:

PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXECUÇÃO DE OBRA (CONSTRUÇÃO DE CONJUNTOS HABITACIONAIS) SEM LAUDO TÉCNICO DE IMPACTO AMBIENTAL, EM ÁREA LOCALIZADA NOS LIMITES DE BACIA HIDROGRÁFICA. LICENCIAMENTO ILEGAL OUTORGADO PELO MUNICÍPIO. MULTA IMPOSTA AOS RÉUS.

1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pela Associação Comunitária do Bairro Bandeirantes em face de MRV Serviços de Engenharia Ltda. e do Município de Belo Horizonte objetivando a declaração de nulidade dos processos de desmembramento, parcelamento e construção, ao argumento de que seria ilegal a autorização de construção de conjuntos habitacionais sem laudo técnico de impacto ambiental, em área localizada nos limites da Bacia Hidrográfica da Pampulha. A sentença julgou procedente o pedido. Embargos de declaração foram manejados pela Associação e acolhidos parcialmente, com efeitos modificativos, para declarar que a condenação abrange também o Município de Belo Horizonte, responsável solidariamente pelo pagamento da multa imposta e da metade das custas processuais e honorários advocatícios. Os réus apelaram. O TJMG reformou a sentença parcialmente no reexame necessário para reduzir a multa diária imposta, entendendo prejudicados os recursos voluntários.

(REsp 902.018/MG, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/09/2007, DJ 11/10/2007, p. 312)

Não se desconhece o fato de que compete à União legislar privativamente sobre direito agrário (Constituição Federal, art. 22, inc. I); todavia, não se pode desconhecer, também, que se faz necessária maior integração entre os espaços urbano e rural, sob pena de a regulação territorial ser insuficiente, ou então de duvidosa utilidade. É disso que passaremos a tratar no tópico a seguir.