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CAPÍTULO 1 MODELANDO A CIDADE

1.1 O QUE É A CIDADE?

1.1.2 O fenômeno urbano no Brasil

Em nosso país, o fenômeno urbano vincula-se à política de ocupação e povoamento da Colônia, e os estágios de evolução da urbanização correspondem aos ciclos econômicos brasileiros. A urbanização, segundo destaca Cláudia Furquim (2013, p. 37), iniciou-se nos aldeamentos indígenas, a partir do incentivo das ordens religiosas que aqui se instalaram (jesuítas, franciscanos, salesianos).

Ademais, o sistema inicial de exploração dos recursos naturais brasileiros, como por exemplo o pau-brasil, deu origem às primeiras feitorias e a alguns agrupamentos humanos com rudimento de agricultura.

No Brasil-Colônia, consoante leciona José Afonso da Silva (2012, p. 21-23), os núcleos urbanos ou vilarejos resultaram da ação urbanizadora das autoridades coloniais, e não propriamente de criação espontânea da massa. A formação de cidades e vilas era ato de iniciativa oficial, decorrente do paradoxal sistema de povoamento por meio da distribuição de terras no regime de sesmarias.

A política da Metrópole portuguesa, como bem pontua José Afonso da Silva (2012, p. 22), era contraditória, pois pretendia realizar e instaurar na Colônia o regime municipalista pela política da fundação de povoações e vilas, mas realizava uma política econômica e povoadora de distribuição de vastas terras em sesmarias, que afastava o homem, forçando-o ao isolamento e fomentando a constituição autárquica dos engenhos rurais.

A atuação do Estado brasileiro no controle das construções e no uso da propriedade, em algumas cidades, segundo o escólio de Cláudia Furquim (2013, p. 38- 39), sempre se demonstrou bastante rígida, mediante a imposição de normas de posturas municipais que especificavam, por exemplo, a altura da edificação, o tipo de construção, como deveriam ser abertas as passagens etc.

Foi, porém, somente no Império, que tivemos a primeira legislação referente à organização municipal, a qual atribuía competência aos vereadores para legislar sobre edificações, atos de polícia administrativa, poder regulamentar. Com efeito, o art. 71 da Lei de 1º de outubro de 1828, estabelecia que:

Art. 71. As Câmaras deliberarão em geral sobre os meios de promover e manter a tranquilidade, segurança, saúde e comodidade dos habitantes; o asseio, segurança, elegância e regularidade externa dos edifícios, e ruas das povoações, e sobre estes objectos formarão as suas posturas, que serão publicadas por editaes, antes, e depois de confirmadas.

No decorrer do Império, a política de formação de cidades continuou por meio de colônias militares no interior do país e de núcleos de colonização nos Estados, sendo que os aglomerados urbanos só se desenvolviam espontaneamente nas zonas mineradoras do interior e, predominantemente, no litoral do país, em virtude do tipo de economia prevalecente, voltada para o comércio exterior. Algumas malhas urbanas firmaram-se, assim, por influência da mineração (Minas Gerais e Goiás), outras sob a influência da cana-de-açúcar, no Nordeste, e das vacarias, no Sul.

Na segunda metade do século XIX, com o intenso movimento imigratório que marcou o Brasil, muitas cidades cresceram e surgiram construídas sob uma nova ordem estética trazida por italianos, ingleses, alemães entre outros. A expansão de centros urbanos impulsionou o Poder Público a estabelecer os primeiros zoneamentos, dividindo cidades maiores em bairros.

A entrada do século XX mudou a paisagem urbana, segundo leciona Cláudia Furquim (2013, p. 39-40). Na década de 1920, fora propugnado um maior controle do desenvolvimento urbano, orientado para propiciar a divisão de classes, sendo certo que muitas cidades maiores (como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife) se movimentaram no sentido de implementar normas urbanísticas, como forma de conferir desenho ordenado à cidade, fazer adaptações à malha viária e recuperar gastos implementados com a urbanização, por meio de contribuições de melhoria.

Com a Revolução de 1930, que colocou fim à República Velha no Brasil, houve o enfraquecimento político dos detentores da riqueza agrária. Nesta época, foi crescente o processo de industrialização em solo nacional. Vale destacar, também, que a construção de Brasília e a consequente mudança da Capital, em 1960, atraíram a urbanização para o interior do país.

É certo, ainda, que, a partir de meados do século XX até o início do século XXI, no Brasil, ocorreu célere migração de expressivo contingente populacional do campo para as cidades. Segundo dados estatísticos do IBGE, em 1950, a população urbana no

Brasil era de tão somente 36,16%, ao passo que 63,84% dos brasileiros viviam no campo. A cada década, em média, até o ano 2000, a população urbana cresceu 10 pontos percentuais. Em 2010, o contingente da população que vive nas cidades é de 84,36%, enquanto apenas 15,64% representam o quantitativo de nossa população rural. Soma-se a isso o impressionante aumento da população brasileira, em termos absolutos. De 1940 a 2000, houve um crescimento de quatro vezes o tamanho da população, que passou dos 41,2 milhões de habitantes para 169,8 milhões de pessoas.25

A propósito, com relação aos loteamentos fechados e condomínios urbanísticos (cujos aspectos controvertidos serão analisados no terceiro capítulo), é certo dizer que, no Brasil, segundo Caldeira (2011), as comunidades residenciais fechadas surgiram na década de 1970, para as classes alta e média em ascensão, com a construção do Alphaville, na cidade de São Paulo. Atualmente, são encontrados em todo território brasileiro como um novo estilo de vida.

Diante da velocidade e do vulto da urbanização brasileira nos últimos setenta anos, pode-se dizer que a percepção sobre a vida na cidade sofreu alterações. Na década de 1940, segundo escólio de Ermínia Maricato (1996, p. 47), as cidades eram vistas como a possibilidade de avanço e modernidade em relação ao campo, que representava o Brasil arcaico; na década de 1990, a imagem da cidade passou a ser associada a violência, poluição, criança desamparada, tráfego caótico, entre outros males. O processo de urbanização com crescimento da desigualdade resultou numa inédita e gigantesca concentração espacial da pobreza.

De todo modo, remanesce a indagação que intitula a presente seção: o que é a cidade? Vejamos algumas conjecturas doutrinárias sobre este tema.

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A respeito das transformações da rede urbana do Brasil, em densa obra publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), fica demonstrado que o crescimento da agroindústria, a urbanização na fronteira, a agricultura irrigada e os empreendimentos voltados para a exploração de recursos naturais criaram alternativas de dinamismo à crise das metrópoles industrializadas. Muitas cidades de pequeno ou médio porte apresentaram melhor desempenho nas duas últimas décadas do século XX. (Caracterização e tendências da rede urbana do Brasil: configurações atuais e tendências da rede urbana / IPEA, IBGE, UNICAMP. Brasília: IPEA, 2001).