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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 DEFICIÊNCIA DE VITAMINA D E DESFECHOS CARDIOVASCULARES

2.3.4 Deficiência de vitamina D e Insuficiência Cardíaca

Do ponto de vista epidemiológico, a prevalência e a incidência de insuficiência cardíaca (IC) na população de idosos vêm aumentando, apesar dos progressos desenvolvidos no tratamento desta condição e esta tendência pode ser atribuída tanto pelo aumento da longevidade desta população, como pelo aumento da prevalência de doenças como diabetes mellitus e obesidade. Estima-se que, em 80% dos portadores de IC acima de 65 anos morrerão em 8 anos. Nos EUA, a IC é mais comum no sexo masculino, porém, pela maior longevidade das mulheres, a descompensação, ou seja a insuficiência cardíaca congestiva (ICC) é mais comum no sexo feminino (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2009; CHEN et al., 1999; MOKDAD et al., 2001). Em estudo de base populacional americano, a prevalência de IC foi de 2,2% (IC 95 de 1,6% para 2,8%), passando de 0,7% em pessoas com

idades entre 45 a 54 anos e para 8,4% para aqueles com idade maior ou igual a 75 anos (REDFIELD et al., 2003).

Entre os fatores de risco independentes associados à IC, encontram-se a idade avançada, sexo masculino, diabetes mellitus, pressão de pulso e IAM, encontrados por Chen et al. (1999), avaliando 1.749 idosos da coorte Established

Populations for Epidemiologic Studies of the Elderly (EPESE). Dados do

estudo MESA (Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis) demonstram que diabetes e hipertensão são os fatores de risco responsáveis pela maior incidência de IC em afro-americanos. Neste mesmo estudo, interleucina 6, ou proteína C reativa, e macroalbuminúria foram preditores independentes do desenvolvimento de IC (BAHRAMI et al., 2008).

Outro fator de risco para IC é a disfunção diastólica, bastante prevalente nos idosos, sendo considerada importante indicador prognóstico de várias doenças cardíacas e relacionada ao desenvolvimento da fibrilação atrial. A disfunção diastólica sintomática pode ocorrer associada à disfunção sistólica do VE ou ser determinante da IC com função sistólica preservada (ICFEP), ou seja, com fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) acima de 50% (GOTTDIENER et al., 2002; GROSSMAN, 2000; TSANG et al., 2002).

A IC, como síndrome clínica complexa de caráter sistêmico, tem como mecanismos responsáveis pelo quadro clínico a disfunção sistólica, diastólica ou ambas, acometendo um ou ambos os ventrículos (BOCCHI et al., 2012). De acordo com a European Cardiology Society (2000), os pacientes com IC podem ser classificados em dois tipos, como IC com fração de ejeção preservada (ICFEP) ou também chamada IC diastólica (ICD), e aqueles com IC com fração de ejeção reduzida (ICFER), mais conhecida como IC sistólica (ICS) (EUROPEAN CARDIOLOGY SOCIETY, 2000). Apesar da ICFEP ter sido considerada como benigna por longo tempo, os estudos epidemiológicos demonstraram que o prognóstico desses pacientes é tão ruim como o daqueles que apresentam IC sistólica (ICS) (BHATIA et al, 2006; FONTES-CARVALHO; LEITE-MOREIRA, 2011; TRIBOUILLOY et al., 2008), salientando-se que no idoso, a disfunção diastólica precede habitualmente a disfunção sistólica e inclusive o desenvolvimento de hipertrofia ventricular esquerda. A proporção de insuficiência cardíaca diastólica nessa população é elevada, podendo corresponder a 40 a 50% dos casos nos indivíduos acima de 75 anos, com aproximadamente 30-50% das internações

hospitalares atribuídas à IC descompensada ocorrerem em pacientes sem disfunção sistólica (DAUTERMAN et al., 2001; GOLDRAICH et al., 2010; PEYSTER; NORMAN; DOMANSKI, 2004).

Em decorrência do progressivo envelhecimento populacional, a ICFEP é responsável por cerca de 50% de todos os doentes internados com IC, assim como pelo aumento da prevalência desta condição, associado com a maior tendência de hipertensão arterial, diabetes e obesidade(FONAROW et al., 2007; MOUTINHO et al., 2008; OWAN et al., 2006; YANCY et al., 2006). No Brasil, também a ICFEP também demonstrou ter prevalência similar aos demais estudos da literatura, com Moutinho et al. (2008), demontrando esta condição em 64,2% dos idosos atendidos em comunidade com diagnóstico de IC e Goldraich et al. (2010), avaliando 721 internações consecutivas por IC descompensada em idosos, encontraram que 31% destes pacientes tinham FEVE preservada, com a disfunção diastólica identificada mais frequentemente, apresentando características clínicas preditivas como idade mais avançada, sexo feminino, etiologia não-isquêmica, fibrilação atrial crônica, anemia, pressão de pulso elevada e complexos QRS estreitos.

Vários trabalhos demonstraram associação entre o papel da vitamina D com mecanismos desencadeadores da IC, tais como modulação pelo SRAA, envolvida com a hipertrofia ventricular esquerda, ação reguladora das metaloproteinases da matriz extracelular na remodelação da matriz extracelular do miocárdio (AFZAL; BOJESEN; NORDESTGAARD, 2013; ARTAZA; MEHROTRA; NORRIS, 2009; COVIC; VORONEANU; GOLDSMITH, 2010; KHALILI; TALASAZ, A. H.; SALARIFAR, 2012; MICHOS; MELAMED, 2008; NIBBERLINK et al., 2007; PILZ et al., 2008a; POTTEAUX et al, 2004; TIMMS et al., 2002), como também relatada a atuação do calcitriol na regulação e equilíbrio das células Treg e Th17 (MA, 2015).

Estudos com suplementação de vitamina D no tratamento da ICC demonstraram diminuição das concentrações séricas defator de necrose tumoral alfa (TNF-α), uma citocina inflamatória e o aumento das concentrações de interleucina (IL) 10, uma citocina anti-inflamatória, sugerindo que a vitamina D tem efeitos cardioprotetores (POTTEAUX et al., 2004; TORRE-AMIONE, 2005). Entretanto, Schleithoff et al. (2006), não encontraram efeito da vitamina D sobre a função ventricular esquerda em relação ao tratamento com placebo em homens com ICC, porém as concentrações de TNF alfa foram suprimidas e as de IL-10 aumentadas, assim como o PTH, que está relacionado à hipertrofia dos cardiomiócitos, também

foi reduzido após suplementação com vitamina D, concluindo que a vitamina D pode servir como um agente antinflamatório e desta forma podendo ser útil para o tratamento da ICC.

Importantes estudos abordaram a deficiência de vitamina D associada à IC, como o estudo prospectivo, LURIC, realizado com 3.299 pacientes com diagnóstico de doença cardiovascular e grande prevalência de disfunção miocárdica identificada por angiografia coronariana e ventriculografia. A essas alterações esteve associada deficiência grave de vitamina D, com risco de morte três a cinco vezes maior por insuficiência cardíaca e morte súbita durante um período de sete anos. Calcitriol e calcidiol foram ambos (p<0,001) inversamente relacionados com déficit da função ventricular esquerda e também baixos níveis de calcidiol e calcitriol foram associados com maior Classe NYHA (PILZ et al., 2008a).

O padrão geométrico do VE tem grande importância no desenvolvimento de IC, com evidências revelando que a hipertrofia concêntrica é o padrão geométrico ventricular mais associado à progressão para IC, e em especial, para sua forma diastólica (MELENOVSKY; BORLAUG; ROSEN, 2007; DE SIMONE et al., 2008), tendo sido utilizado por Fall et al. (2012), avaliando 870 idosos oriundos do estudo PIVUS, na Suécia. Estes idosos, sem doença cardiovascular prévia tiveram um seguimento de 5 anos, e esta pesquisa, com objetivo de estudar a doença cardíaca subclínica, utilizando medidas de geometria e função miocárdica pela ecocardiografia e dosagens séricas de 25(OH)D, encontrou que altas concentrações de vitamina D (>75 nmol\L) foram associadas com melhor função sistólica do VE (FEVE, fração de encurtamento) e menor diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo( DSFVE) (FALL et al., 2012).