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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 DEFICIÊNCIA DE VITAMINA D E DESFECHOS CARDIOVASCULARES

2.3.6 Deficiência de Vitamina D e Arritmia

Na população geriátrica, em decorrência das alterações estruturais do miocárdio atrial, são muito prevalentes as arritmias supraventriculares, que tendem a aumentar com o envelhecimento, sendo a Fibrilação Atrial (FA) a arritmia mais frequente na prática clínica, com prevalência global de 1% a 2% da população geral, com incidência aumentada nas últimas décadas, em decorrência do envelhecimento da população e pela maior prevalência dos fatores de risco cardiovascular tais como hipertensão arterial, diabetes mellitus e obesidade (LIP; TSE; LANE, 2012; 1982; MIYASAKA et al., 2006; PICCINI et al., 2012).

A FA tem sua prevalência aumentada com a idade (0,4% a 1% por cada aumento da idade), do que decorre sua relevante importância na saúde pública, devido a promover aumento do risco de mortalidade, AVC e IC e, consequentemente, aumento do número de internações (FALK, 2001; GO et al., 2001; MIYASAKA et al., 2006; PATEL et al., 2014), principalmente entre as idades de 80 a 89 anos, com aumento de quase 25% no risco de acidente vascular cerebral isquêmico (WOLF; ABBOTT; KANNEL, 1991). Vale ressaltar que o fato de idade ≥ 75 anos, por si só é considerada um importante fator de risco em esquemas de estratificação de risco para AVC, respondendo por dois pontos no sistema de pontuação CHA2DS2-VASc , acrônimo de “Congestive heart failure, Hypertension, Age, Diabetes mellitus, Stroke, Vascular disease, Age, Sex category” (LIP et al, 2010). Há estimativas de que a prevalência da FA, por conta do envelhecimento populacional dobre nos próximos 50 anos (DISERTORI et al., 2011; MIYASAKA et al., 2006; MOZAFFARIAN et al., 2016; PATEL et al., 2014). Na União Européia, há estimativas de que entre 2010-2060, o número de adultos de 55 anos ou mais com FA será maior que o dobro, com importantes implicações para a saúde pública (KRIJTHE et al., 2013).

As taquiarritmias atriais subclínicas foram associados com 5,6 vezes maior risco de FA e por aproximadamente 13% dos acidentes vasculares cerebrais isquêmicos por embolia (MOZAFFARIAN et al., 2016). A evolução clínica dos pacientes com IC é frequentemente complicada por taquiarritmias

supraventriculares, que podem ocorrer nos casos de doença miocárdica estrutural dos átrios ou quando estes encontram-de dilatados em decorrência de alterações de pressão ou sobrecarga de volume dos ventrículos direito e esquerdo, sendo a FA a arritmia atrial tratável mais comum na IC, acometendo 10% a 30% dos pacientes com esta condição clínica, como também associada a uma redução na capacidade de exercício e um pior prognóstico a longo prazo (JESSUP et al., 2009; QASEEM; SNOW; SHEKELLE, 2008).

No importante estudo prospectivo Copenhagen Stroke Study, analisando 1.197 pacientes com AVC agudo em admissão hospitalar, 18% destes tinham FA, que aumentou acentuadamente com a idade, chegando a mais de 40% nos pacientes com idade ≥ 90 anos. A FA foi associada, além da idade, com DAC, AVC, pressão arterial sistólica e com maior tempo de internação e mortalidade, assim como a uma chance duas vezes maior de demência, atribuída aos infartos cerebrais silenciosos, no estudo prospectivo de Rotterdam (JØRGENSEN et al., 1996). Em estudo mais recente, o ENGAGE AF-TIMI 48 (Effective Anticoagulation with Factor

Xa Next Generation in AF-Thrombolysis in Myocardial Infarction 48 study) ECHOCARDIOGRAPHIC SUBSTUDY, avaliando 21.105 indivíduos com FA não

valvular, foi demonstrado que maior dimensão do VE, pressão de enchimento final ventricular esquerdo (PDFVE) e índice do volume diastólico final do ventrículo esquerdo foram significativamente associados com risco aumentado de morte, valorizando a importância da estrutura atrial esquerda como fator desencadeante para FA (GUPTA et al., 2016).

No Brasil, apesar haver poucos estudos epidemiológicos finalizados concernentes à FA, as Diretrizes da SBC divulgaram dados de cerca de 1,5 milhão de indivíduos com FA no País (ALMEIDA et al., 2015; ZIMERMAN et al., 2009) e em estudo transversal retrospectivo, realizado com 407 pacientes atendidos com FA e Flutter atrial em hospital de emergência avaliou-se o tipo de FA e Flutter comparando com perfil de comorbidades, risco de eventos tromboembólicos e uso de anticoagulantes. O achado deste estudo revelou que nos pacientes com FA persistente, houve maior prevalência de idosos, em relação à FA paroxística, assim como nos pacientes com FA permanente e Flutter atrial apresentaram maior diâmetro atrial, menor fração de ejeção ventricular esquerda, maior prevalência de AVC e de IC comparando-se com aqueles com FA paroxística (ALMEIDA et al., 2015).

A associação entre FA e deficiência de Vitamina D foi avaliada em vários estudos (CHEN et al., 2014; DEMIR; UYAN; MELEK, 2014; FROST et al., 2002; HANAFY; CHANG, 2014; MURPHY et al., 2004; RIENSTRA et al., 2011; THOMPSON et al., 2015; VITEZOVA et al., 2015) abordados a seguir. Grandes estudos populacionais, como na Escócia, com 68.045 indivíduos, principalmente idosos (MURPHY et al., 2004) e na Dinamarca, com 32.992 habitantes, em torno de 13 anos de seguimento (FROST et al., 2002), tem mostrado que a FA é mais incidente nos meses de inverno e que é reduzida no verão, compatível com a sazonalidade sinusoidal dos níveis de vitamina D, também demonstrado no

Cardiovascular Health Study (SHOBEN et al., 2011).

Outros dois estudos, em 2014, foram favoráveis à associação de deficiência de vitamina D e fibrilação atrial. Demir, Uyan e Melek (2014) avaliaram a relação entre a deficiência de vitamina D e fibrilação atrial (FA), comparando-se níveis de 25(OH)D nos pacientes com FA não valvular, valvular e grupo controle em ritmo sinusal e obtiveram, como resultado, uma associação inversa entre a deficiência de vitamina D e fibrilação atrial não valvar. No mesmo ano, Chen et al. (2014) também avaliaram a associação de baixos níveis de vitamina D e fibrilação atrial, em 162 chinese com FA não valvular persistente, sem nenhuma outra doença cardiovascular, comparando-se com indivíduos saudáveis. Como resultados, os níveis de 25(OH)D foram significativamente inferiores nos pacientes com FA não valvular em relação ao grupo controle, assim como a PCR de alta sensibilidade e o diâmetro médio do átrio esquardo também foram maiores nos pacientes com FA não valvar. Os níveis de vitamina D tiveram correlação negativa com com o diâmetro do átrio esquerdo, com a pressão sistólica na artéria pulmonar e com nível de PCR de alta sensibilidade, consequentemente, concluindo-se que a FA está associada com baixos níveis de vitamina D.

Vitezova et al. (2015), analisando a coorte prospectiva do Rotterdam Study, com 7.983 habitantes da cidade holandesa de Roterdam, com seguimento em torno de 12 anos, não encontrou associação entre níveis de vitamina D e FA em idosos. Similar ao Estudo de Rotterdam, outros estudos não encontraram associação positiva entre vitamina D e FA (QUAYYUM et al., 2012; RIENSTRA et al., 2011; SMITH et al., 2011), no entanto estes últimos estudos foram submetidos às críticas quanto a erros de metodologia tais como a questão da sazonalidade, tipos de

medidas de conversão laboratoriais, população estudada, entre outras (THOMPSON et al., 2015).

Quanto ao mecanismo fisiopatológico da FA, apesar de não totalmente elucidado, cogita-se que o processo de remodelação estrutural e eletrofisiológico do átrio desempenhe um importante papel, tendo a inflamação como um fator desencadeante para esta remodelação, provocada pelo estresse oxidativo, causado pela formação de espécies reativas de oxigênio (EROs), assim como desencadeado pela própria FA, gerando um circuito de perpetuação da arritmia (THOMPSON et al., 2015).