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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.4 DEFICIÊNCIA DE VITAMINA D E OUTROS FATORES DE RISCO CARDIOVASCULAR

2.4.6 Deficiência de Vitamina D e Etilismo

O alcoolismo, pelo National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA), de 2016, é um dos principais problemas de saúde pública no mundo, não apresentando um padrão homogêneo em sua etiologia, quadro clínico e evolução, e, principalmente com o crescimento da população idosa, o diagnóstico e tratamento deste transtorno se tornam cada vez mais importantes e justificam a elaboração de um programa terapêutico específico para esse segmento da população.

Segundo dados do National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (2016), a prevalência do alcoolismo nos EUA é de cerca de 6,8% em adultos, que inclui 16,3 milhões de pessoas, entre essas com 9,2% em homens; é a quarta causa de mortalidade evitável, com cerca de 88.000 mortes ao ano, com altos custos (US$ 249 bilhões) aos cofres públicos nos EUA em 2010. A dependência de álcool acomete de 10% a 12% da população mundial e 11,2% dos brasileiros que vivem

nas 107 maiores cidades do país, segundo levantamento domiciliar sobre o uso de drogas (MARQUES; RIBEIRO, 2002).

Na população idosa, 40% dos indivíduos consomem bebidas alcoólicas e o alcoolismo severo está associado ao agravamento de condições mórbidas como diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca, doença hepática crônica, osteoporose, declínio cognitivo e transtornos do humor, além do fato de que os idosos têm sensibilidade aumentada ao álcool, com maior risco de quedas, acidentes automobilísticos e outros traumatismos não intencionais e maior risco de interações medicamentosas (NATIONAL INSTITUTE ON ALCOHOL ABUSE AND ALCOHOLISM, 2016).

Avaliando-se os efeitos cardiovasculares em relação ao consumo alcoólico regular usual e o excessivo e isolado (consumir de oito ou mais doses de bebidas alcoólicas de uma só vez) em 1.154 indivíduos canadenses do estudo prospectivo

The Manitoba Health Services Commission (Manitoba Health), os autores

encontraram que o consumo excessivo de álcool aumenta o risco de doença cardíaca coronariana em homens e mulheres, porém aumenta o risco de hipertensão em homens, mas não em mulheres. Em contraste, beber de forma regular normal teve efeitos cardioprotetores significativos em ambos os sexos, e como proteção para DAC ocorreu apenas em homens com uso de mais de 18,1 g de álcool por dia (MURRAY et al., 2002).

Metanálise de 6 estudos observacionais com objetivo de avaliar as evidências na literatura sobre a associação do padrão de consumo alcoólico e risco de DAC, com os autores encontrando que os indivíduos que fizeram uso regular de álcool tiveram um risco de DAC menor que aqueles com uso irregular e excessivo, com a relação dose-resposta entre a quantidade de ingestão alcóolica e o risco de DAC diferente entre etilistas com alto consumo de forma regular e irregular, com curva em forma de jota, com dose protetora de 131 gramas por semana de álcool (BAGNARDI et al., 2008).

Outro estudo relacionando consumo de álcool e DAC em dois países com estilos de vida contrastantes, Irlanda do Norte (Belfast) e França, avaliou 9.778 participantes, oriundos da coorte prospectiva de IAM, o Estudo Epidemiológico Prospectivo de Infarto do Miocárdio (PRIME), com seguimento de 10 anos tendo como desfechos IAM, morte por DAC e angina, resultando em informações de que a média de consumo de álcool foi 22,1 gr na Irlanda e 32,8 gr na França, porém com

incidência de IAM e morte por DAC foi de 5,63 e 2,78 respectivamente, assim como apenas o consumo de vinho foi associado com menor risco de eventos coronarianos mais graves (IAM e morte por DAC), concluindo os autores que o padrão típico de consumo regular em homens de meia idade da França está associado a um baixo risco de DAC, enquanto o padrão compulsivo irlandês confere um risco mais elevado (RUIDAVETS et al., 2010).

As evidências contidas nos estudos denotam a presença de associação em curva de jota ou em forma de U entre o consumo de álcool e IAM, hipertensão arterial e diabetes mellitus tipo 2, condições estas que são relevantes preditoras de risco de IC, por conseguinte, o consumo alcoólico excessivo demonstrou aumentar o risco de IC, enquanto o cosumo leve a moderado, ou seja, 1 dose por dia para mulheres e até duas doses ao dia para homens foi associado a um menor risco de IC (KLONER; REZKALLA, 2007).

Apesar de estudos de cunho epidemiológico demonstrarem efeitos deletérios secundários ao consumo abusivo de álcool, a maioria tem relatado benefícios cardiovasculares associados ao consumo leve a moderado de álcool, com menor risco para Insuficiência Cardíaca (ABRAMSON et al., 2001; BRYSON et al., 2006; KLONER; REZKALLA, 2007; WALSH et al., 2002). Em relação ao risco de IC por cardiomiopatia alcoólica com antecedentes de DAC, também houve benefícios da ingestão leve a moderada de álcool, com redução de 40% a 50% do risco de IC com passado de IAM, assim como quando comparando-se os indivíduos com padrão de consumo excessivo sem passado de IAM, o risco de IC foi maior em relação aos abstêmios (KLATSKY et al., 2005). Outro importante estudo avaliando o risco de IC em pacientes com passado de IAM relacionado ao padrão de ingestão alcoólica foi

Physicians' Health Study (PHS), realizado com 21.601 médicos do sexo masculino

livres de IC com relato sobre o consumo de álcool, com seguimento médio por 18,4 anos, resultando em taxas de incidência de IC de 25,0; 20,0; 24,3 e 20,6 casos por 10.000 pessoas ao ano, para os grupos de consumo de álcool de <1, 1-4, 5-7 e >7 doses por semana, respectivamente, demonstrando associação entre o consumo alcoólico e redução do risco de IC, principalmente com passado de IAM, sugerindo efeitos benéficos do álcool sobre a DAC (DJOUSSE; GAZIANO, 2007).

O consumo excessivo de álcool é considerado a principal causa de cardiomiopatia dilatada não isquêmica nos Estados Unidos da América, em ambos os sexos e em todas as raças, ressaltando-se que esta cardiomiopatia alcoólica,

específica do miocárdio, cursa com fase assintomática e outra sintomática, com o risco de desenvolvimento para a fase assintomática por um consumo alcoólico acima de 90 gr diárias (cerca de 7 a 8 doses ao dia), durante mais de 5 anos. Com o progredir da ingesta alcoólica vai haver a evolução para a forma sintomática, com sinais e sintomas IC (PIANO, 2002). De modo similar às cardiomiopatias dilatadas de outras etiologias, a cardiomiopatia alcoólica é caracterizada por alterações como a dilatação e aumento da massa do ventrículo esquerdo, com paredes ventriculares de espessura normal ou reduzida. No entanto, ao contrário de outras cardiomiopatias, não há critérios histolopatológicos, laboratoriais ou de qualquer outro tipo que, pela sua especificidade, nos permitam classificar inequivocamente uma cardiomiopatia como sendo de etiologia alcoólica (MIRANDA, 2014).

Alguns estudos realizados evidenciaram associação significativa entre consumo de álcool e arritmias principalmente as supraventriculares com a fibrilação atrial como a mais frequente (DJOUSSE et al., 2004; FROST; VESTERGAARD, 2004; MUKAMAL et al., 2005).

Deste modo, baseando-se em informações consistentes na literatura, os padrões de consumo alcoólico vão determinar a associação entre etilismo e risco cardiovascular, com o consumo excessivo de bebidas alcoólicas relacionadas a piores defechos cardiovasculares, enquanto que o padrão de consumo leve a moderado confere proteção cardiovascular (ELLISON, 2005; EVANS et al., 2007; O’KEEFE; BYBEE; LAVIE, 2005; TOLSTRUP et al., 2006).

Além das alterações cardiovasculares provocadas pelo alcoolismo, o fígado também é acometido, com a doença hepática alcoólica (DHA), induzida pelo etanol e/ou seus metabólitos, representando grave afecção desencadeada pelo próprio homem e relacionada com diversos fatores biológicos, clínicos, epidemiológicos e psicológicos, com alta incidência em quase todos os países, inclusive no Brasil, sendo a causa mais frequente de disfunção hepática nos Estados Unidos (MINCIS, M.; MINCIS, R., 2010). A DHA, provoca o desenvolvimento da osteodistrofia hepática (OH), que é caracterizada por ser uma doença osteometabólica, com osteopenia e osteoporose, com prevalência de 12 a 55% em diferentes estudos (BOTINA et al., 2011). Vale salientar que a doença hepática alcoólica, além de causar a osteodistrofia hepática também cursa com deficiência de vitamina D e queda dos níveis de cálcio (MOREIRA; DUARTE; FARIAS, 2004).

Em pesquisa para analisar a relação entre deficiência de vitamina D e mortalidade em etilistas em 128 pacientes, com seguimento de 40 meses, incluindo estado nutricional através de percentuais de gordura e massa magra em diferentes compartimentos corporais, encontrou-se que os níveis mais baixos de vitamina D foram observados em doentes com pior função hepática, com menor massa magra, assim como nos indivíduos não cirróticos, os baixos níveis de vitamina D estiveram associados com maior mortalidade a longo prazo (QUINTERO-PLATT et al., 2015). Estes autores justificam os possíveis efeitos do alcoolismo no aumento da mortalidade relacionada com a deficiência de vitamina D em decorrência da atuação direta do etanol nos órgãos vitais como fígado, coração, sistema imune e sistema nervoso central, assim como por deficiência da vitamina D, a qual está relacionada à mortalidade por todas as causas (WANG et al., 2008), por disfunção hepática na síntese de vitamina D, nos distúrbios de absorção desta vitamina (SONG, ROCKEY, 2013) e por fibrose hepática progressiva na deficiência de vitamina D (ABRAMOVITH; DAHAN-BACHAR; SHARVIT, 2011).