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3. Os direitos fundamentais da criança e do adolescente

3.1 Apontamentos a respeito dos direitos fundamentais

3.1.2 Análise dos direitos fundamentais da criança e do adolescente à luz da Doutrina

3.1.2.5 Direito à convivência familiar e comunitária

O Preâmbulo da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança ao mencionar a família declara que os Estados-partes estão "convencidos de que a família como elemento básico da sociedade e meio natural para o crescimento e o bem-estar de todos os seus membros e em particular das crianças, deve receber a proteção e assistência necessária para poder assumir plenamente suas responsabilidades na comunidade".

O direito à convivência familiar e comunitária está previsto na Constituição de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, demonstrando a preocupação do legislador brasileiro em assegurar um saudável desenvolvimento físico, psíquico e social de crianças e adolescentes.

Esse direito pressupõe que a família e a comunidade são capazes de proporcionar à criança e ao adolescente a proteção e a efetivação dos outros direitos fundamentais, próprios à condição da pessoa em desenvolvimento.

O direito à família natural é inerente a todo ser humano. É na família que ocorrem os primeiros contatos das crianças e adolescentes com a sociedade e é neste ambiente que se dá a formação da personalidade. É papel da família amparar, educar e cuidar das suas crianças e adolescentes, proporcionando-lhes uma vida digna. E é dever do Estado assistir e orientar as entidades familiares na efetivação desses direitos fundamentais especiais da infância e adolescência.

O ambiente familiar adequado é aquele que proporciona às crianças e adolescentes condições materiais, morais e afetivas para o seu pleno desenvolvimento, sem discriminações.

À luz da Doutrina da Proteção Integral, é direito fundamental das crianças e dos adolescentes serem criados no seio de sua família natural e, excepcionalmente, em família substituta, exclusivamente quando tal medida for essencial à proteção do menor.

Quando não for possível a convivência com a família natural e quando o convívio na família natural expõe crianças e adolescentes a situação de risco, não sendo eficaz a aplicação de qualquer outra das medidas protetivas estabelecidas no artigo 101, do ECA, a criança ou adolescente poderá ser colocada em família substituta.

Nesse sentido, temos a posição de Valter Kenji Ishida: “(...) verificada a impossibilidade de reintegração familiar e o prolongamento do abrigamento, procede-se à colocação em família substituta”.73

Diante da absoluta impossibilidade do convívio familiar, poderá haver a suspensão ou perda do poder familiar, sendo necessário que o Estado aplique medidas de promoção, proteção e defesa, até que possa ser restabelecido o convívio familiar saudável, ou que seja encontrada uma família substituta.

A família substituta é aquela que irá suprir, no lugar da família natural, as necessidades da criança e do adolescente, sejam materiais, educacionais, ou afetivas, atuando como se natural o fosse.

A medida de colocação do menor de idade em família substituta é excepcional, aplicada nos casos de orfandade e/ou abandono, bem como nos casos de destituição do poder familiar.

A perda ou a suspensão do poder familiar ocorre nos casos de castigo imoderado, abandono e prática de atos contrários à moral e aos bons costumes ou descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos filhos menores, ou a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Ressalte-se que, mesmo nestes casos de perda do poder familiar, o legislador procurou manter as crianças e adolescentes no seio da família natural, uma vez que dá a oportunidade aos pais que perderam esse poder, ainda que em caráter temporário, a garantia de tentar reverter a situação, desenvolvendo um ambiente familiar saudável.

Acrescente-se como importante forma de proteção o abrigo, que é a entidade que acolhe a criança e o adolescente em situação de risco, impossibilitados de serem mantidos na sua família natural ou substituta. Essa medida de proteção é de caráter excepcional e temporário, sendo que os dirigentes dos abrigos são co-responsáveis pela reinserção da criança ou do adolescente no convívio familiar e comunitário.

O direito à convivência comunitária de crianças e adolescentes consiste no contato com os membros do grupo social e se dá por meio da condução à escola, ao clube, a cursos, passeios, etc. Esse direito deve ser garantido quando a criança ou adolescente está inserida no seio familiar e também quando estiver abrigada sob a proteção do Estado.

Assim, os abrigos devem ter planos individualizados para cada criança ou adolescente abrigado, no intuito criar condições para a volta ao

convívio familiar, mesmo que seja em família substituta, bem como deve propiciar a convivência comunitária.

A colocação em família substituta pode ocorrer por meio de 3 (três) modalidades quais sejam, a tutela, a guarda e a adoção.

A guarda é a primeira forma de colocação em família substituta até que se dê um destino definitivo ao menor de idade. A guarda é o resguardo, direção e educação. Essa medida é tratada nos artigos 33 a 35, do ECA.

Já a tutela, tratada nos artigos 36 a 38, do ECA e busca o suprimento quando da falta de poder familiar, seja por perda ou suspensão. Implica necessariamente o dever de guarda. É deferida ao adolescente até os 18 (dezoito) anos incompletos.

A adoção é ato jurídico no qual a criança ou o adolescente passa a ser, permanentemente, filho do adotante. É tratada nos artigos 39 a 52, do Estatuto. A adoção é medida de efeitos ilimitados, que leva ao completo e irretratável desligamento do adotado de sua família natural, passando a integrar, para todos os efeitos, a família adotiva. Alerte-se que o filho adotivo, constitucionalmente, é considerado igual aos filhos naturais da família adotiva.

As funções principais dessas medidas são a garantia de desenvolvimento de criança e adolescente em um ambiente familiar e reintegração à comunidade, o que não foi possível por meio da família natural.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, no caso da colocação de crianças e adolescentes em família substituta, dá preferência aos familiares, desde que sejam capazes de retirá-las da situação de risco em que se encontram. Assim, o simples parentesco não basta. Há necessidade de comprovação de vínculos de afinidade e afetividade, bem como a de que a colocação da criança ou do adolescente com seus familiares realmente lhe trará vantagens. Essa comprovação é feita por meio de avaliação psicossocial dos adultos e da criança e do adolescente. Ressalte-se que petizes e jovens não são entregues a pessoas que não estejam com perfeita saúde física e mental, ainda que sejam familiares.

Na colocação em família substituta sempre é levada em consideração a personalidade das pessoas que pretendam ter a guarda, a tutela ou adotar. Serão analisadas as suas condições sociais, afetivas e psicológicas, verificando se com a entrega da criança ou adolescente, a situação de risco que se encontra irá cessar.

A adoção, preferencialmente, deve ser concedida a brasileiros. Assim, a adoção por família estrangeira é medida excepcional, como última opção de acolhimento da criança e do adolescente. Note-se aqui que, o legislador procurou proteger a integridade dos jovens de pessoas mal intencionadas, visando evitar o tráfico e a corrupção de crianças e adolescentes, os abusos sexuais, o aliciamento para prostituição infantil, a venda, o sequestro, dentre outros crimes praticados contra crianças e adolescentes.

Sob o enfoque da Doutrina da Proteção Integral, a lei procura manter os filhos, sempre que possível, na companhia dos pais biológicos, mesmo que tenham baixa renda, tendo o Estado o dever de garantir a efetivação dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes e proporcionar condições para que as famílias pobres possam dar a seus filhos menores um desenvolvimento saudável.

Assim, é importante salientar que, a condição socioeconômica não é razão para que os pais venham a perder o poder familiar, como ocorreu no passado, devendo o Estado agir, a fim de preservar os vínculos das famílias com seus filhos.74

Em resumo, podemos afirmar que o sistema constitucional visa sempre a preservação da convivência na família natural, sendo que, em último caso, uma criança ou adolescente deve ser institucionalizado, ou seja, abrigado. E, quando isso ocorrer, deverá ser em caráter excepcional e transitório, devendo ser tentada a volta para a família natural. Na falta ou na ausência de condições

74Artigo 23, do Estatuto da Criança e do Adolescente: “A falta ou a carência de recursos materiais

não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar.

Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.”

dessa família natural de proporcionar o desenvolvimento saudável de seus filhos, o caminho é colocá-los numa das modalidades de família substituta, ficando para em último caso, a colocação em família substituta estrangeira.

Com essa visão constitucional do direito fundamental da liberdade de convivência familiar e comunitária é que a família, a sociedade e o Estado po- dem garantir a proteção integral às crianças e adolescentes.