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Terceirização de serviços: Da sua inconveniência social para o acesso ao pleno trabalho

4. O direito à educação profissional e as políticas públicas de efetivação

4.3 Terceirização de serviços: Da sua inconveniência social para o acesso ao pleno trabalho

A terceirização visa a contratação das atividades acessórias, ou seja, as empresas passam a focar a sua finalidade e delegam a terceiros a execução das atividades-meio. A terceirização possui caracteres próprios que a particularizam, especialmente o de conferir a eficácia organizacional à pessoa jurídica terceirizante. Deve ser considerada como uma espécie do gênero contrato, não apenas de mão-de-obra, mas também de produção de bens.

A terceirização não está definida em lei, nem há, até o momento, regularização do assunto. Trata-se, na verdade, de uma estratégia na forma de administração das empresas, que tem por objetivo organizá-la e estabelecer métodos da atividade empresarial.

Devido a essa problemática, vê-se uma perigosa combinação de omissão legislativa no tocante às limitações da terceirização, com uma atuação legiferante forjada em casuísmos evidentes, alargando as permissividades de contratação indireta de mão-de-obra.

Com efeito, temos que é importante tecer algumas considerações sobre a terceirização de serviços. Como já dito, não há regulamentação em lei, porém, atualmente, a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que trata da terceirização:

“Contrato de Prestação de Serviços – Legalidade: I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20-06- 1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).”

Importante frisar que na terceirização vale o princípio da primazia da realidade, não podendo se constituir na simples outorga de mão-de-obra como burla à legislação trabalhista. Entretanto, tal situação é o que vem ocorrendo na

prática, fato que retira os direitos fundamentais dos trabalhadores e acaba por colocá-los na informalidade.164

Dessa forma, a terceirização se demonstra inconveniente para a sociedade uma vez que os trabalhadores terceirizados têm salários, benefícios e condições de trabalho inferiores, caracterizando uma precarização do trabalho.

Da maneira como a terceirização vem sendo empregada na prática podemos apontar como desvantagens para o trabalhador a perda do emprego, no qual tinha remuneração certa por mês, passando a ter uma remuneração incerta; a perda dos benefícios sociais decorrentes do contrato de trabalho e das normas coletivas da categoria e também o custo das demissões que ocorrem na fase inicial. A aplicação distorcida desse fenômeno tem provocado uma enorme concentração de renda na sociedade brasileira, tornando a classe trabalhadora ainda mais pobre e excluindo grandes massas do mercado de trabalho.

Assim, concluimos que a terceirização afeta de maneira negativa a evolução econômica do País, vez que da maneira em que vem sendo empregada na prática converte-se numa mera estratégia de maximização de lucros, provocando o indesejável efeito da concentração de rendas.

164 Márcio Pochmann, professor de economia da UNICAMP e consultor da OIT para a área de

relações de trabalho, analisou no artigo “Trabalho legal, ilegal e alegal”, publicado no Jornal do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP, edição de abril/maio de 2003, o impacto das políticas públicas de corte neoliberal implementadas no Brasil desde 1990.

Em uma das suas conclusões, quando comentava sobre a reforma trabalhista preconizada atualmente, referiu-se à participação da Terceirização nesse processo nos seguinte termos: „Do ponto de vista prático, é possível dizer que o Brasil fez, sim, uma profunda e avassaladora reforma trabalhista. O fenômeno da Terceirização na década de 90 reduziu salários e direitos trabalhistas, passaram a conviver trabalhadores de diferentes classes, direitos e salários.‟

Em outro trecho, Pochmann analisa o comportamento das ocupações não assalariadas no período de 1989 a 2001, relacionando suas causas ao fenômeno da Terceirização: „O comportamento das ocupações não assalariadas, responsáveis por 73,4% das novas ocupações entre 1989 e 2001, foi mais significativo no setor de comércio e serviços. Assim como, em menor proporção no setor industrial. Mesmo no setor industrial, verifica-se um aumento da sua participação no total de trabalhadores não assalariados, de 12,7% para 15,3%, o que se deve provavelmente ao impacto da Terceirização predatória realizada em vários setores.

Pochmann ainda atribui a fenômenos como a Terceirização, combinada com o baixo crescimento econômico, o inchaço do setor não-estruturado da economia, que segundo o critério proposto pela Organização Internacional do Trabalho – OIT e pela Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – CEPAL, é o segmento das micro e pequenas empresas e boa parte do trabalho autônomo.

O economista, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD, demonstra que as ocupações que mais cresceram no Brasil dos anos noventa foram as autônomas deste setor não-estruturado e que a saturação desse setor ocasionou a regressão da sua renda média.

Esses efeitos negativos demonstram claramente a frontal agressão aos interesses da coletividade. Daí a premente necessidade de dar à terceirização o tratamento normativo adequado, reservando sua aplicação apenas às situações nas quais ela é socialmente conveniente.165

Além das inconveniências sociais apontadas, no tocante ao acesso ao trabalho pleno dos adolescentes, podemos afirmar que a terceirização tornou-se um grande obstáculo à educação profissionalizante. Isto ocorre porque há muitos adolescentes que poderiam estar se beneficiando da educação profissional, com a garantia de salários dignos e direitos previdenciários e trabalhistas garantidos, ao invés de estarem sendo explorados em trabalhos muitas vezes proibidos e tendo seus direitos fundamentais violados, encobertos sob o falso manto da legalidade da terceirização.

Importante colocar que os serviços terceirizados são em sua maioria os que necessitam pouca instrução e fazem com que o adolescente trabalhe muitas horas além do que lhe é permitido.

Entretanto, notamos um certo estímulo à terceirização indiscriminada, por parte do Poder Público, principalmente no que diz respeito ao trabalho dos adolescentes.

Esse estímulo está evidente nos baixos encargos fiscais que a empresa terá com a contratação de serviços de terceiros, bem como na ausência do pagamento de encargos trabalhistas.

A empresa que se utiliza da terceirização terá como encargos: - a taxa de administração, que fica a critério de cada fornecedora; - a retenção de 11% (onze porcento) do valor bruto da nota fiscal que deverá ser recolhido ao Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, em nome do prestador do serviço, até o 2º (segundo) dia do mês subsequente ao da emissão da respectiva

165 Entretanto, não é nesse sentido que o Congresso Brasileiro tem apontado, onde tramita, desde

1998, o projeto de lei nº 4.302, que trata da contratação de mão-de-obra temporária e da locação de serviços, porém, além de não conceituar a terceirização, amplia ainda mais as permissividades de contratação indireta de mão-de-obra.

nota fiscal e; - a retenção e o recolhimento, a título de Imposto de Renda na Fonte, no valor de 1% (um porcento) sobre as importâncias pagas ou creditadas pela prestação do serviço até o 3º (terceiro) dia útil da semana seguinte à ocorrência.

Esses são os encargos da empresa que contrata serviços terceirizados: não há encargos trabalhistas, uma vez que estes ficam sob a responsabilidade da empresa que fornece a mão-de-obra.

Diante dessa situação, fica muito mais interessante terceirizar do que contratar um aprendiz, já que no contrato de aprendizagem, como já visto, haverá a necessidade do pagamento dos direitos trabalhistas e previdenciários.

Por fim, concluímos que a maneira como age o Poder Público favorece a utilização de um instituto (terceirização) que ainda não tem regulação, e que por isso pode ser empregado da maneira que se bem entende e que ainda traz benefícios financeiros às empresas. Assim, obedecer a lei da aprendizagem tornou-se desinteressante, inclusive porque não são aplicadas sanções à sua violação.

5. A CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO SUBJETIVO À EDUCAÇÃO