• Nenhum resultado encontrado

Capitulo VI A Desobediência Civil

2. Características da Desobediência Civil

2.4 Direito de Resistência e Desobediência Civil

No seguimento do raciocínio anterior, Maria Garcia479 que considera a desobediência civil

como uma espécie distinta da resistência, pois esta “não se dirige ao direito de revolução, nem ao direito de objeção de consciência, ou se constitui em dever moral”; do mesmo modo “não objectiva a destruição da lei ou da ordem, da autoridade ou do respeito às regras erigidas pelos homens em normas de coexistência social: é um direito de garantia do exercício da cidadania”, outorgando “ao cidadão o poder de fazer a lei e de incumprir a lei, quando esteja em desconformidade com a ordem constitucional, consubstanciada nos direitos e garantias expressos na Constituição”480.

Machado Paupério481 faz a distinção entre o direito de resistência e o direito de desobediência.

Para ele, o direito de desobediência engloba o direito de resistência porque, segundo o mesmo, a desobediência é um género da qual a resistência à opressão é uma espécie. A

mesma linha teórica é adotada por Maria Garcia482, para quem a desobediência civil é um

género da espécie direito de resistência, logo “a desobediência civil pode‐se conceituar como a forma particular de resistência”483, afirma a autora na sua obra “Desobediência civil, direito fundamental”. Por outro lado, Nelson Nery Costa484 na sua obra “Teoria e realidade da desobediência civil” considera “a desobediência civil uma evolução teórica e prática do direito de resistência”, sendo, por conseguinte, a desobediência civil uma espécie do direito

de resistência, este como género, referindo que “a desobediência civil originou‐se do

479 Cfr. GARCIA, Maria. Desobediência civil, direito fundamental. São Paulo: Ed Revista dos Tribunais, 1994,

p. 257 apud SPARAPANI, Priscilia - O Direito de Resistência, a desobediência civil e os movimentos sociais internacionais. op. cit. p. 36-37. Disponível em: http://www.bibliotekevirtual.org/index.php/2013-02-07-03-02- 35/2013-02-07-03-03-11/430-cd/v11n21/3481-o-direito-de-resistencia-a-desobediencia-civil-e-os-movimentos- sociais-internacionais.html

480 Cfr. GARCIA, Maria. Desobediência civil, direito fundamental. São Paulo: Ed Revista dos Tribunais, 1994,

p. 256 apud idem p. 36-37

481 MORAIS, Océlio de Jesus - Direito de Resistência e Desobediência Civil. Jurisvox. Patos de Minas (2010)

p. 142. Disponível em: http://livrozilla.com/doc/882051/direito-de-resist%C3%AAncia-e desobedi%C3%AAncia-civil

482

Idem p. 142

483

JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 43 Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

484 MORAIS, Océlio de Jesus - Direito de Resistência e Desobediência Civil. Jurisvox. Patos de Minas (2010)

p. 142-143. Disponível em: http://livrozilla.com/doc/882051/direito-de-resist%C3%AAncia-e desobedi%C3%AAncia-civil

141

desenvolvimento do conceito do direito de resistência”485.

Independentemente da falta de consenso entre os autores, seja quanto ao género ou quanto à espécie qualificadora, poderá afirmar-se que, na generalidade, a desobediência civil é uma forma de protesto face a um poder político constituído, seja o Estado ou não, notoriamente opressor e despótico, portanto, neste caso, o Estado (Governo) é visto como opressor pelos “desobedientes”.

Para Celso Lafer486, o conceito de desobediência civil exprime uma acção objectiva que

reivindica inovação e mudança na norma para corrigir injustiças, defendendo que:

“A desobediência civil é uma acção que objectiva a inovação e a mudança da norma por meio da publicidade do acto de transgressão, visando demonstrar a injustiça da lei. Esta transgressão à norma, na desobediência civil, é vista como cumprimento de um dever ético do cidadão - dever que não pretende ter validade universal absoluta, mas que se coloca como imperativo pessoal numa dada situação concreta e histórica”, concluindo que “a desobediência civil é a reafirmação de obrigação político‐jurídica”487.

Maria Garcia488, tratando distintamente direito de resistência e desobediência civil, oferece o

seguinte conceito de desobediência civil: “ (…) A desobediência civil pode‐se conceituar como a forma particular de resistência ou contraposição, activa ou passiva do cidadão, à lei ou acto de autoridade, objetivando a proteção das prerrogativas inerentes à cidadania, quando ofensivo à ordem constitucional ou aos direitos e garantias fundamentais”489. A par

485 JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil

á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 43 Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

486

Idem p. 44

487

Cfr. LAFER, Celso. A Reconstrução dos Direitos Humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 1991, p. 200 apud JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 44 Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

488 Cfr. GARCIA, Maria. Desobediência civil (Direito Fundamental). 2ª ed. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 2004 p. 194 apud MORAIS, Océlio de Jesus - Direito de Resistência e Desobediência Civil. op. cit. p. 144. Disponível em: http://livrozilla.com/doc/882051/direito-de-resist%C3%AAncia-e-desobedi%C3%AAncia- civil

489 Cfr. GARCIA, Maria. Desobediência Civil: direito fundamental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1994,

p. 257 apud JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 44. Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

142

desses conceitos, observa‐se uma ideia consensual na doutrina internacional e entre os mais diversos autores, de que, o direito de resistência e a desobediência civil, “como condição de insurgência “contra o poder político estabelecido, em determinados casos e sob determinadas condições - e até que surgem as divergências””490, conforme assinala Maurício

Gentil Monteiro no seu livro “O Direito de Resistência na Ordem Jurídica Constitucional”491

“com a finalidade da proteção das prerrogativas inerentes à cidadania, quando ofensivo à ordem constitucional ou aos direitos e garantias fundamentais”, segundo Maria Garcia492.

Face ao exposto, Maria Helena Diniz493 distingue o direito de resistência da desobediência

civil, tratando-os “como formas diversificadas de manifestação”; assim, a resistência, num sentido amplo, e face do abuso de poder que exerce opressão irremediável, “reconhece aos cidadãos, em certas condições, a recusa à obediência, a oposição às normas injustas, a resistência à opressão e à revolução”. Desta forma, o referido direito consolida-se; i) pela rejeição de preceitos (in) constitucionais desconformes com a noção popular de justiça; ii) do abuso dos governantes da ideia de direito do qual deriva o poder, cujas prerrogativas exerce; iii) e pela vontade de instituir uma nova ordem jurídica perante a ausência de eco da ordem vigente na consciência jurídica dos membros da coletividade, considerando que a resistência é legítima conquanto que “a ordem que o poder pretende impor seja falsa, divorciada do conceito ou ideia de direito imperante na comunidade”, considerando que a desobediência

civil494 “é uma forma particular de desobediência, na medida em que é executada com o fim

490

JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 44 Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

491 Cfr. MONTEIRO, Gentil Maurício. O direito de resistência na ordem jurídica constitucional. p. 5-6 apud

MORAIS, Océlio de Jesus - Direito de Resistência e Desobediência Civil. op. cit. p. 144. Disponível em: http://livrozilla.com/doc/882051/direito-de-resist%C3%AAncia-e-desobedi%C3%AAncia-civil

492 JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil

á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. op. cit. p. 44 Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

493 Cfr. DINIZ, M. H. Norma constitucional e seus efeitos. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 88-89 apud

SPARAPANI, Priscilia - O Direito de Resistência, a desobediência civil e os movimentos sociais internacionais. op. cit. p. 36-37. Disponível em: http://www.bibliotekevirtual.org/index.php/2013-02-07-03-02-35/2013-02-07- 03-03-11/430-cd/v11n21/3481-o-direito-de-resistencia-a-desobediencia-civil-e-os-movimentos-sociais-

internacionais.html

494 SPARAPANI, Priscilia - O Direito de Resistência, a desobediência civil e os movimentos sociais

internacionais. op. cit. p. 36. Disponível em: http://www.bibliotekevirtual.org/index.php/2013-02-07-03-02- 35/2013-02-07-03-03-11/430-cd/v11n21/3481-o-direito-de-resistencia-a-desobediencia-civil-e-os-movimentos- sociais-internacionais.html

143

imediato de mostrar publicamente a injustiça, a ilegitimidade e a invalidade da lei e com o fim imediato de induzir o poder a mudá-la, daí considerar a desobediência civil como um acto inovador (construtivo) e não destruidor”495. Desta forma, poder-se-á dizer que enquanto o direito de resistência vai contra a ordem jurídica instituída, sendo a desobediência civil uma espécie desse direito, como uma forma de resistência, não violenta (em regra, mas nem sempre, isto porque alguns pensadores relacionam o movimento grevista à violência como forma de alcançar mudanças e os objetivos pretendidos), cuja prática deve ser pública, e que deverá ocorrer dentro do ordenamento jurídico (dentro do principio da legalidade), constituindo-se em direito legitimo do cidadão perante leis injustas.