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Capitulo VI A Desobediência Civil

5. Punibilidade dos desobedientes

Ao tratar do problema da punibilidade - ou não - dos desobedientes, seguindo o pensamento filosófico de Dworkin este refere que duas compreensões que deverão ser afastadas, ou seja, a de que o Estado deve punir sempre ou, pelo contrário, de que se deverá abster de punir esses

actos de desobediência civil, considerando que 566:

“Devemos evitar dois erros grosseiros. Não devemos dizer que se alguém teve motivos, dadas as suas convicções, para violar a lei, o governo não deve puni-lo. Não existe nenhuma contradição e, muitas vezes, há muito sentido em decidir que alguém deve ser punido apesar de ter feito exatamente o que nós, se tivéssemos as suas convicções, faríamos e teríamos a obrigação de fazer. Mas o erro oposto é igualmente ruim. Não devemos dizer que se alguém violou a lei, por qualquer razão que seja e por mais honrosos que sejam seus motivos, sempre deve ser punido porque a lei é a lei.”

Quando é que o Estado deverá punir? Nunca. Para Dworkin ninguém deverá ser punido,

considerando que “é injusto punir homens por desobedecerem a uma lei duvidosa” 567

isto porque quando validade de uma lei é questionada, fragiliza de sobremaneira a capacidade em definir tipos de ilícitos e de sanções penais correspondentes, a não ser que, nos casos, em que considerando todas as circunstâncias envolvidas na acção, a punição provocasse, a longo prazo, um bem geral para a sociedade, sendo, sem dúvida mais desejável que a desobediência civil atinja os seus objetivos sem a necessária punição, considerando que essa condição é melhor para todos e que não deverá ser descartada pelas autoridades responsáveis pela aplicação da lei penal, pois para Dworkin, este não considera incompleta a desobediência civil sem que os desobedientes sejam punidos, mas entende que muitas vezes ela poderá caracterizar-se como elemento estratégico, incitando o desejo de muitos pela sua

566 Cfr. DWORKIN, Ronald - Uma Questão de Principio. Tradução de Luiz Carlos Borges. Martins Fontes: São

Paulo. 2000, p. 168 apud LUCAS, Doglas Cesar - A Desobediência Civil na Teoria Jurídica de Ronald Dworkin´. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia. Curitiba (Julho/Dezembro 2014) p. 125. Disponível em:

https://www.academia.edu/14491665/A_Desobedi%C3%AAncia_Civil_na_teoria_jur%C3%ADdica_de_Ronald _Dworkin_-_Doglas_Cesar_Lucas

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Cfr. DWORKIN, Ronald - Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes. 2002, p. 339 apud LUCAS, Doglas Cesar - A Desobediência Civil na Teoria Jurídica de Ronald Dworkin´. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia. Curitiba (Julho/Dezembro 2014) p. 127. Disponível em: https://www.academia.edu/14491665/A_Desobedi%C3%AAncia_Civil_na_teoria_jur%C3%ADdica_de_Ronald _Dworkin_-_Doglas_Cesar_Lucas

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punibilidade568. Afinal, pergunta Dworkin569, o que deverá fazer um cidadão quando ele

considerar que uma norma é duvidosa e pensa que ela permite algo que, na opinião de outros, é proibido? Para estas questões, Dworkin apresenta três possibilidades que responderão a essa pergunta.

Numa primeira hipótese de a lei ser duvidosa570 ou obscura, quanto permitir que o indivíduo

faça o que quiser, este pode imaginar o pior e agir pressupondo que a lei não o permite, obedecendo à lei mesmo considerando-a errada, enquanto utiliza o processo político para a modificar. A segunda possibilidade diz que se a lei é duvidosa, o cidadão seguirá sua própria interpretação e fará o que quiser, se pensar que o argumento a favor da permissão seja mais

forte do que o da proibição571. No entanto, no momento em que resultar uma decisão judicial

contrária ao seu entendimento, o desobediente passará a respeitar a norma, mesmo

considerando que ela é inválida. E por fim, se a lei é duvidosa572, o cidadão poderá orientar-se

segundo o seu próprio discernimento, mesmo depois de uma decisão contrária tomada pelo Tribunal, pois uma lei cuja validade é questionada, obviamente que tem fragilizada a sua capacidade em definir tipos penais e sanções correspondentes.

Se persistirem dúvidas sobre qual é a melhor interpretação que se deve dar a uma lei é porque a sua própria validade é questionada, e seria um exagero exigir um comportamento incondicional por parte dos desobedientes e seria ainda mais exagerado a sua punição no caso

do incumprimento da norma de validade duvidosa, considerando Dworkin573 que se estaria a

transferir para os Tribunais, Ministério Público, Polícia e demais entidades de prossecução penal a palavra final sobre os conteúdos morais dessa lei, algo totalmente incompatível com a

568 LUCAS, Doglas Cesar - A Desobediência Civil na Teoria Jurídica de Ronald Dworkin´. Revista de Direitos

Fundamentais e Democracia. Curitiba (Julho/Dezembro 2014) p. 125. Disponível em: https://www.academia.edu/14491665/A_Desobedi%C3%AAncia_Civil_na_teoria_jur%C3%ADdica_de_Ronald _Dworkin_-_Doglas_Cesar_Lucas

569 Idem op. cit. p. 126

570 LUCAS, Doglas Cesar - A Desobediência Civil na Teoria Jurídica de Ronald Dworkin´. Revista de Direitos

Fundamentais e Democracia. Curitiba (Julho/Dezembro 2014) p. 126. Disponível em: https://www.academia.edu/14491665/A_Desobedi%C3%AAncia_Civil_na_teoria_jur%C3%ADdica_de_Ronald _Dworkin_-_Doglas_Cesar_Lucas

571

Idem op. cit. p. 126

572 Ibidem op. cit. p. 126

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harmonia dos três poderes estabelecidos no Estado Democrático. Contudo, acrescenta574 que

tratando-se de direitos fundamentais, um individuo ao desobedecer nunca estará a extrapolar os limites do seu direito ao recusar-se aceitar ou a acatar uma decisão definitiva, se argumentar que o Tribunal cometeu um erro e que a dúvida sobre a matéria persistirá, e por isso, duvidar da constitucionalidade de uma lei é duvidar precisamente da sua própria validade, e por isso em caso de dúvida, deverão ser os órgãos competentes a estimular e promover o debate e o diálogo, seja para modificar ou reforçar os diversos entendimentos sobre essa (s) norma (s), seja para rever as leis ou para confirmar a sua legitimidade constitucional575.