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Idade Contemporânea A Desobediência Civil de Thoreau

Capitulo III Evolução histórica do Direito de Resistência e da Desobediência Civil

1.5 Idade Contemporânea A Desobediência Civil de Thoreau

No seu livro “A Desobediência Civil”, Thoreau refere-se à guerra travada entre os Estados Unidos e o México (1846-1848) em que os Estados americanos do Sul invadiram o México, e que segundo ele, visariam ampliar o território onde a escravidão negra podia ser considerada

legal152. Juntamente com outros abolicionistas, denunciou essa guerra, devido ao seu carácter

injusto, “sustentando a sua conduta de resistência à vontade do governo americano, não contribuindo com a taxa obrigatória (impostos), procurando assim, não alimentar as

150 LUCAS, Doglas Cesar - Direito de Resistência e Desobediência Civil - História e Justificativas. Revista

Direito em Debate (2013) op. cit. p. 29. Disponível em:

https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/viewFile/807/525

151 JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil

á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. p. 66. Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

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injustiças que considerava que estariam a ser cometidas”153. Para Thoreau, a guerra contra o México foi um exemplo claro de que quando um governo, “que deve representar e executar a vontade de um povo, se torna inconveniente e injusto”154, deixando de observar os anseios desse mesmo povo para realizar as suas próprias vontades, ainda que essa pretensão apareça num sentido oposto aos anseios do povo, deixando bem claro que não é contra o Estado e que não procura a ruptura com o governo vigente, esperando que esse mesmo governo reveja as suas atitudes, direcionando-as de acordo com os interesses dos cidadãos.

Já quanto á observância á lei, defender que uma lei, mesmo que respeitada por todos, nem sempre é ou deve ser o caminho para se chegar à justiça, defendendo que sómente “através da consciência de cada homem é que se poderá chegar ao ideal de justo e de justiça”155, colocando em causa de saber até que ponto é que o homem se deve “dobrar ao legislador?”. Assim Thoreau formulou a seguinte questão, ou seja, “seria legítimo não aceitar uma lei que se mostra injusta, ou, mesmo sendo a lei injusta somos obrigados a aceitá-la e a cumpri la, ainda que passemos a ser ferramentas alavancadoras de tais injustiças?”156

Deste modo, “a obediência às leis e práticas do governo imporia sempre uma avaliação individual aos cidadãos que deveriam negar a autoridade do governo quando este tivesse carácter injusto, assim, a desobediência decorreria de um direito legitimo, que mesmo sem a participação da maioria, se configurasse contra o Estado”157, sempre e quando o governo ultrapassasse os seus limites ou não cumprisse com as expectativas criadas, e nestes casos a desobediência civil demonstrar-se-ia como a única saída a ser adoptada pelos indivíduos quando “se deparassem com legislação e práticas governamentais que não procurassem agir pelos critérios da justiça ou contrariassem os princípios morais do indivíduo”158

, e neste caso Thoreau, coloca esta questão, ou seja, se “Leis injustas existem, devemos conter-nos em

153

JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. p. 67. Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

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Idem op. cit. p. 67

155 Ibidem op. cit. p. 67

156 Ibidem op. cit. p. 67

157 LUCAS, Doglas Cesar - Direito de Resistência e Desobediência Civil - História e Justificativas. Revista

Direito em Debate (2013) p. 35. Disponível em:

https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/viewFile/807/525

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obedecer a elas ou esforçar-nos em corrigi-las, obedecer-lhes até triunfarmos ou transgredi- las desde logo?”159.

Thoreau, conclui pois, pelo direito-dever em desobedecer, mesmo que disso resultasse o aprisionamento do cidadão desobediente, e que deveria ser encarado como mérito pessoal, pois “quando os governos agissem injustamente e fizessem da prisão o único lugar digno para um homem justo, essa prisão” e consequente encarceramento, serviria pois para mobilizar a opinião pública adoptar a mesma atitude e o próprio governo mudar a sua postura, sendo que estas construções filosóficas de Thoreau que acabarão por influenciar aquele que seria o principal responsável pela independência da Índia e um fervoroso defensor da

desobediência civil como foi Mohandas Karamchand Gandhi160. Assim Thoreau defende que

é reconhecido a todos o direito à revolução, ou seja, o direito de negar lealdade e de oferecer resistência ao governo, sempre que estes com as suas politicas, se tornem ineficientes e degenerem em tirania, ficando assim evidente a função do direito de resistência, quando utilizado numa de suas vertentes, no caso da revolução, na ruptura com a situação em que se encontra, sendo necessária a rápida mudança do governo, precisamente por este não atender mais aos interesses do povo, no fundo, o verdadeiro detentor daquele poder que foi delegado

num determinado e restrito número de pessoas, chamadas de “representantes do povo”161.

Thoreau entendia que uma forma de resistir ao Estado “seria o não pagamento dos impostos, para ele a desobediência civil caracterizar-se-ia pela insurgência da sociedade, de uma minoria ou apenas de uma só pessoa, contra o próprio Estado”162, não com a intenção de o derrubar e substituir, mas sempre que os direitos da população fossem violados, desobedecer seria uma forma chamar á atenção para um determinado problema, levando com isso a uma discussão publica sobre o assunto, visando acabar com a violação de certo ou determinado direito. Assim Thoreau sustentava que, diante de uma lei injusta e de um governo que não providenciava reformas e que não dialogava com as minorias, as pessoas conscienciosas

159 LUCAS, Doglas Cesar - Direito de Resistência e Desobediência Civil - História e Justificativas. Revista

Direito em Debate (2013) p. 35. Disponível em:

https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/viewFile/807/525

160 Idem op. cit. p. 36

161 JÚNIOR, Dorival de Freitas - Direito de Resistência e Desobediência Civil: Movimentos Populares no Brasil

á Luz da Teoria Critica. Piracicaba S. Paulo: Universidade Metodista de Piracicaba, 2007. 192 f. p. 68. Disponível em: http://livros01.livrosgratis.com.br/cp055529.pdf

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deveriam lutar contra o mal, desde logo, através da resistência, pois a espera pelo convencimento da maioria através dos meios tradicionais legais fornecidos pelo Estado, seria para ele uma espera demasiadamente longa, se levada em consideração “a brevidade da vida humana”.

Conclui-se que para Thoreau, a lei não podia ser colocada acima do Direito, nem da Justiça, nem tão pouco se poderia “ferir o pacto político da cidadania”. Por isso, perante situações de injustiças sociais, de leis injustas e de governos autoritários, autor norte-americano defendia a desobediência civil como meio próprio e eficaz de recusa face ao poder do Estado, e portanto, a desobediência civil seria a forma mais correcta para alguém poder expressar a sua discordância face a políticas governamentais despóticas ou violadoras de direitos civis.