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Relatório do Parlamento Europeu A crise afectou os Direitos Fundamentais em

Capitulo VII Legitimidade para a desobediência civil O caso português

1. O caso português

1.3 Relatório do Parlamento Europeu A crise afectou os Direitos Fundamentais em

O relatório do Parlamento Europeu concluiu que a crise teve um impacto acentuado nos direitos fundamentais em Portugal, tendo sido o direito do trabalho provavelmente o direito mais afectado, tendo este estudo concluído que em Portugal, as políticas de austeridade associadas ao memorando de entendimento com a Troika afectaram um grande número de

direitos fundamentais no país605, os quais passaremos a descrever.

Segundo este relatório606, “a crise económica teve um impacto bastante significativo sobre as

crianças”, tendo os seus direitos, especialmente o direito à educação, sido “seriamente afectado pelas medidas de austeridade”, bem como o direito aos cuidados de saúde, apontando este estudo que “o direito ao trabalho, foi provavelmente, o direito fundamental mais afectado no contexto da crise económica” e de acordo com mesmo o documento, o direito ao trabalho foi afectado tanto pela crise em si - que levou a uma subida significativa do

602 SAMBADO, Cristina - Portugal é dos países mais pobres e desiguais da OCDE. Disponível em:

http://www.rtp.pt/noticias/economia/portugal-e-dos-paises-mais-pobres-e-desiguais-da-ocde_n830439

603

Idem

604 Ibidem

605 CANOTILHO, Mariana Rodrigues - The impact of the crisis on fundamental rights across Member States of

the EU Country Report on Portugal p. 8. Disponível em:

http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2015/510020/IPOL_STU(2015)510020_EN.pdf (Tradução nossa)

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desemprego, que “mais que duplicou desde 2008” - bem como pelas medidas de austeridade, que incluíram cortes nos salários, nos subsídios de desemprego, e num aumento das horas de trabalho sem pagamento adicional.

A crise económica teve um impacto muito significativo em especial sobre as crianças (a taxa de pobreza entre as crianças cujos direitos, especialmente o direito à educação, foram

seriamente afectados por medidas de austeridade), tendo a UNICEF607 na altura alertado para

o aumento da taxa de pobreza para 28,6% entre as crianças portuguesas que estavam em risco de pobreza e de exclusão social em 2011, cujos números continuaram a subir, bem como das consequências da perda do Rendimento Social de Inserção para 46.000 famílias pobres, devido a mudanças nas regras de aplicação e atribuição desse valor, considerando esse estudo, que tanto a crise económica como as rigorosas medidas de austeridade causaram um retrocesso social significativo que afetaram os direitos fundamentais das crianças à saúde, educação, habitação e alimentação.

Segundo este relatório, o impacto da crise sobre Portugal foi bastante duro e severo608,

fazendo com que o desemprego mais que duplicasse atingindo um número recorde desde 2008, a emigração atingiu mais de 300.000 pessoas que deixaram o país nos últimos três anos, isto em 2014, tendo o PIB recuado para os níveis de 2000, e após uma série de avaliações negativas realizadas pelas principiais agências de rating, aliado a dificuldades económicas graves, Portugal negociou um programa de resgate financeiro com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional (a chamada Troika), que impôs a Portugal condições bastante rigorosas que foram transformadas em políticas de austeridade, o que afetou um grande número de direitos fundamentais consagrados na Constituição Portuguesa, na CEDH, e em muitos outros catálogos de direitos em Tratados e Convenções internacionais

Relativamente ao emprego, entre 2008 e 2013 mais de 500.000 empregos foram destruídos em Portugal, o que levou a um grande aumento da taxa de desemprego (de 8,5% em 2008 para 16,4% em 2013), sendo particularmente mais elevado entre os jovens com menos de 25

607 CANOTILHO, Mariana Rodrigues - The impact of the crisis on fundamental rights across Member States of

the EU Country Report on Portugal p. 15. Disponível em:

http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2015/510020/IPOL_STU(2015)510020_EN.pdf (Tradução nossa)

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anos, cuja taxa de desemprego aumentou de 20,5% em 2008 para 38,1% em 2013609. No

entanto, o direito ao trabalho610 foi, provavelmente, o direito fundamental mais afectado no

contexto da crise económica, tanto pela crise em si (que levou a um aumento significativo dos números do desemprego) mas também por medidas de austeridade que incluíram cortes, redução dos pagamentos de indeminizações por despedimento, e num aumento do horário de trabalho sem remuneração adicional, cortando-se nas percentagens dos pagamentos de horas extraordinárias.

Quanto á emigração, o aumento assustador desses números está directamente relacionado com os números do desemprego, porque aqueles que deixaram o país já não serão incluídos nas estatísticas, isto porque, mais de 100.000 pessoas deixaram o país em 2011, mais de 120.000 em 2012, e 128.000 em 2013, e tendo em conta que Portugal tem uma população de aproximadamente 10 milhões de habitantes, cerca de 3,5% da população deixou o país durante os últimos três anos. Números similares só poderão ser encontrados na década de

1960, durante a ditadura e a guerra colonial611.

O direito às pensões612 também foi em grande medida afetado por medidas de austeridade,

sempre com a ameaça pelos riscos da sustentabilidade do sistema social, as pensões sofreram grandes cortes entre 2011 e 2014, tendo aumentado a idade para a reforma (dos 65 anos até 2013 para 66 anos em 2014 e 2015), tendo sido mudadas também as regras para o cálculo do montante das pensões a atribuir, agora em função, não só a idade, mas sobre o histórico de trabalho do trabalhador, e também com base num “factor de sustentabilidade” relacionado com o aumento da esperança média de vida aos 65 anos de idade no ano de 2000.

Esse estudo é concluído com algumas recomendações613, defendendo-se que “a prioridade

dada à redução do défice seja equilibrada com a necessidade de manter níveis mínimos de serviços sociais, com os sectores da saúde e educação a merecerem atenção especial”, apontando que a implementação de medidas de austeridade deve ter muito mais em conta os

609 CANOTILHO, Mariana Rodrigues - The impact of the crisis on fundamental rights across Member States of

the EU Country Report on Portugal. p. 13. Disponível em:

http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2015/510020/IPOL_STU(2015)510020_EN.pdf

610 Idem p. 8 (Tradução nossa)

611

Ibidem p. 13 (Tradução nossa)

612 Ibidem p. 8 (Tradução nossa)

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direitos fundamentais, e nessa perspectiva, o documento defende que as recomendações específicas sobre direito a pensões, ao trabalho, à segurança social, e ao acordo colectivo de trabalho, feitas por instituições e organizações nacionais e internacionais, sejam tidas em conta pelas autoridades, e avaliadas por instituições independentes, tais como o gabinete do Provedor de Justiça Europeu, até porque “este não é meramente um problema nacional, mas também europeu”.