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Em abril de 1944, um grupo de jornalistas e escritores reunidos num café no centro do Rio resolvem fazer um jantar, uma homenagem ao Barão pelos seus 25 anos de jornalismo. O evento, o famoso banquete da ABI, toma grandes proporções e torna-se uma demonstração política contra a ditadura do Estado Novo. Guevara e Augusto Rodrigues projetam em slides desenhos reportando a biografia do Barão, com direito à narração pelo próprio, numa versão multimídia da biografia “nonsen- se” do hilário fidalgo-de-araque.

Neste clima de fim de guerra e perspectiva de redemocratização, A Manha

reabre (1945) em sociedade com o alagoano Arnon de Mello (que ficaria famoso em 1963 ao alvejar e matar um colega dentro do recinto do Senado) e diversos colabo- radores ilustres: José Lins do Rego, Rubem Braga, Sergio Milliet, Raimundo Maga- lhães Jr., Álvaro Lins, e outros. E com sucesso igual ou maior que nos anos 20 e 30.

Com a chegada das eleições e o alinhamento do Barão ao PCB, a sociedade com Arnon de Mello se desfaz, assim como vários colaboradores abandonam o jornal. O pessoal do PCB tenta transformar A Manha em jornal mais sério, mas o Barão é

irredutível e mantém seu originalíssimo “órgão de ataques… de riso” preservado daquilo que, para ele, seria o seu fim. E parece que acertou em cheio, A Manha

ainda viria às ruas por mais uns 15 anos.

Essa proximidade com o PCB obrigou-o a aceitar a candidatura à vereança do Rio em janeiro de 1947. Foi o oitavo mais bem votado daquele pleito, com apenas dois slogans de campanha: “Mais leite, mais água. Mas menos água no leite!” e “casa, comida e roupa lavada”.

A volta da democracia com amplas liberdades rendeu ao Rio uma Câmara dos Vereadores muito especial, recheada de personalidades públicas e ídolos populares. Mas esta fase duraria pouco e no recesso parlamentar ao final do ano de 1947, o PCB seria cassado e com ele os mandatos de seus representantes. Seu órgão ofici- al, a Tribuna Popular seria empastelado e fechado. O PCB reabre o jornal com o nome de Folha do Povo e o Barão tem a oportunidade de trabalhar novamente com Carlos Drummond de Andrade, Di Cavalcanti, Jorge Amado, Álvaro Moreyra e o jovem Sergio Porto (aos 22 anos), que era o crítico de cinema do jornal. Sob a influ- ência do Barão, o garoto pulou do cinema para o humor e projetou, pela primeira vez, o que seria o futuro Stanislaw Ponte Preta.

Anos 50: a década Paulista

Com a cassação do Partido Comunista, o empastelamento de seus veículos e a perda de mandato de seus representantes, A Manha pára de ser impressa no Rio

em 1948 e o Barão muda-se para São Paulo. Apoiado por amigos, clientes e correli- gionários, Aporelly consegue estabelecer-se na Paulicéia e rapidamente torna-se um famoso “paulista de 400 dias”.

Em 1949 consegue realizar o projeto dos Almanhaques, o qual tem como sócio o incrível Andrés Guevara. Com grande sucesso, o Almanhaque para 1949 emplaca e alavanca a volta triunfal d’A Manha no ano seguinte (edição S.Paulo-Rio).

Guevara ficou todo o tempo do Estado Novo residindo na Argentina e nunca mais voltou a morar no Brasil, vindo aqui em missões profissionais. Lá, continuou publicando diariamente na imprensa argentina, e ganhou dois prêmios internacio- nais com o projeto gráfico do Clarín (1945) de Buenos Aires. Em 1941, veio ao Rio para fazer o projeto da Folha Carioca, onde introduziu a figura do diagramador na imprensa diária; mudando definitivamente a cara da imprensa brasileira em termos plásticos. Entre o Rio e Buenos Aires, desenvolveu seus projetos, sempre manten- do sua residência na Argentina. A Folha Carioca durou pouco e fechou suas portas com cinco anos de existência.

Pela correspondência manti- da entre Guevara e o Barão (a qual está no Acervo IEB-USP) percebe-se que o Almanhaque é um velho projeto da dupla: para ganhar dinheiro. O entusiasta sempre foi Gue, que tinha uma visão ótima dos negócios — prag- mático, incentivava o Barão a se afastar da política e assumir ares mais profissionais. No meio dos desenhistas sempre foi tido como o único que ganhou dinhei- ro com a profissão e “enrricou”, mas seu talento fazia juz à uma grande contrapartida. Outro fato curioso é que sempre andava muito bem vestido, “numa esti- ca danada”…

A ajuda de gente como Cân- dido Portinari, Mario Scheinberg e muitas outras personalidades da sociedade paulistana facilita- ram as coisas para o Barão e o Almanhaque saiu recheado de publicidade.

Unindo o útil ao agradável, o Almanhaque era uma mistura dos melhores mo- mentos d’A Manha com textos novos; e tudo dentro de uma organização que paro-

diava os digestivos almanaques americanos, franceses e canadenses que inunda- ram o planeta após a segunda grande guerra. Neste momento, o mais fino “nonsen- se” de Aporelly floresceu fazendo história: o primeiro MAD de Harvey Kurtzman, que seria lançado dali a 15 anos, usou esta mesma fórmula (pesquisa do Fortuna e do Jaguar, até o momento inédita).

Em S.Paulo, foi militante assíduo da API (Associação Paulista de Imprensa) e sua vida, sempre oscilante entre a penúria e a prosperidade, entrou num ciclo relativo de expansão. Relatos afirmam que em S.Paulo ele tinha até motorista particular.

Guevara fez um trabalho de mestre no Almanhaque, ajudado por uma equipe de desenhistas que trouxera da Argentina e que seria acrescida de alguns membros em 1951 com o intuito de desenvolver o projeto do jornal Última Hora para Samuel Wainer. Entre os desenhistas que vieram nesta leva e que ficaram muito famosos podemos citar Molas e Lan. Molas, que tinha um traço extremamente semelhante ao do grande Don King, que se aposentou no MAD há bem pouco tempo, criou os mascotes para os clubes de futebol cariocas… o Popeye para o Flamengo, o Pato Donald para o Botafogo, etc. Lan é o nosso eterno cartunista das mulatas, embora seja Uruguaio — ele casou-se uma das irmãs Marinho (de O Globo) e ainda aparece nos plin-plins da TV Globo com certa freqüência (e muita competência).

Guevara introduziu nos Almanhaques o uso de grandes áreas de cor chapada preenchendo o desenho de traço simples, limpo e geométrico que cultivava desde 1926, engajando o desenho de imprensa no cerne da estética modernista: reafir- mando a grande revolução plástica iniciada na Folha Carioca e plenamente desen- volvida no Última Hora.

O Almanhaque para 1949 teve várias reimpressões e por alguns anos seguidos. Tanto é que o segundo Almanhaque vai sair em 1955 (1º semestre).

A Manha retorna às ruas em 1950, mas desenhada por Otávio. A máxima “o

único quintaferino que sai aos sábados” seria reciclada para “ o único quintaferino que sai quando o dinheiro da edição anterior acabou…” e o jornal nunca mais saiu em dias certos e sim em incertos dias até 1959 (e não até 1950 como afirma C. Figueiredo, op. cit.). Em 1950 o Barão já dava mostra de cansaço e acumulava um emprego na Folhinha da Manhã, suplemento infantil semanal da Folha da Manhã, de Otávio Frias. Guevara retorna ao Barão no Almanhaque 1955 1º semestre (o Alma- nhaque do segundo semestre é desenhado por Otávio) e em alguns números pri- morosos d’A Manha entre 1956 e 1959.