• Nenhum resultado encontrado

1 E QUADRAMETO SOCIOGEOGRÁFICO DOS FIALISTAS

No documento Diplomas e (Des)Emprego: um estudo de caso (páginas 152-157)

Revela-se da maior importância iniciar a presente reflexão pela caracterização dos finalistas, de forma a percepcionar que tipo de população acede ao ISPV e que particularidades sociogeográficas encerram, tendo presente o enquadramento institucional e geográfico.

Quadro 5.1 - Caracterização sociogeográfica segundo o curso (%)

SEXO C S G E G C P T EA EI EC EE EM EMGI CA Total

Masculino 27,7 26,8 45,5 13,6 19 85,7 75 93,3 45,5 100 31,2 38,5 Feminino 72,3 73,2 54,5 86,4 81 14,3 25 6,7 54,5 0 68,8 61,5 IDADE 21-24 anos 72,3 75,6 63,6 65,9 66,7 71,4 55% 66,7 45,5 0 12,5 62,7 25-28 anos 14,9 22 36,4 18,2 33,3 28,6 35 20 45,5 100 37,5 26,2 29-36 anos 4,3 2,4 0 11,4 0 0 5 13,4 9,1 0 31,2 6,9 + de 37 anos 8,5 0 0 2,3 0 0 0 0 0 0 18,8 3,2 ORIGEM GEOGRÁFICA Distrito de Viseu 80,9 87,8 90,9 81,8 81 64,3 75 100 72,7 75 100 83,2 Resto do país 19,2 12,1 9,1 18,3 19,1 35,6 25 0 27,3 25 0 16,8 X 47 41 11 44 21 14 20 15 11 4 16 244

143 Como podemos constatar no quadro 5.1, e no que respeita às características pessoais verifica-se uma predominância do género feminino (salienta-se T, CS, GE e EA203) face ao masculino (predominante nas áreas de engenharia, salientando-se EI, EE, EMGI). Este movimento enquadra- se nas tendências verificadas em Portugal nas últimas décadas, com uma sobreposição feminina na frequência do ensino superior, movimento por demais evidente em diversos estudos, como são exemplo Alves N. (2005) ou Alves M. (2007). Constata-se, assim, uma preferência masculina pelos cursos de engenharia, enquadrando-se num movimento já identificado por Marques (2006), o que nos permite concluir que a escolha dos cursos a nível superior traduz, em parte, a estrutura e as desigualdades de género no que se refere à divisão social do trabalho.

Já relativamente à idade, verifica-se que a maioria dos finalistas se encontra situada na faixa etária dos 21 aos 28 anos, detendo a faixa dos 21 aos 24 anos a maior representatividade. Este contexto tem, obviamente, consequências ao nível do estado civil, verificando-se que grande parte dos jovens é solteira, o que se enquadra, segundo Galland (1991), na perspectiva de alargamento das trajectórias académicas e consequente adiamento da entrada na vida adulta.

Quanto à origem geográfica, a quase totalidade dos alunos é originária da região centro, destacando-se a proeminência evidente do distrito de Viseu (com 83,2% de referência), corroborando tendências já verificadas em Cruz e Cruzeiro (1995) ou em Vieira (1995). Esta questão, face às dicotomias nacionais, como refere Barreto (1996), e à diferenciação do ensino superior, como demonstram Amaral e Teixeira (2000), permite equacionar a pertinência da origem social face aos contextos de acesso, tendo presente que, com a instituição dos Institutos Politécnicos, procura-se materializar uma democratização assente na diversificação e dispersão geográfica da oferta formativa de índole superior a nível nacional, como evidencia Simão e Costa (2000) ou Arroteia (2002).

Werfhorst e Andersen (2005) defendem mesmo que existe uma influência directa do

background social (recursos económicos, qualificacionais e organizacionais) na trajectória escolar

e no nível de ensino frequentado, que para Resende e Vieira (1991) se alarga ao nível da instituição e área científica escolhida: “(…) the analysis of the socio-educational indicators

revealed that the student’s household of origin had a marked effect on access to higher education and that Portugal was still far from offering equitable access to higher education. The influence of family background was also observable in the choice of students between university and polytechnic degrees. The results also showed that the household of origin not only influenced the

203

Novamente chamamos a atenção para o nome e iniciais dos cursos em análise como forma de apoio à leitura: Comunicação Social (CS) da Escola Superior de Educação de Viseu e da Escola Superior de Tecnologia de Viseu os cursos de Gestão de Empresas (GE), Gestão Comercial e da Produção (GCP), Turismo (T), Contabilidade e Administração (CA) e as diversas Engenharias: Madeiras (EM), Ambiente (EA), Electrotécnica (EE); Informática e de Sistemas (EI), Civil (EC), Mecânica e da Produção (EMGI).

144

probability of access to higher education, but also the type of discipline chosen by students.”

(Tavares et al, 2008: 112).

Consequentemente, é necessário traçar a origem social dos finalistas. De forma a determinar os lugares de classe dos mesmos, necessária à análise dos movimentos de mobilidade social, utiliza- se a tipologia apresentada por Costa, Machado e Almeida (2007) que defendem que a maioria das propostas teóricas e de investigações empíricas vinculadas na actual sociologia das classes sociais convergem para a atribuição de uma importância central aos indicadores sócio educacionais e socioprofissionais. Estes autores falam em estrutura de classes definindo as respectivas categorias ou lugares de classe.

Quadro 5.2 - Lugares de classe de origem e nível habilitacional dos progenitores por curso (%)

ORIGEM SOCIAL C S G E G C P T EA EI EC EE EM EMGI CA Total EDL - Empresários, Dirigentes e

Profissionais Liberais

9,5 7,7 36,4 4,8 23,1 20 6,7 18,2 7,1 10,3 PTE - Profissionais Técnicos e de

Enquadramento 16,7 10,3 18,2 9,5 4,8 15,4 40 6,7 25 12,9 TI - Trabalhadores Independentes 11,9 5,1 9,1 19 19 7,7 10 6,7 9,1 25 21,4 12,5 TIPL - Trabalhadores independentes Pluriactivos 31 46,2 9,1 28,6 52,4 23,1 15 46,7 54,5 50 50 35,8 AI - Agricultores Independentes 6,7 0,4 AIPL - Agricultores Independentes Pluriactivos 2,4 2,6 0,9 EE - Empregados Executantes 14,3 5,1 21,4 14,3 15 6,7 14,3 11,2 O - Operários 7,7 9,5 4,8 23,1 4,7

AEPL - Assalariados Executantes Pluriactivos

9,1 0,4

EDL - Empresários, Dirigentes e Profissionais Liberais

14,3 15,4 18,2 7,1 4,8 7,7 20 18,2 7,1 10,8 HABILITAÇÕES DO PAI

Não sabe ler nem escrever 0 0 0 0 4,8 0 0 13,3 9,1 0 6,2 2 Sabe ler e escrever 2,1 0 9,1 2,3 4,8 7,1 5 0 18,2 0 12,5 4,1

Ensino Primário 68,1 58,5 36,4 50 57,1 64,3 40 53,3 72,7 75 56,2 57 Ensino Preparatório (antigo 2º

ano);

6,4 22 18,2 9,1 14,3 14,3 0 13,3 0 0 6,2 10,7 3º ciclo (antigo 5º ano liceal) 10,6 12,2 0 11,4 9,5 7,1 5 0 0 25 0 8,2

Ensino Secundário 2,1 7,3 18,2 20,5 9,5 0 25 6,7 0 0 12,5 10,2 Ensino Médio 2,1 0 0 2,3 0 7,1 5 0 0 0 0 1,6 Ensino Universitário 6,4 0 9,1 4,5 0 0 15 13,3 0 0 0 4,5 Não responde 2,1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6,2 0,8 Outra Situação 0 0 9,1 0 0 0 5 0 0 0 0 0,8 MÃE

Não sabe ler nem escrever 0 0 0 0 4,8 0 0 6,7 0 0 0 0,8

Sabe ler e escrever 0 0 9,1 2,3 4,8 7,1 10 0 27,3 0 18,8 4,9 Ensino Primário 55,3 61 45,5 47,7 52,4 21,4 30 60 54,5 75 56,2 50,8 Ensino Preparatório (antigo 2º

ano)

19,1 17,1 9,1 9,1 9,5 57,1 15 6,7 18,2 0 12,5 16 3º ciclo (antigo 5º ano liceal) 12,8 17,1 9,1 11,4 19 7,1 0 20 0 0 0 11,1

Ensino Secundário 6,4 2,4 18,2 25 9,5 0 30 6,7 0 0 6,2 11,1

Ensino Médio 0 0 9,1 0 0 7,1 5 0 0 0 0 1,2

Ensino Universitário 4,3 2,4 0 4,5 0 0 10 0 0 25 0 3,3

Não responde 2,1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6,2 0,8

145 Face à já referida pertinência do nível educacional dos progenitores nas trajectórias académicas e profissionais dos seus filhos204, como defende o modelo teórico da reprodução social de Bourdieu e Passeron (s/d) e Bourdieu (1979), verifica-se que o nível das habilitações dos progenitores destes alunos é efectivamente baixo, comprovando as dicotomias socioculturais que persistem em Portugal e são particularmente visíveis no ensino superior politécnico, “(…) o

politécnico é, nesta perspectiva, claramente o mais aberto no recrutamento social. A estrutura socioeducacional é significativamente mais qualificada nos pais dos estudantes que frequentam quer o ensino superior particular, quer o universitário público (…)” (Martins, Maurittie Costa, 2005: 38).

Saliência para a existência residual de casos de analfabetismo (Pai - EE e EM; Mãe - EE e EA) e uma predominância do ensino primário (Pai - EM, EMGI e CS; Mãe - EMGI e EE), sendo este nível mais representativo no sexo feminino, confirmando que nos encontramos na presença de uma população cujos progenitores apresentam níveis educacionais baixos. Esta realidade está interligada com o nível profissional (cf. Quadro 1 do Anexo III). Assim, e de uma forma notória assiste-se uma proeminência de profissões manuais, pouco qualificadas, sobretudo por parte dos progenitores do sexo masculino, situação particularmente visível ao nível das condições perante o trabalho, onde sobressaem, sobretudo, os trabalhadores por conta própria ou independentes. Contrariamente, o género feminino apresenta maior linearidade analítica; assim, 41% ocupam-se exclusivamente das tarefas domésticas205, sendo as restantes distribuídas por profissões manuais pouco qualificadas. Saliente-se, ainda, relativa representatividade desta população ao nível do

204

Como salienta Tavares et al: “(…) those from households with higher education levels preferred

universities. For instance, the percentage of fathers with a higher education degree of public and private university students was much higher than that of fathers of public and private polytechnic students, and the same holds true for the schooling level of mothers. On the other hand, the lower the level of schooling of the parents, the less different was the preference for the university and the polytechnic sub-systems. (…)Thus, the polytechnics admitted the highest percentage of students from families with the lowest financial resources. (…) The influence of family background was also observable in the choice of students between university and polytechnic degrees (…) those from households with higher education levels preferred universities. For instance, the percentage of fathers with a higher education degree of public and private university students was much higher than that of fathers of public and private polytechnic students, and the same holds true for the schooling level of mothers. On the other hand, the lower the level of schooling of the parents, the less different was the preference for the university and the polytechnic sub-systems. The results also showed that the household of origin not only influenced the probability of access to higher education, but also the type of discipline chosen by students.” (Tavares et al, 2008, 112-113).

205

Como salienta Martins, Maruatti e Costa: “Xo entanto é de assinalar que, em relação às mães, é no

ensino público politécnico que as “outras inactivas” têm maior peso (…) sobressaindo o trabalho doméstico como a marca mais reforçada desta condição face ao trabalho. “(…) 58% dos estudantes do ensino superior são provenientes das categorias sociais melhor equipadas de recursos económicos, culturais e sociais - os empresários, dirigentes e profissionais liberais e os profissionais técnicos e de enquadramento. Existe uma forte prevalência de origens sociais de profissionais técnicos e de enquadramento (…) sendo estes, aliás, os maiores portadores de qualificações, reflectindo-se nas próprias trajectórias escolares dos filhos. (…) Em relação a uma diferenciação por subsistemas do ensino superior, é no universitário público que o acesso é mais fechado e no politécnico onde a base de recrutamento é mais diversificada (…)” (Martins, Maruatti e Costa, 2005: 33-35).

146

funcionalismo público, movimento já verificado em Martins, Mauritti e Costa (2005) e que equaciona a importância do mercado público neste processo.

Tendo presente o contexto cultural e profissional verifica-se que os finalistas apresentam origens sociais diversificadas, com proeminência da categoria dos Trabalhadores independentes pluriactivos. Na categoria dos Empresários, dirigentes e profissionais liberais e Profissionais técnicos e de enquadramento destacam-se as engenharias (EI e EC), nas classes dos Trabalhadores independentes, e Assalariados executantes pluriactivos, os cursos de CS, GE e T. Estes dados permitem-nos equacionar a pertinência da origem social na escolha das áreas de formação académica, movimento sobretudo visível nas áreas de engenharias, aproximando-se do verificado em Mauritti (2002) e em Marques (2006).

Este movimento enquadra-se na perspectiva de Cabrito (1997) de uma forma mais evidente, e em Balsa et al (2001) e Machado et al (2003) de uma forma mais moderada, na constatação de um movimento de desigualdade social no acesso ao ensino superior e na afirmação de uma diferenciação social que confirma uma lógica reprodutora e de selecção social do sistema binário nacional que perdura, tendo presente que nos encontramos face a um ensino politécnico, com uma população predominantemente feminina, com classes sociais de mais baixos recursos económicos, qualificacionais e organizacionais e denotando um movimento evidente de procura regional de educação de índole superior. Esta situação reforça paralelamente a ideia de uma evidente menor selectividade social no acesso ao ensino superior, particularmente visível no ensino politécnico, o que contribui, consequentemente, para a existência de clivagens face ao ensino universitário.

A situação é confirmada do ponto de vista institucional, verificando-se uma postura crítica face ao capital cultural detido pelos alunos, no início da formação académica, “(…) o aluno que nos

chega não tem nenhuma autonomia (…) muitos deles nunca entraram numa biblioteca, não sabem procurar um documento, uma bibliografia… mas isto também é transversal, penso eu. É um problema do ensino em Portugal. (…) nós, no primeiro ano, temos que dar algumas dicas para eles saberem fazer uma comunicação, apresentar um trabalho, saber o básico de uma língua estrangeira, isto eram competências que eles já deviam chegar (…)” (Coordenador B),

que atinge por vezes situações extremas “(…) nós temos alunos com muitas dificuldades, nós temos feito milagres (…) já pegámos em alunos de direito e transformámo-los em engenheiros e estão nas empresas e as empresas não se queixam (…)” (Coordenador D).

A presente problemática levanta, segundo Vieira (1993), a questão dos estudantes de massas, que segundo Lapeyronnie e Marie (1992), se apresentam como os novos protagonistas deste sistema em mudança profunda. Importa, consequentemente, equacionar as questões de captação de novos públicos, reflexo do contexto de penúria de alunos do ensino superior em Portugal e do aumento efectivo da oferta de formação académica neste nível de ensino, materializada na diversificação de instituições de índole superior nas últimas décadas em Portugal. Este movimento é comprovado pela mutação evidente do tipo de alunos que acedem a este nível de

147 ensino, representando os trabalhadores-estudantes o exemplo mais representativo deste movimento.

No documento Diplomas e (Des)Emprego: um estudo de caso (páginas 152-157)