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E VOLUÇÃO DOS CONCEITOS DE S EGURANÇA E DE D EFESA

No documento Doutoramento (páginas 47-51)

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO-CONCEPTUAL

1. INTRODUÇÃO DE CONCEITOS

1.1. CONCEITOS OPERACIONAIS

1.1.2. CONCEITOS DE SEGURANÇA E DEFESA NACIONAL

1.1.2.1. E VOLUÇÃO DOS CONCEITOS DE S EGURANÇA E DE D EFESA

Desde cedo que o sistema político mundial vigente tem sido caraterizado pelas relações de poder entre os Estados (Fernandes & Borges, 2005, p. 19), fazendo com que cada sistema internacional tenha de enfrentar crises provocadas pelos desequilíbrios existentes entre os Estados que o integram e pela constante tendência da defesa incondicional dos interesses singulares. Nestas circunstâncias as noções tradicionais de Segurança e Defesa Nacional passaram a estar relacionadas com todos os setores e elementos que ditam a

36 Hierarquicamente, importa descrever o quadro organizado que envolve a estrutura do Poder Maritimo de um

Estado (Sea Power): num primeiro patamar encontra-se o «Naval Power», que abrange as Marinhas Militares e a Aviação Naval; depois o «Maritime Power», que compreende o «Naval Power», traduzido nos Fuzileiros Navais e as Guardas Costeiras; e por último o «Sea Power», que engloba o «Maritime Power», e outros elementos não armados, incluíndo meios aéreos militares não orgânicos com vocação marítima (Carvalho, 1982, p. 127).

37 No âmbito das Relações Internacionais, o conceito de "Poder" revela-se um complexo conceptual e prático

muito vasto, uma vez que diferentes escolas teóricas e pensadores defendem diferentes perspetivas, na medida que o conceito tem evoluído mesmo para as grandes potências; estas têm vindo a abdicar um pouco da sua vontade impositiva, de caráter coercivo, dando espaço á outras formas de relacionamento – hard power vs soft

power –, fazendo com que, na atualidade, seja mais complicada a determinação quantitativa e qualitativa dos

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sobrevivência do Estado, envolvendo também a totalidade dos seus recursos38 (Ribeiro, 2009, p. 15).

Assumindo que o sistema de segurança coletiva surge como um elemento essencial nas sociedades contemporâneas39, revestindo-se de substancial importância no quadro da Ciência Política e das Relações Internacionais (Moreira, 2011, pp. 123-124), assiste-se atualmente a um alargamento dos conceitos de Defesa e de Segurança Nacional, numa perspetiva mais inclusiva, para além daqueles «ditos clássicos», ao considerar-se como integradas as duas vertentes militares (externa e interna), incluíndo também as vertentes política, social, económica e tecnológica. Atualmente, a dimensão tecnológica surge como uma nova dimensão do poder efetivo de um Estado o que, associado à científica e à dimensão do ciberespaço, veio proporcionar a entrada numa nova Era: a da Informação. Ao Pretender-se demonstrar o desdobramento das ideias em torno da presente temática e o âmbito de cada conceito, o de Segurança e o de Defesa, torna-se necessário abordar estes conceitos de forma isolada, dado que os mesmos aparecem várias vezes deficientemente aplicados. Neste sentido, numa análise inicial à abrangência dos conceitos de "Segurança" e "Defesa", constata-se que o âmbito desta última se encontra mais associado às «ações», enquanto o da Segurança está associado aos «resultados» e a um sentimento (Ribeiro, 2009).

Inequivocamente, a evolução do conceito de Segurança encontra-se intrinsecamente ligada à evolução do conceito de fronteira e da reformulação do conceito de soberania, referente á ordem interna. De facto e com o passar dos anos, os conceitos clássicos de Fronteira e de Segurança encontram-se cada vez mais indissociáveis, visto que o território nacional deixou de ser o espaço privilegiado em que se afirma a segurança das pessoas e bens, passando a ser alvo da crescente disseminação da violência (a nível global) e da proliferação de novas ameaças e riscos para o Estado (Marchueta, 2002, p. 41). Este facto tem contribuído para que a intenção inicial no que se refere à divisão do mundo por fronteiras, «acertada»

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Estas questões tiveram importantes repercussões sobre as atividades de preparação e emprego dos sistemas estratégicos nacionais, uma vez que, na atualidade, os Estados se sentem permanentemente ameaçados, no seu conjunto, por diversas formas de coação, indiretas ou diretas, que se combinam e fortalecem reciprocamente, sendo as mais comuns de natureza económica/tecnológica e psicológica/ideológica, de liberdade dos mares, de abastecimento energético, etc, através de ferramentas e modelos diversificados. Nesta ótica, este envolvimento permanente de todos os recursos do Estado no âmbito da Segurança e Defesa, engloba ao mesmo tempo medidas de preparação técnica e psicológica (RAM), elaboradas com muita antecedência relativamente aos acontecimentos a que se destinam, de forma a maximizar as capacidades de resistência do Estado, face a um conjunto que lhe é disfavorável (Moreira, 2011).

39 A segurança coletiva é um Instrumento do controlo internacional e envolve sempre dois conceitos intimamente

relacionados: a soberania, porque esta intimamente relacionada com a sobrevivência do Estado enquanto peça do sistema internacional; e o Direito Internacional, porque a sua concretização exige a aplicação de ações coercivas que possam impôr esse Direito (Nye Jr., 2002, p. 105).

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pelos Estados e visando amparar a fragilidade das comunidades políticas por meio do providenciar da sua segurança e defesa, se encontre ainda longe de concretizar (Moreira, 1996, p. 258). Nestas circunstâncias verifica-se atualmente uma diluição dos domínios internos e externos da Segurança, com estes a encontrarem-se mais interligados com os da Defesa, atualmente encarada de uma forma mais «abrangente e desterritorializada», tendo em vista a contenção em conjunto das ameaças vindas do exterior40 (Ribeiro, 2009, p. 50).

Assim como refere Philippe David, o conceito de Segurança tem sido objeto de uma profunda renovação conceptual, com base na capacidade do Estado em conter de forma autónoma as ameaças à sua soberania, devido à evolução dos níveis clássicos de análise da segurança nacional, regional, internacional e cooperativa, para o nível de segurança comum, global e humana (2001, pp. 29-30). Segundo Sacchetti, a primeira grande evolução na ideia de segurança ocorreu, com a «assinatura da Ata Final de Helsínquia», em 1 de agosto de 1975, em plena Guerra Fria, uma vez que esta se dedicou a analisar atitudes, a definir comportamentos e a estabelecer princípios de segurança (Sacchetti, 2008, p. 20; Albuquerque, 1995, pp. 348-394). O êxito destas decisões permitiu posteriormente ampliar o seu âmbito à redução de armamentos e adotar o conceito de Segurança, não apenas restrito ao equilíbrio de forças em todos os níveis da escalada prevista pela dissuasão nuclear mas também como um resultado das iniciativas desenvolvidas para a criação de confiança (David, 2001).

O conceito de Segurança defendido, atualmente, no quadro das Relações Internacionais, refere-se à «segurança coletiva», entendida como um pilar essencial para a manutenção da estrutura dos Estados e do sistema mundial, englobando o espetro da segurança nacional dos países, ou de um espaço regional ou continental em que se centra a área de interesses desses Estados que dele fazem parte. Assim, conforme defende Abel Cabral Couto:

“O conceito de Segurança pode ser considerado como abrangendo todo um conjunto de interesses, que podem ir desde a garantia de acesso a matérias-primas essenciais até a protecção de investimentos e de cidadãos nacionais no estrangeiro, desde cinturas de segurança a zonas de influência ou neutralizadas, desde o controlo do nível de capacidade militar de adversários potenciais e vizinhos até à uniformidade dos regimes e sistemas políticos…” (1988, p. 71).

Por sua vez de acordo com o conceito defendido por Sacchetti (2008, p. 19), o conceito de Segurança Nacional consiste:

40 Na atualidade e contrariando a corrente realista, a localização geográfica das ameaças já não serve de base a

uma compartimentação do conceito de Segurança Nacional segundo as fronteiras do país, porque as ameaças são estruturalmente complexas, dispõem de grande mobilidade e possuem um caráter transnacional e difuso, que não respeita esses limites políticos (Morgenthau, 1993).

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“Na situação que garante a unidade, a soberania e a independência da Nação; a integridade do território e a segurança das pessoas e bens; a unidade do Estado e o desenvolvimento normal das suas tarefas; a liberdade de acção política dos órgãos de soberania e o regular funcionamento das instituições democráticas constantes do quadro constitucional”.

Na verdade a última definição demonstra que, quanto à extensão, houve uma seleção escalonada e séria dos interesses a proteger, perante a impossibilidade de salvaguardar todo o conjunto extenso de valores. Foi assim estabelecido o âmbito dos valores essenciais, sobre os quais devem incidir os esforços de integridade e de proteção, os chamados interesses e objetivos vitais do Estado. Numa visão mais aprofundada, Fernandes e Borges (2005, p. 77) defendem que a nível estratégico, a segurança é percebida como “um acontecer-fazer em que se garante (por oposição a estar garantido) a dialética de liberdade de acção, de vontades e de forças de uma dada sociedade enquanto racionalidade social estratégica”, face a um outro Ator hostil que representa riscos que um dado ambiente estratégico configura como uma ameaça ao Estado.

Encontra-se subentendido que o "sentimento de segurança" pressupõe não apenas o conceito de Defesa face ao exterior, mas também uma visão político-estratégica, em que se está menos inseguro quando se alcançam as metas traçadas que garantam a segurança desejável e não apenas quando se assegura a própria sobrevivência da Nação. Em suma, enquanto a Segurança Nacional representa um fenómeno psicólogo, resultante de um sentimento comum de defesa e garantia do interesse comum, exprimindo a sensação de salvaguarda, a noção de proteção e a imagem de tranquilidade de sentimentos, a Defesa Nacional surge como a dinamizadora e a potenciadora deste sentimento de segurança, face às ameaças que se vão proliferando do exterior (Ribeiro, 2009, p. 54).

Num outro prisma, surge o conceito de "Defesa Nacional" que remete quase sempre para a noção de um valor de resistência e proteção contra uma dada ameaça, constituindo o «conjunto de ações que permitem ao Estado proteger-se de uma ameaça latente ou concretizada, que afeta o Interesse Nacional» (idem, p. 55). A Defesa Nacional surge assim como uma atividade que visa garantir a Segurança do Estado, numa visão mais alargada tendo o seu conceito sofrido várias evoluções ao longo do tempo. Com efeito, no passado confundia-se com o conceito de Defesa Militar, porque estava maioritariamente restringido às questões militares; com o passar dos anos foi-se assistindo a uma evolução do conceito tradicional de Defesa Nacional, devido ao alargamento do seu âmbito, passando a abranger várias áreas e a contemplar uma coordenação intersectorial ou interdisciplinar, das quais o aparelho militar passou a ser um pilar, talvez o mais importante, mas não todo o seu suporte e

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que agora se distribui também por outras áreas do Estado (Ribeiro, 2009, p. 57). De acordo com o IDN, no seu primeiro conceito depois do 25 de abril, a Defesa Nacional surge como:

“O conjunto de medidas tanto de carácter militar como político, económico, social e cultural que, adequadamente integradas e coordenadas e desenvolvidas global e sectorialmente, permitem reforçar as potencialidades da Nação e minimizar as suas vulnerabilidades, com vista a torná-la apta a enfrentar todos os tipos de ameaças que, directa ou indirectamente, possam pôr em causa a segurança nacional” (citado por Cardoso, 1983, p. 100).

Desta definição entende-se que a segurança e a defesa pressupõem uma atividade permanente, destinada a minimizar vulnerabilidades, face aos riscos imediatos ou potenciais decorrentes das principais ameaças. Logo pressupõe que os Estados e as Organizações que melhor e mais rapidamente souberem adaptar-se às novas aplicações doutrinárias e práticas da Segurança e Defesa, estarão em melhores condições para proporcionar segurança e o necessário ambiente de proteção e de bem-estar aos seus cidadãos (Fernandes & Borges, 2005, p. 83), para que as mais atualizadas noções de Segurança e de Defesa, face aos riscos inerentes às ameaças globais, originaram um novo tipo de ator da cena internacional, criado a partir das estruturas de cooperação, de alianças e de integração de Unidades Políticas menores, os «Grandes Espaços» ou Blocos, de caráter político-estratégico e de fronteiras alargadas, mas com autonomia de gestão e de atuação (Marchueta, 2002, p. 113). Nesta linha de orientação e independentemente das várias correntes de pensamento dos diversos teorizadores e académicos que se têm debruçado sobre as temáticas de segurança e defesa, e respetivas conceções conceptuais e doutrinárias, o corpo da Constituição da República de Angola41 define os conceitos de Segurança e Defesa como constitutivas de linhas mestras que servem como bases de orientação de toda a estrutura que concorre para a promoção e a garantia da Segurança e Defesa do Estado.

No documento Doutoramento (páginas 47-51)