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O SOFT POWER ANGOLANO

No documento Doutoramento (páginas 114-119)

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO-CONCEPTUAL

3. A REALIDADE ANGOLANA: UMA ANÁLISE GEOPOLÍTICA E GEOESTRATÉGICA

3.6. FATOR POLÍTICA EXTERNA E SEUS INSTRUMENTOS

3.6.1. O SOFT POWER ANGOLANO

Como anteriormente exposto, com o término da guerra civil em Angola a «Política Externa Nacional» tem como principal linha de ação o fomento da economia, tendo em conta o melhor posicionamento geopolítico do país, através de uma maior interação com os países vizinhos e com as maiores potências mundiais, viabilizando assim uma maior dinamização e valorização da diplomacia. O Estado angolano através do seu Ministério das Relações Exteriores, tem alargado os seus organismos centrais de representação político-económica, permitindo por um lado a manutenção dos laços de amizade e cooperação com todos os Estados com os quais já se relacionam, e por outro lado a formalização de laços com outros

148 Importa sempre lembrar, que para as grandes potências mundiais, o poder militar surge não só como um

elemento de Segurança e Defesa, mas também como um elemento essencial da Política Externa, tendo em conta a sua possível aplicação como instrumento de dissuasão, persuasão, coação, gestão de crises, demonstração de força, apoio indireto a países aliados, entre outras formas de aplicação. Por sua vez, no que toca à Defesa ou mais explicitamente a Política de Defesa, onde as fronteiras assumem importância para a segurança dos Estados, a política externa angolana deve incorporar um conjunto de medidas e de meios, cuja execução pode ir desde a dissuasão militar à ameaça da guerra, ou em última instância, à própria guerra, mas como elemento aglutinador da Nação e potenciador da identidade nacional.

149 A Agenda Nacional de Consenso apresenta, no domínio regional, um conjunto de estratégias concretas, sendo

que neste âmbito o país pretende se afirmar como um parceiro económico privilegiado, permitindo a sua inserção na economia mundial.

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países, cujos laços de amizade são mais afastados150 (Chikoti & Vines, 2012, p. 3). Nesta ótica e considerando a atual dinâmica das relações internacionais, reconhece-se que existe a necessidade de adequar a atividade diplomática à atual conjuntura internacional, a fim de defender o Interesses Nacional, num cenário em que nos últimos anos a atuação de Angola tem-se mostrado imprescindível a nível regional e continental.

No intuíto de tornar a abordagem sobre o poder diplomático de Angola mais clara, abrangente e ao mesmo tempo direcionada ao objetivo, estabeleceu-se um paralelismo no que toca à taxonomia piramidal na qual a Estratégia se subdivide (Total, Gerais e Particulares), para fazer a descrição sobre a diplomacia de Angola de acordo com as áreas fundamentais da «nova diplomacia» (diplomacia económica, diplomacia securitária, diplomacia humanitária e diplomacia ambiental) (Silva, 2009, p. 637). Para efeitos deste estudo, o centro da abordagem incide apenas na dimensão securitária e económica da diplomacia nacional ou seja, foca-se na análise dessas duas perspetivas por considerar que são os dois principais fundamentos da mais recente Política Externa Angolana.

3.6.1.1. ADIPLOMACIA SECURITÁRIA

Atualmente observa-se que o fator segurança é um elemento económico, em virtude da economia estar diretamente dependente do sentimento de segurança e de estabilidade, bem como dos instrumentos de defesa. Assim sendo, com o término da guerra civil as FAA têm surgido como um forte suporte ao nível da política externa e da diplomacia geral, nas mais variadas dimensões, no sentido que a “Diplomacia securitária surge atualmente como uma componente da Diplomacia Geral do Estado e/ou das OI, que se dedica aos assuntos relacionados com a Segurança e Defesa151” (Silva, 2009, p. 637; Couto, 2002, p. 15).

Neste contexto, as dinâmicas da globalização levam à utilização das FA como instrumento da Política Externa e obrigam a uma maior reflexão e reorientação estratégica dos contextos de intervenção, em nome dos interesses conjunturais permanentes e não permanentes do Estado, nos quais o elemento segurança constitui um dos principais fatores

150 Assim, de forma a haver uma melhor implementação da política externa angolana, preconizando a defesa dos

interesses nacionais, sobretudo a nível político, securitário e económico, Angola detém atualmente mais de 72 embaixadas e representações consulares, espalhadas em vários países, por todos continentes, permitindo uma maior aproximação a todos os países parceiros. De facto, o chamado «soft power» angolano tem-se mostrado cada vez mais forte, no que toca à sua intervenção a nível da esfera internacional, permitindo dar uma nova dimensão ao país, sobretudo nos aspeto geopolítico, geoestratégico e geoeconómico, sendo o último a principal aposta do país, depois do final da guerra civil.

151 Nesta perspetiva, Abel Cabral Couto defende, “frequentemente as intervenções das Forças Armadas em

territórios terceiros, mesmo que para fins pacíficos, abrem naturalmente o caminho para outros interesses, em especial de natureza económica, com a tarefa de estabilização económica e social associadas”, fazendo com que a dimensão estratégica das operações das FAA não seja ignorada.

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para a consolidação do desenvolvimento nacional. Num período de paz e estabilidade nacional tem-se observado um aumento das missões das FAA no exterior de Angola, devido à necessidade de defender os interesses nacionais e alargar os laços de amizade com outros países, dado que as operações de paz desenvolvidas pelas FAA, ao longo da sua história, têm permitido ao país uma maior afirmação e visibilidade externa, e de reforço ao seu prestígio internacional, valorizando assim a sua imagem como Estado soberano e as suas FA, enquanto braço armado do Estado.

Diante disso, as FAA constituem um instrumento essencial para a prossecução dos fins do Estado, nomeadamente garantindo a Segurança e a Defesa Nacional, nas diversas fronteiras e espaços estratégicos, preferencialmente o mais afastado possível do território dos Estado numa perspetiva de atuação de «operations out of área», sobretudo porque a estabilidade regional é essencial para o desenvolvimento nacional. Neste cenário, existe a noção no seio dos decisores políticos, sobre a necessidade do redimensionamento da fronteira nacional, com vista a dar resposta aos inúmeros desafios que se colocam ao país nestes novos tempos. Por isso, o empenhamento das FAA em «Missões de Paz» no continente Africano representam uma missão ao nível da «Política Externa», com incontornáveis dimensões e significados estratégicos, visto que o "Conceito Estratégico de Defesa Nacional" reflete a importância crescente de atuação no quadro das intervenções internacionais, onde na última década importa sublinhar a relação privilegiada mantida com a Guiné-Bissau, num primeiro plano, sobretudo no âmbito militar, com contornos profundamente económicos152 (Saraiva, 2011, p. 96); e noutro com a RDC e São Tomé e Príncipe.

O emprego das FA em Missões de Paz vem assim consolidar a consciência de que a utilização do poder militar no âmbito da diplomacia e em missões de paz é sempre preferível à guerra, ou ainda Reportando aos tempos de Churchill, citado por David (2001, p. 281) “…to jaw-jaw is always better than to war-war…”, fazendo com que as FAA representem hoje um elemento agregador e estruturante na sociedade civil, com relevância para a coesão nacional,

152 A atuação das FAA no âmbito da CEEAC, nos últimos anos, tem pesado bastante para a participação de

Angola na agenda continental sobre a segurança e estabilidade, em que a sua presença em vários teatros de operações despertou a consciência de outros Estados africanos, quanto a sua importância no continente. Por outro lado, conscientes de que o MoU assinado por Angola e pela Guiné-Bissau envolve também a exploração de recursos naturais (petróleo, bauxite, etc.), percebe-se os ganhos económicos da «diplomacia securitária». Assim, a Guiné é um destino inevitável dos esforços Angolanos de política externa e de investimento, visto ser claro o desejo de afirmação de Angola no continente. Todavia, as relações de Angola com a Guiné-Bissau têm vindo de forma constante a perder importância e as ligações têm sido marcadas por um esmorecimento e desgaste, devido também a fatores políticos, que determinam o confronto entre as autoridades angolanas e as autoridades guineenses. Basta lembrar os incidentes ocorridos entre os finais de março e princípio do mês de abril de 2012, em que os soldados angolanos foram acusados por algumas autoridades guineenses de protegerem o Primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, durante uma tentativa de golpe.

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na política interna, e com crescente importância na Política Externa. O processo de reestruturação, redimensionamento e de reequipamento (3R) em curso surge em conformidade com esta sua missão, enquanto instrumento da ação politico-estratégica do Estado (Leão & Rupiya, 2005, pp. 36-40).

Deste modo, parece provável que enquanto as estruturas regionais no âmbito da Segurança e Defesa não forem consistentes, Angola, com a apetência que tem demonstrado em intervir além-fronteiras, muito devido ao potencial das suas FA, continue a ganhar espaço para a sua intervenção, tendo em vista a contenção dos conflitos regionais internos que se multiplicaram logo após o fim da bipolarização153. Neste particular e tendo em conta a dimensão que as FAA vêm adquirindo nos últimos anos, o Estado precisará de estar efetivamente preparada em termos militares para o cumprimento da sua missão, enquanto elemento da Política Externa, onde será necessário continuar a fortalecer os laços de amizade com outros Estados, Organizações e fora internacionais, com vista a adaptar o seu poder castrense ao quadro geopolítico, nomeadamente no âmbito da componente naval.

3.6.1.2. ADIPLOMACIA ECONÓMICA

Após a queda do Muro de Berlim as relações diplomáticas deixaram de estar viradas exclusivamente às questões políticas e de Segurança e Defesa, passando a envolver com maior rigor as questões económicas, fazendo com que a “diplomacia económica” não constitua uma novidade no espetro da «Diplomacia Geral», já que ao longo da História mundial os interesses económicos e comerciais estiveram quase sempre no centro dos conflitos. Por isso, ainda hoje, a «diplomacia económica» surge como um importante instrumento da política externa de qualquer país, sendo uma forte influenciadora da Geoeconomia e da Geofinança154 (Tomé, 2011, p. 25).

No entanto tal como acontece com a «definição clássica de Diplomacia», não existe uma definição consensual de Diplomacia Económica, pelo que neste trabalho se considera como objetiva e sintética a definição apresentada pela «Resolução do Conselho de Ministros

153 Conforme apontou P. Chabal, «Angola is undoubtedly acting as if it considers itself to have become an

arbitre of these potentially dangerous regional conflicts» (citado por Guedes, 2011, p. 33).

154 Em boa verdade, na atualidade a atividade da diplomacia na cena internacional recorre em maior ou menor

grau às formas de pressão económica e psicológica, fazendo com na realidade os Estados recorram a diplomacia económica como parte integrante da estratégia económica nacional. Esta dualidade existente entre a estratégia e a economia está também relacionada com a natureza dos objetivos últimos e inalienáveis do Estado (Couto, 1988, p. 44). Portanto, considerando a necessidade de diversificação e ampliação dos setores geradores de riqueza, a fortificação dos laços de diplomacia económica angolana com os seus parceiros internacionais faz parte da «Estratégia Económica de Angola», constituindo um objetivo estratégico nacional.

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de Portugal n.º152/2006», que indica que a Diplomacia Económica155 é “a atividade desenvolvida pelo Estado e pelas suas instituições públicas fora do território nacional no sentido de obter os contributos indispensáveis à aceleração do crescimento económico, a criação de um clima favorável à inovação e à tecnologia, bem como a criação de novos mercados e à geração de emprego de qualidade” (RCM 152/2006, Série I-DR 216). Dessa forma no caso de economias pequenas, como é a economia angolana, com um mercado de pequena dimensão e uma grande dependência do mercado externo, a ação diplomática surge como um vetor essencial, sobretudo na adaptação deste mercado à economia internacional e na criação de novas oportunidades de IDE. Hoje os Estados já não são autossuficientes, num cenário em que cada vez mais se observa o surgimento de novos atores na estrutura económica global156.

Nesta perspetiva, em Angola crescem cada vez mais as preocupações do Governo, quanto ao estímulo da atividade económica nacional, quer «abrindo portas» para as empresas estrangeiras investirem no país, quer promovendo oportunidades aos empresários nacionais de investirem no estrangeiro, como desenvolvendo o mercado interno e contribuindo para o crescimento da economia nacional. Tendo em vista a melhor condução da diplomacia económica, o Estado tem partilhado esta missão com o setor privado, com vista a atingir os objetivos económicos nacionais e a permitir uma maior afirmação das empresas nacionais no estrangeiro, evitando assim possíveis tensões entre os dois setores157.

Consequentemente e tendo a plena noção da importância geoestratégica do petróleo, Angola tem apostado nos últimos anos na diversificação económica através dos recursos provenientes das receitas do petróleo. O Grupo Sonangol158 surge atualmente como a

155 A diplomacia económica compreende duas vertentes principais: a Política Externa (económica e comercial)

que visa os elementos essenciais para o relacionamento bilateral, regional e multilateral; e a promoção internacional das exportações de bens e serviços e de IDE.

156 Em Angola esta nova lógica mundial, acelerada pela globalização e favorecida pela queda do sovietismo, foi

visível pela maior multilateralidade da economia angolana, logo após a fundação da II República, em que observou-se uma erupção combinada de numerosos atores não-estatais no universo exterior da política externa angolana. Pelo que, de acordo com Clapham, citado por Guedes (2011, p. 28), “changes in the structure of

international politics after end of the Cold War helped to increase both the scope and the legitimacy of non- governmental relief operations. The decline in respect for national sovereignty, coupled with the removal of the constraints imposed by superpower competition”.

157 No caso de Angola, as relações económicas, estabelecidas a nível internacional, têm sido pautadas de acordo

com a Agenda Nacional de Consenso. As estratégias económicas do Estado visam a sua maior inserção e afirmação na economia mundial, aparecendo como um parceiro privilegiado dos seus parceiros económicos. O principal órgão de coordenação da política externa e da diplomacia económica bilateral de Angola é o Ministério das Relações Exteriores (MIREX), com a ajuda da Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP) e com envolvimento direto do presidente da República.

158 A SONANGOL – Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola – foi criada pelo Decreto n.º 52/76, de 9

de junho, com um estatuto provisório posteriormente revogado pelo Decreto n.º 97/80 de 2 de setembro (Teixeira, 2012, p. 19). A Sonangol foi apenas criada em junho de 1976, como concessionária do petróleo

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Instituição pivô pública do setor petrolífero e também como o principal instrumento da estratégia e diplomacia económica nacional, porquanto a sua atuação tem sido respeitado pelos seus homólogos africanos, o que faz com que a mesma estabeleça laços de partilha de experiência no setor da energia com outros países, ajudando desse modo no estabelecimento de algumas empresas do ramo em países parceiros, a saber a SNPC – Congo Brazaville (Société Nationale des Pétroles du Congo). Neste quadro, a Sonangol além de ser a empresa responsável pelas atividades de Upstream no país surge como «o principal fomentador do desenvolvimento nacional», estando responsável pela viabilização da maior parte das parcerias público privadas no país e pela internacionalização de muitas empresas nacionais.

É notável o impacto económico que a Sonangol tem para o setor petrolífero e não petrolífero, tendo parceria com a maior parte dos grandes grupos empresariais angolanos, surgindo como a principal "arma" da diplomacia económica nacional e o motor para o desenvolvimento nacional. Na atualidade, a Instituição encontra-se fortemente apostada em investir no mercado português, detendo grandes contribuições e parcerias em grandes grupos empresariais, dentre os quais: Enacol, Galp Combustíveis, Millennium BCP, EDP Energia, Amorim Energia, Caixa Geral dos Depósitos, Banco Santander Totta, Mota Engil, Escom, Rio Forte, entre outras empresas de vários setores (Carvalho, 2011a). Até ao ano de 2015 a Sonangol tem em carteira o objetivo de se tornar numa empresa de energia integrada, competitiva e de projeção internacional, com alto nível de desempenho na base das melhores práticas de governação do setor petrolífero (Sonangol, 2012, p. 5), de forma a ter uma maior participação na afirmação do Estado no xadrez internacional, como elemento chave da Política Externa de Angola.

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