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Educação em Saúde no âmbito da Atenção Básica

2.1 POLÍTICAS DE SAÚDE BRASILEIRAS E SUAS REPERCUSSÕES À POPULAÇÃO

2.1.3 Educação em Saúde no âmbito da Atenção Básica

A primeira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada no Canadá, em novembro de 1986, resultou na Carta de Ottawa. Este documento apresenta a noção de Educação em Saúde, além de trazer a idéia de empowerment e consciência política comunitária. (BESEN et al., 2007). A Carta de Ottawa (1986 p.1) apresenta a concepção de Promoção de Saúde como: “nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo maior participação no controle deste processo.” A promoção da saúde está diretamente ligada a ações de capacitação das pessoas para o estado de bem estar físico, mental e social, para isto, os indivíduos necessitam identificar aspirações, satisfazer necessidades e transformar positivamente o meio ambiente (OTTAWA, 1986).

A Atenção Básica, organizada a partir da atuação da Estratégia Saúde da Família, é o nível de atenção onde são priorizadas as ações de promoção da saúde. Segundo Machado e outros (2007), a ESF é percebida como modelo inovador, estabelecida a partir de uma nova ética social e cultural e ainda, no ideário de promoção da saúde. Dentre todas as ações da ESF na comunidade, encontram-se as ações educativas, como instrumento para estimular a auto- estima e o auto-cuidado dos usuários, produzindo reflexões que conduzam a modificações na comunidade (MACHADO et al., 2007). A Estratégia Saúde da Família compõe um importante dispositivo para a prática de Educação em Saúde.

De acordo com Besen e outros (2007 p.64), a ESF é observada como objeto de Educação em Saúde, que desempenha uma função central na prática educativa direcionada para a promoção da saúde, “como um conjunto de atividades orientadas a propiciar o melhoramento de condições de bem estar e acesso a bens e a serviços sociais”. Machado e outros (2007) afirmam que educação em saúde abrange a participação da comunidade sobre as

questões emergentes do cotidiano e não somente dos usuários que se encontram sob a situação de adoecimento, caracterizando, deste modo, em ações que também visam a promover saúde. Por meio da educação em saúde os usuários são estimulados a adotarem hábitos que promovem saúde, reduzindo, desta forma, as possibilidades de adoecimento por problemas controláveis.

Construir conhecimentos por meio das ações em educação em saúde requer a necessidade de desenvolver um processo educativo que envolva a comunidade por meio de uma participação efetiva, que possibilite uma reflexão crítica das condições de saúde e dos fatores que influenciam o modo saudável de vida (MACHADO et al., 2007). Os autores ainda pontuam que a educação em saúde necessita propor ações que conduzam o indivíduo ao exercício da sua autonomia e emancipação, enquanto sujeito histórico e social com capacidade de sugerir ações e decisões de saúde para o seu cuidado, para o cuidado da sua família e da comunidade. Com o conhecimento acerca dos determinantes em saúde, o usuário torna-se mais ativo no seu cuidado, com mais capacidade de se auto-gerir, adotando medidas que conduzem para a manutenção da sua saúde.

Oliveira (2005 p. 425) enfatiza que a educação deve ir além da concepção biomédica e incorporar objetivos mais amplos, visto que a saúde deixa de ser concebida como a ausência de doença. Deste modo, pontua a autora, a educação em saúde não deve direcionar apenas para a prevenção de doenças, mas sim, a preparar o usuário para a conquista de uma vida saudável, estimulando o indivíduo a decidir sobre sua vida, desenvolvendo “uma noção de autonomia que cria um ideal de autogoverno”. As ações em educação em saúde necessitam ser direcionadas de modo a estimular os usuários à reflexão de melhores condições de saúde e de como preservá-la, desenvolvendo, deste modo, uma consciência crítica dos usuários frente aos determinantes da saúde.

Segundo Oliveira (2005), o modelo preventivo, também chamado de educação em saúde tradicional, é fundamentado nas concepções biomédicas e tem por objetivo prevenir doenças. A autora aponta que este modelo não considera o fato de que as diferentes formas de vida são resultados de uma ação recíproca de aspectos socioculturais e individuais e que fatores sociais e culturais que organizam a vida têm influência nas escolhas do dia-a-dia das pessoas. Ou seja, determinam que as causas de saúde e doença sejam resultado direto do comportamento individual dos usuários. Isto resulta em classificar a maneira como as pessoas vivem, em certo e errado, conduzindo assim a um julgamento tendencioso (OLIVEIRA, 2005). Besen (2007) afirma que este modelo é baseado na tentativa de mudanças dos comportamentos das pessoas, sendo por vezes, exercido de forma vertical e impositiva. Pode-

se dizer que esta forma de educação em saúde está direcionada a erradicar doenças por meio do controle dos comportamentos individuais.

Neste modo de conduzir a prática de educação em saúde, não são considerados os saberes dos usuários e nem sua capacidade de, através da sua autonomia, modificar sua realidade. Sobre a maneira de conduzir o ser humano ao conhecimento, Freire (1987) afirma que as pessoas, no momento da aquisição de um novo saber precisam, primeiramente, reconhecer-se enquanto sujeitos. O modelo preventivo não pressupõe um lugar de importância aos usuários, considera apenas o saber técnico ao qual as pessoas precisam aderir. Segundo Freire (1987 p. 29) “ao defendermos um permanente esforço de reflexão dos oprimidos sobre suas condições concretas, não estamos pretendendo um jogo divertido em nível puramente intelectual. Estamos convencidos, pelo contrário, de que a reflexão, conduz a prática”. Pode- se dizer que aos priorizar a oportunidade de reflexão aos usuários acerca de suas condições e vivências, não se está reduzindo a educação em saúde apenas a uma prática intelectual, mas acredita-se que a partir da reflexão é que conduz a prática, ou seja, a um novo modo de vida que objetiva a saúde.

Para o desenvolvimento de uma prática em educação em saúde que estimule a autonomização do sujeito e não apenas imponha os saberes, é preciso que os profissionais em saúde saiam do lugar do suposto saber e venham a perceber no usuário potencialidades para também melhor conduzir sua saúde. De acordo com Freire (1987 p.30), “se esta crença nos falha, abandonamos a idéia ou não a temos, do diálogo, da reflexão, da comunicação, e caiamos nos slogans, nos comunicados, nos depósitos, do dirigismo.” A concepção de que enquanto técnicos em saúde, os profissionais são detentores do conhecimento, impede a aproximação entre os saberes técnicos e populares e a interação entre profissionais da saúde e usuários.

Segundo Machado e outros (2007), a prática de uma educação que visa a conscientização e mudança requer uma relação aproximada entre os profissionais da saúde e a população. Os autores afirmam que nesta relação educativa passa a ser produzido um conhecimento coletivo, ocasionando transformação mútua, pois ambos possuem conhecimentos distintos. Educadores e educandos, quando intencionados à uma mesma realidade, quando se encontram numa mesma tarefa em que ambos são sujeitos e estão dispostos a descobri-la, passam também a ser coadjuvantes na criação do mesmo conhecimento. (FREIRE, 1987). Percebe-se que o vínculo entre os membros da equipe ESF e os usuários também pode ser um facilitador para a educação em saúde, pois, a medida que um

maior contato entre ambos é efetivado, aumentam também as possibilidades de engajamento nas ações, o que pode resultar na criação de novas práticas.

Freire (1987) pontua que o caminho da libertação, ou seja, da tomada de consciência, não está no ato de ditar o que deve ser feito, mas sim no diálogo. Os profissionais da ESF precisam se dispor para juntamente com a população abordar as causas em saúde a serem trabalhadas, isto a partir de um diálogo que também considere o conhecimento da comunidade e formas que ela encontra para a resolução da questão. Os membros das equipes de ESF passam a desenvolver a função de facilitadores do processo de educação em saúde, ou seja, conscientização dos usuários sobre as causas da saúde e de seus determinantes. (MACHADO et al., 2007).