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2.1 POLÍTICAS DE SAÚDE BRASILEIRAS E SUAS REPERCUSSÕES À POPULAÇÃO

2.1.4 A Psicologia na Atenção Básica em Saúde

De acordo com Kahhale (2003) os profissionais da psicologia adentram no campo da saúde por volta dos anos 1970, quando os cuidados primários além dos serviços médicos, passam a envolver também as áreas do serviço social e da psicologia. A inserção destes profissionais é resultado de um movimento no Brasil que lutava por direito à saúde de qualidade, nesse período destaca-se também o movimento dos psicólogos na luta pela conquista de atuação nos espaços de atenção primária, no que atualmente é nomeado de Unidade Básica de Saúde. Segundo Kahhale (2003), o desejo dos psicólogos em atuar nesse campo se tornou possível com a mudança do conceito de atendimento clínico psicológico que, de curativo ampliou-se também para o exercício de ações de prevenção e promoção de saúde. De acordo com Borges e Cardoso (2005) a psicologia vem conquistando maior espaço no âmbito da saúde, contribuindo para a abrangência do processo de saúde, doença e cuidado.

A Atenção Primária à Saúde atualmente tem sido organizada pela Estratégia Saúde da Família, a qual apresenta uma ampliação na perspectiva de assistência à saúde da população. Borges e Cardoso (2005) apontam que esta nova configuração de atendimento primário à saúde possibilita abertura de espaços de atuação para a psicologia, que ao inserir-se neste cenário passa a reformular suas práticas tradicionais de modo a contribuir com as diretrizes preconizadas pelo SUS. Kahhale (2003) enfatiza que a atenção básica exige um empenho diferenciado do qual o psicólogo está habituado nos espaços clínicos, onde até

mesmo a característica da clientela é diferente na composição desses dois campos de atuação. O exercício profissional na atenção básica requer um projeto de intervenção, o qual deve ser explicitado a mudança pretendida e também engloba “recriar sentidos e refazer projetos de vida, o que permitirá apropriação da subjetividade individual e social, possibilitando o controle social da saúde.” (KAHHALE, 2003 p.188). O psicólogo em uma UBS volta sua atuação para o coletivo, de modo a estimular nos usuários uma identidade social que venha a beneficiar a comunidade como um todo.

Segundo Bock (1999), a psicologia tem se disponibilizado para novas leituras, onde tem se procurado compreender o aspecto psicológico a partir das relações sociais e de modos de produção de sobrevivência. Segundo a autora, ao psicólogo não compete mais ter uma visão restrita de sua intervenção, voltada somente para o indivíduo como se este não tivesse envolvido com sua realidade social, sendo ao mesmo tempo, produtor e produto dela. Faz-se necessário perceber uma intervenção como social, ainda que esteja apenas em nível individual. É preciso extinguir a concepção de que o mundo psicológico não está relacionado com os aspectos sociais e que o sofrimento psíquico não está atrelado às questões objetivas da vida. Os psicólogos precisam se apropriar da idéia de que ao fazer psicologia, através de suas práticas e conhecimentos, estão também interferindo na sociedade (BOCK, 1999).

Pensar em psicologia no âmbito da Estratégia Saúde da Família atribui a reflexão nos processos de trabalho que se originam nesse espaço e as relações que nele transcorrem; é refletir e problematizar as diferentes formas de intervenção, que precisam ser criativas para compor trabalhos que sejam condizentes com a realidade da comunidade assistida (BORGES; CARDOSO, 2005). A psicologia, segundo os autores, tem contribuído para a construção de modos diferenciados de intervir na saúde, pois busca revisar suas práticas com vistas a aprimorar as formas de atender as necessidades levantadas no campo de atuação, e deste modo, possibilita a geração de novos saberes e a ampliação de sua inserção na saúde.

O psicólogo na Estratégia Saúde da Família precisa atuar conforme a política que a fundamenta, priorizando maneiras de intervenção que efetivem as diretrizes de promoção de saúde e prevenção de agravos. Conforme exposto anteriormente, ao profissional é colocado o desafio de rearticular suas práticas clínicas, o qual está mais habituado, e desenvolver práticas que sejam harmoniosas com a PNAB. Este desafio tem sido enfrentado à medida que a psicologia adentra esses espaços e procura perceber as dinâmicas de funcionamento. Bock (1999 p. 327) afirma,

O psicólogo pode e deve, hoje, pensar sua intervenção de maneira mais ampla, no sentido da promoção da saúde da comunidade – e isto significa compreender o sujeito como alguém que, ampliando seu conhecimento e sua compreensão sobre a realidade que o cerca, se torna capaz de intervir, transformar, atuar, modificar a realidade.

Bock (1999) aponta que o desafio enfrentado pelos psicólogos é o de construir uma profissão que se identifique com a realidade da maioria da população brasileira. A autora destaca o povo brasileiro que luta e sofre devido às condições de vida que possuem e afirma que a psicologia precisa seguir atentamente o movimento dessas dificuldades e construir, frente à elas, respostas técnicas e científicas. À medida que a psicologia, inserida em uma unidade de saúde, se atenta para a forma de viver dos usuários, consegue promover ações de promoção de autonomia e mecanismos de enfrentamento a estas necessidades. E desta forma, possibilita uma aproximação dos usuários aos serviços de saúde e consequentemente, com os profissionais que ali atuam.

A Estratégia Saúde da Família é organizada de modo que tenha uma unidade de saúde inserida em um território; preconiza o trabalho em equipe, que mantém como foco a família e na cultura local; e principalmente, acompanha o cotidiano das pessoas. Borges e Cardoso (2005) afirmam que esta forma de organização da ESF vai ao encontro de questões que solicitam acolhimento, vínculo e maior interação entre equipe e comunidade. Os autores colocam que o estabelecimento de vínculo nas relações de trabalho entre os profissionais e também, profissionais com os usuários é foco da Estratégia Saúde da Família e também da Psicologia. Desta forma, Borges e Cardoso (2005, p.30) irão dizer acerca da relação ESF e Psicologia que,

a parceria pode ser útil para pensar discursos, na saúde, que propiciem a construção de espaços viabilizadores de acolhimento e a construção do vínculo, contribuindo para a reflexão e a problematização dessas práticas que se propõem coletivas.

França (2006) afirma acerca do papel do psicólogo na atenção básica, que este precisa priorizar o acolhimento dos que procuram ao serviço e deste modo, favorecer o vínculo do usuário com a unidade de saúde e com os integrantes da equipe. Borges e Cardoso (2005) apontam que é de interesse da Psicologia o desenvolvimento de práticas relacionais e de ações que possam ser compartilhadas entre as pessoas envolvidas. Uma atuação que prioriza tais aspectos demonstra que o acolhimento e a efetivação do vínculo podem ser funcionais em um espaço coletivo de trabalho.