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EDUCAÇÃO POPULAR E O DIÁLOGO COM O FEMINISMO

No documento Anais Completos (páginas 149-157)

Jociani Fatima Alves Pinheiro (UNOESC) jopinheiro.pjr@gmail.com Educação e contemporaneidade Categoria: Comunicação Oral

Resumo: Trata-se de um estudo exploratório sobre elementos sócio-históricos da Educação popular no Brasil e de

como ela dialoga com o Feminismo, reafirmando a importância da práxis libertadora defendida por Paulo Freire. Essas reflexões referem-se ao período compreendido entre final dos anos 1940 a 1960, quando surgem as ideias e os escritos freirianos. A síntese foi elaborada a partir de estudo bibliográfico e contou com Paulo Freire e Dermeval Saviani, como autores de referência, para articular outros intelectuais orgânicos que abordam o referido tema. As conclusões apontam para a convergência entre a Educação popular e a construção do Feminismo a partir de saberes historicamente construí- dos por mulheres que insurgem-se contra a invisibilidade imposta pela sociedade patriarcal e machista.

Palavras-chaves: educação popular; feminismo; libertadora

1 INTRODUÇÃO

A expressão “educação popular” foi usada, inicialmente, na Primeira República, intrinsecamente ligada com o “processo de implantação dos sistemas nacionais de ensino ocorrido ao longo do século XIX”, de acordo com Saviani (2013). Nos anos 1940 até 1963, em consequência da implementação da política populista de mobilização das mas- sas, do crescimento industrial, do aumento da população urbana, bem como da busca pela ampliação de participação nas votações eleitorais (condicionada à alfabetização), inicia-se a implantação das escolas primárias e as campanhas de alfabetização em todo o país, com amplo apoio de dirigentes políticos, pois estes dependiam do voto para terem êxito no processo eleitoral (SAVIANI, 20 13)

É nesse contexto que o movimento de educação popular tem início no Brasil, dentro de uma conjuntura social, política e econômica conflituosa, entre a extrema direita, o populismo e as forças de esquerda atentas à neces- sidade do avanço da consciência das massas, esta que contribui decisivamente para que a mobilização assumisse outra significação, bem como “a educação passa a ser vista como instrumento de conscientização” (SAVIANI, 2013, p. 317). São nessas circunstâncias que a educação popular solidifica o termo “popular”, das bases, construída com o povo.

Do “chão da vida”, da base, das expressões culturais, da realidade social e econômica do povo, nasce a edu- cação popular de que falaremos. Ela surge carregada de simbolismo, ligada aos movimentos e organizações populares, num processo dialógico com sujeitos coletivos e capazes de mudanças em favor da justiça, com bases emancipatórias influenciando práticas educativas também dentro das escolas.

A educação popular se faz e refaz numa teia grandiosa de práticas populares, perpassa a escola, onde edu- cador/a e educandos/as se misturam em suas realidades e constroem momentos de aprenderes e ensinares compro- metidos uns com os outros, atravessa os muros e se faz no cotidiano de lutas coletivas, ligadas aos estudos, debates e organizações em favor da vida dos povos ― embora não tenha tida a importância e relevância que merece dentro dos espaços formais de educação, inclusive a academia.

É impossível falar, descrever ou tentar abordar a educação popular sem trazer como principal referência, o educador pernambucano Paulo Freire, que propõe a teoria da Educação Libertadora, dentro de uma pedagogia radical enraizada na conscientização do povo enquanto classe. Suas obras fazem uma ligação estreita entre a realidade brasileira e a possibilidade da educação ser instrumento de libertação da opressão, como diz: “a educação não podendo tudo, pode alguma coisa” (FREIRE, 1992).

O trabalho de Paulo Freire influenciou não só a educação no Brasil, como em toda a América Latina, bem como na África e em programas isolados na Europa, na América do Norte e na Austrália.

Neste artigo buscamos revisitar elementos da história da educação popular a partir de pesquisa bibliográfica, perpassando a ideia de “outro mundo possível”, descrito por Paulo Freire e outros educadores. Nesse sentido é que aparecem as mudanças urgentes nas relações de gênero e o debate sobre feminismo popular e classista, inclusive onde este se entrecruzam com a educação popular.

A maioria dos movimentos feministas e outros movimentos sociais que têm debatido as relações de gênero buscam em seu cotidiano as práticas educativas, como em momentos de formações, seminários, debates, articulação de

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grupos de partilha e de luta. Isso indica que para o feminismo a educação é um elemento de fundamental, especialmen- te para mulheres da classe trabalhadora, que precisam entender o mundo no qual estão inseridas para poder transfor- má-lo de forma coletiva e definitiva. Essa práxis educativas está interiormente ligada à educação popular.

2 REMEMORANDO A EDUCAÇÃO POPULAR

A terminologia “educação popular” aparece pela primeira vez na educação brasileira no início do século XX em um contexto histórico onde a maioria da população não tinha acesso à educação formal, existindo, portanto, uma grande massa de analfabetos. O país buscava o desenvolvimentismo e a modernização, e a política estava atrelada ao capitalismo periférico e populista, influenciado pelas nações Europeias e da América do Norte.

A perda da hegemonia dos latifundiários cafeicultores e a ascendência da burguesia industrial brasileira, com uma nova estruturação econômica no país, configurando outra realidade de acúmulo do capital e bens de produção, veio também a modificar e exigir novos rumos para a educação. Esta passa a ter a responsabilidade da qualificação e diversificação da mão de obra para o mercado industrial, bem como a necessidade de alfabetizar para aumentar o con- tingente eleitoral. É nesse período que e a educação de jovens e adultos ganha expressão.

No final da década de 40 a educação é marcada pelas discussões da educação de base, surgindo várias campa- nhas ministeriais e a construção do sistema educacional brasileiro. Os programas e campanhas de educação de adultos entraram como iniciativa criada para a classe trabalhadora, e não com a classe trabalhadora, ou seja, o objetivo tinha a ver com a necessidade dos governos e poderosos e não com o interesse do povo. Nesse contexto, a educação popular era concebida como a extensão da educação formal, que tinha o objetivo de contribuir na adaptação do povo para a realidade econômica e política do momento.

A educação de base era entendida como o processo educativo destinado a proporcionar a cada indiví- duo os instrumentos indispensáveis ao domínio da cultura de seu tempo, em técnicas que facilitassem o acesso a essa cultura − como a leitura, a escrita, a aritmética elementar, noções de ciências, de vida social, de civismo, de higiene − e com as quais, segundo suas capacidades, cada homem pudesse de- senvolver-se e procurar melhor ajustamento social (BEISIEGEL, 1989, p. 14).

Segundo Paiva (1987), na década de 1950 educadores, entre eles Paulo Freire, aprofundaram o debate em torno da educação de jovens e adultos (EJA), alguns deles acreditavam que a EJA poderia ser uma ferramenta para cons- trução de ideias e consciências. Para esses educadores a educação que era destinada às classes oprimidas não poderia ter caráter somente de transmissão de conteúdo, mas na construção de seres críticos a partir de suas realidades.

Saviani (2013, p. 317) esclarece que na primeira metade dos anos 1960 é que a concepção de educação po- pular assume outro significado, trazendo consigo uma bagagem de luta e organização popular. A educação passa a ser considerada instrumento importantíssimo na construção do “pensar” da classe trabalhadora, ligada ao avanço de cons- ciência de classe e libertação das situações e opressão. Começa a ser vista como algo construído “do povo, pelo povo e para o povo”, deixando de ser destinada somente para as elites que a usavam para dominação e manipulação das pessoas. Esse novo conceito de educação popular tem seu início em Recife/PE, onde várias iniciativas estavam ocor- rendo, como os Centros Populares de Cultura (CPCs), ligados a União Nacional dos Estudantes (UNE), os Movi- mentos de Cultura Popular (MCPs), liderados por Paulo Freire, e o Movimento Popular de Base (MEB), criado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – este coordenado por leigos que deram ao “movimento um cará- ter de conscientização e politização do povo” (SAVIANI, 2013, p. 317). Essas iniciativas tinham o respaldo dos debates e estudos em torno da realidade brasileira efetuada no âmbito do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE). Estes, por sua vez, seguiam as reflexões feitas por pensadores cristãos e marxistas do pós-guerra europeu. O Concílio Vaticano II também influenciou muito nesse entendimento de educação popular, já que propunha a doutrina social da Igreja, onde leitos e leigas tornavam-se agentes de trabalho de base nas comunidades e protagonistas de um novo “jeito de ser Igreja”, a igreja dos empobrecidos, trazendo em sua teologia a palavra libertação como centro de toda a ação.

Apesar de suas diferenças e particularidades, esses movimentos tinham em comum o objetivo da transformação das estruturas sociais e valorizando a cultura do povo como sendo a autentica cultura nacional, intensificavam-se com a visão ideológica nacionalista, advogando a libertação do país do laços de dependência com o exterior.” (SAVIANI, 2013, p. 318).

Os CPCs estavam ligados às artes, e multiplicavam-se por todo o país. Entendia-se que a cultura popular es- tava ligada diretamente à ação política, no sentido da consciência que tais espaços podiam despertar, seja nas artes, teatro, cinema, cordéis, música, literatura. Essa tomada de consciência das massas os preparava para a revolução.

Os MCPs acreditavam numa educação genuinamente brasileira, construída a partir da própria cultura po- pular. Sua prática objetivava aproximar a intelectualidade do povo, através de um dialogo do “aprender e ensinar”, por meio da qual o intelectual “misturava-se” aos conhecimentos da massa e partilhavam saberes. Essas experiências servi- ram de base às ideias de Paulo Freire, nas quais o diálogo, a generosidade e a amorosidade se convergem no aprender coletivamente. Saviani (2013) destaca também o movimento criado em 1961, pela Prefeitura de Natal, com o nome “Campanha de pé no chão também se aprende a ler”.

Este “movimento” reuniu professores e artistas. Ele não existia só nas escolas e nem era um trabalho só da educação [...] as pessoas que faziam o MCP queriam que tudo o que é bom, e está nas palavras, nas cantigas, e nas ideias que as pessoas criam, fosse levado para a gente pobre também. (BRANDÃO, 2001, p. 35).

O MEB avançou para o meio rural e teve grande influência na sindicalização. Por ser um movimento da Igre- ja foi o único que sobreviveu ao golpe militar de 1964. O MEB trabalhava com monitores e animadores dos grupos de base nas escolas radiofônicas. No segundo ano, sua atuação mudou significativamente, contribuindo para as mudanças das condições de vida da população e na própria Igreja. Confome Wanderley (1984), os embriões da “igreja popular” nascem forjados pela ação do MEB.

Nesse contexto é importante lembrar que a igreja Católica sempre esteve presente nos momentos fundantes da história do Brasil, especialmente no que se refere à educação e às decisões políticas. Conforme assinala Ianni (2004, p. 50), ela aparece como “argamassa intelectual, cultural e ideológica, sendo particularmente relevante em conjunturas críticas, quando se ameaçam ou rompem estruturas de poder”, e continua citando a intervenção da Igreja na catequese aos povos indígenas, a influência e participação na cultura do escravismo, a presença junto à “casa grande”, solidariedade às elites e envolvimento nas demais esferas de poder.

No final da década de 1960 nasce na América Latina a teologia da libertação, uma corrente teológica cristã que defende o evangelho da opção pelos pobres. Surge depois do Concílio Vaticano II e da Conferência de Medellín (COLÔMBIA, 1968). Essa teologia não só incomodou a hierarquia da igreja católica por seus discursos marxistas, como também resultou em práticas educacionais não escolares, através de formação de agentes de pastorais nas bases. Paiva (1984) fala que os caminhos optados pelo Movimento da Educação de Base (MEB) e as ideias da juventude dentro da ação católica daquele período se aproximaram da obra de Paulo Freire.

3 PAULO FREIRE E SUA EDUCAÇÃO LIBERTADORA

Paulo Reglus Neves Freire nasceu no Recife, Pernambuco, em 1921, de família de classe média “que aos pou- cos foi vendo chegar a pobreza, especialmente a partir da crise de 1920” (CALDART, 2001). Aprendeu a ler e escrever à sombra das árvores, junto de seus pais. Paulo Freire foi aprendendo ainda pequeno o significado de ser povo, a realidade nordestina o despertava para isso. Como educador Freire propôs uma das mais radicais formas de educar/alfabetizar, en- sinar e aprender para a liberdade. Sua reflexão falava do ato criador dos educadores/educadoras e educandos/educandas.

Freire (1997, p. 123) diz que “ninguém luta sem esperança”, por isso defende uma educação que valorize o ser humano em sua essência, suas vontades, emoções, sentimentos e limitações, e que busque a compreensão da história como possibilidade, provocando esperanças e o desejo de construir o novo. Essa educação para a liberdade ob- jetivava tornar homens e mulheres produtores de cultura e de seus pensares, ao mesmo tempo que os colocava como protagonistas da recriação da vida.

Educar para a liberdade era educar para a consciência crítica, superando a educação bancária, de depósito e domesticação. Para Freire a educação popular era o espaço de fazer este ensino, por meio dela os seres humanos sairiam da situação de objetos para sujeitos históricos e de transformação, como explica Saviani:

Para Paulo Freire a educação surgia como um instrumento de crucial importância para promover a passagem da consciência popular do nível transitivo-ingênuo para o nível transitivo – crítico, evitan- do-se a sua queda na consciência fanática. É em vista desse objetivo que foi criado um método de alfabetização ativo, dialogal, crítico e “criticizador” (SAVIANI, 2008 p. 335).

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A educação possibilitaria a autorrealização do ser humano, permitindo que o educando falasse sobre a reali- dade para entender o processo histórico, possibilitando momentos de discussão e reflexão sobre as causas das injustiças econômicas e sociais e propiciando condições de educandos e educadores participarem conscientes e ativamente na luta por novas formas de organização da vida econômica, política e social.

Na contribuição da dialética marxista e gramsciana, práxis, teoria e prática se encaixam nesse contexto tradu- zido em Freire por Ação e Reflexão (1987, p. 77). “A práxis necessita promover ação-reflexão-ação mediada pelo diálogo autêntico para preparar cidadãos críticos, criativos, conscientes em suas ações, que sejam capazes de transformar tais conhecimentos em prática.” (THAINES et al., 2006, p.38).

Paulo Freire e todo o movimento de educação popular sofreram com a mudança na conjuntura do país. In- teresses econômicos internos e externos, atrelados ao capital estrangeiro, ameaçavam o governo com a possibilidade de um golpe militar, considerado pela esquerda como um golpe civil/militar.

Nesse período, o país passava por um ascenso das massas, sindicatos camponeses e urbanos, estudantes, igreja libertadora, educação popular etc. Muitas experiências vinham contribuindo para a construção da consciência das classes subalternas, que começavam a compreender a opressão e iniciavam um processo organizativo para a superação. Segundo Saviani (2013), o golpe desencadeado em 31 de março de 1964 interrompeu “toda mobilização que vinha sendo feita em torno da cultura popular e da educação popular”. Paulo Freire foi exilado no Chile, mas continuou a escrever e pensar a pedagogia da liberdade.

4 O GOLPE MILITAR E AS CONSEQUÊNCIAS PARA A EDUCAÇÃO POPULAR

A repressão nos anos de ditadura militar foi tão violenta que atingiu todos os movimentos de trabalhadores. Sindicatos, universidades, grupos de formação e educação popular, todos foram reprimidos com o objetivo de desarti- cular qualquer possibilidade de organização. As intervenções militares violavam o direito do diálogo e de ir e vir.

Em 1967, com objetivo de acabar de vez com os movimentos de educação popular, proibindo qualquer concepção freiriana, o governo militar criou o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), que estimulava o in- dividualismo e a adaptação ao novo modelo de sociedade.

O governo militar passou por crises ao final dos anos 70. As torturas e o controle total da vida das pessoas fez com que movimentos populares de resistência começassem a aparecer e se espalharem pelo país. Guerrilhas armadas, organizações clandestinas, iniciativas populares, sociais e culturais conseguem articular o povo e a educação popular ressurgia em organizações não governamentais (ONGs) e nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Os movimentos populares ganharam força e foram às ruas, pela democracia, anistia, abertura política e passam a alterar a correlação de forças sociais e políticas.

Matrizes vão dar origem ao movimento social na década de 70, a Igreja Católica, os remanescentes das organizações de esquerda e o novo sindicalismo. [...] a prática social da militância das pastorais e co- munidades e a “Educação Popular” por ela desenvolvida era o paradigma do período, influenciando e acolhendo os militantes dispersos que só aí encontravam possibilidades de contato e trabalho político com setores populares. (PEREIRA. E, 2006, p. 31).

Nos anos seguintes, na década de 80, levantaram-se com mais força as organizações populares: Central Única dos Trabalhadores (CUT); Movimentos dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST); Movimentos dos Atingi- dos por Barragens (MAB); ressurgimento das Pastorais da Juventude com o eixo da luta de classes ― como a Pastoral

da Juventude Rural (PJR) e a Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), estas com bases na ação católica, mais especificamente nas organizações juvenis do período ―; Juventude Agrária Católica (JAC); e Juventude Operário Ca-

tólica (JUC) dentre outras. Nascia também o Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), que vinha discutindo o feminismo popular e camponês.

Para Saviani (1995) “A década de 80 foi um período em que a área da educação conquistou espaço decisivo no âmbito da sociedade e do Estado, constituindo-se num dos setores mais dinâmicos e atuantes da chamada ‘socie- dade civil’”. O campo educacional foi influenciado de maneira concreta pelas mobilizações desses anos. Educadores acreditavam na escola e no educar como instrumentos de reapropriação do saber da classe trabalhadora, bem como no “significado político e social da Educação”.

Como se sabe à época o país passava por momentos decisivos. O processo de democratização levou às ruas milhares de manifestantes na luta pelas eleições diretas e, em seguida, a Assembleia Constituinte mobilizou também a

sociedade civil. O Brasil estava se redesenhando: de um lado, “gente” querendo a transformação, e de outro, o poder que nunca “larga mão” da opressão, mesmo depois da eleição do primeiro presidente pelo voto direto.

O neoliberalismo se instala, o capitalismo avança, o poder econômico nacional e internacional continuam a delimitar e ditar como deve ser a vida dos brasileiros, e por onde passa a exploração de nossas riquezas e de nossas “gentes”. Os movimentos sociais se enfraquecem, e com eles a educação popular também sofre mudanças em seu coti- diano. Na base onde tudo acontecia, os educadores populares passam pela desesperança, a realidade política e econômi- ca metamorfoseada pelo capitalismo traz um tipo de exploração menos visível aos olhos dos trabalhadores, tornando-os apáticos a realidade que vivem.

5 DIALOGANDO COM O FEMINISMO E AS NOVAS RELAÇÕES DE GÊNERO

Após a memória feita ao contexto sociopolítico e à educação popular, relativamente a esta é possível reafir- mar, a partir de Freire (2000), que pensar o poder popular e a resistência das classes subalternas na correlação de forças tem a ver com essa concepção de educação, que se propõe a despertar para a ação. Essa é sua contribuição no processo necessário a construir.

A educação popular sobreviveu às ações contra os movimentos socais e conquistou educadores e educadoras que levaram para as escolas e para as políticas educacionais importantes características dessa concepção.

Mas é a educação popular que acontece fora dos muros da escola que vamos tratar daqui em diante. É no viver e conviver das comunidades, nos diálogos de grupos de formação, nas construções coletivas de pensares e fazeres, especialmente para a construção de novas relações de gênero, discutidas pelos movimentos feministas, populares e classistas, que propõem o que Freire chamou “de outro mundo possível”.

A educação como ato político não tem caráter neutro. Onde a educação popular acontece, ela provoca, instiga e desafia. O processo dialógico de olhar para a realidade, entendê-la para transformá-la, de olhar para outros humanos de forma amorosa e comprometida, faz-nos assumir uma postura concreta com o mundo, e com as “gentes”. (FREIRE, 1992)

O projeto popular defendido por Paulo Freire é alicerce para as organizações e movimentos sociais, acredi- ta-se na possibilidade de construção de uma nova cultura: do cuidado, da generosidade, do respeito entre os gêneros, do respeito e da relação com toda a natureza. Portanto falar de educação popular é falar de conflito, defender os povos, a natureza, é denunciar as mazelas mais profundas da sociedade, desafiando o poder que corrompe, mata e extermina.

Nessa perspectiva ressaltamos a busca, o estudo, a leitura e a compreensão de mundo, de forma coletiva e radical. Nenhuma realidade é porque tem que ser. A realidade pode e deve ser mutável, deve ser transfor- mável. Mas, para justificar os interesses que obstaculizam a mudança, é preciso dizer que “é assim mesmo”. O discurso da impossibilidade é, portanto, um discurso ideológico e reacionário. Para con-

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