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que a educação, por via social, é um processo arbitrário, flutua, conforme a ordem de pertença social ou a filiação religiosa, ou a

condição étnica, por exemplo e que, assim sendo, não há nenhum

fundamento para que se defenda este ou aquele tipo de valores em

17 - KHAN, P. (199=: 174), ao analisar a génese da construção do Emílio, considera que "Si Jean-Jacques prend le parti de se donner un élève imaginaire, c'est qu'il veut le délester à l'avance des déterminismes locaux, des pesanteurs de l'histoire et de la géographie, des idiosyncracies familiales ou sociales. Ainsi Emile est-il orphelin (liv. I, p. 267), sans racines particulières, sans parents, mais aussi "orphelin de la société civile" historique". (...) De sorte qu'au bout du compte, on sera sûr de n'avoir éduqué ni un bourgeois, ni u n Français ou Anglais (liv. I, p. 250), mais u n homme: 'En sortant de mes mains il ne sera, j'en conviens, ni un magistrat, ni soldat, ni prêtre: il sera premièrement homme" (liv. I, p. 266).

vez de outros, a não ser a pressão social ou a conveniência, o que significa a negação da identidade para si e a instrumentalização da humanidade. É a questão do fundamento da necessidade dos valores da humanidade, contra a sua arbitrariedade actual, aquilo que está em causa.

Só então se poderá responder ao que é educar. Nesta instância, porém, ROUSSEAU responde com outro artifício, recorrendo ao estratagema da figura do preceptor que, não ensinando, nem prescrevendo, limita-se a accionar a lição das coisas, à maneira de Sócrates relativamente ao Ménon, ainda que segundo uma lógica inversa, contribuindo gradualmente para a tomada de consciência das aprendizagens que lhe são imanentes. ROUSSEAU toca, então, o limite do paradoxo18: é que não há

educação sem mediação, representada aqui na figura do preceptor. A autonomia, afinal, precisa da alteridade. ROUSSEAU tenta resolver o paradoxo ardilosamente, ocultando-o à consciência de Emílio sob pretexto de que está ainda em formação19.

A razão da educação e, portanto, a sua possibilidade enquanto prática, isto é, enquanto dever-ser, repousa, em última análise, na sua não-transparência ao sujeito educando. A razão da educação está no outro. Que outro deve ser este para que possa legitimamente educar, para que possa ter a razão de educar, ou autoridade pedagógica, ROUSSEAU define-o segundo

18 - "J'aime mieux être homme à paradoxes qu'homme à préjugés", disse dele próprio ROUSSEAU (Emile ou de L'Éducation (Extraits), I,Paris, Larousse, Paris, s/d.

19 - ROUSSEAU, o.c.,p 53: "Qu'il croie toujours être le maître, et que ce soit toujours vous qui le soyez".

um estatuto que poderíamos considerar próximo daquele que CORREIA( 1997:273 e ss.) designa por neutralidade activa, ao analisar a intervenção formativa em termos de dispositivo clínico. A legitimidade do outro para intervir no processo educativo inscreve-se num plano de acção que não busca sustentar-se nem na autoridade científica, nem na eficácia técr.i'ca. Como diz

CORREIA (Ib.)

"a 'neutralidade activa', porque se inscreve numa actividade comunicacional, procura activamente induzir um trabalho de interpretação sem lhe determinar previamente o sentido. Os conceitos e sistemas teóricos de referência inserem- se neste contexto comunicacional, não como interpretações gerais, cuja validade empírica se procura verificar (racionalidade cognitiva), nem como interpretações gerais susceptíveis de intervirem eficazmente em todas as situações particulares (racionalidade instrumental), mas como elementos de u m a compreensão antecipada, cuja eficácia estratégica se define pela sua eficácia comunicacional, isto é, pela sua capacidade de induzirem relações objectivantes e reflexivas do grupo de formação consigo próprio, com os seus elementos e com as suas produções históricas e projectuais."

A mediação pelo outro em termos de neutralidade activa, aplicada ao caso do preceptor de ROUSSEAU, supõe um compromisso ético que traduz, ao nível da acção, a cumplicidade implicada na construção dum destino comum que é a liberdade, entendida não como livre arbítrio, como capricho, mas como auto- desenvolvimento participado da consciência dos limites, imposta, aqui, pelas determinações da natureza, transfigurada, obviamente, em ideal regulador, enquanto equivalente moral do que é ou não possível, segundo a sanção das coisas.

GUINERET (l.c.) chama a atenção para o facto de que o preceptor de Emílio deve ser interpretado em analogia com o

estatuto do legislador do Contrato Social20. Explorando essa

analogia, torna-se claro que o uso da autoridade educativa, tal como o da autoridade política, assenta a sua legitimidade na condição de submeter a sua acção à necessidade de ela se conformar com a natureza humana, tal como ela deve ser, isto é, purificada da sua perversão social. O critério último desta legitimidade é o de se exercer na completa independência dos interesses e paixões particulares, razão por que, tanto o preceptor, como o legislador gozam dum estatuto transempírico de impassibilidade e de equidistância vigilantes, carácter distintivo que os qualifica como apenas dependentes da realização moral do ser humano: o primeiro, perante o educando; o segundo, perante os cidadãos. Só nessa condição se preserva a possibilidade de a subjectividade reconhecer a sua auto-limitação, reconhecendo uma comunidade de iguais, que é o fundamento e garante da vontade geral, donde procede, finalmente, a autoridade política.

Enquanto o mundo de ROUSSEAU é o mundo da vontade, do mundo visto "como se" - por isso a conjectura, como viu KANT (cf. supra, Nota 16), organiza a acção auto-referenciada e pela acção se aprende e daí que seja o aprender o pólo determinante da relação educativa - , o mundo dos enciclopedistas é o mundo da inteligência que penetra a verdade da natureza, verdade que pré- existe como já constituída e a que se acede mediante a descoberta das respectivas leis. As hipóteses são verdades antecipadas que apenas dependem da administração da prova, ("hipothesis non fingo") e já não constructos organizativos do próprio mundo e

20 - É o próprio ROUSSEAU que põe em evidência que

Emílio e Contrato Social formam, em conjunto, um todo completo

("les deux ensemble font un tout complet"), in ROUSSEAU, Oeuvres Complètes, tomo 2, Paris, Seuil, 1971, p. 515.

geradores do seu sentido. O saber e a respectiva representação da realidade não precisam de outro mediador que não seja o método experimental e analítico, pelo que a autoridade passa a ser reivindicada e atribuída àqueles que manipulam os meios de demonstração da verdade e cada vez menos àqueles que falam em nome dela. O critério da evidência, que era, ainda, com Descartes de natureza lógica e racional, desloca-se do mundo inteligível para o mundo sensível e torna-se, cada vez mais exclusivamente, de natureza observacional, construindo, desta forma, um reforço da sua apoditicidade à medida que insinua em seu favor a importância do controlo público, pela via do olhar, a que toda a ciência deve submeter-se.

O paradigma do olhar como dominante na construção e desenvolvimento da ciência moderna, crescentemente sustentado, na sua ampliação, através de instrumentos ópticos dia a dia mais poderosos, pressupõe a homogeneização do objecto observado e uma relação de exterioridade com ele, que se confunde com domínio, como, aliás, a técnica se encarregará de demonstrar. O que torna possível a homogeneização do objecto é, por um lado a naturalização do mundo, incluindo nele o homem, o que significa autonomizá-lo do poder divino com a consequente autonomização da Razão, como um poder universal distintivo do homem e presente em cada ser segundo diferentes graus de desenvolvimento. Como sublinha GRAMSCI (1974: 82/83), a homogeneização do objecto científico, a partir duma concepção una de natureza, integra-se n u m a estratégia de luta da burguesia pela hegemonia política com fundamento na igualdade natural do ser humano:

"A igualdade é procurada pelo materialismo francês do século XVIII na redução do homem a categoria da história natural, como indivíduo de uma espécie biológica, distinto não

por qualificações sociais e históricas, mas por dotes naturais; em qualquer caso essencialmente igual aos seus semelhantes".

A questão da naturalização do mundo torna-se, portanto, uma questão central para os iluministas, empenhados quer na desteologização do processo do conhecimento que, em última análise dependia da revelação divina e, como tal, da mediação da Igreja, quer do idealismo cartesiano que, através do dualismo, mantinha o conhecimento na órbita das ideias inatas e, portanto, submetido à esfera lógica prisioneira das verdades eternas, incompatíveis com as verdades da experiência que passaram a organizar a prática social e científica do século XVIII. A naturalização é, assim, no plano ontológico o que, no plano epistemológico é a factualização da natureza. Os factos do século XVIII são, antes de mais, a criação resultante duma desordem criadora que é tributária da destotalização ideológica que se foi desenvolvendo na segunda metade do século precedente. Como diz CHÂTELET (1974: 185,

"a metafísica do século anterior já não pode assegurar a sua função redutora: doravante as práticas fazem explodir os saberes".

Dos factos causadores da desordem e da contradição, vai nascer a ordem dos factos, assumidos agora como manifestações naturais, isto é, portadores de significado universal e constante, justamente o inverso daquilo que os factos era suposto serem, o

domínio da ilusão e da opinião.

Esta conversão só é possível, porém, a partir do momento em que se purifica a experiência subjectiva, rompendo aquilo que é o continuum da vida sensível em que se exprime a natureza pela sua decomposição em laboratório ou pelo seu registo analítico. Ao separar a natureza da sua experiência subjectiva pela

interposição do método experimental (CORREIA, Ib), opondo a experiência profana à experiência culta, os iluministas abrem caminho à retotalização ideológica da realidade pela mão da natureza, abstraindo dela aquilo que é, também, todo o ingrediente da subjectividade socio-cultural. E ainda que no pensamento iluminista tenha havido lugar para uma certa perspectiva histórica acerca da evolução da natureza (DESNÉ, 1974: 8 1 ; LÉACH,1985: 97), especialmente no que se refere ao domínio da razão, cujo estatuto face à natureza permanece ambíguo (DESNÉ, Ib), a verdade é que a leitura da natureza como expressão duma legalidade acessível à razão não é questionada como criação da razão temporalizada, mas antes como uma conquista da humanidade contra os seus usurpadores. Conhecer as leis da natureza é, portanto, um acto de emancipação, tanto contra as intempéries e cataclismos físicos, como contra as paixões e desregramentos humanos, como, ainda, contra as injustiças e desigualdades sociais.

A reforma da humanidade faz-se então pela iluminação do espírito, pela instrução. Examinámos já, noutro lugar (cf. pp 46 e ss.) a relação de necessidade que o Iluminismo estabeleceu entre razão teórica e razão prática. Por agora, apenas interessa salientar como essa relação fundamenta a exigência da instrução pública e, consequentemente, a institucionalização da instrução como objecto da Escola, orientação particularmente visível nos sistemas socio-políticos influenciados pela tradição racionalista francesa que, sobretudo através do positivismo, se objectivou numa ordem social que fez da ideologia do progresso indefinido a matriz da sua expansão e manutenção, sedeada na escola.

O sucesso desta orientação, centrada no instruir, em detrimento do aprender ou do formar, a cujos pressupostos nos referiremos nas páginas que seguem, deve ser articulado, por um

lado, com os arquétipos socio-culturais duma Europa católica (termo este do qual, nem sempre, se toma consciência que é sinónimo de universal) que se projectou, politicamente, n u m a concepção centralista do poder, cuja linha, laicizada ((KAHN, 1990:203), se manteve nos Estados modernos e, por outro, com a experiência histórica da desintegração social sequente à revolução francesa, cujos efeitos sobre a libertação dos interesses subjectivos, tendo tornado possível a ascensão da burguesia, passaram a constituir, desde então, uma ameaça para ela. A manutenção da unidade do poder do Estado, já fisicamente constituído no interior das velhas fronteiras, mas com outros titulares, exigia contrapartidas materiais e simbólicas correspondentes aos interesses em nome dos quais se havia fundado a legitimidade da nova ordem, interesses que se haviam organizado basicamente em torno da ideia de felicidade h u m a n a e de progresso para todos em nome da igualdade.

As novas relações de poder não podiam, pois, continuar a ignorar a importância do indivíduo, cuja estrutura ontológica e respectivo estatuto social vão passar a ser representados, cada vez mais, como dependentes da apropriação pessoal de bens materiais, individualmente investidos. A construção da identidade do indivíduo, segundo o referente da propriedade, desvincula-o da sua classe de origem (à qual estava atribuído ou não, enquanto tal, e não enquanto indivíduo, o património como fonte de importância social) e articula-o directamente com o Estado, do qual recebe o estatuto de cidadão, sujeito de direitos e deveres no espaço impessoal da cidade e não já no espaço rural das comunidades tradicionais, onde "os obstáculos não provêm tanto de o espírito se encontrar vazio de ciência como do de se encontrar cheio de preconceitos" (BAYLE, in DESNÉ, 1974:98).

instruído e, portanto, a sua des-substantivação. O modo de instruir, que não pretende explicitamente formar, revela-se, afinal, um modo de formação que, ao tornar-se dependente das estruturas do objecto, tal como ele é instrucionalmente pensado, condiciona a actividade do sujeito a um regime de desenvolvimento segundo a ortodoxia do que está instituído, com sacrifício da possibilidade de construir uma identidade que se reconheça como alteridade e não apenas como reprodução. Verifica-se aquilo que, em linguagem hegeliana, se pode designar por objectivação da subjectivação, o que BACHELARD (1986: 249) traduz, noutro registo, através da expressão "se o objecto me instrui, ele modifica-me". Não é, assim, de estranhar que este modelo de instrução privilegie o ponto de vista didáctico, com base no apelo sistemático ao mundo da natureza sensível segundo a sensibilidade escolar que, independentemente dos recursos técnicos, se guia, em última análise, pela normatividade do objecto e que, no plano das ciências da educação, tenha estimulado, de forma tão poderosa, o desenvolvimento da psicologia, como em BINET se torna manifesto (Cf. mais adiante, Capítulo III).

Se o paradigma do instruir pressupõe, no plano socio- político, a valorização prática da ciência, tanto por razões de ordem ideológica, como por razões de ordem técnico-instrumental, cabendo àquelas, fundamentalmente, assegurar funções de reprodução e a estas de produção, o paradigma do formar que, neste contexto, se considera, exemplarmente, representado por HEGEL distingue-se claramente dos dois modos anteriormente referidos, se o considerarmos na sua condição de vector articulatório das restantes funções educativas.

Historicamente, o modo do formar aparece marcado por preocupações de produção ideológica indispensável à construção

do Estado ou à sua consolidação segundo uma estratégia ofensiva, mais do que por necessidades da sua reprodução. A prioridade do estado como síntese superadora da contradição que é a vida em sociedade apresentou-se a HEGEL, simultaneamente, como o fundamento e desfecho necessário da sua Lógica da Ciência21.

Sendo o conhecimento um processo através do qual o ser se vai determinando como espírito, negando e superando a suas múltiplas determinações, como sendo, a um tempo, necessárias e contingentes, até ao reconhecimento da sua auto-identidade, onde a necessidade se põe como liberdade, o estado hegeliano é a projecção viva desse conhecimento, o momento em que o espírito, enquanto lei soberana, age como condição e garantia da liberdade. O conhecimento tem, portanto, um sentido que é o de revelar ao homem a forma como de unidade potencial, inconsciente de si, disperso em múltiplas contradições se vai progressivamente apropriando das suas objectivações, reconhecendo nelas momentos de alienação que, ao serem reconhecidos como tal, permitem a sua integração numa nova identidade, como síntese das diferenças incorporadas. E o que é válido para a espécie

21 - Segundo PEREIRA, M. Baptista (1982: "O Iluminismo e a Secularização"a in O Marquês de Pombal e o seu tempo, tomo II,

Revista da História das Ideias, Coimbra, Instituto de História e

Teoria das Ideias, Faculdade de Letras) "Ch. Thomasius é o primeiro a introduzir o direito natural como instância crítica no discurso do Iluminismo alemão e anima com as suas categorias e os princípios da filosofia prática (v. g. a felicidade do homem é o fim do Estado, do contrato social e do domínio; o indivíduo só no Estado pode ser feliz, não contra ele ou sem ele".

h u m a n a , fenomenologicamente testado na história, é válido psicologicamente para o indivíduo22.

Nesta perspectiva, a realidade individual é fenoménica, um em-si inconsciente de si, dependente da imediatitude não mediada, incapaz de sair de si, como da s u a auto-negação inconsciente2 3. É o momento da subjectividadade, da animalidade sobre a racionalidade. Como diz DOZ (1994:217), "no fundo, toda

22 - ADORNO, citado por KOHN-PLOUCHART in KAHN, u.c., p.162, reconhece que HEGEL perseguiu, ao longo da sua obra, a problemática do romance da formação, querendo significar com tal expressão a forma particular que a questão assumiu na tradição da cultura alemã: "O idealismo objectivo de Hegel é muito próprio para formular a problemática do romance da formação, pois que o projecto hegeliano é a superação da oposição abstracta do sujeito e do objecto". Cf. também FABRE. M. Penser la Formation, Paris, P.U.F.pp. 138 e ss.

23 FABRE (1994:143/4) intrepreta a Fenomenolgia do

Espírito como a expressão filosófica dum tema literário caro ao

romantismo alemão, para o qual a questão da formação da identidade se tornou central e de que é testemunho eminente o

W. Meister de Goethe. Nos termos de FABRE, "A Fenomenologia é

o Bildung-romance da cultura filosófica. Retomando a ideia do paralelismo ontofilogenético, ela segue o desenvolvimento da consciência que, renunciando às s u a s convicções primeiras, atinge através das suas experiências, que recapituam as figuras da consciência histórica, o ponto de vista propriamente filosófico, o do saber absoluto. As duas tarefas que Hegel se atribui são introduzir a consciência individual n a ciência e, ao mesmo tempo, elevar o eu singular ao eu da humanidade: ora, isso é o cumprimento da Bildung": FABRE, M.: 1994:Percser la Formation, Paris, P.U.F

a filosofia do espírito de HEGEL poderia ser considerada como uma grande variação sobre o tema do homem "animal racional". A educação é o processo através do qual este todo contraditório em acto que é o "homem, animal racional" se vai destotalizando/retotalizando em estádios sucessivamente superiores até realizar a unidade do espírito que HEGEL reconhece, expressamente, como coincidente com a unidade da pátria.

Na alocução inaugural, proferida na Universidade de Berlim, em 1818, em que HEGEL apresenta aos seus ouvintes o curso que para eles preparou, A Ciência da Lógica, pode ler-se que (1970:145/6):

"O espírito do mundo, tão ocupado na realidade efectiva e tão virado para o exterior, esteve impedido de se voltar para o interior e de se dirigir para si próprio, assim como de fruir de si na sua própria pátria. Agora, que esta torrente da realidade efectiva se quebrou e que a nação alemã salvou a sua nacionalidade, o

fundamento de toda a vida viva, chegou o tempo em que, no

Estado, ao lado do governo do mundo efectivamente real, o livre reino do pensamento pode também florir de modo independente".

Como projecto colectivo, que é suportado n u m a ideia de pátria prometida como "o livre reino do pensamento", a educação articula uma dinâmica do desejo, condição da actividade subjectiva e dominada pela sensibilidade, com uma cultura vivida segundo a lógica do universal e do necessário. Ê assim que a educação formal, realizada na escola, por oposição à da família, se distingue desta como o exercício da racionalidade incoativa se distingue da afectividade guiada pelo amor e pela obediência pessoal. Em palavras do próprio HEGEL (1994: 61)

"A escola é portanto a esfera mediadora que faz passar o homem do círculo familiar para o mundo das relações naturais, do sentimento e da inclinação para o elemento da coisa (do mundo efectivo). Isto é, na escola começa a actividade da criança a receber, no essencial e de forma radical, um significado sério, na medida em que deixa de estar ao critério do arbítrio e do acaso, do prazer e da inclinação do momento; aprende a determinar o seu agir segundo uma finalidade e segundo regras; cessa de valer pela sua pessoa e começa a valer por aquilo que realiza, a conquistar para si o mérito".

A ideia de um saber que se justifica na coisa pública, que é simultaneamente uma competência e uma ética, torna-se estruturante do processo de formação: a cultura protestante que instituiu o individualismo num fundo de responsabilidade solitária, ao criar e ao desenvolver a subjectividade n u m registo de auto-consciência dependente, mas sem fronteiras éticas controláveis, tem necessidade de se absolutizar no Estado, como forma de se expandir e de se diversificar subjectivamente, sem perder a sua identidade cultural que, como reconhece o próprio HEGEL, se revê na autonomia e na responsabilidade2 4. Ê nesse

sentido que CHÂTELET (1975: 184) pode afirmar que

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