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recombinada com a abordagem cognitivista de teor reflexivo e com os contributos oriundos da investigação psicanalítica, mormente

dos que tentam compreender os fenómenos da formação e do

desenvolvimento humanos a partir dos mecanismos que

estruturam a experiência pessoal e social onde desempenha papel

de relevo o modo como estão instituídas as relações entre

9 - HABERMAS (1995) sublinha a importância da reflexão husserliana para a compreensão crítica das relações entre a produção científica e o mundo da vida, pondo em destaque que se deve a HUSSERL, designadamente através da sua obra, La Crise

des sciences européennes et la phénomeénologie transcendantale,

a denúncia do princípio, que toda a comunidade científica adopta, "de pressupor como u m a evidência a validade factual do seu mundo vivido quotidiano" (31).

processos de representação, comunicação e linguagem no mundo quotidiano (SCHUTZ: 1993; 1994); (HABERMAS: 1976); (ANDLER:1992); (VARELA: 1993).

Esta orientação para o reconhecimento intersubjectivo da objectividade da ciência, de que são reflexo mais visível as inflexões da psicologia em favor da constituição de novos domínios do saber, como a psicossociologia (ARDOINO, 1996:150-

176) ou a sua integração em novas áreas como a psicologia das organizações, ou, ainda, as práticas interdisciplinares de investigação significa, assim, o colapso duma prática científica que unilateralizava a razão teórica, protegida pela hiperbolização do método, cuja manipulação reservada e caucionada permitia a descoberta da "verdade".

A objectividade, interpretada como intersubjectividade, liga- se a uma dimensão projectual da realidade social, imprimindo à ciência um carácter mais de invenção, do que descoberta, o que, obviamente, se repercute nas metodologias e epistemologias a eleger para o seu desenvolvimento (USHER 85 BRIANT, 1992: 51). Não se tratará, neste caso, de encontrar regularidades que exprimiriam leis gerais independentes das motivações e das intencionalidades dos sujeitos humanos, mas, antes, de propor e identificar linhas de sentido e quadros de significação que permitam compreender de que modo a prática social, incluída a ciência, é um jogo de tensões entre interesses, cuja racionalidade emerge do seu próprio desenvolvimento e cujo fundo de legitimidade, não podendo prescindir do quadro social próprio em que se inscreve e do que nele também instituiu a própria ciência

normal, não poderá prescindir igualmente das lógicas construídas

nesse quadro pelos actores sociais envolvidos10.

Para dar conta dessa racionalidade, a perspectiva científico- técnica deve ser encarada como um obstáculo epistemológico na medida em que impede a visibilidade dos aspectos realmente significativos na montagem e desenvolvimento dos sistemas sociais de acção.

Ao fazer derivar as práticas de investigação de hipóteses nomológicas prè-inscritas em modelos de causalidade ou de funcionalidade já constituídos normativamente, o regime científico-técnico obriga a que os fenómenos sejam observados à luz da necessidade de estabelecer relações entre eles e as hipóteses enunciadas, sem que seja possível pôr em evidência se outras observações são possíveis, precisamente porque as observações dependem daquelas hipóteses. Como assinala STENGERS (1993:69) "a função primeira dos factos não é serem observados, mas a de constituírem produções activas de

observabilidade" (itálico da autora).

A este propósito, é elucidativa a polémica suscitada por VIGOTSKI face à posição de PIAGET relativamente à questão das relações entre desenvolvimento e aprendizagem. Como se sabe, VIGOTSKI acusou de naturalista a tese de PIAGET segundo a qual "a aprendizagem segue sempre o desenvolvimento". A partir daí, - considera ele - ela torna-se "irrefutável, na medida em que valida

10 - Como veremos oportunamente (Cf. Capítulo III, Parte Terceira), as microssociologias e, designadamente, as etnometodologias, puseram em relevo o papel das interacções na criação de lógicas específicas internas aos grupos, emergentes das próprias interacções (GARFINKEL, 1967).

metodologicamente o que foi postulado epistemologicamente; de algum modo, ela não encontra no real senão aquilo que ela decidiu ver nele e aquilo para o qual ela construiu instrumentos de observação" (in MEIRIEU, 1994:167).

O obstáculo epistemológico não se limita, porém, a pre- determinar o sentido da observação; ele induz a ilegimidade epistemológica de outras vias de acesso ao conhecimento que não sejam redutíveis ao protocolo observacional, isto é, à formalização de uma situação em que o objecto seja exterior e independente do sujeito investigador. Esta preocupação metodológica com as condições de assepcia formal do campo de produção do saber traduziu-se, homologicamente, na atomização do objecto, na sua sectorização sucessiva na ânsia de lhe reconstituir a relação de pertença com o todo mental de que procede a explicação. Certas práticas das ciências sociais e, mais especificamente, as que, ainda, são dominantes no âmbito das ciências da educação, não resistiram a este intento, como é visível no domínio das docimologias, antigas e modernas, e na chamada Pedagogia da Mestria, práticas que são directamente tributárias de uma visão experimentalista da ciência que obrigou a investigação a considerar como variáveis (e, portanto, como objectos homogéneos) situações comportamentais que foram isoladas das suas condiçõeses concretas de produção, cuja necessária intersubjectividade, entretanto, se perdeu. A perda desta subjectividade é explicada pela exigência metodológica de produzir saberes universais, se bem que sobredeterninada pela necessidade social de produzir, em simultâneo, a disciplina social e o desenvolvimento de competências profissionais aplicáveis no campo da divisão social do trabalho (CORREIA, 1996,a).

A construção de uma epistemologia capaz de dar conta de uma objectividade intersubjectiva, como acima se sugeriu, rompe

com esta unidimensionalidade metodológica para adoptar perspectivas multirreferenciais, visando reintegrar a produção dos factos e dos acontecimentos nas suas respectivas condições de significação. Ou seja, por outras palavras, porque a realidade social se complexifica, complexificam-se os processos e os instrumentos teóricos e metodológicos através dos quais se procura compreender essa complexidade que aqui exprimimos sinteticamente pelo conceito de objectividade intersubjectiva.

Como já se deixou entrever, este conceito introduz uma teia de relações que estruturam a reflexão epistemológica a vários níveis, articulando-os, mas preservando a sua autonomia heurística. Importa determo-nos um pouco sobre ele no sentido de lhe revelarmos os aspectos mais pertinentes.

A experiência socio-cultural, política e económica dos últimos cinquenta anos e, mais acentuadamente a partir dos anos sessenta, obrigou a uma intensa multiplicação dos campos do saber em proporção directa com o desenvolvimento dos mecanismos de interacção e participação social na definição e institucionalização das formas que regulam a vida em sociedade. Em consequência da tecnologização do mundo contemporâneo, que pressupõe a ciência, mas também a potencia, as relações sociais e económicas foram, gradualmente, gerando sistemas subvertores da autonomia dos sistemas político-culturais à escala das unidades nacionais, contribuindo desse modo, por um lado, para uma maior homogeneidade social, ou, pelo menos, para uma maior permeabilidade social e, por outro, para o reposicionamento de novos interesses e novos valores, alinhados ou realinhados com interesses mais vastos e, necessariamente, mais contraditórios. Desta dinâmica resulta que os sistemas sociais são, por isso mesmo, mais flexíveis e, em consequência, mais intercondicionados e intercondicionantes.

Cabendo à economia o papel de produtor de energia do

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