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O s objetivos d a escola se co n fu n d em com a ação exercida sobre cria n ças e adolescentes (p rin cip alm en te), p a ra to rn á -la s aptas

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a viver n u m a d e te rm in a d a sociedade. A ação p edagógica é, assim , o tra ç o de união e n tre o in dividual e o social. E n tre ta n to , pelo fato de a realid ad e social ser h istó rica e, p o r isso, superável, ê relevante p e rg u n ta r-se : de que sociedade se tra ta ? q u e hom em se quer fo rm a r? qual o sentido d a ap rendizagem escolar? que significa falar en desenvolvim ento da cria n ç a e do ad olescente? T êm sido dadas m u ita s respostas a essas questões e, q u a isq u e r que sejam elas, são m a rc a d a s p o r u m a dim ensão política, pois q u e os propósitos de ed u ca ção individual não se sep aram da to ta lid a d e social o nde está in se rid a . Com efeito, n u m a sociedade de classes dão*se relações sociais q u e são o re s u lta d o do conflito de interesses de d u a s classes fu n d a m e n ta is, sendo q ue u m a delas, a q u e detém o poder econôm ico e político, p ro c u ra con fo rm ar as in stituições a seus inte­ resses. A ssim é que, no B rasil, a escola se m p re esteve o rganizada p a ra fo rm ar as elites sociais.

A fo rm a ped ag ó g ica que p red o m in o u até 1920, m ais ou menos» foi a tra d ic io n a l, cujo objetivo e ra tra n s m itir u m a cu ltu ra g e ra l h u m a n ístic a, de c a rá te r enciclopédico. E la sem pre ate n d e u às c a m a d a s socialm ente privilegiadas e ate n d e u bem ; to rn a -se r en tre­ ta n to , ineficaz q u an d o su a clientela se diversifica devido ao acesso d as c a m a d a s m édias e p o p u la re s.

N as p rim eiras décad as do século X X , a b u rg u esia nacional tin h a interesse de que a escola se a d ap tasse às necessidades de desenvolvim ento in d u stria i, e p a ra isso o cu rríc u lo enciclopédico da escola tradicional j á n ão servia. E is aí o objetivo do m ovim ento d a escola nova: m o dernizar o ensino, isto é, colòcá-lo a serviço das necessid ad es sociais. O s princípios d a escola nova — respeito à in d iv id u alid ad e d a c ria n ç a , desenvolvim ento d e aptidões natu rais, a p re n d e r fazendo, ativ id ad e e sp o n tân e a, etc. — coincidiam com os p rin c íp io s d a filosofia lib erai, q u e exigiam u m a escola p rá tic a , um e n sin o ú til p a ra a sociedade, vale dizer, p a r a a in d ú stria m oderna. N a escola nova decresceu o interesse pelos co n teú d o s d as m atérias em fav o r dos m étodos, h ab ilid ad e s, p esq u isa, com o arg u m e n to de que, desenvolvendo os processos m e n tais, a cria n ç a seria m elhor a te n d id a em suas necessidades e sp o n tân e as e c h eg a ria sozinha aos conteúdos.

E ssa orien tação d a escola nova p reju d ico u m uito as crianças d as classes p o p u la re s, pois se s u p u n h a q u e elas j á traz iam de cada u m a fo rm ação p révia p a ra en fren tar u m cu rrícu lo n a base de ex periências. Com efeito, a su p rem acia do m é to d o ativo e intuitivo favorecia aquelas c ria n ç a s que tin h a m ex p eriên cia s fam iliares mais

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rícas e sistem atizad as e prejudicava as que tin h a m n a escola a única ch an c e de acesso ao sab er. O s professores, por su a vez, foram d esobrigados de d o m in a r o conteúdo d a s m a téria s, g a n h a n d o peso o dom ínio d as técnicas de ensino,

O aten d im e n to , p o rta n to , co ntinuou p recá rio , e caiu p o r te rra o p ro p ó sito apregoado p ela escola nova de prom over a ig u ald ad e de o p o rtu n id a d e s. E n q u a n to isso, co n tin u a ra m os elevados índices de evasão e rep etên cia , em bora persistisse a reivindicação d a p o pulação p o r m a is escolas. É o m om ento de colocar em ação u m m odelo pedagógico de escola q ue viesse a re d u z ir as pressões, atendesse o m áxim o d e cria n ças e com o m e n o r cu sto possível, além de a ten d er aos interesses d a classe em presarial. A P edagogia tecnicista não rom pe com a P edagogia trad icio n al (q u e n u n c a deixou de existir) e nem com a Pedagogia nova, e in tro d u z n a escola os objetivos p reestabelecidos p a ra u n ifo rm izar o en sin o , a c e n tu a r as técnicas, sim p lificar os conteúdos, co m p ro m eten d o m ais ain d a a qu alid ad e.

E sse breve esboço da evolução h istó rica da escola p erm ite co m p re en d er com o a ação pedagógica a c o m p a n h a as form as pelas q u ais a sociedade é o rg an izad a. O ra , se o q ue c a ra cteriza a sociedade são as relações en tre as classes sociais, que são relações de c o n tra d iç ã o em função de interesses q u e são distintos, conclui-se que essa c o n tra d iç ã o ta m b ém existe n a escola, já que ela é u m a m a n ifestação p a rtic u la r d a sociedade. É possível, então, considerá- la com o “ u m a d as m ediações pela q u a l se e fetu a o conflito en tre as classes sociais, u m a in te re ssa d a n a re p ro d u ç ã o d a e s tru tu ra de classes ta l qual é, o u tra cujos interesses objetivos exigem a negação da e s tru tu ra de classes e a supressão da d o m in ação econôm ica" (M ello, 1982). P o rta n to , a escola ta n to pode se o rg an iz ar p a ra n eg ar às classes p o p u la re s o acesso ao co nhecim ento com o p a ra garanti-lo; se assu m e o p a p e l de agente de m u d a n ç a n as relações sociais, cabe-lhe in stru m e n ta liz a r os alunos p a r a su p e ra r su a condição de classe tal q u a l m a n tid a p ela e s tru tu ra social.

P o rta n to , u m a escola que se p ro p o n h a a a te n d e r os interesses das. classes populares te rá de assu m ir suas finalidades sociais referid as a um projeto de sociedade o nde as relações sociais existentes sejam m odificadas. Isso significa u m a reorganização pedagógica q ue p a rta d as condições co n cre tas de vida das cria n ças e su a d estin ação social, tendo em vista u m p ro jeto de tran sfo rm ação d a sociedade, e aí se insere a fu n ção d a transm issão d o saber escolar. E m o u tra s palavras, ao la d o de o u tra s m ediações, é a aq u isição de conhecim entos e h a b ilid ad e s q u e, assum indo form as

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p edagógicas, g aran tirão a inserção d as classes po p u lares num p ro je to am plo de tran sfo rm a ção social.

A perspectiva q ue se propõe a q u i é u m a nova m a n e ira de co m p re en d er os elem entos d a ação pedagógica: o aluno, o educador, a sociedade. Com efeito, a P edagogia tra d ic io n a l caracteriza-se por p rivilegiar o pólo da tra d iç ã o co n stitu íd a, o n d e o saber é tran sm itid o u n ilatera lm en te, sem possibilidade de se q u e stio n a r seu sentido e fu n ção face às realidades sociais. A P ed ag o g ia nova não lid a com o s a b e r en q u a n to tal p o r e n te n d e r que su a b u sc a deva ser espontânea, p o r um processo de d escoberta d a c ria n ç a . Além disso, essa P ed ag o g ia «extrapola as funções específicas da escola quando p re te n d e a b a rc a r m u itas dim ensões do desenvolvim ento h u m ano. P o r o u tro lado, certas posições m ais críticas o ra negam o valor à escola a tu a l devido à su a condição de re p ro d u to ra das relações sociais vigentes, o ra restrin g em seu p a p e l à discussão d a experiência vivida pelas classes p o p u la re s a fim de possib ilitar-lh es a d q u irir um a consciência política. U m a Pedagogia social v o ltad a p a ra os conteú­ dos c u ltu ra is entende que h á saberes u niversais que se constituíram em dom ínios de co nhecim ento relativ am en te autônom os incorpo­ ra d o s p ela h u m a n id ad e e que devem ser p erm a n e n te m e n te reava­ lia d o s face às realidades sociais, através de u m processo de tratis- m issão-assim ilação-reavaliação critica. O objetivo da escola, assim , será g a ra n tir a todos o sa b e r e as c a p a c id a d e s necessárias a um d o m in io de todos os cam pos d a atividade h u m a n a , com o condição p a ra red u çã o das d esigualdades de origem social.

E ste é o núcleo da ação pedagógica cujos m ecanism os íntim os devem ser bem co m p reen d id o s a fim de p o ssib ilita r suas interfaces com as dim ensões psicológica e social.