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Psicologia educacional: uma avaliação crítica

J o sé Carlos L ib â n eo

O a u to r deste texto n ão é psicólogo, m a s u m edu cad o r que, h á m ais de dez anos, vem a co m p an h an d o a tra je tó ria d a Psicologia ed u ca cio n al nos cursos de licen ciatu ra e n as escolas de 1? e 2? graus. As idéias expostas a q u i não fo rm am u m p e n sa m e n to acabado» pelo c o n trá rio , devem ser con sid erad as com o u m a ten tativ a m u ito provi­ só ria de estabelecim ento d as relações e n tre a P edagogia e a P sicologia educacional.

A m ais grave lim itação do ensino d a Psicologia educacional é a d istâ n c ia entre seu con teú d o e a p rá tic a escolar, e isso explica seu efeito qu ase insignificante n a form ação de professores. P o r exem plo, m u ito s m a n u ais em uso nos cursos referem -se a estudos e pesquisas feitos em outros paises, cujos resu ltad o s são de p o u ca ou n en h u m a valia p a ra o co tid ian o de u m a sala de a u la . E m alguns casos, o e n sin o se reduz à descrição de teo rias sob re os estágios do desenvolvim ento in fa n til ou às técnicas de d iagnóstico e tratam en to d a s dificuldades de apren d Í2agem e d istú rb io s em ocionais, sem levar em conta an teced en tes sociais d as c ria n ç a s e p rá tic a que os professores vâo e n fre n ta r n as escolas.

A Psicologia educacional com o á re a profissional específica caracterizou-se, d u ra n te m u ito tem p o , p o r ativ id ad es de tratam e n to de c ria n ç a s com p ro b le m a s de ap ren d izag em e aju stam en to escolar. P o r volta dos anos 60-65, houve te n ta tiv a s, n a m aior p arte fra c a ssa d a s, de in serção do psicólogo esco lar com o m em bro d a eq u ip e técnica d a escola ao lad o de supervisores e orientadores e d u cacio n ais. N a p rá tic a , as atrib u içõ es cabíveis a um psicólgo

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educacional sem p re a c a b aram ficando com o o rien tad o r e d u c a ­ cional e, evidentem ente, com o professor, que efetivam ente sem pre esteve exercendo algum as de suas atrib u içõ es com o “ psicólogo” aplicado.

A tu alm en te, os psicólogos escolares ou se dedicam a pesquisas so b re a escola e n ã o na escola ou a tu a m em clínicas especializadas em p ro b lem as de ap rendizagem e a ju sta m e n to escolar, p re sta n d o .serviços eventuais n as escolas.

E m 1971 Poppovic escrevia: “ Ê de se la m e n ta r em nosso p a n o ra m a a tu a l a falia de coordenação e en tro sam en to e n tre a P ed ag o g ia e a Psicologia. E n q u a n to a q u e la ra ra m e n te se p reo cu p a em u sa r os d ad o s proporcionados pelas p esq u isas psicológicas, esta, com m u ita freq ü ên cia, perm anece num cam p o teórico, sem ch eg a r a conclusões p rá tic a s de u tilid a d e p a ra a P ed ag o g ia11. O fato é que, até hoje, os psicólogos educacionais insistem em se restrin g ir a tra ta r p ro b lem as de desenvolvim ento ou a ju sta m e n to das cria n ças à escola, d en tro d a tradição da Psicologia funcionalista e m ais recen tem en te da Psicologia h u m a n ista , sem voltar-se p a ra questões com o m etodologia u sad a peios professores n a sala de aula, c u rrí­ culo, seleção e organização de con teú d o s, p articip a ção da escola na co m u n id ad e e vice-versa, co m p o rtam e n to de professores e m sua in te ra ç ã o com alunos, etc. O u seja, a fo rm ação do psicólogo se restrin g e ao contex to psicológico, sem ch eg a r ao pedagógico p ro p ria m e n te dito e , m uito m enos, ao social.

U m a das dificuldades desse en tro sa m e n to pode e sta r na im p erm eab ilid ad e entre as ciências que co n co rrem na explicação do ato educativo. D evido ao pouco desenvolvim ento d a ciência p e d a ­ gógica, os p ró p rio s educadores têm p e rm itid o que as ciências auxiliares da educação (Psicologia d a, Sociologia da, E conom ia da) d isputem a hegem onia sobre o especificam ente pedagógico. Isso, inclusive, tem favorecido to d a a sorte d e reducionism os: além do p ró p rio pedagogism o, o soctologism o e o psicologism o.

O s reducionism os p ecam p o r isolar u m aspecto d a to talid ad e do a to educativo e, em cim a desse aspecto p a rc ia l, d iscutir o objeto ed u cação . O privilegiam ento do en foque sócio-político, p o r exem ­ plo, leva a red u zir todos os pro b lem as d a escola e da educação ao co nhecim ento e crítica da função social de rep ro d u ç ã o das relações sociais de p ro d u ção q u e cum prem em n ossa sociedade. E sta posição recusa q u a lq u e r fu n d am e n taçã o psicológica n a educação, força a diluição do pedagógico no psicológico e assim falha p o r não co n sid era r o ato educativo n a sua to ta lid a d e . P o r o u tro lado, o

JOSÉ CARLOS U B À N E O

en fo q u e estritam e n te psicológico ig n o ra o efeito das condições sociais e políticas sobre o c o m p o rtam e n to , to m a n d o subjetivos os p ro b le m a s gerados p e la e s tru tu ra social e econôm ica. Q uase todas as te n d ên cia s psicológicas a tu a is (funcion alistas, h u m a n istas, cogni- tivistas, psicanalistas, o rien talistas, etc.)* c o n tin u a m m a n te n d o a c re n ç a n u m a sociedade h arm o n io sa p a ra a q u a l as pessoas devem ser a ju sta d a s, p ro cu ran d o p rin c ip a lm e n te no indivíduo a origem de suas c o n d u ta s. Os professores e técnicos esco lares tam b ém insistem no seu “ ism o” ao te n ta r preservar a m issão salv ad o ra d a escola na su p ressão das ig ualdades sociais, absolvendo o sistem a social e p o lítico e até rejeitando os auxílios científicos que p o dem ser fornecid o s p e la Psicologia. O pedagogism o a c re d ita p o d e r resolver os p ro b lem as d a escola e d o m undo d e n tro do seu interior, com o se a m u d a n ç a social pudesse se d a r com o co n seq ü ên cia d a m u d a n ça esco lar.

O ato educativo é u m a to ta lid a d e n a q u a l afluem fatores (sociais, econôm icos, psicológicos) q ue se co n stitu em n as condições

para o desenvolvim ento individual. C ondições biológicas, condições

sociais, disponibilidades psicológicas são to d as m ediações e n tre o Indivíduo e a sociedade, e que p erm item ou d ificu ltam à criança a p ro p ria r-se do p a trim ô n io cu ltu ral, co n stru in d o -se p e la su a pró­ p ria atividade, com o ser hu m an o , vale d izer, com o ser social.

D isc u tir o objeto d a Sociologia e d a P sicologia educacional supõe a discussão â o o bjeto d a ciência pedagógica, ou seja, a especificidade do pedàgógico. De fato , h á m ecanism os íntim os p ró p rio s d a relação p ed ag ó g ica q ue incluem m ediações de n a tu re z a social e política, m as ta m b é m incluem a an álise d a experiência in d iv id u al e a p ró p ria eficácia d a situ a ção de ensino. Isso significa q ue a s situações pedagógicas precedem a an álise do a to educativo n a s ^ u a s dim ensões psicológica e sociológica. N o caso d a Psicologia, ela intervém p a ra explicar os co m ponentes p síquicos envolvidos no

processo en sin o -ap re n d iza g e n u S e g u n d o M ia la re t, “o ed u ca d o r nâo

p o d e d eix ar de re sp e ita r as leis estabelecidas p e la Biologia, pela Sociologia ou pela Psicologia; m as essas leis n ão p odem ser co n sid era d as senão com o m eio de ação e de v alo r relativo às pró p rias co ndições pedagógicas” (1974).

À u tilidade da Psicologia ed u cacio n al, p o rta n to , depende do g ra u em que dâ co n ta de explicar p ro b le m a s enfren tad o s pelos p ro fessores n a sala de a u la , pro b lem as esses, no en ta n to , que so m en te p odem ser co m preendidos com o resu ltan tes de fatores e s tru tu ra is m ais am plos. N ão é possível, assim , que a Psicologia

A PRÁX1S DO PSICOLOGO IS?

ed ucacional seja d eterm in a n te d a ação p edagógica; antes,

è

u tM

fonte de orientação p ara os processos e situações pedagógicai,

cab en d o à experiência escolar a ú ltim a p a la v ra . O pape] prepon­

d e ra n te d a Psicologia é o de fornecer ao professor princípios do

co m p o rtam e n to hu m an o , especialm ente os relacionados com a

ap ren d izag em escolar, p a ra q u e ele, d e acordo com seu senso crítico, os tran sfo rm e em m étodos ad e q u a d o s às situações p ed ag ó ­ gicas co ncretas.