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Socialização nSo é integração: a criança já é sempre socializada

A Pedagogia e a Psicologia têm , q u ase sempre» tra ta d o o processo de socialização com o um estágio de in te g ra ç ã o d a crian ça à sociedade. Vim os q ue ta n to a P edagogia trad icio n al q u an to a P ed ag o g ia nova se p re o c u p a ra m em faze r d a escola u m a passagem do m u n d o infantil p a ra o m u n d o ad u lto , levando em c o n ta o que a sociedade esp era de seus m em bros em defesa d a m a n u ten ção de seus interesses.

N a sociedade m edieval, a idéia de in teg ração n ão teria sentido alg u m , u m a vçz que o espaço social e ra ig u a lm e n te eom partÜ hado p o r cria n ças e ad u lto s. C om o vim os, a n ecessidade de integração su rg iu com a exclusão d as cria n ças do m u n d o dos adultos. A in stitu iç ã o e n ca rre g ad a de iniciar a cria n ç a egressa do m eio fam iliar n a v ida social a d u lta p asso u a ser a escola.

N a atu alid a d e, a escola co n tin u a p ro p o n d o a in teg ração social — a socialização — com o um a de suas p rin c ip a is finalidades. T a l fin a lid a d e a tu a com o d issim u lad o ra d a re a lid a d e social, pois, ain d a q u e m a rg in alizad a n a e s tru tu ra social m o d e rn a , a cria n ç a sofre c o n tin u a m e n te um processo de socialização — desde o seu nasci* m e n to , a té m esm o a n tes, no ú te ro ou n a p ró p ria h istó ria de su a m ã e. P o rta n to , com o a firm a C h arlo t, “ a c ria n ç a é u m ser sem pre já socializado” (1979t p . 259). N âo se p o d e su p o r, com o a Psicologia q u ase sem pre o faz, u m desenvolvim ento social individual q u e depois se am plia, se in te g ra , ao m u n d o social adulto. D esde sem pre a c ria n ç a jâ sofre u m processo de socialização através do q ual a su a orig em social de classe d eterm in a su a co n d ição de ser social. A fo rm a ç ã o de sua p e rso n a lid a d e social n ã o p a ssa prim eiro p o r u m estág io individual p a r a depois se socializar. A inda q ue assum a os co n to rn o s de suas características especificas, ela é sem pre socia­ liz a d a . A firm ar o c o n trá rio é a c re d ita r n u m a c a p a c id a d e p ró p ria do indivíduo — n a tu ra l — p a r a a socialização. A m a rg in alid ad e social

O IN DIV ÍD UO £ AS INSTITUIÇÕES I J i

seria, e n tã o , facilm ente ex p licad a p ela in c ap acid ad e de adaptaç& o do indivíduo às no rm as sociais. F ica, assim , p len am en te ju stific a d a a fin a lid a d e ideológica d a escola de p ro m o v er a a d a p ta ç ã o do indivíduo à sociedade. A escola é u m a ag ên c ia socializadora d e um a sociedade que se afirm a d em ocrática. Se o processo de sociali­ zação- in teg ração n ã o é possível, preserva-se a escola e a ord em d em ocrática, pois a responsabilidade s e rá sem pre do indivíduo in a d a p ta d o .

A fa sta d a a idéia de socialização e n q u a n to integração» p o d e ­ m os re c u p e ra r a idéia de socialização evolutiva, p ro p o sta por C h arlo t. P a ra ele, a socialização deve ser tra ta d a com o um processo evolutivo d a co ndiçào social d a criança. A ssim , o problem a n ã o é investigar com o a crian ça se socializa, m as "com o a sociedade socializa a c ria n ç a ” {id em , p . 259).

A Psicologia tem quase sem pre te n ta d o explicar com o a crian ça se socializa, ab o rd an d o o processo pelo q ual ela se tra n s ­ fo rm a em ser social. A Psicologia não su p era, p o rtan to , o a n ta ­ gonism o en tre indivíduo e sociedade. N ão tem p o r objetivo um a análise d ialética d as relações en tre a c ria n ç a e a sociedade, n u m a p erspectiva de to talid ad e e historicidade.

A Psicologia estu d a a socialização de u m a cria n ç a que vive em condições sociais específicas e norm a tiza suas conclusões p a ra todas as crian ças. É perto que todas as c ria n ç a s vivem um período de crescim ento, de desenvolvim ento d a p e rso n a lid a d e num m u n d o social a d u lto que a in d a não é in te ira m e n te assim ilado, em q u a lq u e r m eio social. M as este processo de desenvolvim ento será diferente de acordo com su a condição social. A Psicologia no rm alm en te e stu d a esta co m plexidade de fatores com o “ in flu ên cia do m eio” . Não p erceb e que o processo de desenvolvim ento do indivíduo se inscreve n u m processo històrico-social que o d e te rm in a e, p o r su a vez, é por ele d e te rm in a d o . A ssim , o processo de socialização d a c ria n ç a é co n cre tam e n te determinado p ela su a condição histórico-social. A lém disso, e n q u a n to sujeito da h istó ria, a cria n ç a tem a possibi­ lidade de re c ria r seu processo de socialização e através dele in te rfe rir n a realid ad e social.

A firm ar q ue a crian ça é sujeito d a ação p ode causar certa e stra n h e z a n u m a sociedade q ue nega o p a p e l social d a in fân cia. Isto fica m a is explicito q u an d o consideram os as d iferentes fo rm as de p a rtic ip a ç ã o d a cria n ç a em condições sociais d istin tas. As crian ças pob res d a cid ad e e d a zo n a ru ra l tra b a lh a m desde q ue te n h a m o desenvolvim ento físico suficiente. M u ita s vezes su sten ta m suas

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fam ílias. R epresentara um im p o rtan te co n tin g en te de tra b a lh a ­ dores, quase sem pre su b em p reg ad o s, ex p lo ra d o s pelas relações de p ro d u ção . P o r o u tro lad o , as crianças dos diferentes estratos d a classe m éd ia são co n su m id o ras m u ito im p o rta n te s, en q u an to filhos de consum idores, o q u e será sem pre le m b ra d o p ela p u blicidade, p e la in d ú stria de b rin q u ed o s, discos e livros, pelas escolas p a rti­ culares, etc. Com o tra b a lh a d o ra ou com o co n su m id o ra, a criança p a rtic ip a ativam ente e n q u a n to ser social a tu a n d o m ais ou m enos de a co rd o com seu estágio de desenvolvim ento físico.

C oncluindo, o pro cesso de socialização da cria n ç a n âo pode ser tra ta d o senào d e n tro d a perspectiva d a análise d ialética das relações de reciprocidade estabelecidas e n tre a cria n ç a e a sociedade d e classes, o processo de socialização só p o d e ser tra ta d o com o u m processo evolutivo d a condição social d a c ria n ç a , co nsiderando a su a orig em de classe.