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Espaços Públicos Participativos

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3. GESTÃO SOCIAL, PARTICIPAÇÃO E ESPAÇOS PÚBLICOS: CONSTRUINDO

3.3. Espaços Públicos Participativos

Esferas públicas, espaços públicos ou instâncias participativas são considerados “formas diferenciadas de incorporação de cidadãos e associações da sociedade na deliberação sobre políticas” (AVRITZER, 2008, p. 45). Por isso, são reconhecidos como constructos institucionais inovadores, ou melhor, renovadores do ponto da vista da relação Estado- sociedade pelo seu caráter plural, participativo e deliberativo (TATAGIBA, 2004). Representam, portanto, desenhos institucionais de partilha do poder e são constituídos pelo próprio Estado, com representação paritária de atores da sociedade civil e do Estado (AVRITZER, 2008).

Tais instâncias são constituintes do modelo de gestão das políticas públicas, sendo suas deliberações fruto do processo de discussão com os representantes do Estado, que devem ter como eixos norteadores a representatividade de seus membros, a visibilidade de suas proposições, a transparência das relações e a articulação com a sociedade para garantir o processo democrático e a qualidade das ações (ASSIS; VILA, 2003).

Isso promove uma nova governança democrática, com a inclusão de diversos atores sociais no processo de tomada de decisão, antes restrito aos dirigentes políticos. Além disso, com a institucionalização desses canais de participação, é possibilitado não somente o compartilhamento de ideias e de posições entre os segmentos que compõem a sociedade civil, como também o envolvimento direto do cidadão junto ao Estado na construção de um novo modelo de gestão pública (FUNG; WRIGHT, 2003; GAVENTA, 2001).

A institucionalização de espaços participativos na gestão pública está relacionada à consolidação da democracia representativa em países latino-americanos no final da década de 1980, o que ocasionou na inauguração da democracia participativa por meio da previsão de mecanismos de participação direta nas respectivas legislações constitucionais.

Entretanto, é importante ressaltar que nos países latino-americanos há distinções quanto ao processo de consolidação democrática e à institucionalização de mecanismos de participação. É o que será abordado no próximo capítulo, quando será estabelecida uma comparação entre Brasil e Argentina no que concerne à constituição de espaços públicos participativos entre Estado e sociedade. No caso argentino, por exemplo, a democracia instaurada na década de 1980 e fortalecida nos anos 1990 não pressupôs um novo modelo de relação entre Estado e sociedade que contribuísse, por um lado, para a atuação do Estado enquanto agente de desenvolvimento e democratização e, por outro, na efetiva criação de canais institucionais de participação nos níveis locais que promovessem a descentralização da gestão do Estado (GABARRA; ZAGNI; HAIEK, 2004).

Os espaços públicos participativos fazem parte do aprofundamento da democracia e da descentralização do poder político, à medida que:

(1) tornam os mecanismos de decisão política permeáveis à influência dos setores da sociedade civil que geralmente têm se mantidos à margem dos processos decisórios; (2) favorecem a ampliação da política, seja por questionar a unilateralidade do Estado na tomada de decisões, seja por questionar a prevalência dos interesses de grupos privilegiados;

(3) permitem que as decisões políticas sejam fruto de uma deliberação pública ampliada, na qual um número maior de demandas e propostas pode se fazer ouvir e representar;

(4) atuam na revisão de prioridades e na agenda política, ao questionarem a exclusão social, tendo em vista o seu potencial em transformar carências e necessidades da sociedade em termos de políticas públicas;

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(5) contribuem para o aprendizado e a consolidação de uma cultura de direitos, pois possibilitam a convivência e a interlocução entre diversos grupos sociais portadores de bandeiras identitárias legítimas;

(6) reconhecem o outro como um “sujeito portador de direitos”, pois detém a capacidade de superar assimetrias de poder e construir um espaço democrático que supere os conflitos sociais (GRUPO DE ESTUDOS SOBRE A CONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA, 1998-1999).

Tais medidas se tornam possíveis porque os espaços públicos de cogestão entre Estado e sociedade possuem (1) composição plural e paritária, (2) são de natureza deliberativa e (3) assumem funções de formulação e controle na execução de políticas públicas setoriais (TATAGIBA, 2002).

Em relação à composição plural e paritária, nas esferas públicas se fazem representar tanto organizações da sociedade civil (associações, sindicatos, movimentos sociais, organizações não governamentais, conselhos comunitários etc.), quanto agências do Estado (secretários, órgãos públicos, instituições de ensino e pesquisa etc.). A pluralidade de segmentos participantes, em vez de ser percebida como obstáculo, corresponde à natureza pública e constitutiva da própria sociedade (TATAGIBA, 2002).

O maior desafio, portanto, reside justamente neste aspecto: incluir diferentes atores sociais junto ao Estado no processo deliberativo, sobretudo aqueles em situação de desvantagem, os quais, ali inseridos, podem expressar e sustentar publicamente sua diferença, de modo que haja compartilhamento de necessidades e influência nos resultados da deliberação (TATAGIBA, 2002).

Para isso, o processo dialógico torna-se o elemento primordial na dinâmica deliberativa, ao ser considerado instrumento privilegiado na resolução de conflitos característicos da diversidade de interesses presentes no jogo político. Para que os espaços públicos participativos gerem impactos nas políticas públicas, torna-se necessário o estabelecimento de acordos entre os diversos participantes que necessitam expor e defender publicamente suas posições na forma de argumentos racionais, o que contraria outras maneiras de atuar politicamente, como a troca de favores, o clientelismo, a cooperação etc. Ademais, os argumentos devem ser construídos a partir de princípios éticos elementares de vida pública (TATAGIBA, 2002).

Aliada à natureza deliberativa da institucionalização dos espaços públicos na gestão pública, é garantida à sociedade civil o exercício de competências legais para formular políticas e fiscalizar sua implementação, além de redefinir prioridades contribuindo para a democratização da gestão e da partilha do poder do Estado em direção à sociedade (TATAGIBA, 2002).

Além dessas características que configuram o potencial dos espaços públicos participativos, outro elemento a ser considerado diz respeito ao desenho institucional, ou seja, o aparato normativo que estabelece as regras de funcionamento dessas instâncias. A primeira característica do desenho institucional consiste na resolução de problemas de interesse público. Isso se torna possível devido algumas características, como: (1) o potencial de mobilizar e capacitar os cidadãos; (2) ao participarem, os cidadãos, por vivenciarem os problemas, sabem a melhor forma de resolvê-los; (3) permitem a participação de diferentes grupos que, no processo de discussão, tendem a gerar melhores soluções, em comparação com formas centralizadoras e hierárquicas; (4) encurtam a distância e o tempo entre as decisões na ação pública, pois criam um formato ágil de atividade coletiva que reconhece e responde as estratégias ineficazes; (5) congrega diversos segmentos sociais como componentes que atuam de forma articulada e cooperada, o que permite a construção de múltiplas estratégias a serem construídas para o enfrentamento dos problemas (FUNG; WRIGHT, 2003).

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A segunda característica do desenho institucional refere-se ao seu caráter de espaço público, aberto à participação da sociedade. Isso permite que cidadãos comuns tenham contato com representantes do Estado e, por meio de suas entidades representativas, participem do processo decisório, tornando as decisões mais justas e equitativas. Soma-se a isso, a inclusão de grupos menos favorecidos, tradicionalmente excluídos, que através da participação em espaços públicos possuem a chance de interferir na tomada de decisão política (GAVENTA, 2001; FUNG; WRIGHT, 2003).

Ao possibilitar a ampliação da participação cidadã na gestão pública, partilhando poder entre Estado e sociedade, os espaços públicos contribuem para que informações baseadas na sabedoria local dos cidadãos tenham permeabilidade junto ao Estado e, dessa maneira, sejam consideradas no enfrentamento dos problemas (GAVENTA, 2001; FUNG; WRIGHT, 2003).

Além disso, os arranjos institucionais também servem como canais de comunicação à população sobre questões que importam profundamente aos cidadãos como, por exemplo, a destinação dos recursos públicos. Uma conexão direta é estabelecida entre o cidadão e o Estado, por meio da participação em instâncias mais inclusivas e democráticas, redefinido, desta forma, o conceito de cidadania e participação (GAVENTA, 2001; FUNG; WRIGHT, 2003).

Uma das principais características dos arranjos institucionais participativos é a constituição de uma estrutura de governança orientada por questões concretas, de interesse público, como, por exemplo, questões de segurança pública, saúde, educação, desenvolvimento rural e orçamento municipal. Tal estrutura deve seguir um modelo que priorize a participação de baixo para cima (bottom-up participation), em detrimento de um modelo hierárquico (top-down), onde o esforço central é a resolução de problemas de forma pactuada, com a participação direta e substancial nas decisões de segmentos sociais tradicionalmente excluídos (FUNG; WRIGHT, 2003).

Ainda sobre o desenho institucional, os espaços públicos participativos garantem a inserção da sociedade no processo de decisão política, possuindo as condições para que o mesmo se estabeleça pela forma deliberativa. O processo de tomada de decisões em espaços públicos permite que os envolvidos ouçam as posições dos diferentes grupos e façam escolhas após as considerações. Contudo, é importante considerar que esse processo, na maior parte das vezes, é permeado por conflitos entre os diversos participantes, sendo difícil a convergência para um consenso (FUNG; WRIGHT, 2003).

Dentre as características mencionadas acima que justificam o desenho institucional como um dos aspectos centrais do processo decisório participativo, Avritzer (2008) chama a atenção para o fato de que o êxito dos processos participativos não pode estar concentrado apenas no aspecto das disposições normativas, mas sim na forma como se articulam desenho institucional, organização da sociedade civil e vontade política na implementação das instâncias de participação.

De forma similar, Coelho et. al (2005b) destaca os aspectos que ultrapassam o marco institucional dos espaços decisórios participativos: “as regras do jogo importam, mas há um jogo das regras que permite ver estes espaços a partir de seu enraizamento no rol mais amplo de conflitos e homologias estruturais das quais estes fóruns são uma expressão” (p. 32).

Esse “jogo das regras” é perceptível quando aliamos a discussão da gestão social à prática deliberativa em espaços públicos participativos, sobretudo numa abrangência que ultrapassa o local e incorpora a delimitação territorial, como é o caso da ênfase dada ao estudo em tela. Tal relação gestão social-esfera pública-território requer a construção de uma dinâmica política que promova a articulação e a cooperação entre os participantes, tendo em vista que o objetivo é a promoção do desenvolvimento (ABRAMOVAY, 2001; BEDUSCHI

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FILHO, 2007; COELHO et. al., 2005a; COELHO et. al., 2005b; COELHO; FAVARETO, 2008; FAVARETO, 2006; 2008; 2010a).

Portanto, mesmo que o desenho institucional seja considerado um elemento importante, variáveis como inclusão, negociação e cooperação inerentes à deliberação também constituem elementos centrais da dinâmica interna desses espaços públicos. Com isso, devem ser ressaltados a atuação característica de cada segmento social no processo político decisório e as motivações dos grupos participantes para a construção de ações pactuadas de desenvolvimento (COELHO et. al., 2006).

Assim, se por um lado, os estudos reconhecem a inovação institucional que os espaços decisórios participativos representam para o contexto democrático, por outro, apontam diversos entraves, principalmente a fragilidade da participação e sua submissão às elites dominantes (ABRAMOVAY, 2001).

Além desses, outras dificuldades também podem ser destacadas quanto à efetivação dos espaços públicos como arranjos institucionais inéditos capazes de traduzir processo deliberativo em ações públicas concretas. Tais limitações referem-se tanto a questões de desenho institucional, “regras do jogo” que norteiam o funcionamento desses espaços, como também a elementos que caracterizam o “jogo das regras”, principalmente aqueles relacionados à cultura política democrática; identidade; mobilização e organização social; capacidades técnicas e políticas (TATAGIBA, 2002).

A primeira delas, relacionada ao desenho institucional, diz respeito à valorização do caráter “público”, democrático e participativo dos espaços públicos. No caso de esferas públicas institucionalizadas, o formato obedece a diretrizes básicas, padronizadas, que provêm de sua regulamentação legal, em que a participação da sociedade civil é obrigatória para a existência do espaço. Por isso, logo constituída a instância participativa, os primeiros encontros devem ser dedicados a estruturar e pactuar o regimento com as disposições normativas de operacionalização concreta de funcionamento (DAGNINO, 2002).

No entanto, o que ocorre é o atropelamento nesse processo de constituição dos espaços públicos institucionalizados, o que acaba por conferir ao Estado a centralidade na composição dos membros participantes, a elaboração das regras de funcionamento, a determinação dos assuntos a serem discutidos, dentre outros. A ausência da informação destinada à população em relação à existência do espaço, o desconhecimento sobre suas funções e potencialidades, a falta de consciência política sobre a importância da sociedade “tomar parte” das instâncias participativas acabam por minar a priori o potencial democrático e deliberativo dos espaços públicos.

Outro entrave se liga à composição paritária e sua influência no processo decisório deliberativo. Ao constituírem-se espaços institucionais de participação, compreendeu-se que a sua composição deveria seguir um número par de membros que atuassem como representantes do poder público e da sociedade civil. A paridade foi considerada uma condição preliminar para uma justa disputa entre posições e interesses divergentes entre os diversos segmentos representantes, garantindo, dessa maneira, a legitimidade e o equilíbrio do processo deliberativo (TATAGIBA, 2002).

Porém, o que se tem percebido é que a paridade não gera efeitos no debate político, apenas serve como expressão numérica na regulamentação dos espaços públicos, pois, na maior parte das vezes, tende para a cultura política traduzida em vantagens para os governos e desequilíbrios no processo decisório. A igualdade numérica não é suficiente para garantir o equilíbrio de forças no processo decisório, o que é explicado pela (1) dificuldade em tornar o espaço público um campo de discussão e deliberação de propostas com a presença de segmentos plurais da sociedade e da presença do Estado; (2) qualificação dos participantes para “fazerem parte” do processo deliberativo; (3) organização social e fortalecimento da relação entre representante-representado (TATAGIBA, 2002).

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Outra dificuldade encontrada diz respeito ao reconhecimento do “outro”, tendo em vista a multiplicidade de segmentos que participam dos espaços públicos e a diversidade de motivos que os fizeram participar. Interesses distintos, muitas vezes conflitantes e particularistas entre os atores sociais dificultam a construção coletiva de propostas e, consequentemente, a formação de consenso em prol do bem-estar social (TATAGIBA, 2002).

Como já mencionado, é importante não “romantizar” a participação, e isso passa por não desconsiderar que o campo da sociedade civil é heterogêneo e altamente fragmentado, havendo disputa por recursos, muitas vezes exíguos; distintos projetos políticos que animam a participação; diferentes percepções e posições no que diz respeito à compreensão sobre participar da elaboração e implementação de políticas públicas, podendo ocorrer intenções particularistas e de favorecimento (TATAGIBA, 2002). Como resume Dagnino (2002, p. 281): “(...) A conhecida e bem difundida visão da sociedade civil como “polo de virtude” e do Estado como a “encarnação do mal””.

Reconhecer o “outro” passa pelo entendimento de que os segmentos sociais que compõem a sociedade civil são plurais e, consequentemente, possuem demandas específicas que, ao “fazerem parte” dos espaços públicos, exigem respeito à diferença e motivação para a construção de projetos comuns. Isso passa também pela atuação do Estado em espaços públicos, que ali representa mais um ator político junto à sociedade e deve saber considerar as opiniões, respeitar a sabedoria popular e estar permeável a novas decisões que podem refazer as estratégias anteriormente consideradas pela administração pública.

A ferramenta para isso é o diálogo entre os participantes, tanto entre aqueles que representam o Estado, como entre os que representam a sociedade. Por mais que o processo deliberativo seja permeado pela explanação de argumentos que defendam posições divergentes, não se pode perder de vista que o intuito da participação em espaços públicos é o debate sobre questões de interesse público operacionalizado pela gestão social em detrimento de uma gestão estratégica.

Todavia, nem sempre o diálogo torna-se o instrumento privilegiado para a resolução de conflitos, tampouco as esferas públicas são legitimadas enquanto espaços potenciais para expressar reivindicações, expor diferenças e construir coletivamente propostas e projetos comuns. Ao contrário, o que se percebe é a dificuldade em explicitar interesses e, principalmente, de reconhecer o conflito na qualidade de troca de ideias e o debate de argumentos como procedimentos necessários para a tomada de decisão (TATAGIBA, 2002).

Relacionado a esse aspecto, muitas vezes o Estado assume o controle da dinâmica de funcionamento dos espaços públicos, definindo, de forma unilateral, os temas relevantes de acordo com seus interesses. Dessa forma, o diálogo, o processo de discussão e a deliberação acabam por se tornarem irrelevantes, o que desqualifica as instâncias participativas como campo de decisão política.

Frente a esse cenário, outras estratégias são utilizadas na resolução do binômio pluralidade/deliberação, que passam ao largo da utilização do diálogo como método da dinâmica política, como a cooptação, a manipulação e a troca de favores presentes na relação Estado-sociedade e, por que não, entre os diversos segmentos sociais que compõem a sociedade civil como forma de favorecimento e conciliação de interesses.

Além do reconhecimento do “outro” e do diálogo como ferramentas indispensáveis para a integração social em demandas específicas que podem se tornar comuns, o fortalecimento da participação dos atores sociais em espaços públicos passa pelo seu contato com a base, ou seja, pela efetiva relação entre representantes e representados. Quanto mais forte for essa relação, maior será a participação nos espaços públicos como forma de “tomar parte” e de se apropriar das discussões e do processo deliberativo (TATAGIBA, 2002).

Os representantes governamentais que participam dos espaços públicos, em sua maior parte, possuem um vínculo frágil com seus órgãos de origem e tendem a defender suas

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próprias opiniões, em detrimento das propostas e posicionamentos resultantes da discussão com suas respectivas agências estatais envolvidas. Com isso, as posições do poder público nem sempre chegam ao conhecimento do público participante dos espaços públicos. Isso ocorre, muitas vezes, pela pouca importância conferida ao Estado nos espaços de cogestão com a sociedade, o que acarreta a inserção de representantes com pouco poder de decisão política (TATAGIBA, 2002).

A questão da representatividade passa também pela atuação de segmentos da sociedade civil em diversos espaços públicos, em diferentes áreas. Até mesmo para aquele representante da sociedade civil bem intencionado, é difícil acompanhar e se “fazer parte” de forma real em múltiplas instâncias de participação. Acontece que tais instâncias se tornaram obrigatórias por legislação nacional, o que demanda representatividade de segmentos da sociedade civil na validação do seu funcionamento. Acontece que nem sempre há essa motivação ou engajamento de tantos atores sociais para a participação em espaços públicos, ocasionando, dessa maneira, a formação de uma “elite participativa” que sempre se perpetua como representante da sociedade civil nesses espaços (TATAGIBA, 2002).

A ausência de uma via de mão dupla entre representantes e representados, ou seja, essa fragilidade de enraizamento com as respectivas entidades, acaba por ocasionar a emissão de posições particulares sobre determinados temas e, especialmente, a adesão de propostas defendidas por aqueles segmentos mais articulados e representativos que detêm maior poder de influência e argumentação (TATAGIBA, 2002).

Aliado ao aspecto da representatividade nos conselhos, tem-se a qualificação técnica e política da sociedade civil para uma efetiva deliberação. A participação em instâncias decisórias de cogestão com o Estado necessita de certas capacidades que nem sempre os atores sociais possuem e que são consideradas fundamentais para “tomar parte” do processo deliberativo (DAGNINO, 2002; TATAGIBA, 2002).

A exigência de um saber técnico especializado, principalmente pelos segmentos mais subalternos, diz respeito à capacidade de negociação no processo deliberativo sem a perda da autonomia, para uma melhor construção do interesse público possibilitada pela efetiva participação na formulação, discussão, deliberação ou execução das políticas públicas (DAGNINO, 2002).

Tal conhecimento passa por questões mais específicas, desde o entendimento de uma planilha de custos orçamentários até a compressão macroestrutural do funcionamento do Estado, da máquina administrativa e dos procedimentos envolvidos. No entanto, a disposição por tal qualificação exige da sociedade civil um considerável investimento de tempo e energia que, muitas vezes, num quadro de disponibilidade limitada, acaba dando prioridade a compromissos já estabelecidos. Esse dilema é central quando se analisa a participação pela luta institucional, como é o caso deste estudo, que associa a prática da gestão social aos espaços públicos de cogestão com o Estado, ou pela mobilização social, como atuação dos cidadãos pela organização social, mas fora da alçada institucional, como os movimentos sociais, fóruns de participação etc. (DAGNINO, 2002).

De forma geral, pode-se concluir que a efetiva inserção da sociedade nos espaços públicos está diretamente relacionada a um conjunto de condições para a participação que seja capaz de promover uma igualdade de oportunidades, evitando, dessa maneira, que existam excluídos durante o processo deliberativo. Por isso, para que haja as mesmas condições participativas entre os diversos membros participantes, é necessário atentar para alguns

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